No dia 27 de novembro passado, quando abrimos a porta de acesso ao armazém-fábrica da Shapetek, empresa de tecnologias de maquinação em Pombal, tivemos de colocar a mão no puxador e empurrá-la para entrar. Em fevereiro de 2021, se a prótese para puxadores em aço inoxidável 316L do projeto Covid Porta Aberta – que aqui tem o epicentro de fabrico – já estiver pronta para comercialização, como está previsto, iremos abrir esta mesma porta com o antebraço, usufruindo de um movimento contínuo com o nosso corpo.
Uma vez dentro desta empresa na zona Industrial da Formiga, líder do consórcio que tem em mãos o desenvolvimento do dispositivo, o alvoroço sonoro que mais se evidencia é o de uma sinfonia de máquinas industriais. Ora sobressai o estalido pontual e metálico de talhar. Ora se amplifica um som persistente, embora abafado, parecido com o de vaporizar. Ora escutamos a aspersão de líquido, seguido de fragor estridente de metal a ser cortado. Martelar, fresar, furar, tornear. Trabalhos manuais e trabalhos mecânicos, sobretudo de máquinas de corte de precisão com tecnologia de controlo numérico computorizado (CNC). Sons que depressa se transformam em ruído branco, por habituação, quanto mais tempo permanecermos no local, ao ponto de sermos capazes de identificar que, do rádio sintonizado algures escondido, sai um fado.
Ao fundo, quatro homens com camisolas de tecido polar cinzento-escuro estão concentrados: podem estar a fazer peças para robôs, componentes para automóveis, moldes industriais, ou outros trabalhos que exigem precisão. Em primeiro plano, perto da porta, Nicolle Lourenço, coordenadora dos projetos de investigação e desenvolvimento (I&D) da Shapetek, Vítor Maranha, engenheiro mecânico do Instituto Superior de Engenharia de Coimbra (ISEC) e Nuno Fidélis, engenheiro do Centro Tecnológico da Indústria de Moldes, Ferramentas Especiais e Plásticos (CENTIMFE), na Marinha Grande, estão indiferentes à orquestra industrial. Acabaram há instantes a reunião semanal de equipa do projeto Covid Porta Aberta, para alinhar os próximos passos do dispositivo. Estão em pé, ao lado do último protótipo que não podem ainda mostrar publicamente. O design não está finalizado, os testes em ambiente controlado ainda estão a decorrer. Até fevereiro, a equipa de 12 pessoas ainda tem detalhes para aperfeiçoar.
Uma ideia dinâmica para abrir portas com o antebraço
“A iniciativa deste dispositivo surgiu da Shapetek”, diz Nicolle Lourenço, 27 anos, responsável por coordenar os membros deste consórcio. A engenheira electrotécnica nascida nos EUA representa a Shapetek nesta parceria que envolve a empresa SANDREDY – Comércio de Artigo de Decoração, o CENTIMFE e duas instituições do Instituto Politécnico de Coimbra: o ISEC e a Escola Superior de Educação.
No princípio, era apenas a Shapetek. Depois, o CENTIMFE, com uma preocupação transversal. “Alguns funcionários têm familiares que trabalham em contexto hospitalar”, continua a responsável pelo departamento de I&D há um ano e meio. Por essa razão, pensaram em “criar algo que tentasse colmatar algumas dificuldades do dia-a-dia ao abrir as portas”. Nicolle, que também ensina robótica para crianças no Agrupamento de Escolas de Ensino Básico de Pombal, refere-se ao risco de transmissão de Covid-19 por puxadores de portas e de como o querem mitigar em grande escala.
Os manípulos são um meio de contaminação maior do que poderíamos pensar até hoje”, diz o engenheiro mecânico do ISEC, Vítor Maranha, 46 anos, natural de Coimbra. As mãos estão mais expostas aos vírus e às bactérias. São a extensão táctil das nossas ações orgânicas: comer, ajustar os óculos, mexer no cabelo, coçar o rosto. Por isso, o antebraço, entre o pulso e o cotovelo, oferece riscos menores de contacto direto passível de potenciar uma infeção.
Nuno Fidélis, 44 anos, a trabalhar no CENTIMFE desde os 27 anos, também tem familiares na área hospitalar. Por isso, quando no final de abril foi desafiado pela Shapetek para o Covid Porta Aberta, não hesitou. “Tínhamos de tentar resolver isto de alguma forma”, enfatiza. Como as primeiras reuniões foram entre Fidélis e a equipa da Shapetek, concluíram que tinham, ainda, “uma lacuna” por resolver para este projeto: “ergonomia e design”. Nessa altura pensavam já em formas possíveis de financiar o desenvolvimento do produto – e veio daí a ideia de procurar apoio junto de concursos comunitários [ver caixa em baixo].
199
É este o número total de projetos aprovados, lançados por empresas e centros de investigação nacionais, que vão receber financiamento para desenvolver produtos e serviços para fazer face à pandemia – tal como a Shapetek.
Um quarto de um milhão de euros é o valor que os responsáveis da empresa acreditam que custará a investigação, desenvolvimento e início da produção do Covid Porta Aberta. Foi esse o montante de investimento que o líder do consórcio que envolve empresas e centros de investigação de Pombal, Marinha Grande, Coimbra e Figueira da Foz declarou quando concorreu a financiamento comunitário para arrancar com o projeto.
E, ao abrigo do Aviso 15/SI/2020 (Sistema de Incentivos a Atividades de Investigação, Desenvolvimento e Investimento em Infraestruturas de Ensaio e Optimização no Contexto Covid-19), concluído em maio deste ano, o projeto da empresa de Pombal foi um dos 199 selecionados (de um total de quase 300 candidaturas), tendo sido apoiado em 193 mil euros.
A adesão ao Aviso 15 superou de forma clara as previsões mais otimistas das autoridades nacionais. Tal como aconteceu, aliás, com os outros três concursos lançados durante a primeira vaga da Covid-19 pela Autoridade de Gestão do Programa Operacional Competitividade e Internacionalização (Compete 2020) para o desenvolvimento de projetos orientados para o combate à pandemia. A ideia era apoiar as empresas e instituições de investigação na adaptação às normas de segurança e no desenvolvimento de bens, produtos e serviços para fazer face ao Coronavírus. E os mais de 300 milhões de euros de incentivo atribuídos são um bom reflexo da mobilização geral.
Boa parte dos 199 projetos selecionados no Aviso 15 nasceram em pequenas e médias empresas espalhadas pelo país. Ao todo foram 146 as candidaturas cujo co-financiamento dependeu assim das autoridades de gestão dos respetivos programas operacionais regionais – as CCDR. No caso do Covid Porta Aberta, por exemplo, foi a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro que (tal como fez com outros quarenta projetos da região) suportou o investimento, a par dos fundos comunitários. Na região norte houve 44 candidaturas aprovadas, em Lisboa e Vale do Tejo foram 51, no Alentejo seis e no Algarve quatro.
“Parece-me que é natural que tenham sido as regiões mais afetadas – nomeadamente Lisboa e Vale do Tejo e Norte – a apresentar mais candidaturas, até porque, nessa primeira fase, lidaram de forma mais próxima com o problema”, disse ao Observador a ministra da Coesão Territorial quanto a este desequilíbrio entre regiões. “Mas claro, essas diferenças existem dentro do país, especialmente se compararmos Litoral e Interior. Temos territórios onde já há dinâmicas instaladas, que temos de incentivar para fazer crescer. Noutros locais, temos ainda de ajudar a criar essas dinâmicas que geram riqueza para o território e as pessoas, famílias e empresas que já lá estão”, continua Ana Abrunhosa.
Os fundos europeus – que suportaram parte das dotações iniciais para estes avisos, nomeadamente o 15 – ajudam a colmatar estas diferenças regionais, e o ministério tutelado por Ana Abrunhosa é um dos braços que procura nivelar este desequilíbrio tão flagrante no país. “Felizmente, no que toca à ciência, temos em Portugal uma distribuição bastante equilibrada de Universidades, Politécnicos, centros de conhecimento e investigação. É importante que trabalhem com as empresas locais e com a massa crítica dos seus territórios para repostas adaptadas às necessidades do local e do momento. Foi isso que fizemos aqui.”
Quanto à adesão geral, Ana Abrunhosa reitera a surpresa perante o número grande de candidaturas. E, sobretudo, o impacto que os projetos selecionados podem ter no combate à pandemia: “Na maioria destes projetos, a comunidade científica trabalhou em parceria com as empresas, o que vem ajudar à mudança de postura nos dois mundos, academia e empresarial, para cada vez mais trabalharem em conjunto na circulação de conhecimento que se transforma em soluções e valor através das empresas.”
Uma possível solução para diminuir contágios nos puxadores
Nicolle licenciou-se duplamente. Primeiro em Engenharia Biomédica. Depois em Engenharia Electrotécnica. É ainda Mestre em Instrumentação Biomédica. Conhece bem New JerseyNewark no estado de Nova Iorque, onde nasceu, e sonha poder visitar a cidade em breve. Já trabalhou numa outra empresa de I&D e também numa start up que desenvolvia uma aplicação preditiva para manutenção industrial. É a anfitriã, o elo de ligação entre todos nestenese projeto e foi dela a ideia de desafiar um antigo docente.
“Fui aluna no ISEC e conhecia o professor Luis Roseiro. O laboratório que ele coordena [de biomecânica aplicada do Instituto de Investigação Aplicada do IPC] tinha as competências que precisávamos para este projeto.” Roseiro, 52 anos, especializado em engenharia mecânica, reuniu de imediato uma equipa de confiança. Vítor Maranha foi um dos escolhidos. “Ele contactou-me a dizer que havia um desafio da Shapetek para desenvolver um novo dispositivo [para puxadores], com uma nova filosofia e nova abordagem. E assim colaborarmos para o bem-estar da sociedade.” A este engenheiro natural de Coimbra, pai de uma adolescente de 15 anos, e que neste momento está também a desenvolver um submarino, juntou-se um matemático, Luís Margalho, e um professor em Design, Pedro Bandeira Maia, que tem experiência em desenvolver projetos de design industrial.
O fluxo de trabalho deste projeto é iterativo, partilhado em ciclo colaborativo entre o design e a engenharia, a execução de testes de validação e o fabrico de protótipos para irem experimentando até chegarem à melhor solução de produção. Fidélis, que tem experiência em desenvolver dispositivos para a indústria farmacêutica, explica o estado da arte. “Nesta fase vamos fazer vários testes em ambiente controlado, para garantir que segue todas as normas vigentes”. Por exemplo, vão aplicar forças, ver a resistência mecânica e fazer cálculos para essa resistência. Quando ficar prontao, vão ainda testar a nova prótese nas portas no Hospital Santo André, emde Leiria, e no Hospital de Santa Maria, em Lisboa. “Vamos pôr protótipos a funcionar”, explica Fidelis, para analisarem a reação das pessoas ao produto, aplicando inquéritos para aferir a funcionalidade e o que ainda poderão melhorar.
Todos os dias, milhões de pessoas abrem portas partilhadas no espaço público. Por isso, se tudo correr bem, o impacto positivo para evitar contágios com esta prótese é um dado adquirido. “Se conseguirmos extravasar a nível nacional”, realça Fidélis, “estamos a falar de várias centenas de milhar de portas só em instituições de saúde [em Portugal]”. Faz uma pausa para pensar e acrescenta: “Por isso, imagine-se também em locais públicos como shoppings, repartições públicas, escolas e todos os lugares onde há grande afluência de pessoas”.
O fresador de moldes que gosta de pescar
Albino Domingues dos Santos tem 50 anos e é um profissional discreto. Está em frente a uma mesa com fresas, brocas de metal duro e sistemas de aperto. A 9 de novembro de 2015, quando fundou a Shapetek com mais três sócios, aproveitando uma lacuna do mercado de empresas especializadas em controlo numérico computorizado, nunca pensou estar a desenvolver uma prótese para mitigar o contágio de um vírus.
Pai de dois filhos e natural de Pombal, é o diretor de produção da empresa e dá “apoio técnico quando as peças aparecem para executar”. Sublinha que é “fresador de moldes”, uma jornada que começou há 32 anos num curso de verão para formar técnicos de arranque de aparas. E em que é que consiste? Em cima da mesa, onde sobram restos de matérias-primas dos metais utilizados,utlizados, está a explicação deste processo de subtração de material, para produzir as peças. “É tudo isto” explica apontando para as sobras. “São as aparas que vamos arrancando do material do bloco”.
“Portugal tem dos melhores fresadores do mundo com alta precisão e o conhecimento do senhor Albino é o grande património da empresa”, reforça Vítor Maranha, destacando o trabalho deste “escultor industrial”. A tecnologia de CNC veio massificar esse outrora processo manual, mas sem a experiência de profissionais como ele, o qual indica os parâmetros da máquina, para controlar a precisão da apara, nada feito.
Albino sabe fazer cálculos rápidos. Recorda que foi logo depois de terminar o 12º ano, no curso de secretariado, que a sua vida mudou de rumo. Tinha planos parade continuar a estudar antes de entrar no mercado de trabalho.
Eu vim para esta área motivado por esse curso do Fundo Social Europeu, dos primeiros, em 1986, quando Portugal entrou na então Comunidade Económica Europeia”, relembra. Foi o que “traçou o futuro” deste sócio-fundador da Shapetek, que entrou no curso “porque era pago”, mas que “pouco depois” começou “a gostar da área”. “Ainda bem que o fiz, porque não me via sentado a uma secretária.”
Falar de aparas, de CNC, de produtos e de maquinaria é dar motivos para que os olhos de lince deste fresador de moldes brilhem. Para explicar o rigor da profissão ganha um ar solene. “Para nós fazermos uma peça temos de ter três coisas muito importantes: o desenho em 3D, a máquina e as ferramentas e a matéria-prima”. Depois, continua, “estudamos o processo para fazer – e muitas vezes temos de fazer coisas que nunca fizemos, como esta peça para o Covid Porta Aberta – para encontrar as melhores soluções”.
Com três décadas de experiência, olha para uma peça e começa a esculpi-la mentalmente. “Um rapaz novo está por vezes meses à volta daquilo”, nota, lamentando logo a seguir a falta de profissionais com este nível de experiência no mercado, onde há imensa procura por esta especialização. “É uma área em que temos de ir formando as pessoas, porque isto não se aprende na teoria.”
Mas a paciência é uma das suas grandes qualidades. Por um lado, para pescar nas barragens ao redor de Pombal: “O maior peixe que pesquei foi um achigã, devia ter uns dois quilos”. Por outro, para ensinar o ofício. É professor na Escola Tecnológica, Artística e Profissional de Pombal e faz saber que “uma das maiores qualidades de um profissional desta área é a concentração”. Com tanto barulho ao redor, nessa orquestra industrial com volume no máximo, Albino aprendeu a arte do ruído branco para se concentrar.
O discípulo ex-militar
Diogo Oliveira também aprendeu a arte da concentração máxima. Tem 31 anos e está sentado em frente a um computador com um molde em 3D no software MasterCam (computer aided manufactured). Ao lado está uma CNC, uma máquina grande, quadrangular, para onde conseguimos espreitar através de janelas de um vidro frontais e laterais todo o labor minucioso de um braço robótico que vai trabalhando um bloco de metal.
Do centro de maquinação de CNC da Shapetek fazem parte pelo menos cinco modelos distintos. Diogo, o primeiro funcionário da empresa e discípulo de Albino dos Santos, está a inserir coordenadaos numa delas, que tem o nome de código “MAS MCV800”, referente ao modelo industrial.
Estas máquinas variam de acordo com o processo de trabalho: tornear, fresar, jato de água, furadeira entalhadeira, puncionadora, eletroerosão a fio e por penetração, retificadora. “O senhor Albino ensinou-me tudo aquilo que sei. Passo mais tempo com ele do que com a minha família”, graceja este pai de uma menina de nove meses, natural de Pombal, que já quis ser veterinário. Aos 26 anos Diogo estagiou na empresa depois de terminar a formação de técnico de maquinação CNC. Acabaria por ser contratado. Refere-se a Albino Santos com reverência, reconhecendo-o como o mentor com quem continua a aprender. “É uma pessoa muito paciente, eu tive a sorte de ser o primeiro nesta empresa e costumo dizer que estou a tirar, todos os dias, um curso que ainda é remunerado.”
Antes de trabalhar na Shapetek, este técnico de CNC que é também árbitro de futebol esteve oito anos na Polícia do Exército e cumpriu uma missão de seis meses em Cabul, no Afeganistão. “Aprendi a importância da pontualidade, da assiduidade e da lealdade para com os nossos empregadores”. É calmo, fala com ponderação e cortesia. Por isso, quando na hora de se fotografar se pede um exemplo para ilustrar a reportagem, é ele quem vai assegurar ao mentor que tem tudo sob controle e não vai danificar nenhuma peça.
Quer o tempo e a energia despendidos,dispendidos, quer cada bloco de metal são um investimento muito alto que deve ser medido e controlado. Não se poderá fresar em vão. Aliás, as duas primeiras peças que serviram de protótipo para o Covid Porta Aberta, “demoraram duas semanas a serem feitas”, diz Diogo. “O maior desafio deste trabalho e deste projeto em concreto é como dar a volta às peças, encontrando a estratégia para conseguir chegar ao produto final, garantindo a precisão e a qualidade”, reflete, pausadamente. Franze o sobrolho e ainda faz questão de realçar: “Temos de ter muita imaginação, às vezes, e perceber de cálculos”. Interrompe o discurso e volta a concentrar-se, assumindo uma expressão mais séria. Santos reforça, tautológico: “Vê lá, não estragues a peça”. Diogo sossega-o com o olhar , seguro. Insere no teclado da máquina os cálculos necessários, dando ordem para que a máquina esguiche água, simulando o processo inicial que facilita o corte do metal, sem o cortar.
A décima tentativa de design e mais algumas
Quando o design ficar, finalmente, fechado e o protótipo – agora de latão para os testes – for validado, o bloco que veremos nessa máquina de CNC será em aço inoxidável, a cru, sem qualquer outra camada estética. “É o material utilizado em ambiente hospitalar e fácil de descontaminar, usado em materiais cirúrgicos, próteses e permite a produção em escala”, explica Vítor Maranha. O engenheiro do ISEC, a concluir o Doutoramento em Biomecânica, alerta que já existem dispositivos do mercado para servir de extensões de portas, mas “por serem estáticos, não são necessariamente eficientes”. O Covid Porta Aberta quer oferecer uma solução mais eficaz. “O que estamos a fazer é adicionar a componente dinâmica [a esta prótese]”, sublinha.
Pedro Bandeira Maia, 45 anos, professor na Escola Superior de Educação no Politécnico de Coimbra, é o responsável por desenvolver este produto de forma ergonómica e com design intuitivo. Doutorado em design, regressou há meses a Coimbra, a terra natal. “O grande desafio passa por acrescentar algo ao que já existia nas soluções de mercado”, reforça. E que não são, defende, suficientemente, intuitivas. Pedro quer garantir que quem se deparar pela primeira vez com a prótese do Covid Porta Aberta no puxador saiba, exatamente, o que fazer, sem pensar muito: abrir a porta com o antebraço.
Nicolle Lourenço exemplifica numa porta-protótipo disposta no meio da fábrica-armazém. Coloca o antebraço no dispositivo que parece um amparo a esse membro do corpo, faz uma leve pressão para baixo, a porta abre e gira sobre si própria, evidenciando o elemento dinâmico, contínuo ao corpo, de que falava Maranha.
Maia envia-nos os desenhos por e-mail. No separador 240 do documento anexado, percebemos que também se inspirou na natureza. Mais concretamente numa folha, cuja imagem está evidente como referência ao lado do desenho. Em contexto real, uma folha comum, tem uma flexibilidade que permite um movimento orgânico maleável: se a pressionarmos, para baixo, tem um movimento suave. É esse o objetivo desta extensão para puxadores. Através de videochamada, o responsável pelo design explica que o processo mais desafiante tem sido o de simplificação do dispositivo. Vai já na décima versão. Como ainda vão ter de afinar o modelo, poderá haver mais algumas.
As coisas mais simples são, na maioria das vezes, as mais desafiadoras, reforça este designer com três prémios no currículo profissional: o primeiro lugar, em 2009, na competição de design “Remade in Portugal”, o segundo lugar na mesma competição no ano seguinte e a menção honrosa no concurso Solzaima Hotdesigners (2010). “Não tem muitas reentrâncias, não tem ranhuras, não tem furos, por isso não favorece a acumulação de resíduos”, diz o académico apaixonado por viagens. “A base em termos funcionais já está, o que estamos a fazer é melhorar em termos de dimensões e afinar através de testes a tal parte ergonómica e antropométrica”, sistematiza Pedro Bandeira Maia.
Numa das paredes da Shapetek, junto à entrada de cargas-e-descargas, estão dispostas várias impressões de imagens do protótipo e várias versões físicas do Covid Porta Aberta, que podemos tatear para testar como a peça é já lisa e leve. Nicolle deixa como ideia no horizonte futuro a importância de a peça ser inclusiva. “Que conseguisse, também, ser de fácil utilização para pessoas com necessidades especiais, sendo que vai ser utilizado em meio hospitalar”.
Mas esse desenvolvimento do produto “será numa fase posterior”. Por agora querem garantir a eficiência do Covid Porta Aberta, pensando no registo de patente, mas, sobretudo, “em como poderá mitigar a contaminação por Covid-19, naquele que é gesto diário de milhões de pessoas no mundo inteiro: abrir portas com as mãos.
Este artigo faz parte de uma série sobre o trabalho levado a cabo pelo Parlamento Europeu e é uma parceria entre o Observador e esta instituição.