A Sociedade Portuguesa de cardiologia inicia na quarta-feira um estudo para determinar a prevalência em Portugal da insuficiência cardíaca, a causa mais comum nos internamentos acima dos 65 anos e cujos dados têm mais de 20 anos.
Em declarações à agência Lusa, Rui Baptista, um dos investigadores envolvidos no PORTHOS, explicou que a insuficiência cardíaca se caracteriza pela “incapacidade do coração em bombear sangue para os vários órgãos“, sublinhando que é como que “uma doença de um coração que já sofreu várias agressões”.
“Ela [insuficiência cardíaca] acontece porque as pessoas têm hipertensão, têm diabetes, têm enfartes, vão sobrevivendo, felizmente, mas o coração vai tendo as suas sequelas”, explicou Rui Baptista, sublinhando que a insuficiência cardíaca é a principal causa de internamento depois dos 65 anos.
À medida que a população vai envelhecendo, o número de doentes vai aumentando e, na realidade, a insuficiência cardíaca é a principal causa de internamento depois dos 65 anos em Portugal, o que, no fundo, traduz este envelhecimento da população”, afirmou.
Lembrou que os últimos estudos sobre a prevalência (número de doentes por 100 mil habitantes ou por milhão de habitantes) têm mais de 20 anos e que o que os investigadores pretendem é saber, “com a população envelhecida que Portugal tem e com toda a evolução epidemiológica que ocorreu nos últimos 20 anos, qual é a realidade atual”.
O especialista destacou a importância desta atualização de dados, não só para os médicos: “é importante também para podermos distribuir melhor os recursos, saber que doentes temos, onde é que eles estão, como é que eles distribuem [pelo território] urbano ou rural, pelos sexos e pelas idades”.
Adiantou também que os registos de base populacional “são bons”, pois permitem conhecer quantos doentes há de determinada doença, mas “não têm o rigor de um estudo epidemiológico como o PORTHOS”, que arranca na quarta-feira, em Matosinhos.
De acordo com o investigador, este estudo surge da junção de esforços de várias entidades, entre elas a NOVA Medical School — Faculdade de Ciências Médicas, a Sociedade Portuguesa de Cardiologia e a indústria (AstraZeneca), acrescentando que a amostra partiu de grupos de centros de saúde que são representativos da população portuguesa e que foram escolhidos pela Escola Nacional de Saúde Pública.
“Esta distribuição (…) vai envolver o número proporcional de participantes de acordo com a densidade populacional de cada área e com a sua representatividade”, explicou o responsável, adiantando que, a partir dos dados inscritos nos centros de saúde, os doentes serão contactados para serem convidados a participar.
Haverá depois uma camioneta a circular nas localidades com capacidade para fazer recolha de sangue, para analisar um marcador específico indicador do risco para insuficiência cardíaca.
Se o marcador for positivo, ou se a pessoa já tiver história de ter tido a doença, então vai avançar nos exames ao coração e vai realizar, naquele momento, um eletrocardiograma e um ecocardiograma”, explicou.
Segundo Rui Baptista, “isto vai permitir ter um diagnóstico em meia hora da síndroma de insuficiência cardíaca, com o mínimo de incómodo para o doente”.
Serão abrangidas mais de 7.000 pessoas para conseguir uma “amostra significativa e representativa dos doentes com insuficiência cardíaca em Portugal”.
O especialista disse que os investigadores pretendem ter o estudo concluído dentro de nove meses a um ano, mas lembrou que “a contingência pandémica” dá alguma incerteza sobre quando o estudo ficará concluído.
“É realmente uma síndroma que tem um impacto, não só a nível hospitalar, mas também para os doentes, que habitualmente têm mais idade, sobretudo tem impacto na sua qualidade de vida, com consequentes internamentos. É realmente importante saber exatamente o que se passa para podermos tratar melhor os doentes”, afirmou Rui Baptista.
Segundo disse, “os internamentos acabam por ser o fardo escondido da carga da doença. Não é só o facto de o doente estar internado. Um internamento significa que a doença progrediu ao ponto de levar o doente ao hospital”.
Cada internamento é sempre mais uma lesão num coração que já não é bom habitualmente e que nunca sai melhor do que quando entrou. O nosso objetivo é sempre manter o doente fora do hospital e evitar os internamentos”, concluiu.
A insuficiência cardíaca é a causa mais comum de internamento hospitalar acima dos 65 anos e a sua mortalidade pode chegar aos 50% ao fim de cinco anos. Estima-se que em Portugal possa afetar 400.000 pessoas, mas os últimos estudos foram desenvolvidos há mais de 20 anos.