O primeiro-ministro foi o último a chegar ao Instituto Superior de Engenharia do Porto, local do lançamento oficial da Stayway Covid, a aplicação móvel portuguesa que auxilia o rastreio da Covid-19. Ainda assim, António Costa parece ter sido um dos primeiros representantes do Governo a instalar a app e a prometer dar-lhe utilidade. “Ontem tive a oportunidade de descarregar a app”, afirmou enquanto mostrava, no púlpito de um auditório com cerca de 60 pessoas, o ecrã com uma luz verde do seu smartphone, sinal de que não está infetado nem recebeu qualquer alerta de que esteve em contacto com alguém diagnosticado com o novo coronavírus durante mais de 15 minutos nas ultimas 48 horas e a menos de dois metros de distância.

António Costa comprometeu-se a usar a app, lançada na passada sexta-feira, disponível para Android e iOS e com quase 80 mil downloads, caso um dia fique infetado, alertando os que se cruzaram consigo, esperando, em contrapartida, que todos os outros tenham também esse cuidado. “Só assim podemos interromper rapidamente a cadeia de contaminação”, sublinha.

O líder do Governo garante que as pessoas “não devem ter receio” em instalar a Stayaway Covid, sendo esta uma opção voluntária e completamente segura. “Não dá para engraçadinhos fazerem partidas”, assegura, acrescentando que o utilizador só pode dar o alerta do risco de contaminação ao usar um código de 12 dígitos, válido durante 24 horas, pelo médico, não havendo, por isso, “falsos alertas.”

Segundo Luís Góis Pinheiro, presidente do conselho de administração dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, esse código é atribuído pelos profissionais de saúde graças à “ferramenta agregadora” Trace Covid-19, criada a 26 de março para monitorizar tarefas de acompanhamento de utentes suspeitos ou infetados. Esta é uma valência acessível a todos os hospitais, públicos e privados, centros de saúde, integra o serviço SNS 24 e o SINAVE lab. Ao atribuir o código à pessoa infetada, o médico deve registar dois dados importantes, a data do início de sintomas ou a data da realização do teste, no caso dos assintomáticos. “São estas datas que permitem identificar os contactos relevantes”, explica.

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Ao receber o alerta, em forma de aviso amarelo, o utilizador da aplicação “não tem que entrar em pânico”, avisa o primeiro-ministro, pois não significa que esteja infetado. “O alerta diz para pegar no telefone, ligar para o SNS 24 e, a partir daí, seguir todas as instruções”, acrescenta. Mais uma vez, Costa voltou a afirmar que instalar a app é “um dever cívico”, um “exercício de enorme responsabilidade” e equipara-o mesmo a lavar as mãos, usar máscara ou manter a distância social recomendada, atitudes que “ajudam a travar esta pandemia enquanto a vacina não chega”.

O momento escolhido para o lançamento, em vésperas de outono-inverno e época de regresso às aulas ou ao trabalho, é elogiada pelo primeiro-ministro, que defende ser necessário “estar mais alerta do que nunca”. “Não podemos relaxar ou baixar a aguarda, o problema não passou, está e vai continuar entre nós (…) a única forma de garantir que a pandemia não se descontrola depende única e exclusivamente de cada um de nós.”

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António Costa mostrou-se ainda satisfeito com o facto de, este ano, a União Europeia ter classificado Portugal na “primeira divisão dos países considerados altamente inovadores”.  “É muito importante que o sistema científico nacional e as empresas nacionais tenham conseguido vencer a meta que tínhamos estabelecido, e captar em concorrência com todo o sistemas científico europeu  mais de mil milhões de euros ao longo deste quadro financeiro. Isso dá-nos, efetivamente, confiança que no próximo quadro financeiro seremos capazes de cumprir e vencer a nova meta, duplicar aquilo que alcançamos agora e ir buscar mais dois mil milhões de euros a fundos europeus.”

Uma confiança que, segundo o primeiro-ministro, é dada por um dado obtido na semana passada, já que não obstante da “enorme crise” sanitária, económica e social, 2020 é o ano onde mais alunos concorreram para frequentar o ensino superior. “Isto é muitíssimo importante, significa que mesmo na hora de uma crise tão profunda, as famílias e as novas gerações acreditam e percebem que o acesso e a valorização do conhecimento podem construir o seu futuro e ter melhores condições e vida.”

“A exposição não é necessariamente sinal de infeção”

Duas cadeiras ao lado estava sentada Marta Temido. A ministra da Saúde confessou, durante a sua intervenção, que ainda não descarregou a Stayaway Covid e explica a razão. “Estou em processo, ainda não consegui o descarregamento efetivo, porque o meu sistema disse que me tinha que ligar à corrente durante a noite, portanto não desistam. Da mesma forma que eu penso que amanhã o meu processo estará concluído, o vosso também poderá vir a estar.

Temido reforça que a aplicação é uma “ferramenta complementar” ao trabalho das autoridades de saúde e das equipas de saúde pública. “Não substitui esse trabalho, mas pode ser um auxiliar precioso.”

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Apoiar a memória do utilizador, registar acontecimentos muitas vezes impercetíveis e controlar as pessoas que se movimentam entre vários países são algumas vantagens apontadas pela ministra, que admite existirem limitações associadas a esta alternativa. “Nem todos têm uma tecnologia compatível, nem todos descarregarão a aplicação, nem todos levam o telemóvel para todo o lado, mas apresentar limitações de qualquer instrumento, estudo ou conhecimento novo, é o melhor caminho para se poder progredir.”

Para Marta Temido, o aperfeiçoamento e calibração da ferramenta “é essencial” e o alerta por ela emitido deverá ser lido com prudência. “A exposição não é necessariamente sinal de infeção”, salienta.

Manuel Heitor, ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, foi outro dos intervenientes da cerimónia e no seu discurso reforçou essencialmente o papel das associações académicas na propagação e massificação da utilização da nova aplicação por parte de alunos e docentes neste arranque do ano letivo. “A app não cura, mas previne”, afirmou, defendendo que utilizá-la representa um “exercício de responsabilidade cívica, que todos temos que seguir e partilhar”.

Portugal é, assim, o 9º país a ter disponível uma aplicação móvel deste tipo e Manuel Heitor sublinha que a Stayaway Covid  é “um processo inédito em Portugal”, onde foram garantidas todas as condições de fiabilidade e segurança.

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A privacidade foi mesmo um dos aspetos que mais dúvidas e críticas levantou durante o processo de desenvolvimento da aplicação por parte do INES TEC, algo que José Manuel Mendonça, presidente do conselho de administração dessa mesma instituição, definiu como sendo uma “prioridade máxima”. “A nossa prioridade máxima foi a privacidade do utilizador, claro que a capacidade de análise de dados sofreu com isso”, afirma, explicando que nem o Estado nem os epidemiologistas têm qualquer acesso a dados pessoais. “O SNS não sabe as pessoas que foram ou não avisadas, apenas os próprios utilizados têm a informação se tiveram algum contacto de risco”, sublinhou, deixando claro que as pessoas conhecem apenas há quantos dias esse contacto surgiu e não o local ou a identidade da pessoa infetada.

Segundo José Manuel Mendonça, no futuro é provável que existam “mais sensores específicos para rastreio de contactos” e o principal desafio agora é atingir uma forte adesão por parte dos portugueses. “Não gasta bateria, não há dados pessoais, é gratuita e pode ser útil e bastante interessante. Descarreguem, não dá trabalho nenhum, dá muito menos trabalho do que usar uma máscara ou lavar as mãos.” Uma afirmação que mereceu o reparo de António Costa, que sentando na primeira fila recordou em voz alta a importância contínua desses mesmos comportamentos.

Na apresentação oficial da Stayaway Covid era esperada a intervenção de Graça Freitas, diretor-geral de Saúde, mas esta não esteve presente.