O dirigente dos Verdes José Luís Ferreira admite um novo entendimento, no futuro, com o PS e partidos de esquerda, porque a experiência da “geringonça” foi “positiva a todos os níveis”, incluindo o democrático.

“Não excluímos que, no futuro, isso se volte a colocar. Na altura, será avaliado em função do que foi o programa do Governo”, afirmou, em entrevista à Lusa, José Luís Ferreira, que é também deputado e líder parlamentar do Partido Ecologista “Os Verdes” (PEV), sobre a 15.ª convenção, que reúne este fim de semana, em Lisboa.

Olhando para trás, para os anos da “geringonça”, de 2015 a 2019, quando PS, PCP, BE e PEV assinaram acordos — as chamadas “posições conjuntas” —, José Luís Ferreira considerou que a experiência “foi positiva a todos os níveis, até do ponto de vista da democracia”. Porque, argumentou, quando um partido está em minoria, esse facto “transforma a Assembleia [da República] num órgão muito ativo do ponto de vista político” e não numa mera “caixa de ressonância” como quando existe uma maioria absoluta.

Nesses quatro anos, exemplificou, houve “avanços”, com a recuperação de direitos sociais e dos feriados, retirados durante os anos da crise da troika, ou ainda “vantagens do ponto de vista ambiental”, dado que o PEV reclama ter conseguido “algum travão no Programa Nacional de Barragens”.

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Mesmo depois das legislativas de 2019, quando o acordo não foi renovado — o PS não o quis — “isso não perturba”, a não ser na altura da negociação, à esquerda, dos Orçamentos do Estado, para saber “se vão ou não vai, se é aprovado ou se não é aprovado”.

O Orçamento do Estado de 2021, por exemplo, foi aprovado apenas com os votos a favor do partido do Governo, o PS, beneficiando da abstenção do PCP, PEV e PAN. PSD, CDS-PP, BE, Chega e Iniciativa Liberal votaram contra. Os Verdes já foram convidados pelo Governo para uma primeira reunião, em julho, para negociar o próximo Orçamento, mas querem primeiro fazer um “diagnóstico” do que está a ser cumprido no orçamento deste ano.

Verdes “de esquerda”, na CDU e em “luta” contra lítio e aeroporto de Montijo

Os Verdes fazem, este fim de semana, a sua 15.ª Convenção em que vão vincar ser “de esquerda”, admitindo o desejo de continuar na CDU, e assumir as “lutas” ecologistas contra o aeroporto do Montijo ou a exploração do lítio. José Luís Ferreira antecipou prioridades e algumas “bandeiras” ecologistas, a começar pela contestação ao novo aeroporto do Montijo, mas também promete dar atenção ao ambiente em Odemira, distrito de Beja.

Porque, além dos problemas sociais revelados pela crise pandémica com as condições em que viviam milhares de trabalhadores imigrantes, “aquilo é uma lixeira de plástico a céu aberto”, com milhares de estufas, o que é também “um problema ambiental grave”, descreveu.

A “luta” contra o novo aeroporto continuará a ser uma prioridade para o PEV, que atribui “a teimosia” do Governo em insistir na opção Montijo com “a pressão” da Vinci, já concessionária do aeroporto de Lisboa, e reivindicou o facto de avançar uma “avaliação ambiental estratégica”, proposta pelos Verdes no Orçamento do Estado deste ano.

Há também outros objetivos para os próximos tempos, como sejam a “frente de batalha” contra a exploração da mina de lítio, em Montalegre, no norte do país, e outros mais políticos.

O partido, com dois deputados à Assembleia da República — José Luís Ferreira e Maria Silva — vai igualmente apresentar um projeto para a criminalização do enriquecimento ilícito e voltar às iniciativas quanto aos paraísos fiscais.

Mais a curto prazo, há ainda o processo de negociação do Orçamento do Estado de 2022, para que o deputado afirma manter abertura para conversar, embora queira fazer um diagnóstico ao cumprimento dos compromissos assumidos pelo Governo para este ano — e que justificaram a abstenção do partido.  “Nós dissemos que antes de começar a negociar teríamos que ver como as coisas estão [relativamente ao Orçamento deste ano]. Porque se não andamos aqui a enganar-nos uns aos outros”, disse à Lusa.

O PEV admite que possa haver atrasos em pelos três dossiês — a continuação do reforço dos quadros no Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (INCF), o fundo de tesouraria para as micro, pequenas e médias empresas e o Estatuto da agricultura familiar — e é por isso que quer fazer esse diagnóstico antes do primeiro encontro com o Governo de António Costa, previsto para julho.

Segundo José Luís Ferreira, na reunião deste fim de semana, o PEV pretende assumir uma “postura de partido de esquerda” por entender “um ecologista terá mesmo que ser de esquerda se for mesmo verdadeiro ecologista”, a favor de um “desenvolvimento sustentável”.

De resto, politicamente, o partido deverá continuar a fazer parte da coligação com o PCP e Intervenção Democrática, na Coligação Democrática Unitária (CDU), embora a decisão sobre cada uma das eleições seja caso a caso, pelo órgão próprio, o conselho nacional.

Fazemos um balanço positivo da nossa participação na CDU e vamos, no futuro, continuar a fazer um esforço para que haja uma convergência de esforços de fato que resolvam os problemas do país”, afirmou.

O PEV não tem um líder, ao contrário de outros partidos. A convenção, que se realiza de três em três anos, elege o conselho nacional, responsável por desenvolver e executar a política partidária, a comissão de arbitragem nacional e a comissão nacional de fiscalização de contas. Existe depois a comissão executiva, órgão político permanente saído do conselho nacional.

Em números, haverá, nos órgãos nacionais, uma “renovação de 11,6%” e também uma maioria feminina: as mulheres são 58,1%, os homens são 49,1%. É uma marca “do próprio ADN” do partido haver “mais mulheres na direção nacional do que homens”, o que acontece sem “qualquer imposição de quotas”, afirmou.

Esta será uma convenção diferente, no Fórum Lisboa, com cerca de 200 delegados — menos 40% do que em 2018 — devido à epidemia de Covid-19, e que também implicou regras sanitárias e de distanciamento, como a medição de temperatura a todos quantos entrem no recinto, o uso obrigatório de máscara. As salas serão higienizadas depois de cada sessão do congresso, que não duram mais de três horas, os almoços são ao ar livre, as cadeiras a ocupar estão assinaladas, há circuitos e, para evitar aglomerações de pessoas, não haverá pausas para o café.