A European Travel Commission (ETC), entidade europeia de turismo, antecipou este domingo que o próximo verão na Europa será como regressar a 1970, com os europeus a optarem pelo turismo de proximidade, e pediu regras uniformes para evitar problemas sanitários.

“Todos temos de começar a pensar em alternativas e neste verão, provavelmente, viajaremos de forma diferente, não indo para longe, não apanhando voos longos, talvez optando por viagens curtas, de comboio ou de carro, como os nossos pais faziam há 40 ou 50 anos”, afirma em entrevista à agência Lusa o diretor executivo da ETC, Eduardo Santander, numa altura em que o continente europeu é o mais afetado pela pandemia da covid-19.

Eduardo Santander, que lidera a entidade responsável pela promoção e divulgação da Europa enquanto destino turístico e da qual faz parte o Turismo de Portugal, indica que o próximo verão será “como voltar aos anos 1970 ou 1980, em que planear uma viagem não era tão fácil como é hoje em dia”.

Dadas as fortes restrições para tentar conter a propagação do surto, entre as quais limitações às viagens, o responsável espanhol antecipa que “o espaço Schengen continue fechado a viajantes de mercados terceiros até final do ano”, razão pela qual “o destino [europeu] estará focado maioritariamente nos turistas domésticos […], que procurarão ‘resorts’ próximos ou locais para férias perto de casa”. E com a atividade turística estagnada, “a única solução” é mesmo a de “reinventar o setor”, nomeadamente na temporada alta, assinala Eduardo Santander.

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“Penso que há uma oportunidade na crise: o turismo estava a atingir uma capacidade limite devido ao seu aumento exponencial, que já era quase insustentável em alguns locais, […] e agora podemos reajustar a forma de fazer turismo, para que seja mais educativo, para se tornar mais competitivo e seguir práticas sustentáveis”, elenca Eduardo Santander.

A curto prazo, serão, então, privilegiadas “viagens conscientes, percebendo melhor o que se quer fazer em férias, não apenas tendo em conta os preços baixos, e optando antes por gastar em produtos ou comunidades locais, para que o dinheiro seja gasto onde é mais necessário”, prevê o responsável.

Apontando que, por vezes, os cidadãos “não conhecem” algumas zonas dos seus países, Eduardo Santander sugere, por exemplo, que esta é a altura de os portugueses conhecerem o interior do país. Ainda assim, admitiu que “o turismo só poderá ser reativado” quando as fronteiras forem abertas dentro da União Europeia (UE), o que espera que aconteça nos próximos meses. “Teremos, por exemplo, portugueses a ir para outros países, alemães a quererem ir jogar golfe para o Algarve, e essa é a única solução”, refere Eduardo Santander.

E, para isso acontecer, o diretor da ETC apela para que a “Comissão Europeia crie uma espécie de caixa de ferramentas para os países se poderem abrir ao turismo com um padrão comum”. “Caso contrário, veremos que alguns abrirão em junho e outros no final do ano”, destaca Eduardo Santander, falando em “vantagens competitivas” desiguais e em eventuais problemas de saúde pública decorrentes da descoordenação, nomeadamente nas zonas de praia.

“Se as pessoas sabem que se pode ir livremente a uma praia sem controlo na Croácia e que em Espanha ou Portugal as praias são controladas e que têm de cumprir uma série de requisitos, talvez escolham a Croácia”, exemplifica o responsável pela orgaização sem fins lucrativos fundada em 1948, com Portugal como um dos membros fundadores, composta por 33 organismos nacionais de promoção turística de países europeus.

Turismo europeu precisa de 375 mil ME para recuperar

A ETC estimou ainda que o setor do turismo europeu necessite de 375 mil milhões de euros para recuperar da crise gerada pela covid-19 e para restabelecer as suas operações.

“As estimativas da União Europeia [UE] são à volta de 255 mil milhões de euros para ajudar os Estados-membros a recuperar a indústria e mais cerca de 120 mil milhões de euros para investimento extra, para ajudar os empreendedores e operadores a restabelecerem as suas operações”, afirma em entrevista à agência Lusa o diretor executivo Eduardo Santander.

Com o turismo europeu estagnado, devido às medidas restritivas adotadas pelos Estados-membros da UE para tentar conter a propagação da pandemia, incluindo com limitações nas viagens entre países, o responsável assinala que “o turismo passou de [uma atividade] de 100% para zero” e está hoje “reduzido a praticamente 10% do que era”, dadas as perdas totais.

“Desde as empresas de cruzeiros, passando por outros operadores e, em particular, pelas companhias aéreas, todos têm enormes perdas, com quedas entre 45% para as transportadoras aéreas – que fazem alguns outros serviços além de passageiros – e os 70% para hotéis e restaurantes”, precisa o responsável espanhol.

Notando que em países como Portugal e Espanha “há agregados familiares que dependem do turismo, de forma direta ou indireta”, Eduardo Santander estima que esta crise “se reflita num elevado desemprego” no setor a nível europeu.

E, numa alusão aos dados do Conselho Mundial de Viagens e Turismo, o responsável alerta para que “podem estar em causa perdas de 10 milhões de postos de trabalho na Europa se a situação se mantém nos próximos meses”.

Mais afetados, de acordo com o diretor da ETC, serão “os países onde o PIB [Produto Interno Bruto] está mais dependente do turismo, como é o caso da Grécia, Portugal, Espanha e Itália”, sendo que, além disso, estes últimos foram particularmente afetados pelo novo coronavírus.

Ainda assim, em todos os Estados-membros, as empresas turísticas enfrentam “um enorme problema de liquidez e não vão sobreviver se não houver uma intervenção ou injeções de capital pelos Estados ou outros tipos de ajuda da UE”, sublinha Eduardo Santander.

“E estamos a falar também de grandes companhias e não só da Europa do sul, estamos a falar, por exemplo, das companhias aéreas Lufthansa, TUI, grandes marcas alemãs, entre outras”, elenca o responsável, apelando para “medidas extraordinárias” para financiar o setor, inclusive por parte da Comissão Europeia.

Outro apoio que, para Eduardo Santander, urge dar a estas empresas são garantias estatais em casos de cancelamento de férias ou de viagens, com os Estados-membros a assumirem o risco perante a emissão de ‘vouchers’ aos consumidores visando adiamentos ou futuros reembolsos.

“Sem liquidez, nenhuma empresa irá sobreviver, é uma questão de proteger o mercado”, justifica, saudando as “medidas certas” que estão já a ser adotadas neste âmbito em Portugal.

Ainda assim, Eduardo Santander diz à Lusa que o setor começa a “ver alguma luz ao fundo do túnel”, perante o levantamento faseado das restrições nas viagens dentro da Europa, argumentando que é preciso agora “lutar para recuperar a imagem” do turismo europeu, “para não só restabelecer a procura, como também para restabelecer a confiança entre futuros visitantes”.