O Grão-Mestre da Maçonaria Regular defendeu esta quinta que a iniciativa que obriga titulares de cargos políticos e altos cargos públicos a declarar que pertencem a associações coloca em causa “o respeito pelos direitos e liberdades individuais dos deputados”.
O Grão-Mestre da Grande Loja Legal de Portugal — Grande Loja Regular de Portugal (GLLP/GLRP), Armindo Azevedo, afirmou, em comunicado, que a votação na comissão da Transparência e Estatuto dos Deputados na quarta-feira configura “uma perda de confiança da instituição parlamentar nos seus próprios representantes” e que “saíram a perder o bom senso e o respeito pelos direitos e liberdades individuais dos deputados“.
A Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados aprovou na quarta-feira uma iniciativa do PSD que estabelece que titulares de cargos políticos e altos cargos públicos tenham de declarar pertencerem a associações, desde que não implique revelar “dados constitucionalmente protegidos“, como sejam convicções religiosas.
Para Armindo Azevedo, a decisão foi tomada “sem o devido entendimento da profundidade das consequências éticas e morais da aprovação de uma Lei que obriga um homem livre, para exercer uma função para a qual foi eleito, a ter de confessar obrigatoriamente as convicções filosóficas e espirituais que regem os princípios da sua vida”.
No comunicado, a Maçonaria Regular recorda “a perseguição historicamente feita aos maçons, ao longo dos séculos“, que “torna particularmente sensível este tema”, para além de “colocar em causa dúvidas sobre uma instituição que, como a Maçonaria o faz, age constantemente no estrito cumprimento e respeito da legalidade”.
Um dos princípios basilares da Maçonaria é o da liberdade dos indivíduos e o respeito pela privacidade das opções espirituais e crenças de cada um, algo que agora fica posto em causa no lugar que entre todos seria o mais insuspeito para esta decisão; a Assembleia da República, a casa por excelência da nossa democracia”, sustenta-se na nota.
A Maçonaria Regular deu ainda conta de que a Confederação da Maçonaria Simbólica do Brasil enviou uma nota de solidariedade à Grande Loja Regular de Portugal, em que sustenta que propostas como a que foi aprovada “criam precedentes perigosos que ferem princípios fundamentais de um Estado Democrático de Direito, além de gerarem cenários propícios à intolerância e ao preconceito, ao qualificar cidadãos pelas suas filiações, identificações ou orientações ideológicas e filosóficas”.
O texto de substituição, apresentado pelo PSD na comissão da Transparência e Estatuto dos Deputados, de alteração a um projeto de lei do PAN que esteve em discussão na comissão, determina que os titulares de cargos políticos e altos cargos públicos tenham de declarar a “filiação, participação ou desempenho de quaisquer funções em quaisquer entidades de natureza associativa, exercidas nos últimos três anos ou a exercer cumulativamente com o mandato”. Mas “desde que essa menção não seja suscetível de revelar dados constitucionalmente protegidos, como seja os relativos à saúde, orientação sexual, filiação sindical ou convicções religiosas ou políticas, casos em que tal menção é meramente facultativa”. Esta proposta foi aprovada com os votos favoráveis de PSD, BE, PCP, CDS-PP e PAN e os votos contra do PS.
A iniciativa do PSD visa também alterar o artigo do regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos relativo ao acesso e publicidade, estabelecendo que a consulta destes elementos apenas possa acontecer mediante requerimento fundamentado, como sucede com informações relativas a rendimento e património.
Esta discussão surgiu na sequência de um projeto de lei do PAN (que deu entrada em dezembro de 2019), que pretendia que a declaração, que já se aplica a rendimentos, património, interesses, incompatibilidades e impedimentos, incluísse “um campo de preenchimento facultativo” para indicação de pertença a organizações “discretas“, como a Maçonaria e a Opus Dei.
O PAN prescindiu do seu projeto de lei em detrimento da proposta alternativa aprovada na especialidade, tendo sido apenas votada e aprovada a norma transitória do partido que estabelece que estas alterações “aplicam-se aos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, e equiparados nos termos do n.º 5 do artigo 13.º da lei n.º52/2019” que “iniciem, renovem ou terminem funções a partir da entrada em vigor”, o que acontece cinco dias após a publicação do diploma.