A organização não-governamental (ONG) Human Rights Watch (HRW) apelou esta terça-feira ao fim das restrições à liberdade de circulação das mulheres e das regras de tutela masculina que dificultam as deslocações no Médio Oriente e no Norte de África.

A conclusão está contida num relatório, de 119 páginas, que refere que, embora os ativistas dos direitos das mulheres tenham conseguido assegurar uma maior liberdade em muitos países da região, antigas e novas restrições exigem que as mulheres ainda peçam autorização ao seu tutor masculino — normalmente o pai, irmão ou marido — para se deslocarem no seu país, obterem um passaporte ou viajarem para o estrangeiro.

“Muitos países do Médio Oriente e do Norte de África continuam a impedir as mulheres de circularem livremente no seu próprio país ou de viajarem para o estrangeiro sem a autorização de um tutor masculino. As mulheres da região lutam contra regras que as autoridades alegam ser para sua proteção, mas que as privam dos seus direitos e permitem que os homens as controlem e abusem delas à vontade”, lê-se no relatório, enviado à agência Lusa.

“Todas as autoridades do Médio Oriente e do Norte de África devem eliminar todas e quaisquer restrições discriminatórias à liberdade de circulação das mulheres, incluindo todas as regras de tutela masculina”, exige o HRW, com sede em Nova Iorque.

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O relatório baseia-se numa análise comparativa de dezenas de leis, regulamentos e políticas, bem como em informações fornecidas por advogados, ativistas e mulheres em 20 países do Médio Oriente e do Norte de África, embora saliente que as políticas de tutela masculina também existem fora desta região.

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Quinze países da região ainda aplicam leis relativas ao estatuto pessoal ou à família que exigem que as mulheres “obedeçam” aos seus maridos, vivam com eles ou peçam a sua autorização para sair da casa conjugal, trabalhar ou viajar. Os tribunais podem ordenar às mulheres que regressem à casa conjugal ou que percam o direito à pensão de alimentos.

Em alguns países, estas regras “estão a ficar mais enraizadas”, sublinha o HRW, lembrando que, em março de 2022, a Arábia Saudita emitiu a sua primeira Lei do Estatuto Pessoal escrita, que codificou a prática de longa data de exigir que as mulheres obedeçam ao marido “de forma razoável” ou percam o apoio financeiro dos maridos se se recusarem a viver no domicílio conjugal “sem uma desculpa legítima”.

Na Jordânia, Kuwait, Qatar e Arábia Saudita, as mulheres podem ser presas, detidas ou obrigadas a regressar a casa se os seus tutores informarem que elas estão “ausentes” de casa. Na Arábia Saudita e no Iémen, as mulheres ainda não estão autorizadas a sair da prisão sem a aprovação de um tutor masculino.

Nos países em conflito, alguns grupos armados impuseram restrições à tutela em áreas sob o seu controlo e, nas partes da Síria sob o controlo de alguns grupos armados, as mulheres têm de ser acompanhadas por um mahram (marido ou outro familiar masculino próximo).

As autoridades Huthi que controlam partes do Iémen têm exigido cada vez mais que as mulheres viajem com um mahram ou que apresentem a aprovação escrita do seu tutor masculino, regras que obrigaram muitas funcionárias iemenitas de organizações não-governamentais e de agências das Nações Unidas a abandonar os seus empregos, perdendo o tão necessário rendimento para as suas famílias.

A HRW refere que, no Irão, as mulheres continuam a luta de décadas contra o hijab obrigatório, na base dos protestos nacionais “mulheres, vida, liberdade” que eclodiram após a morte sob custódia policial de Mahsa Amini, em setembro de 2022.

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Algumas universidades públicas, nomeadamente na Arábia Saudita, Bahrein, Irão, Kuwait, Omã, Qatar e Emirados Árabes Unidos, exigem que as mulheres mostrem que têm autorização de um tutor masculino antes de poderem participar em visitas de estudo ou permanecer ou sair dos alojamentos ou terrenos do campus.

Nalguns países, as mulheres podem também ser discriminadas quando tentam alugar apartamentos ou ficar em hotéis se não forem casadas ou não tiverem autorização de um tutor masculino.

Segundo a ONG, um avanço positivo é o facto de a maioria dos governos da região permitir agora que as mulheres obtenham passaportes e viajem para o estrangeiro sem necessitarem da autorização de um tutor.