O presidente executivo da Ryanair elevou o tom das acusações ao ministro das Infraestruturas, que tem o pelouro da aviação. Numa conferência de imprensa realizada esta sexta-feira em Lisboa, Michael O’Leary acusou Pedro Nuno Santos, a quem chama de “ministro Santos”, de proferir “críticas falsas” contra a companhia low-cost irlandesa que está a contestar no Tribunal Geral Europeu a ajuda de Estado à TAP.
E usou até uma foto do ministro alterada, com um “nariz de Pinóquio” para dar mais força à mensagem que já tem vindo a passar nos contactos feitos com a imprensa portuguesa nas últimas semanas.
Vestido com uma camisola da seleção portuguesa de futebol — no dia em que Portugal disputa com a França a passagem aos oitavos de final do Euro 2020 — O’Leary aproveitou a conferência de imprensa para anunciar a retoma da oferta em Portugal com novas rotas para atacar Pedro Nuno Santos e repetir a ideia recorrente de que dar subsídios de 3,2 mil milhões de euros à TAP é “deitar dinheiro pela sanita”, que nunca será recuperado.
O homem forte da companhia low-cost quis contrariar o que classificou de “mentiras e críticas falsas” atribuídas por Pedro Nuno Santos. E classificou de falsas cada uma das questões que terão sido levantadas em intervenções do ministro depois do Tribunal Geral Europeu ter anulado a autorização dada pela Comissão Europeia à ajuda dada à TAP. Esta decisão, cujos efeitos foram suspensos aguardando argumentação adicional da Comissão Europeia, é o resultado de uma queixa apresentada pela companhia low-cost.
O’Leary projetou um slide para desmentir os argumentos dados pelo ministro, nomeadamente recusando a prática de “dumping social” e de incumprimento dos contratos de trabalho em Portugal, comparando os salários pagos pela empresa não aos profissionais da mesma categoria ou ocupação em outra companhia aérea, mas a “enfermeiros e professores”.
A Ryanair mostrou um quadro com os valores pagos anualmente em taxas e impostos (mais taxas que impostos) pela Ryanair em Portugal no valor de 130 milhões de euros.
“Somos um grande contribuinte em Portugal. Pagamos impostos. Pagamos mais de 100 milhões de euros por ano em impostos. Acreditamos que não devem ser desperdiçados na TAP.”
Questionado sobre a motivação para um discurso hostil face ao governante que tem o pelouro da aviação em Portugal, o presidente executivo da Ryanair justifica: “Nenhum outro ministro francês ou alemão, acusou a Ryanair de fazer uma guerra comercial contra a TAP — é apenas concorrência — e de praticar dumping social.
“São críticas falsas do ministro Santos. que vamos rejeitar”. Michael O’Leary garante que a Rynair tem tido o apoio do Governo português, apesar da relação “conturbada” com o ministro Pedro Nuno Santos que, defende, devia pedir desculpas. Para o CEO da Rynair, o ministro está “a fazer política” e joga uma carta “populista” na TAP, mas acho que ele se “auto-bloqueou”.
Atraso do Montijo protege a TAP
Nesta conferência, a primeira presencial dada após a pandemia em Portugal, Michael O’Leary apontou ainda o dedo ao ministro das Infraestruturas pelo atraso na construção do aeroporto complementar do Montijo. Um atraso que diz ter o como objetivo proteger a TAP. “Não há outra explicação”.
O projeto do aeroporto complementar tinha recebido luz verde ambiental mesmo antes do início da pandemia em 2020, mas acabou por ser travado pelo regulador depois de duas das câmaras abrangidas terem dado parecer negativo. O Governo anunciou entretanto que vai promover uma avaliação ambiental estratégica do Montijo face à alternativa de um aeroporto de raiz em Alcochete, mas o processo não avançou (ainda não se sabe quem vai fazer este trabalho).
O gestor denuncia um atraso de dois anos no calendário deste aeroporto, atribuído a razões ambientais, e pede ao ministro Santos que faça o que um ministro das Infraestruturas que “deixe de perder tempo e dinheiro” e faça o que um ministro das Infraestruturas “deve fazer”: abrir o Montijo para que a Ryanair possa trazer mais emprego e investimento”. O aeroporto do Montijo tem sido “atrasado” para proteger a TAP que beneficia dos constrangimentos da Portela onde controla os mesmos slots, apesar de ter reduzido a frota. Esses slots, sublinha, têm de ser libertados.
“Quem beneficia do constrangimento reduzido da oferta na Portela? TAP Que beneficiaria de mais capacidade? Toda a gente beneficiaria, menos a TAP”.
Michael O’Leary. 3 mil milhões para a TAP é dinheiro “mandado pela sanita abaixo”
Michael O’Leary afirmou ainda que escreveu ao Governo português a mostrar disponibilidade para instalar bases de manutenção em Portugal, mas que ainda não teve qualquer resposta da parte do Ministério tutelado por Pedro Nuno Santos. E garante que a empresa está disponível para investir 500 milhões de euros e criar 500 empregos no aeroporto complementar do Montijo.
Nova gestora da TAP é “talentosa”, mas vão ser os sindicatos a gerir a companhia
Ainda sobre a companhia portuguesa, o o presidente executivo da Ryanair garante que até quer que a TAP sobreviva, mas para isso tem de ser mais pequena e mais eficiente. Admite ainda que a transportadora pode receber alguma ajuda (mil milhões de euros — menos do que já recebeu), mas que em contrapartida deve ceder metade dos slots na Portela. A Ryanair quer aumentar a oferta, mas esses slots não estão disponíveis, acrescentou.
O presidente executivo da Rynair comentou ainda a nova CEO apontada para a TAP, a francesa Christine Ourmières-Widener, que descreve como uma “senhora talentosa”. É boa e eficaz, mas tem pela frente um “desafio monumental” por causa da intervenção governativa. Para O’Leary quem vai gerir a TAP são os sindicatos porque é isso que acontece em empresas controladas pelo Estado. E sindicatos fortes significa “gestões fracas”.
No plano laboral o CEO foi questionado sobre como vai a Rynair reagir perante a decisão judicial que considerou ilegal o processo de seleção para o despedimento coletivo feito no ano passado no Porto e em Lisboa. O’Leary diz que a empresa está já a contratar em Portugal e que esses trabalhadores foram convidados a regressar.
O arranque da conferência de imprensa foi marcado pela retoma da oferta para Portugal este verão. A empresa vai disponibilizar mais de 600 voos semanais através de 122 rotas, incluindo novos destinos de Colónia, servidos a partir de Lisboa e Faro, Belfast City e Teesside. Apesar da decisão do Governo inglês de excluir Portugal dos corredores verdes para os turistas britânicos, Michael O’Leary está otimista com o regresso dos turistas a Portugal. Anunciou ainda a oferta de 100.000 lugares a partir de 19,90 euros para viagens até 31 de outubro, disponível a partir de 24 de junho.