O processo orçamental está a entrar na fase mais bicuda, com a análise e votação de 1300 propostas de alteração dos partidos à proposta que o Governo entregou em dezembro. E António Costa foi às Jornadas Parlamentares do PS, em Setúbal, alertar para “quem tem muita pressa de precipitar o fim da legislatura” e de querer logo no primeiro Orçamento “fazer o que se comprometeu fazer ao longo de quatro anos”.

A tirada tem múltiplos destinatários e o líder socialista não especificou nenhum, num discurso de quarenta minutos onde, ao contrário do que foi prática de outros governantes e socialistas que intervieram nesta jornadas, não foi tão hostil para o PSD. Uma tirada aqui, outra ali. Os avisos gerais eram para todos e num momento sensível em que o também primeiro-ministro não quer cair na “irreponsabilidade orçamental”. Até porque está aqui para o “orçamento de 2021, de 2022 e de 2023”, a legislatura toda.

E aqui o destinatário até está mais à esquerda, com Costa a sublinhar que acabou a “geringonça” e o quadro político é agora outro. “Ninguém pense que por termos mudado o quadro político vamos agora ter a irresponsabilidade orçamental que soubemos não ter na legislatura anterior”. PCP, Bloco de Esquerda e Verdes podem ter-se multiplicado em propostas de alteração, mas para o líder socialista há aí um limite e uma regra: “Não dar um passo maior do que a perna”.

Essa foi, garante, “a chave do sucesso da legislatura anterior”, referindo que o seu Governo na última legislatura “deu sempre cada passo seguro e sempre desmentindo as previsões mais catastróficas e mais pessimistas da Comissão Europeia, da UTAO [Unidade Técnica de Apoio ao Orçamento], do Conselho de Finanças Públicas e até o diabo de Pedro Passos Coelho“.

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Assim, a indicação que deixou à bancada socialista para as votações em catadupa que acontecerão no Parlamento dentro de uma semana e meia é para “aceitar as boas sugestões que os outros proponham desde que não sejam contraditória e incompatíves” com as do PS: “Não obrigamos ninguém a cumprir o Programa do Governo do PS, mas não nos obriguem a trair o Programa do Governo“. E desta vez esse documento é exclusivamente da responsabilidade socialista e não tem contributos dos partidos à esquerda do PS, como aconteceu durante a última legislatura.

Há margem para “melhorar” o Orçamento na especialidade, diz António Costa, até porque “com ou sem amioria, ninguém Governa sozinho em democracia” isso implica “postura dialogante”, mas agora é cada partido no seu galho. E a líder parlamentar, Ana Catarina Mendes, já tinha prometido antes desta intervenção que o “PS se empenhará em não discirtuar o Orçamento e isso significa conseguir garantir aos portugueses o equilíbrio entre a justiça social e o equilíbrio com as contas certas”.

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Há, no entanto, uma linha vermelha: reduzir o IVA da eletricidade “de forma acritica, generalizada, para todos”. Porque isso é, segundo Costa, “socialmente injusto e irresponsável do ponto de vista ambiental”. Aqui só cita a proposta do PSD, embora também PCP e Bloco de Esquerda tenham propostas de alteração no mesmo sentido — até com reduções mais generalizadas da taxa do IVA na energia — e exista até uma ameaça de coligação negativa para o Governo a pairar sobre a votação na especialidade deste Orçamento do Estado.

“Como toda a gente sabe — menos o PSD — não é possível alterar o IVA em função da natureza do consumidor. Não há um IVA para uns e um IVA para os outros”. E falou antes da proposta do Governo de diferenciar a taxa do IVA na luz segundo o consumo que está a ser analisada pelo comité do IVA, em Bruxelas. Para o líder socialista — que foi mais brando nesta matéria com o PSD do que Ana Catarina Mendes, Duarte Cordeiro, Mário Centeno ou António Mendes, nestas jornadas — a proposta socialista “é mais justa porque quem tem menos, consome menos e por isso mais beneficiará”. E é “sobretudo responsável do ponto de vista ambiental porque incentiva ao consumo responsável e não o desperdício”. “É uma medida coerente com aprioridade ao combate às alterações climáticas”, sublinha sem dizer que outros partidos a ergueram em campanha apresentando agora propostas que condena.

No discurso detalhou — e agradeceu em concreto à Juventude Socialista — os contributos do partido com propostas para os jovens. Deixou para o fim a referência a uma proposta de peso que veio do PS e que nos últimos dias levantou reservas até dentro do próprio PS: o fim dos vistos gold para investimentos no imobiliário em Lisboa e Porto. É uma proposta da bancada que tem — como já era de esperar — o total apoio do primeiro-ministro socialista.

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Costa considera que “os vistos gold podem e devem permitir reforçar investimento produtivo” e devem ser “canalizados para adquirir títulos da dívida pública e podem e devem contribuir também para a recuperação o de património imobiliário onde ele tem de ser renovado ou em zonas de baixa densidade”. “Felizmente já não é necessário nas grandes cidades, mas continua a ser nas regiões do interior”, disse indo ao encontro da proposta do PS que defende que sejam apenas possíveis estas autorizações para investimentos no interior. E o socialista ainda avisou quem levanta problemas: “Não venham com fantasmas que estamos a alterar as regras a meio do jogo, porque os que já obtiveram mão perderão e os que quiserem agora vir, são bem-vindos”. Desde que invistam onde o PS quer.