Uma “história de sucesso” que se transformou numa situação limite. Do milagre ao colapso. O epicentro do novo coronavírus na Europa. O incumprimento dos portugueses. A ajuda alemã. E ainda as ambulâncias à porta do Hospital Santa Maria. A terceira vaga da Covid-19 atingiu severamente Portugal, que se tornou o país com mais casos e mortes por milhão de habitantes. O facto não passou despercebido à imprensa internacional, que relatou nas últimas horas o que se passa no país.

“Surto de vírus em Portugal coloca os hospitais no limite”. É assim que o New York Times titula o artigo dedicado à situação da pandemia no país, que foi considerado uma “história de sucesso no início da pandemia” e está agora a lutar para travar a “maior taxa de mortalidade da Europa”.

A notícia também incluiu declarações do ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, que considera que o aumento dos casos se deveu ao facto de “muitas pessoas” terem visitado os membros da sua família no Natal, sendo que muitos ignoraram a proibição de se deslocarem dentro do país (apesar de a deslocação entre concelhos ser permitida nos dia 24, 25 e 26 de dezembro): “A mobilidade no país mostra que as pessoas nem sequer respeitaram as restrições que estavam em vigor”, disse.

O ministro da Economia antevê “semanas muito difíceis” e afirmou em entrevista telefónica ao órgão norte-americano que muitos membros do Governo já contraíram Covid-19 (ou estiveram em isolamento profilático). Siza Vieira refere ainda que uma das “lições” desta crise é que “realmente precisamos de uma União Europeia com poderes e recursos para lidar com este tipo de ameaça que a humanidade enfrenta e que só pode ser combatida a nível continental”.

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Contactada pela Renascença, que tentou averiguar “o alcance destas declarações”, fonte do gabinete do ministro garantiu que “tais afirmações não configuram uma imputação de responsabilidades aos portugueses” pela mobilidade constatada especificamente no Natal, período em que vigoravam exceções ao estado de emergência. O Governo tinha autorizado a circulação entre concelhos nos dias 23, 24, 25 e 26 de dezembro. Além de que, nas noites de 24 e 25 de dezembro, a circulação na via pública estava autorizada até às 2h.

Segundo a mesma fonte, refere a Renascença, a conclusão de que Siza Vieira se referia ao período das festas de Natal “resulta da interpretação feita pelo jornalista do NYT”, lembrando porém que, apesar das exceções, o Governo apelou aos portugueses para que evitassem grandes ajuntamentos e cumprissem com o distanciamento social.

Acrescentou ainda que, durante a entrevista ao NYT, o ministro admitiu que, “sabendo o Governo, hoje, as consequências do alívio das restrições no Natal, a medida, eventualmente, não teria sido tomada”.

O mesmo artigo do NYT também inclui declarações de Tomás Lamas, médico que trabalha nas unidades de cuidados intensivos no Hospital Egas Moniz: “Nunca pensei que isto pudesse alguma vez acontecer em Portugal, ter pacientes a ir a vários hospitais a esperarem para ser salvos”.

The Guardian destaca ajuda de médicos alemães

Também o The Guardian fala de Portugal e da necessidade de apoio estrangeiro. O jornal lembra que o país tem uma das taxas de infeção mais altas da Europa e que em janeiro se registaram “quase metade do número de mortes de toda a pandemia”. O médico João Colaço é citado no texto, referindo que os hospitais e UCI estão sobrelotados e que “muitos pacientes estão muito doentes — alguns deles jovens. Aqueles que sobreviverem precisam de ajuda por semanas, meses, e até anos”.

Associated Press sublinha vacinação indevida, aulas online e “desordem no Parlamento”

Em vez de um retrato a nível sanitário, a Associated Press foca-se nas respostas que o Governo tem dado à pandemia. E afirma: “A pressão parece estar a chegar ao Governo português”.

A agência menciona as várias polémicas que têm acontecido: a vacinação indevida, a resposta contraditória sobre o ensino à distância, falta de informação sobre a chegada de ajuda estrangeira e a “desordem no Parlamento sobre quem deve tomar a vacina primeiro”. E diz mesmo: “Estes episódios puseram o Governo português em apuros, no momento em que Portugal enfrenta a pior vaga da pandemia”.

A Associated Press destaca ainda a citação de Marta Temido, que disse que criticar o Governo por gerir mal a situação pandémica é um ato “criminoso para todos aqueles que todos os dias […] fazem um grande esforço”.

Folha de São Paulo: “Portugal perde controlo da pandemia”

A Folha de São Paulo relata que “Portugal perde controle da pandemia, pressiona sistema de saúde e precisa de ajuda internacional”, contrariamente ao que aconteceu nos primeiros meses da pandemia em que o país era “um bom exemplo”.

Ricardo Mexia, presidente da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública, descreve a situação ao órgão brasileiro como o “pior período da pandemia” em que “não há nenhum indicador que não esteja, nos últimos dias, nas suas piores condições”.

O artigo relata que o SNS está perto do limite e dá conta das filas de ambulâncias “que se tornaram constantes” em frente ao Hospital Santa Maria. E também menciona a lentidão na vacinação.

Deutsche Welle: “Situação é tensa”

Este meio de comunicação social narra o aumento de infeções no país, a situação nos hospitais do SNS e a ajuda germânica.

Reinhard Naumann, presidente da Fundação Friedrich Ebert da secção de Lisboa, relata que a “situação é tensa” e que “toda a população está muito nervosa à luz dos desenvolvimentos dramáticos das últimas duas a três semanas”.

El Mundo: Portugal foi do “milagre” ao “colapso”

O retrato que o jornal espanhol pinta de Portugal é bastante pessimista. “Hospitais à beira da rutura”, “dramático número de mortes” e “Portugal autoconfina-se”. Após ser visto como exemplo na Europa, o país converteu-se “no mais afetado do planeta em mortes”.

Portugal foi “epicentro do coronavírus na Europa” para o Le Figaro

O meio de comunicação social Le Figaro afirma que Portugal se tornou nos últimos dias “o epicentro do novo coronavírus na Europa”. 

As imagens das ambulâncias à porta do Hospital Santa Maria não passaram despercebido ao Le Figaro, que também informa sobre a ajuda alemã e a possibilidade de a Áustria poder ajudar Portugal.

As palavras de António Costa, que descreve a situação nos hospitais como uma “pressão gigantesca”, e ainda a pressão nos hospitais são mencionados no artigo.

Por fim, o órgão francês menciona já alguns sinais positivos — como o facto de Portugal já ter passado, aparentemente, o pico de infeções nos últimos dias.

II Post: “Portugal é o país europeu onde a pandemia está pior”

O Il Post, órgão italiano, aborda o número elevado de infeções e de óbitos, explicando que a variante britânica teve uma grande influência no aumento de casos e mortes de Covid-19 em Portugal. Mas não só: também destaca o alívio de medidas no Natal como fator que impulsionou a subida de contágios.

Em relação ao SNS, o Il Post afirma que os hospitais estão à beira da rutura, mas também realça que o país é dos que menos capacidade hospitalar tem na Europa, bem como um dos que menos enfermeiros tem por habitante.

Paris Match. No “país do fado” “a afluência das festas de fim de ano” fez a pandemia explodir

A revista Paris Match dá grande destaque à pandemia em Portugal. As ambulâncias à frente do Hospital Santa Maria, o número elevado de óbitos e a situação nos hospitais.

“Foi um grande erro comemorar o Natal. As pessoas queriam reunir-se com família. Agora, eles estão numa arca frigorífica”, descreve um médico citado pela revista francesa. A situação das morgues e do aumento de funerais é um dos motivos de destaque, que fala com Paulo Carreira, diretor da maioria empresa funerária portuguesa.

O estado a que chegaram os hospitais do SNS também é um ponto retratado pela revista, principalmente o Santa Maria.

Artigo atualizado às 18h07 com a cobertura da revista Paris Match