Foi o próprio secretário-geral das Nações Unidas quem anunciou ter enviado uma carta às autoridades russas. António Guterres revelou ter partilhado “um conjunto de propostas concretas” ao ministro dos Negócios Estrangeiros russo para tentar restaurar o Acordo de Cereais do Mar Negro, bloqueado pela Rússia em julho. Agora, o jornal alemão Bild (conteúdo fechado) revela o que Guterres propõe nessa carta: deixar cair sanções, ou encontrar formas habilidosas de contorná-las.
A missiva enviada a Sergei Lavrov a 28 de agosto assenta em quatro pilares, segundo o Bild: contornar as sanções relativas ao SWIFT, criar seguros para navios russos que sejam atacados pelas forças ucranianas, recuperar ativos congelados devido às sanções e, por último, acesso dos navios russos aos portos da UE para comércio agrícola.
O Governo ucraniano reagiu à notícia — que ainda não mereceu nenhum comentário das Nações Unidas — e criticou o levantamento de parte das sanções internacionais. “Debilitar parte do regime de sanções contra a Federação Russa em troca do restabelecimento do acordo dos cereais seria um triunfo da chantagem alimentar russa e um convite a novas vagas de chantagens por parte de Moscovo”, escreveu o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Oleg Nikolenko, nas redes sociais.
O Acordo dos Cereais surgiu para tentar combater a crise alimentar global, intensificada com a guerra da Rússia e Ucrânia, ambas importantes exportadoras de cereais.
Contornar a bomba atómica. O regresso do Swift
Foi chamada de a “bomba atómica” das sanções financeiras contra a economia russa e passava por impedir alguns bancos russos de usarem o Swift — o principal sistema de comunicação de transações bancárias que garante segurança e rapidez no processamento destas operações entre as partes envolvidas. Há alternativas, mas não tão rápidas ou seguras.
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Segundo o Bild, a solução proposta por António Guterres é usar uma subsidiária (especialmente fundada para o efeito) de um banco russo sancionado. Esta forneceria serviços técnicos para transações de pagamento sem desempenhar o papel de banco. Deste modo, ao abrigo da lei luxemburguesa, não precisaria de uma licença bancária.
A sanção “nuclear”. O que é o SWIFT e que consequências teria um bloqueio à Rússia?
Contactada a Comissão Europeia, a resposta obtida foi de abertura para este plano: “A UE manifestou à Rússia, através da ONU, a sua abertura para procurar uma solução mais permanente e construtiva através da subsidiária designada do Rússia Banco Agrícola, que permite pagamentos Swift de acordo com as sanções da UE sobre transações agrícolas.”
“Estamos cientes de discussões de alto nível que decorrem atualmente em torno do Acordo de Cereais do Mar Negro e estamos a acompanhar de perto os desenvolvimentos”, respondeu à Bild, por seu lado, o fornecedor dos serviços Swift.
Seguros contra ataques ucranianos e fundos congelados devolvidos
Outra das propostas do secretário-geral das Nações Unidas, segundo o jornal alemão, passa por segurar navios russos contra ataques dos militares ucranianos. “Uma companhia de seguros financiada pela ONU para as exportações russas de alimentos e fertilizantes estaria a trabalhar com o Lloyd’s dentro de 4 a 6 semanas”, propõe Guterres.
A seguradora naval britânica Lloyd’s não quis comentar a notícia, escreve o Bild.
Outro ponto, passa por devolver à Rússia os fundos congelados pelas sanções a empresas russas de fertilizantes, que deveriam solicitar às autoridades nacionais relevantes da UE as isenções apropriadas. A ONU dispõe-se a trabalhar com a UE para dar resposta a estes pedidos.
Por último, seria dada permissão a navios russos que transportem alimentos e fertilizantes para atracarem em portos da União Europeia, através de licenças portuárias aceleradas.
“As Nações Unidas estão prontas para explorar outras opções para facilitar o acesso dos navios russos aos portos da UE para o comércio agrícola, incluindo procedimentos simplificados para a emissão de licenças relevantes, especialmente antes da partida para os portos russos”, escreve Guterres na carta. Segundo o Bild, o secretário-geral da ONU já terá mantido contactos com vários países para garantir esta possibilidade.