Diagnóstico: A carga fiscal não cessa de aumentar, tendo atingido um valor record de 37,7% do PIB em 2018. Após o Programa de Ajustamento, em que aquela subiu acentuadamente, seria de esperar um alívio durante a legislatura a acabar, mas tal não aconteceu. Por outro lado, vários especialistas têm apontado que existem várias taxas marginais de imposto elevadas que distorcem a economia, nomeadamente as decisões de trabalhar (emprego-desemprego, reforma), poupar e investir. Como se referiu acima, a taxa de investimento líquida foi negativa no quinquénio de 2014 e a taxa de poupança das famílias é quase um terço da média da zona Euro (4,6 contra 12% do PIB em 2018).
O sistema fiscal atual não só é uma manta de retalhos como não revela um mínimo de estabilidade, além de ser bastante complexo. Em termos internacionais revela um baixo nível de competitividade fiscal (sobretudo em relação aos países com quem competimos) e não está em linha com as mais modernas teorias económicas.
O sistema fiscal português teve a maior reforma em 1988 e depois foi sujeito a uma miríade de modificações e alterações não só de taxas como de redefinições constantes da base fiscal. Vários especialistas têm apontado a necessidade de fazer uma reforma de fundo para simplificar, modernizar e tornar o sistema mais fácil de utilizar.
Quesitos:
- A política fiscal proposta pretende tornar o sistema fiscal mais simples, moderno, estável e com baixos custos de compliance?
- A política fiscal incentiva a poupança das famílias? Com especial preocupação para complementar a reforma?
- A política fiscal contribui para os incentivos para trabalhar?
- A política fiscal assegura a competitividade fiscal das empresas? Contribui para a poupança das empresas? Com especial preocupação pela recapitalização das empresas?
- A política fiscal incentiva o investimento das famílias, em capital humano e outros ativos líquidos ou ilíquidos, que possam contribuir para o crescimento?
- A política fiscal incentiva o investimento das empresas, sobretudo em investimento diretamente reprodutivo e que contribuam para as exportações?
Conclusão: Nenhum partido propõe uma reforma fiscal abrangente. O CDS propõe uma forte redução do IRC sobre as empresas. O PSD uma redução não tão significativa. O PS não faz propostas nesta matéria. O BE e PCP propõem aumentos substanciais dos impostos sobre as empresas.
O CDS e PSD propõem reduções do IRS, o primeiro levando a um corte significativo das taxas marginais. O PS propõe o englobamento de todos os rendimentos (incluindo as rendas e de capitais) no IRS — o que iria fazer subir a carga fiscal e reduzir a poupança, a não ser que faça cortes das taxas médias. O BE e PCP propõem também o englobamento, aumentos dos impostos sobre património e subida das taxas de IRS para os escalões mais elevados de rendimento.
PS
Resumo: A carga fiscal não se reduz. Propõe-se o englobamento e a política fiscal é inadequada para aumentar a poupança e investimento.
Respostas aos quesitos:
- A política fiscal proposta pretende tornar o sistema fiscal mais simples, moderno, estável e com baixos custos de compliance?
Não há medidas de reforma fiscal nem de desagravamento fiscal previstas no programa. A nível do IRS propõe-se um aumento da progressividade, acentuando as já elevadas taxas marginais de imposto. Propõe-se também o englobamento de todos os rendimentos no IRS, incluindo os impostos sobre juros e rendas (posteriormente, o Partido indicou uma possível ligeira redução da carga do IRS, nos escalões mais baixos, que poderia levar a uma redução de 0,4 pontos percentuais do PIB da carga fiscal). Não se prevê qualquer redução do IRC, mas a eliminação de benefícios fiscais, dentro da revisão em curso. - A política fiscal incentiva a poupança das famílias? Com especial preocupação para complementar a reforma?
O englobamento de todos os rendimentos em sede de IRS constituirá um grave ataque à poupança das famílias portuguesas, na medida a que podem taxar a 48% rendimentos de capital que até agora eram taxados a 28%. Esta circunstância irá diminuir ainda mais a poupança portuguesa, que é já uma das reduzidas da Europa, em prejuízo nomeadamente do investimento. - A política fiscal contribui para os incentivos para trabalhar?
Na medida em que acentua as taxas marginais sobre os rendimentos do trabalho: não. - A política fiscal assegura a competitividade fiscal das empresas? Contribui para a poupança das empresas? Com especial preocupação pela recapitalização das empresas?
Não, e se houver redução dos benefícios fiscais, sem redução de taxas haverá aumento de impostos para as empresas. - A política fiscal incentiva o investimento das famílias, em capital humano e outros ativos líquidos ou ilíquidos, que possam contribuir para o crescimento?
Também não. - A política fiscal incentiva o investimento das empresas, sobretudo em investimento diretamente reprodutivo e que contribuam para as exportações?
Também não.
PSD
Resumo: Redução da carga fiscal em 1,6 pontos percentuais do PIB, que se divide em cerca de metade entre redução do IRS nos escalões inferiores e médios, e na redução do IRC sobre as empresas.
Respostas aos quesitos:
- A política fiscal proposta pretende tornar o sistema fiscal mais simples, moderno, estável e com baixos custos de compliance?
Não há medidas de reforma fiscal propostas. - A política fiscal incentiva a poupança das famílias? Com especial preocupação para complementar a reforma?
Propõem-se incentivos à poupança, mas faltam detalhes. A redução do IVA pago pelas famílias de 23 para 6%, custando 500 milhões de Euros, não ataca o problema principal dos custos de energia que são os subsídios pagos pelos consumidores aos produtores. - A política fiscal contribui para os incentivos para trabalhar?
A redução das taxas de IRS, de cerca de 15% dos escalões intermédios, contribui para uma maior propensão para trabalhar, mas permanecem elevadas as taxas marginais. - A política fiscal assegura a competitividade fiscal das empresas? Contribui para a poupança das empresas? Com especial preocupação pela recapitalização das empresas?
A redução da taxa de IRC de 21 para 17%, acompanhada do alargamento da dedução dos lucros retidos e dos créditos para investimento produtivo, contribui para a poupança das empresas, embora o montante (300 milhões de euros) seja reduzido.
- A política fiscal incentiva o investimento das famílias, em capital humano e outros ativos líquidos ou ilíquidos, que possam contribuir para o crescimento?
O alargamento da dedução da educação. A redução do IMI no equivalente a 1 300 milhões de Euros, contribui para o investimento em casas de habitação. - A política fiscal incentiva o investimento das empresas, sobretudo em investimento diretamente reprodutivo e que contribuam para as exportações?
O crédito fiscal ao investimento produtivo, mas faltam detalhes. Falta especificar as medidas fiscais propostas para incentivar as exportações.
CDS
Resumo: “Baixamos em 15% a taxa efetiva média de IRS até 2023 e isentamos de IRS as quantias investidas, tributando só o rendimento gasto — não o rendimento investido ou poupado. … Baixamos sucessivamente o IRC até o comparar com o irlandês, e revemos o tratamento das PME, para que não imponha requisitos onerosos ao crescimento das empresas. … Se há um excedente orçamental, ele tem de servir para devolver aos portugueses os frutos do seu enorme esforço, não para engordar uma visão tentacular do Estado e projetos de poder político-partidários.”
Respostas aos quesitos:
- A política fiscal proposta pretende tornar o sistema fiscal mais simples, moderno, estável e com baixos custos de compliance?
Não há medidas de reforma fiscal propostas. A principal medida é re-equilibrar a relação entre a administração tributária e os contribuintes para evitar abusos. - A política fiscal incentiva a poupança das famílias? Com especial preocupação para complementar a reforma?
O CDS propôs (a) redução de todos os escalões do IRS em 15%, de forma a reduzir a carga fiscal em 3,2 milhões de Euros, e (b) redução da taxa de IRC dos atuais 21% para 12,5% em seis anos. Para além da redução do IRS, o CDS propõe a criação de um sistema complementar de reforma, via o atual sistema de Segurança Social, por descontos adicionais do trabalhador ou contribuições das empresas, com benefícios fiscais. Criação de um sistema de informação pessoal baseado na Segurança Social sobre a capitalização dos descontos para a reforma. - A política fiscal contribui para os incentivos para trabalhar?
A redução das taxas de IRS, de cerca de 15% em todos os escalões, contribui para uma maior propensão para trabalhar e reduz as taxas marginais. - A política fiscal assegura a competitividade fiscal das empresas? Contribui para a poupança das empresas? Com especial preocupação pela recapitalização das empresas?
A redução da taxa de IRC contribui para a competitividade fiscal das empresas, para a poupança e recapitalização das empresas. Coloca Portugal em pé de igualdade com a Irlanda e com taxas mais baixas que a Europa de Leste. Além disso o PE propõe a isenção fiscal do investimento, aproximando o regime fiscal do tipo cash-flow. - A política fiscal incentiva o investimento das famílias, em capital humano e outros ativos líquidos ou ilíquidos, que possam contribuir para o crescimento?
Não há medidas adicionais para incentivar investimento das famílias. - A política fiscal incentiva o investimento das empresas, sobretudo em investimento diretamente reprodutivo e que contribuam para as exportações?
Ver 4.
BLOCO
Resumo: O PE abrange um conjunto alargado de medidas de agravamento fiscal, com incidência sobretudo na classe média e alta de rendimentos, aumentando a sua progressividade. Além dos impostos sobre o rendimento também se agravam os impostos sobre o património.
Respostas aos quesitos:
- A política fiscal proposta pretende tornar o sistema fiscal mais simples, moderno, estável e com baixos custos de compliance?
Não há medidas de reforma fiscal. As medidas de alteração fiscal são: (i) agravamento da progressividade fiscal através do englobamento obrigatório dos rendimentos do trabalho e de capital em sede de IRS, a introdução de oito escalões de IRS, (ii) criação de um imposto sobre doações e heranças, com uma taxa de 25% para um património superior a 2 milhões de euros e 16% para patrimónios entre 1 e 2 milhões de euros, (iii) agravamento do IRC: um novo escalão de derrama estadual de 7% para empresas com lucros superiores a 20 milhões de euros; (iv) novo imposto sobre o património de 0,6% a 1,2%, consoante o valor seja de 2.000 ou 8.000 salários mínimos. (v) aumento até 50% do imposto sobre as mais-valias imobiliárias, (vi) novo imposto de 0,75% sobre o valor acrescentado das grandes empresas, e (viii) eliminação, sempre que possível, dos benefícios fiscais a pessoas, empresas e instituições. - A política fiscal incentiva a poupança das famílias? Com especial preocupação para complementar a reforma?
Não, as medidas propostas reduziriam a poupança, pois a maior parte desta é feita pelas classes média e de rendimentos mais altos. - A política fiscal contribui para os incentivos para trabalhar?
Não, porque se propõe subir ainda mais as taxas marginais do imposto sobre o rendimento. - A política fiscal assegura a competitividade fiscal das empresas? Contribui para a poupança das empresas? Com especial preocupação pela recapitalização das empresas?
Não, porque a subida dos impostos sobre as empresas reduz a competitividade global. - A política fiscal incentiva o investimento das famílias, em capital humano e outros ativos líquidos ou ilíquidos, que possam contribuir para o crescimento?
Não, porque a subida das taxas marginais do IRS reduz a taxa de rentabilidade da acumulação de capital humano. - A política fiscal incentiva o investimento das empresas, sobretudo em investimento diretamente reprodutivo e que contribuam para as exportações?
Não, pelas mesmas razões de 4.
PCP
Resumo: Propõe-se, para além do englobamento de todos os rendimentos no IRS, um aumento da taxa de IRS máxima de 75%, aumento dos impostos sobre as empresas e redução em 2 pp no IVA.
Respostas aos quesitos:
- A política fiscal proposta pretende tornar o sistema fiscal mais simples, moderno, estável e com baixos custos de compliance?
Não há medidas de reforma fiscal. A política fiscal proposta compõe-se por: (a) englobamento de todos os rendimentos no IRS, o que equivale a um aumento dos impostos sobre rendimento das famílias de cerca de mil milhões de euros, equivalente a um aumento médio de 7,9%, mas se excluir uma parte significativa dos menores rendimentos, poderá ser de 12 a 15% para os restantes, (b) criação de dois novos escalões de 65 e 75% (só o governo socialista de François Hollande introduziu uma taxa deste nível em França. Esta medida provocou uma elevada saída de capitais, e foi abandonada passados dois anos, porque as receitas caíram. Veja-se Aghion, P. , V. Ciornohuz, M. Gravoueille, S. Stancheva, Reforms and Dynamics of Income: Evidence Using New Panel Data. Mimeo, July 2019, disponível em https://scholar.harvard.edu/aghion/publications) para os rendimentos superiores a 152 e 500 mil Euros, que gerariam um acréscimo de rendimento não quantificado, mas baixo, (c) redução da taxa normal do IVA de 23 para 21% e redução do IVA sobre eletricidade para 6%, (d) subir a taxa de IRC de 21 para 25% e 35% para lucros superiores a 3 milhões de Euros, (e) taxa de 0,5% sobre todas as transações financeiras, (f) imposto sobre património mobiliário (não especificado). - A política fiscal incentiva a poupança das famílias? Com especial preocupação para complementar a reforma?
Não, as medidas propostas reduziriam a poupança, pois a maior parte desta é feita pelas classes média e de rendimentos mais altos. - A política fiscal contribui para os incentivos para trabalhar?
Não, porque se propõe subir ainda mais as taxas marginais do imposto sobre o rendimento. - A política fiscal assegura a competitividade fiscal das empresas? Contribui para a poupança das empresas? Com especial preocupação pela recapitalização das empresas?
Não, porque a subida dos impostos sobre as empresas reduz a competitividade global. - A política fiscal incentiva o investimento das famílias, em capital humano e outros ativos líquidos ou ilíquidos, que possam contribuir para o crescimento?
Não, porque a subida das taxas marginais do IRS reduz a taxa de rentabilidade da acumulação de capital humano. - A política fiscal incentiva o investimento das empresas, sobretudo em investimento diretamente reprodutivo e que contribuam para as exportações?
Não, pelas mesmas razões de 4.
PAN
Resumo: As medidas orçamentais propostas são a reformulação da política fiscal para a tornar mais amiga do ambiente e o aumento da dedução pessoal, bem como subida de alguns benefícios sociais.
ALIANÇA
Resumo: “… Este deficit é conseguido com uma carga fiscal que atingiu o máximo da nossa história e compromete o nosso desenvolvimento estrutural, seja pela reduzida propensão para o investimento (IRC) seja pela fuga dos nossos talentos humanos que procuram melhores condições de trabalho (IRS) no exterior, pondo a perder o investimento formativo que fizemos no seu percurso académico.”
A política orçamental propõe reduzir a carga fiscal aproveitando a margem orçamental, mas sem especificar qual é. Redução do IRC para 17% em 2022. Aumento das deduções em sede de IRS e maior progressividade.
INICIATIVA LIBERAL
Resumo: Propõe pela primeira vez em Portugal um “flat-tax” de 15% para o IRS. Também propõe um orçamento de base zero e redução do peso do Estado, introduzindo maior liberdade de escolha para o utente, na saúde (generalização da ADSE) e no ensino (cheque ensino).
Análise aos programas eleitorais dos partidos
Abel Mateus