Mais de 13 milhões de chilenos foram às urnas este domingo e os resultados conhecidos esta segunda-feira de manhã não deixam dúvidas: não querem uma nova Constituição. Ou, pelo menos, não da forma como o documento foi redigido ao longo do último ano pela Assembleia Constituinte. Do lado da aprovação contaram-se apenas 38% dos votos, enquanto 62% daqueles que decidiram votar rejeitaram a proposta de alteração.
No entanto, esta recusa não significa que os planos para alterar o texto redigido em plena ditadura, durante o governo de Pinochet, terminem aqui. Aliás, o Presidente chileno, Gabriel Boric, já convocou todos os partidos para uma reunião esta segunda-feira.
O povo chileno não ficou satisfeito com a proposta de Constituição e, por isso decidiu rejeitá-la claramente nas urnas. Enfrentar estes importantes desafios vai requerer ajustes imediatos nas nossas equipas de Governo para enfrentar este novo período com vigor renovado”, disse Boric, durante um discurso.
Los anhelos de cambio y dignidad exigen a nuestras instituciones y actores políticos que trabajemos con más empeño, diálogo, respeto y cariño, hasta arribar a una propuesta que nos interprete a todas y todos. Para allá vamos. Que viva la democracia y que viva Chile! pic.twitter.com/f5rQv2G5mJ
— Gabriel Boric Font (@GabrielBoric) September 5, 2022
A proposta de uma nova Constituição começou precisamente há um ano, na altura em que foi constituído um grupo de trabalho — composto pelo mesmo número de homens e mulheres — e na sequência de vários protestos violentos, que aconteceram em 2020. Nesse ano, o Chile realizou então um primeiro referendo para que os chilenos decidissem que queriam, ou não, alterar a Constituição. Apesar de apenas metade da população ter ido votar, 78% deu luz verde para avançar com as alterações.
Agora, perante um novo referendo, as atenções focam-se na razão pela qual os chilenos rejeitaram as alterações. Há então duas grandes questões a ter em conta. Primeiro, a figura de Boric, que defendeu desde o início as alterações à herança do governo de Pinochet. Este apoio resultou numa inevitável ligação entre a proposta de alteração e o atual governo de esquerda, eleito há cerca de seis meses e que enfrenta uma forte resistência dos partido da oposição — de direita e de centro-esquerda.
Depois, existem vários pontos no documento apresentado pela Assembleia Constituinte que não agradaram à maioria dos chilenos. “O Chile quer uma nova Constituição, mas uma em que todos estejamos incluídos”, disse uma mulher chilena ao El País, este domingo. Por exemplo, o texto sugere o reconhecimento de direitos aos povos indígenas, que são invisíveis para a atual Constituição — no total, o novo texto reconhece 11 povos. De acordo com o mesmo jornal, este ponto dividiu as opiniões, já que estaria previsto que os povos indígenas teriam total autonomia, incluindo na justiça. Ou seja, teriam as suas próprias leis.
O Chile é um estado social e democrático de direito. É plurinacional, intercultural, regional e ecológico”, lê-se no documento rejeitado este domingo.
De facto, a proposta apresentada não agradou aos chilenos, mesmo aos que apoiaram Boric nas eleições. E basta olhar para o mapa do Chile: o documento foi rejeitado em todas as 16 regiões do país.