O Grão-Mestre do Grande Oriente Ibérico, de obediência maçónica, considera um “inadmissível atentado ao direito de liberdade de consciência” a exigência de os titulares de cargos públicos declararem se pertencem a alguma sociedade secreta.

Inácio Ludgero reagia em comunicado enviado esta segunda-feira à Agência Lusa, ao projeto de lei apresentado pelo partido Pessoas Animais Natureza (PAN) que pretende incluir no regime do exercício de funções dos titulares de cargos políticos “um campo de preenchimento facultativo” para indicarem se pertencem a organizações secretas.

Também o PSD propôs uma alteração legal para tornar obrigatório que deputados e titulares de cargos públicos declarem, no seu registo de interesses, se pertencem a associações e organizações “discretas” como a maçonaria e Opus Dei.

Para o responsável maçónico esta é uma iniciativa “inequivocamente dirigida contra a Maçonaria” e compara-a à lei das Associações Secretas de 1935, a lei nº 1901, de 21 de maio de 1935, publicada durante a ditadura militar, instaurada na sequência do golpe militar de 28 de maio de 1926.

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“É certo que o texto da proposta PAN/PSD não é exatamente igual ao da lei que ilegalizou a Maçonaria, mas por ele perpassa claramente o espírito bafiento reinante na Assembleia Nacional de 1935”, afirma Inácio Ludgero.

“A obrigatoriedade, como pretende o PSD, de que os titulares de cargos políticos ou de altos cargos públicos sejam obrigados a declarar, por escrito, se pertencem ou não à Maçonaria – porque é a isso que, verdadeiramente, se reconduz tal iniciativa legislativa – configura um inadmissível atentado ao direito de liberdade de consciência consagrado sobre o art. 41º da Constituição da República, razão pela qual não podemos deixar de repudiar”, lê-se no comunicado.

Para Inácio Ludgero “o projeto de decreto-lei do PAN com o acrescente do PSD é de todo descabido e evidencia, antes de mais, o total desconhecimento dos seus proponentes da matéria que pretendem ver legislada, confirmando assim que aquilo que os move são meros intuitos ‘voyeristas'” e levanta “suspeitas” sobre cidadãos que livremente se associaram a uma obediência maçónica.

O responsável maçónico escreve que “o diploma assenta no pressuposto de que os Maçons são cidadãos por natureza suspeitos, que fazem juramentos ao demo, quando, ao invés, são homens e mulheres livres e de bons costumes que têm como primeiro juramento o respeito pela Pátria, pelas suas leis e pelos poderes legalmente instituídos”.

Inácio Ludgero realça que a “participação dos maçons na Maçonaria não cabe ao legislador sindicar” a sua “forma de organização e de trabalho”, pois “não cometem crimes ou quaisquer outros atos reprováveis”.

Para o Grão-Mestre do Grande Oriente Ibérico esta é “uma iniciativa legislativa que deve ser frontalmente desmascarada e combatida, não obstante os pareceres solicitados à medida, nome”adamente à Opus Dei”, e refere que “acidentalmente — ou talvez não — não consta que tenham sido chamadas a pronunciar-se qualquer uma das obediências maçónicas que desenvolvem os seus trabalhos no território nacional.

Realça o Grão-Mestre que este é “um assunto demasiado sério” e adverte, “que não pode ser deixado à mercê dos jogos de bastidor partidários, quando o que está em causa é a violação do disposto sob o artigo 41º da Constituição da República”. Inácio Ludgero refere que “a Maçonaria sempre foi atacada ao longo dos tempos” e salienta que “sempre agiu em conformidade com a lei”.

“Vivemos tempos difíceis com a pandemia que a todos nós afeta e que, já ela, nos coarta de algumas liberdades”, argumenta o Grão-Mestre que termina fazendio um apelo: “Não queiram os proponentes e os apoiantes desta iniciativa legislativa fazer-nos voltar a uma época que Abril encerrou” e deixa uma garantia: “como maçons que somos continuaremos a lutar diariamente, na liberdade absoluta de consciência e independentemente da Obediência de que façamos parte, pelos ideais nobres da Maçonaria Universal”.

Também o Grão-Mestre da Maçonaria Regular Portuguesa, Armindo Azevedo, manifestou-se na passada quinta-feira contra as propostas parlamentares para que deputados e titulares de cargos públicos passem a ser obrigados a declarar se são maçons ou pertencem a outras organizações “discretas”.

Em comunicado enviado à Lusa, a Grande Loja Regular de Portugal (GLLP/GLRP) “apela ao bom senso das entidades que regem a nossa Nação, para que defendam os direitos e os princípios estabelecidos pela Constituição Portuguesa”.

Apela ainda “ao entendimento da profundidade das consequências éticas e morais da aprovação de uma Lei que obrigue um homem livre, para exercer uma função para a qual foi eleito, a ter de confessar obrigatoriamente as convicções filosóficas e espirituais que regem os princípios da sua vida”.