Luís Montenegro avançou que Joaquim Pinto Moreira vai renunciar esta quinta-feira “à sua posição de vice-presidente do grupo parlamentar do PSD e como presidente da comissão de revisão constitucional”. “Fá-lo porque passadas 60 horas das diligências das autoridades judiciárias sem que se tivesse consumado o pedido de levantamento de imunidade parlamentar, não podemos ficar eternamente à espera.”

Em entrevista à SIC, Montenegro garantiu que tudo estava combinado com Pinto Moreira na terça-feira. De acordo com o líder social-democrata, dado o facto de não se perceber se o deputado era ou não arguido e que factos lhe são imputados o partido não podia esperar mais. “Não vamos escamotear a dimensão política [do caso]”, reconhece.

O presidente do PSD falou ainda dos contratos que a sociedade de advogados de que fazia parte assinou com as autarquias de Espinho (de que Pinto Moreira era autarca) e de Vagos, liderada por Silvério Regalado, membro da direção social-democrata — tema que foi recuperado esta semana apesar de já ter sido notícia em 2017 e em 2022.

“Acho ignóbil confundir a prestação de serviços jurídicos de uma sociedade de advogados com um processo de investigação judicial em curso cujo objeto não tem rigorosamente nada que ver com essa prestação de serviços. É maldoso, vergonhoso e leviano. Não faz parte do caso”, defendeu-se.

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“Não há nada do ponto de vista legal, moral e ético a apontar na prestação desses serviços. Esse assunto é requentado, foi alvo de uma apreciação parlamentar que concluiu que do ponto de vista legal e ético não tinha qualquer problema”, insistiu.

Montenegro reconheceu que a sociedade de advogados que detinha parte apenas prestou serviços a autarquias lideradas por sociais-democratas — e por duas figuras que lhe são próximas. “Naturalmente que a relação que se estabelece entre a prestação de serviços jurídicos, nomeadamente de contencioso, requer confiança. Mas a escolha não foi feita sequer por minha causa. Nem sequer era eu que acompanhava essas matérias”, notou.

Confrontado com a ligação entre a sociedade que detinha e o facto de ter chamado Pinto Moreira e Regalado para a sua direção (na bancada e no partido, respetivamente), Montenegro disparou: “Não aceito essa insinuação. Não admito mesmo. Essas pessoas têm qualidade política, por isso é que foram presidentes de Câmara. E quem escolheu Pinto Moreira para lista de deputados nem sequer fui eu”, recordou.

Desafiado a dizer se se sente “fragilizado” com este caso, Montenegro cortou a eito. “Não ponho a minha honorabilidade ou os meus critérios éticos em causa. No dia em que o fizer, deixei de ser um ator político. Estou disponível para que se investigue de todas as formas que quiserem estes contratos. Estou absolutamente à-vontade.”

Esta é a primeira vez que o líder social-democrata se pronuncia sobre esta questão. A última vez que Montenegro falou em público antes desta entrevista foi no sábado, 7 de janeiro, durante a apresentação dos novos membros do Conselho Estratégico Nacional (CEN) do PSD.

Recorde-se que Luís Montenegro e Joaquim Pinto Moreira são muito próximos. Além de naturais de Espinho, os dois têm um percurso político comum, como recordava aqui o Observador. Duas vezes candidato (derrotado) à Câmara de Espinho, Montenegro alcançou finalmente o objetivo de derrotar os socialistas em 2009, depois de ter ajudado a construir a campanha de Pinto Moreira — nessas autárquicas, o agora líder social-democrata foi eleito presidente da Assembleia Municipal de Espinho.

Operação Vórtex. Montenegro pressionado a afastar o amigo Joaquim

Mecanismo do Governo foi um ato de “inconseguimento”

Na mesma entrevista à SIC, conduzida pelo jornalista Bernardo Ferrão, Montenegro pronunciou-se também sobre o mecanismo de escrutínio encontrado pelo Governo. Citando Assunção Esteves, antiga presidente da Assembleia da República, o líder social-democrata criticou António Costa.

“Foi um ato de verdadeiro inconseguimento. Aquilo que o Governo veio dizer são coisas óbvias, redundantes. São níveis de interação com as pessoas que escolhem que são normais. É uma tentativa falhada do primeiro-ministro de se desresponsabilizar”, atirou. “Lembrou-se num repente de criar um mecanismo. E quis responsabilizar diretamente o Presidente da República pelas escolhas.”

“António Costa tem a responsabilidade sobre os ministros e sobre os secretários de Estado”, continuou. “O primeiro-ministro é que responde por todos. Nós, responsáveis partidários, temos de ser cada vez mais criteriosos nas nossas escolhas”, disse Montenegro, revelando que o partido está a criar uma comissão ética para avaliar escolhas que o partido vai fazendo para vários cargos.

Montenegro e abstenção na censura. “O que as pessoas querem dos políticos não são eleições”

Ainda antes de falar sobre a posição do PSD na votação sobre a moção de censura ao Governo socialista, Montenegro foi ainda questionado sobre uma alegada divisão no grupo parlamentar do partido sobre o sentido de voto do PSD nesta questão. Irritado, Montenegro garantiu que não existia qualquer tensão com os deputados.

“Do PSD, não vi nenhuma pronúncia de ninguém. Vi uma notícia do jornal Expresso que dizia que maioria da bancada estava contra decisão de Luís Montenegro. Fui ao grupo parlamentar, estive olhos nos olhos, aqueles que intervieram concordaram com a minha decisão e aqueles que não intervieram não a colocaram em causa. E um órgão de comunicação social disse ‘a maioria dos deputados está contra’. Com base em quê?!”, insurgiu-se.

Montenegro explicou depois o porquê de se ter abstido na censura a Costa. “É preciso que haja questões de governabilidade irreparáveis e tem de haver interesse no país para que haja eleições. Estamos hoje sob uma pressão elevadíssima que impende sobre a vida das pessoas, famílias, empresas e instituições. O que as pessoas querem dos políticos não são eleições”, começou por dizer.

“Não ando aqui a brincar a moções. Estou a preparar o PSD para que tenhamos em Portugal um ciclo virtuoso de crescimento”, atirou.

Sobre se a sua reserva em ir a votos nesta altura está relacionada com as sondagens pouco animadoras, Montenegro disparou: “A tendência das sondagens, a mim, satisfaz-me. O PSD vem a subir consistentemente, gradualmente e um pouco de cada vez. Mas eu não estou a governar o PSD para as sondagens. Só quero ganhar uma sondagem: a do dia das eleições. Seja lá quando forem”.

Sobre cenários futuros, Montenegro disse que preferia ir a votos contra António Costa em futuras legislativas. Mas acrescentou: “Vou a votos com qualquer um. Com Pedro Nuno Santos, com Fernando Medina, com Mariana Vieira da Silva, com Ana Catarina Mendes. Mas preferia ir a votos com António Costa. O país ainda não o responsabilizou politicamente”.

Tabu sobre Chega mantém-se até às legislativas. “Falamos nessa altura”

Montenegro foi também confrontado com possíveis alianças com o Chega, mas nunca respondeu concretamente às várias questões. “Linhas vermelhas com o Chega ficam em casa, ficam no bolso… Não ficam na minha preocupação. Estou focado em fazer a oposição ao PS. O Chega não é minha preocupação. Ponto final, parágrafo. Faz pela vida e eu faço pela minha. Eu quero ganhar os eleitores que votaram neles, isso quero”, disse. Perante a insistência, e desafiado a revelar o que fará depois das eleições legislativas, o presidente do PSD cortou. “Falamos nessa altura.”

Sobre uma possível derrota nas europeias de 2024, e sobre como isso pode significar o surgimento de um adversário nas eleições internas marcadas para esse ano, Montenegro deixou todos os cenários em aberto: sair pelo próprio pé ou recandidatar-se. Mas garantiu: não tem medo de ninguém.

“Logo se vê qual é a dimensão do resultado. Quero ganhar as europeias e estou convicto que vou conseguir. Se o resultado for tão mau assim, até posso ser eu a decidir não continuar. Não tenho sombras. Vivo muito bem com as minhas responsabilidades. Se não tiver a vitória, tenho de analisar o contexto do nosso resultado. Se chegar à conclusão de que não há condições para continuar.”

Uma das figuras apontadas com insistência a uma eventual disputa interna nessas eleições de 2024, num cenário em que o resultado do PSD fique aquém das expectativas nas europeias, é Carlos Moedas, que nessa altura estará a cerca de um ano das eleições autárquicas de 2025. Nesta entrevista à SIC, Montenegro não fugiu à questão e disse estar convicto de que Moedas será recandidato a Lisboa.

“Carlos Moedas? Temos uma relação muito boa. Quando acabar este mandato de dois anos, disputarei eleições com quiser avançar. Não tenho nenhum temor de disputar eleições. Já ganhei e perdi muitas vezes. Tenho a expectativa de que vai continuar a ser um excelente presidente da Câmara de Lisboa e que vai dar uma maioria absoluta ao PSD em 2025. Se houver alguma alteração, ela terá de ser gerida na altura.”

“Passos em Belém? Tem condições para isso e muito mais”

O presidente do PSD foi também desafiado a dizer se gostaria de ter Pedro Passos Coelho como candidato apoiado pelo partido às próximas eleições presidenciais. Desdobrando-se em elogios ao antigo primeiro-ministro, Montenegro disse que que Passos tem “condições para isso e muito mais”.

“Tem uma qualificação quase única no país que o habilita a ser quase tudo o que se pode ser numa sociedade. Ele escolherá aquilo que for melhor e aquilo que corresponder às suas expectativas“, notou.

Já sobre a eventualidade de Passos regressar para disputar as eleições internas no PSD, Montenegro atirou o cenário para canto. “Essa questão não se coloca, não sou capaz de colaborar nesse tipo de exercício mental, académico ou abstrato.”

O social-democrata abordou ainda a gestão que os socialistas têm feito da TAP, revertendo uma privatização, nacionalizando a companhia aérea e agora admitindo a privatização total da empresa. À boleia disso, o líder social-democrata voltou a dizer o “caso da TAP é um crime político e financeiro”.

O presidente do PSD ainda acrescentou: “A administração da TAP não tem condições para continuar. Mas também acho que Fernando Medina está diminuído politicamente”.