A moda das pick-ups eléctricas, alimentadas exclusivamente por bateria, aproxima-se a passos largos e todos os fabricantes que disputam o segmento querem conquistar a maior fatia possível. No mercado norte-americano, este tipo de veículo com caixa de carga atrás é uma instituição, figurando habitualmente entre os modelos mais vendidos, pelo que não é de estranhar que todos os construtores se queiram fazer representar, dos mais conceituados e antigos aos mais novos, alguns ainda autênticas startups que assim se preparam para comercializar o seu primeiro veículo. Contudo, é precisamente destas pequenas e dinâmicas empresas que, muitas vezes, nos chegam os grandes avanços tecnológicos.
O pontapé de saída das pick-ups a bateria foi dado pela Rivian e pela Tesla, a primeira com a R1T e a segunda com a Cybertruck, que rapidamente granjearam a atenção do público e, por tabela, dos restantes fabricantes. A Badger da Nikola não chegou a dar os primeiros passos, após o seu CEO ser afastado sob acusações de fraude, enquanto a Lordstown avançou com um veículo mais acessível.
Toda esta movimentação obrigou os pesos-pesados da indústria norte-americana a avançar antes do que tinham previsto, com a General Motors a reinventar o Hummer EV, para já apenas como pick-up (o SUV chegará depois), e a Ford a propor a versão eléctrica da F-150, o best-seller do segmento, agora com dois motores eléctricos e bateria.
Há grandes diferenças entre as várias pick-ups, com aquelas que derivam de plataformas originadas para motores de combustão a saírem penalizadas, como seria de esperar e à semelhança do que já acontece nos automóveis e SUV europeus. A Lordstown aposta numa gama mais barata, limitando a potência e a autonomia, com a Ford a propor um produto melhor, mas ainda assim a apontar armar ao coração do mercado, uma vez que está determinada a continuar a ser o construtor líder nas vendas de pick-ups, mesmo se 100% eléctricas.
Tudo eléctrico, mas com muitas diferenças
A Lordstown aposta numa pick-up proposta por 52.500 dólares, a Endurance, com 600 cv – sendo a única a colocar os motores eléctricos dentro das jantes –, capaz de puxar 2721 kg e com uma autonomia de 402 km, confirmando que o fabricante dá pouca importância à capacidade da bateria. Já a Ford joga em dois tabuleiros, um que lhe permite ter um preço de arromba (a partir de aproximadamente 42.000 dólares), ainda que uma autonomia de apenas 370 km e 426 cv, com a bateria Standard Range, e outro em que aposta no incremento da potência (563 cv) e da autonomia (483 km), com a versão Extended Range, cujo preço ainda não foi anunciado.
A Rivian R1T, um dos modelos mais promissores oriundos de uma startup, caracteriza-se por oferecer soluções surpreendentes. A começar pela capacidade de realizar inversões de marcha estilo tanque, ao fazer com que as rodas de um lado girem para a frente e as do outro para trás (só possível por ter um motor por roda), com a pick-up a rodar sobre si própria. A R1T vai ser proposta com mais do que uma capacidade de bateria, mas a mais potente eusufruirá de 135 kWh e 754 cv, sendo capaz de ir de 0-97 km/h em apenas 3 segundos. A versão de lançamento, denominada Launch Edition, será comercializada por 75.000 dólares, estando prevista a Explorer, menos dotada de equipamento, por 67.500$.
As propostas mais potentes, com maior autonomia e mais rápidas ficam entregues à GM e à Tesla. A Hummer EV equipa a versão de lançamento, a Edition 1, por 112.600 dólares, com três motores que somam 1014 cv, o que aliado a uma bateria com 200 kWh garante acima de 560 km de autonomia, segundo o fabricante. À semelhança da Tesla, da Rivian e da Lordstown, a GM também recorre a uma plataforma específica para veículos eléctricos, o que facilita a montagem de distintas capacidades de bateria e número de motores.
O Hummer EV3X (99.995$) é similar em tudo ao Edition 1, mas com apenas 800 cv e uma autonomia de 483 km, enquanto o EV2X (89.995$) reduz a potência para 625 cv, mantendo contudo a autonomia, bem como a suspensão hidropneumática e as quatro rodas direccionais, solução que permite o “andar à caranguejo”. Se a Edition 1 está prevista para o final de 2021, o Hummer EV3X para 2022 e o EV2X para 2023, só em 2024 será lançado o EV2 (79.995$), que será a versão mais simples e acessível da pick-up eléctrica da GM.
A Cybertruck da Tesla, provavelmente pelas suas formas diferentes e construção inovadora, em que em vez de chassi e carroçaria, a própria carroçaria é estrutural, construída com o mesmo aço inox que é utilizado no Starship, o foguetão que a SpaceX está a preparar, é o modelo que tem suscitado mais polémica e curiosidade. Esta pick-up eléctrica vai estar disponível em três versões, a mais acessível por 39.900$, sendo capaz de percorrer 400 km entre recargas e atingir 175 km/h, os 0-97 km/h ao fim de 6,5 segundos e rebocar 3,4 toneladas, tudo com apenas um motor e tracção traseira.
A Cybertruck com dois motores e tracção integral assume-se como a versão intermédia, com um preço de 49.900$, anunciando 195 km/h, 0-97 km/h em 4,5 segundos, capacidade de puxar 4,5 toneladas e 480 km de autonomia. O topo de gama é a Tri Motor, cujas especificações técnicas passam por reclamar 210 km/h, menos de 2,9 segundos de 0-97 km/h, puxar 6400 kg e uma autonomia de 800 km, com um preço de 69.900 dólares.
Quem vai liderar nas vendas?
Esta é uma questão que todos gostariam de conhecer a resposta, sobretudo os construtores envolvidos. Contudo, é possível retirar algumas ilações através da comparação do volume de pré-encomendas que cada modelo amealhou. Vamos então fazer uma ronda pelos diferentes construtores, deixando de lado a Badger da Nikola, pois não é evidente o futuro da empresa, especialmente depois das acusações ao seu CEO e de a GM ter decidido não adquirir uma fatia considerável da startup, uma injecção de capital que seria muito bem-vinda para fazer evoluir a pick-up e os camiões.
Nas pré-encomendas anunciadas, a Hummer EV surge com apenas 10.000 unidades, mas todas elas relativas à Edition 1, a única versão que vai estar à venda em 2021. Mas se tivermos em conta que as unidades previstas para esta versão de lançamento esgotaram em apenas 10 minutos, segundo o construtor, é de prever que quando forem reveladas as encomendas das versões EV2 à EV3X, a Hummer passe de última destacada a ter um lugar no top 3, isto apesar de ser de longe a mais cara.
A segunda pick-up eléctrica com menos encomendas é a Rivian R1T, que anunciou ter 30.000 clientes à espera que as primeiras unidades cheguem ao mercado. As primeiras entregas deste construtor, que conta com o apoio da Amazon, estão agendadas o próximo mês de Junho. Melhor do que a Rivian parece estar a Ford, uma vez que a F-150 Lightning já reuniu 70.000 encomendas, um valor respeitável, mas não para um gigante como este. Ainda assim, as entregas a clientes começarão apenas em 2022 e, nessa altura, a Ford contará com a sua extensa rede de concessionários e capacidade comercial para esgrimir condições de crédito mais competitivas.
Impressionantes são as 100.000 encomendas reunidas pela Lordstown para a sua Endurance. Este construtor, de longe com menos notoriedade, concentrou a sua comunicação nos frotistas e nas empresas que podem usufruir deste tipo de veículos para trabalhar, o que pode explicar o sucesso. Como a Lordstown não espera produzir mais de 2200 pick-ups até final de 2021, é fácil perceber que os clientes que colocaram as suas encomendas devem preparar-se para esperar uns meses.
Notável, a todos os níveis, é o volume de encomendas registado pela Tesla para a Cybertruck, facto a que não será estranho a imagem do construtor e a ousadia do modelo. Em Novembro de 2019, o CEO Elon Musk anunciou (no Twitter) 250.000 encomendas, para em Março de 2020 a fasquia ter subido para 600.000. Agora, com o arranque da produção na nova fábrica do Texas (que ainda está a ser construída) agendado para o final de 2021, surge uma empresa que controla o volume de reservas a publicar um relatório que aponta para 1 milhão o número de clientes que encomendaram uma Cybertruck através do site da marca. Por muito que este valor coloque um sorriso na face dos accionistas da Tesla, a realidade é que serão necessários cerca de três anos para que todos estes clientes recebam o seu veículo, o que representa cerca de 60 mil milhões de dólares de facturação para o construtor norte-americano.