A assembleia do Livre decidiu enviar a polémica em que o partido se viu envolvido com a deputada Joacine Katar Moreira para o Conselho de Jurisdição. Apesar de não ter havido qualquer referência a essa decisão no comunicado divulgado no final da reunião de domingo, a notícia foi conhecida na tarde desta segunda-feira, depois de avançada pelo Público.

Mas esta decisão só foi tomada depois de Joacine Katar Moreira ter saído da reunião. A revelação é feita ao Observador por Rafael Esteves Martins, assessor de Joacine Katar Moreira no Parlamento. Segundo conta o assessor, enquanto a deputada esteve presente na reunião da assembleia do Livre no passado domingo, chegou a ser colocada a hipótese de enviar a polémica dos últimos dias para o Conselho de Jurisdição mas por proposta da presidente da mesa, foi acordado que seria antes nomeado “um mediador da assembleia para sanar as relações entre o grupo de contacto e a deputada”.

Joacine Katar Moreira esteve presente na reunião, mas saiu antes, cerca de três horas depois do início da assembleia (por ter um comboio para apanhar ao final da tarde até Carregal do Sal onde se encontra esta segunda-feira, a propósito da proposta para que Aristides de Sousa Mendes tenha honras de Panteão).

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De acordo com o assessor da deputada, Joacine Katar Moreira concordou com a proposta da presidente da mesa mas — depois de a deputada sair da assembleia — “a pedido e por insistência de Rui Tavares” (que tinha colocado a questão do Conselho de Jurisdição no primeiro momento), foi colocada novamente a hipótese de enviar o caso para o órgão responsável pela interpretação e aplicação internas da lei, estatutos e regulamentos do partido. Possibilidade que acabou por ser votada e aprovada por unanimidade, embora não constasse do comunicado final saído da reunião. Em todo o caso, e por não ser membro da assembleia do partido, Joacine não teria direito a voto, mesmo que estivesse presente na hora da votação.

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A polémica começou na sexta-feira com um voto apresentado pelo PCP de “condenação da nova agressão israelita a Gaza” em que, no plenário, a deputada se absteve em vez de votar a favor. O partido veio a público criticar a atuação da deputada e desde então sucederam-se os comunicados e trocas de acusações, que culminaram na noite de sábado com declarações de Katar Moreira ao Observador, onde garantia não ter apoio da direção do partido desde a campanha eleitoral.

O Observador contactou a direção do Livre que não quis prestar declarações. Mas logo na noite de domingo, já Ricardo Sá Fernandes, membro do Conselho de Jurisdição do partido, admitia a possibilidade de aquele órgão vir a analisar o caso. Em entrevista à SIC Notícias, Sá Fernandes justificava a polémica com a “inexperiência do partido” e garantia que “o Conselho de Jurisdição tomará as decisões que os factos apurados justifiquem que sejam tomadas” e que isso será feito “com transparência, lisura, respeito por todos e sem declarar ninguém proscrito à partida”.

Apesar de a decisão ter sido tomada na ausência da deputada única do partido, Joacine Katar Moreira “reitera total confiança na assembleia do partido” e afirma que está “com a decisão final dos camaradas”. Ao que o Observador apurou, apesar de ainda não haver uma data para a reunião do Conselho de Jurisdição, este deverá ser um processo breve, já que o partido quer voltar à sua agenda e às questões de justiça social e ambiental que defende. Facto esse salientado, no domingo, pela assembleia do partido no comunicado emitido no final da reunião.

O que pode acontecer agora a Joacine Katar Moreira?

O parecer do Conselho de Jurisdição deverá ser entregue à assembleia do partido para que, tendo em seu poder as conclusões deste órgão, possa tomar qualquer decisão quanto ao desfecho da polémica que colocou a deputada e o grupo de contacto (como é conhecida a direção do partido) de lados opostos. A 40.ª assembleia do Livre deverá realizar-se nas próximas semanas — estando dependente da agenda do Conselho de Jurisdição—, tendo poderes para decidir sobre o futuro de Joacine Katar Moreira no partido.

De acordo com os estatutos do partido, o Conselho de Jurisdição tem na sua estrutura um plenário e duas comissões: a Comissão de Ética e de Arbitragem e a Comissão de Fiscalização. À Comissão de Ética e de Arbitragem cabe, por exemplo, “instaurar e decidir os processos disciplinares”. Caso se verifique que algum dos membros do partido violou a lei, os estatutos ou o regulamento do partido, a situação é enviada para o Conselho de Jurisdição que, depois de analisar, emite um parecer. Os visados pelo parecer são informados do mesmo e dispõem ainda de tempo para recorrer, antes deste ser enviado para a assembleia do partido que decidirá com base nesse mesmo parecer.

Caso se considere que há matéria para instaurar uma sanção disciplinar, por eventual violação dos Estatutos do partido, o Livre prevê três possibilidades, por ordem de gravidade: uma advertência, a suspensão de funções até um máximo de seis meses ou, no limite, o afastamento (ou expulsão).

Neste caso em concreto, ao que o Observador apurou, o Conselho de Jurisdição irá analisar quer a conduta da deputada Joacine Katar Moreira, quer a conduta do grupo de contacto do partido.