“A boa notícia é que não vi nenhuma vítima mortal.” Constanza Pérez Haro é uma jornalista espanhola, atualmente em reportagem na Ucrânia. Tal como muitos outros colegas de profissão, de diferentes nacionalidades, a espanhola não encontrou quaisquer indícios dos 600 mortos que a Rússia alega ter feito durante o ataque a Kramatorsk. As imagens mostram a destruição no local e muitos escombros — embora os edifícios continuem de pé —, mas nada indica que as explosões tenham tirado a vida a alguém.

Apesar disso, esta segunda-feira, o Kremlin voltou a insistir na mensagem que passou no fim de semana. O ataque, retaliação à ofensiva ucraniana de Makiivka, fez 600 vítimas mortais entre os soldados ucranianos. No primeiro minuto de 2023 em Makiivka terão morrido centenas de soldados russos — 89 segundo Moscovo, 400 segundo Kiev.

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Dimitry Peskov garantiu ter “confiança absoluta” nos números oficiais. “Gostava de vos lembrar as palavras do Presidente: a principal fonte de informação é o Ministério da Defesa” russo, disse o porta-voz de Vladimir Putin.

600 mortos em Kramatorsk? Na Rússia, bloggers de guerra estão irritados com o Ministério da Defesa

Internamente, muitos milbloggers (bloggers de guerra) russos têm contestado os números apresentados por Moscovo e falam de “fraude”.

Vários jornalistas estiveram no local para reportar o sucedido. É o caso de um repórter do jornal La Repubblica. No Twitter, o jornalista italiano Daniele Reineri escreve que os mísseis não tocaram nos edifícios. “Estou a verificar o primeiro lugar, dormitório 28: o míssil errou o alvo, fez um grande buraco no terreno e não tocou nos prédios ao redor”, escreve.

Juntamente com as palavras, publica imagens do local.

Daniele Reineri visitou o segundo lugar apontado pelas autoridades russas e o resultado foi o mesmo. “A verificar o segundo lugar, o dormitório 47: o míssil russo errou o alvo, de novo. Há um buraco enorme na frente do prédio, mas o lugar está vazio. E isto é tudo de Kramatorsk”, conclui.

O finlandês Antti Kuronen, um dos primeiros repórteres a chegar ao local, mostrou no Twitter o mesmo que o colega italiano: imagens do edifício danificado, mas de pé. Vítimas não encontrou e escreve que as suas fontes ucranianas lhe garantiram não ter desenterrado mortos.

O correspondente da finlandesa Yleisradio escreveu ainda que falou com moradores e que ninguém viu ambulâncias ou vítimas no local.

A história dos jornalistas do Tg3, o telejornal da televisão italiana Rai Tre, é idêntica. Apesar de terem relatado a destruição da zona industrial, não fazem qualquer referência aos 600 cadáveres que, segundo Moscovo, teriam ficado nos escombros.

Numa segunda visita ao local, para tentar encontrar os vestígios da mortandade, nada encontraram. Os relatos das testemunhas são de que o local se encontrava vazio na altura do ataque — embora o Ministério de Defesa russo tenha avançado que se abrigavam no local cerca de 1.300 soldados.

As imagens dos repórteres da agência de notícias Reuters também chegaram às redes sociais. Tal como as restantes, não encontram sinais de vítimas mortais.

Quando, em abril do ano passado, as Forças Armadas russas atacaram Kramatorsk, as imagens da estação de comboio onde morreram mais de 50 pessoas, crianças incluídas, correram mundo. Nas imagens partilhadas nas redes sociais eram visíveis os corpos no chão, algo que agora não aconteceu.