Depois de publicações nas redes sociais, pouco comuns, o PCP continua a utilizar o resultado de João Ferreira para mostrar que “não morreu” e que “até cresce” em alguns distritos que foram apontados como “bastiões” perdidos. Números são números, é um facto, mas as conclusões que se retiram, fica provado, podem ser bem diferentes. Logo na noite eleitoral Rui Rio dedicou grande parte do discurso a sublinhar a votação de André Ventura, frisando que lhe permitiu ficar à frente do candidato comunista apoiado por PCP e PEV.

O PCP ouviu e além de não concordar, não gostou. Diz Jerónimo esta sexta-feira em entrevista ao jornal oficial do partido que o discurso de Rui Rio, colocando em evidência André Ventura na frente de João Ferreira no Alentejo, foi “um grito de alma”. “É um grito de alma de Rui Rio. O que dói a Rio, e a setores reacionários, é o facto do progresso do PCP e a fuga de votos do PSD para a candidatura do Ventura e Tiago Mayan”, disse Jerónimo de Sousa que considera o tema dos bastiões “uma aldrabice do costume”.

E já depois do Comité Central do PCP ter reunido para avaliar as eleições presidenciais, Jerónimo de Sousa trouxe à entrevista três pontos que fez questão de salientar. No primeiro, afirma que “em rigor os resultados da candidatura são idênticos à de 2016”; no segundo recorda que “em nenhum dos distritos alentejanos o PCP é a força maioritária”, pelo menos, nos últimos 30 anos; em terceiro usa o “tão badalado distrito de Portalegre” para provar o crescimento do PCP, afirmando que o partido “até cresceu”. E para tentar acabar com o mito da morte do PCP, diz que na própria noite eleitoral foram “dezenas” de jovens a inscrever-se na JCP e no PCP.

O que aconteceu então no Alentejo para que André Ventura tivesse resultados tão expressivos? Jerónimo de Sousa considera que “a verdadeira razão da votação de Ventura ofereceu à deslocação de votos claros do PSD”. Indo mais longe, o secretário-geral comunista diz que “onde Ventura tem mais expressão eleitoral nessas regiões [do Alentejo] é onde Marcelo Rebelo de Sousa tem menos votação”.

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Jerónimo de Sousa aproveitou ainda o espaço no jornal oficial do partido para deixar fortes críticas aos que “queriam abrir porta à revisão constitucional para conseguir outros objetivos que estão para além destas eleições presidenciais”.

O PCP sempre se mostrou contra o adiamento das eleições, que se realizaram em pleno estado de emergência e com o país em confinamento, e explica agora porquê. Diz Jerónimo que os partidos à direita iriam aproveitar-se do processo de revisão constitucional para outros fins que não apenas o da alteração de data das eleições.

“O que se pretendia era que com a proibição das eleições se abrisse um processo de revisão constitucional onde caberia essa questão das eleições e tudo aquilo que a direita e extrema-direita preconizam em termos de desfigurar e descaracterizar a constituição que é um sonho de décadas”, apontou o secretário-geral comunista que diz ainda “não desvalorizar os projetos de extrema-direita e tudo o que significam”.

Recordando a história de luta antifascista, tal como fez João Ferreira ao longo da campanha eleitoral, Jerónimo diz que “ninguém mais que os comunistas tem a dura experiência do confronto” com forças de extrema-direita, mas nota que “é preciso não agigantar resultados destes candidatos”. “Não é o primeiro nem segundo candidato presidencial com projetos reacionários”, apontou Jerónimo recordando o resultado de Soares Carneiro nas presidenciais de 1980.