Portugal foi um dos poucos países na União Europeia, a par com a França a anunciar medidas temporárias e extraordinárias para aliviar a fatura dos combustíveis junto das famílias e empresas de transportes. A mensagem voltou a ser repetida pelo Governo, através do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, após a aprovação em Conselho de Ministros do desconto de 10 cêntimos por litro para 50 litros mensais a partir de 10 de novembro.

A medida custará 132,5 milhões de euros nas contas do Executivo e não dependia do Orçamento do Estado para ser aplicada. Os descontos foram criticados pela oposição, à direita e à esquerda, que preferiam uma baixa do imposto sobre os produtos petrolíferos que o Governo só muito timidamente reduziu em 1 cêntimo no gasóleo e dois cêntimos na gasolina. Esta baixa não impede Portugal de se manter no clube dos países que mais impostos cobram sobre o litro do combustível.

Com base na última edição do Oil Bulletin, uma publicação da Comissão Europeia que compila os preços médios oficiais dos países da União Europeia, de 25 de outubro, a gasolina portuguesa é a sétima com maior carga fiscal (imposto petrolífero e taxas incorporadas mais IVA). É superior à média dos impostos cobrados por litro na União Europeia e está muito acima de Espanha. O mesmo acontece com o gasóleo, que tem o oitavo nível de impostos mais elevado na Europa a 27.

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A carga fiscal é assim responsável em grande parte pela elevada fatura que os portugueses suportam nos combustíveis, como argumentam as petrolíferas. Mas não é a única culpada. Pelo menos no caso da gasolina.

As mesmas estatísticas dos preços médios mostram que a gasolina portuguesa está também entre as mais caras da UE antes de impostos. Portugal estava no sexto lugar dos valores mais altos sem considerar a carga fiscal, acima da média, ainda que ligeiramente abaixo de Espanha, o que demonstra que os preços que atraem milhares de portugueses para o outro lado da fronteira são sobretudo explicados por impostos mais baixos. Já no gasóleo antes de impostos, Portugal está na metade dos países que praticam preços médios inferiores.

Uma explicação possível para esta diferença no comportamento verificado nos dois combustíveis — e que nem sempre foi assim — é o facto de o gasóleo ser o mais vendido e também aquele onde a queda de procura foi menos expressiva pelo efeito da pandemia. A gasolina está mais associada aos carros particulares e a viagens de lazer e o menor volume de consumo pode justificar preços médios mais altos antes de impostos, porque os custos são diluídos por menores quantidades.

Foi precisamente na gasolina que o relatório da Entidade Nacional do Setor Energético detetou a tal subida média das margens brutas de comercialização durante o período de maior quebra da procura, que serviu de argumento para o Governo avançar com a legislação que permite fixar temporariamente margens na cadeia dos combustíveis. As petrolíferas já apontaram erros na extrapolação feita desta subida de margens para uma apropriação de maior lucro por parte dos operadores, sublinhando que o efeito quantidade é fundamental para as margens do negócio.

Mas se os automobilistas portugueses pagam mais impostos sobre os combustíveis do que a maioria dos europeus e têm uma das gasolinas mais caras antes da carga fiscal, foram também dos menos prejudicados pela escalada dos preços que se tem verificado este ano.

A análise levada a cabo pelo Observador aos preços médios praticados na União Europeia permite concluir que Portugal — um dos poucos a anunciar medidas para compensar os custos com os combustíveis — foi um dos países onde os combustíveis menos subiram desde o início deste ano. A conclusão resulta da comparação entre os preços médios finais e antes de impostos praticados na primeira semana de janeiro com os valores registados na terceira semana de outubro.

Este tipo de exercício pode dar resultados diferentes consoante o período analisado porque há países onde os preços reagem mais rapidamente às tendências do mercado internacional. No passado e em contextos inversos, as comparações sugeriam que Portugal era um dos países mais lentos a baixar os preços.

O Observador selecionou também um período entre o início de abril, quando se começou a consolidar a tendência de alta nos combustíveis a reboque do fim dos confinamento. Nesta comparação face aos valores médios praticados na terceira semana de outubro, o comportamento dos preços portugueses é menos favorável.

Portugal continua a ser um dos países onde as subidas foram menos expressivas, mas ainda assim com vários Estados-membros a apresentar aumentos menos significativos. Curiosamente um deles é França, o outro país que vai dar um cheque às famílias de rendimentos mais baixos para ajudar na fatura com os combustíveis. Já em relação a Espanha, Portugal teve aumentos mais suaves.

Do outro lado destes rankings de subidas, a Suécia destaca-se com aumentos que no gasóleo já ultrapassam os 40 cêntimos por litro desde o início do ano.

Ainda que a evolução dos preços em Portugal compare bem nesta análise, isso não quer dizer que as famílias e empresas não estejam a sofrer os efeitos de aumentos muito significativos nos combustíveis. Entre janeiro e outubro, o preço médio da gasolina simples subiu 26 cêntimos por litro e o gasóleo 24 cêntimos por litro. Esta escalada travou ligeiramente nas últimas semanas, em particular na gasolina onde o Governo baixou o imposto em dois cêntimos.

Mas é preciso assinalar que os aumentos aqui referidos, e que têm como fonte o Oil Bulletin, correspondem apenas aos combustíveis simples (excluindo os aditivados que são mais caros). E não traduzem de forma direta a evolução dos preços fixados nas bombas de gasolina (e que são os reportados no site preço dos combustíveis da DGEG (Direção Geral de Energia e Geologia), mas sim o valor pago com os descontos que a maioria dos postos oferece e que, segundo as petrolíferas, abrangem 70% a 80% dos consumos feitos.