Quando se tornou oficial que Jim Ratcliffe, o dono da Ineos, tinha mesmo adquirido 25% do Manchester United ficou claro que o investimento do bilionário britânico iria para lá da simples contratação de jogadores. Depressa se falou na renovação de Old Trafford, na melhoria de infraestruturas, na mudança de peças na pirâmide administrativa e institucional — e nem foi preciso esperar um mês para perceber que esse caminho já está a ser feito.

Durante o fim de semana, o Manchester United anunciou a chegada de um novo CEO: Omar Berrada, até aqui braço direito de Txiki Begiristain no futebol do Manchester City e antigo Diretor Comercial e Diretor de Operações dos citizens. Ou seja, os red devils olharam para um executivo de topo de um dos principais rivais e decidiram renovar a forma como o clube é gerido e organizado. De recordar que o anterior CEO, Richard Arnold, decidiu afastar-se em novembro, com o cargo a ser ocupado de forma interina por Patrick Stewart desde então.

“Como um dos executivos com mais experiência no topo do futebol europeu, Omar traz uma enorme riqueza ao nível de expertise de futebol e departamento comercial, com um registo comprovado de liderança bem sucedida e uma paixão para nos ajudar a liderar a mudança no clube. É atualmente Chief Football Operations Officer no City Football Group, supervisionando 11 clubes em cinco continentes”, pode ler-se no comunicado dos ingleses, onde é sublinhada a “ambição de restabelecer o Manchester United como um clube vencedor de títulos”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Filho de pais marroquinos, Omar Berrada nasceu em Paris e cresceu nos Estados Unidos, mudando-se para Barcelona aos 18 anos e depois de desistir da universidade. “A minha primeira experiência universitária foi nos Estados Unidos, mas só durou seis meses. Ia licenciar-me em Engenharia no Massachussets, mas decidi que aquilo não era para mim e a meio do ano letivo, em dezembro, decidi sair e mudar de país. Tudo o que sabia era que queria ir para a Europa”, contou numa entrevista de 2021 com a EU Business School, onde acabou por terminar a formação em Gestão de Empresas.

Engenheiro, com presença no ciclismo e com tudo para decidir sobre Old Trafford: Jim Ratcliffe, o bilionário que comprou 25% do United

Adepto do Barcelona desde criança, o objetivo de Omar Berrada sempre foi construir um caminho profissional que lhe permitisse trabalhar no futebol, no geral, e nos catalães, em particular. Começou por entrar na Tiscali, uma empresa de telecomunicações onde acabou por conhecer a futura mulher, e teve a oportunidade de uma vida quando o CEO foi contratado pelo Barcelona para o Departamento de Marketing. Omar Berrada acompanhou o chefe na mudança e já chegou a dizer, em formato de brincadeira, que teria ido “de borla”.

Começou a aprender catalão no segundo dia no clube — uma das quatro línguas em que agora é fluente, em conjunto com espanhol, inglês e francês — e cruzou-se pela primeira vez com Pep Guardiola, Ferran Soriano e Txiki Begiristain. Ainda assim, e mesmo tendo chegado a Diretor de Patrocínios do Barcelona, a ligação próxima com a tríade que ganhou tudo nos catalães e que repetiu o sucesso no Manchester City só iria materializar-se na Premier League.

Na verdade, Omar Berrada foi o primeiro de todos a chegar ao Manchester City, ainda em 2011 e quando o clube estava no início da autêntica revolução que o levou a conquistar tudo em pouco mais de uma década. “Queria muito trabalhar na Premier League e a proposta foi muito atraente. Ainda não sei como é que consegui convencer a minha mulher a trocar o tempo de Barcelona pelo tempo de Inglaterra. Mas consegui, de alguma maneira”, revelou.

GettyImages-1074367084

O executivo foi o representante do Manchester City nas homenagens a Vichai Srivaddhanaprabha, dono do Leicester que morreu num acidente de helicóptero

Começou por liderar o Departamento de Assuntos Internacionais do clube, acabando promovido a Diretor Comercial ao fim de um ano e subindo a Diretor de Operações quando Guardiola, Soriano e Begiristain já estavam todos em Inglaterra. Com o passar do tempo, foi sendo visto como um autêntico braço direito de Soriano e Begiristain, CEO e Diretor para o Futebol, e depressa assumiu funções mais específicas no futebol do Manchester City — e nas negociações de contratações, de forma mais clara.

Estreou-se na contratação de Aymeric Laporte ao Athl. Bilbao em 2018 e foi um dos principais responsáveis pelo sucesso da operação de charme que garantiu a transferência de Erling Haaland. “Um jogador como ele poderia ter escolhido qualquer equipa. O que quisemos fazer foi entender o que o motivava. Quando percebemos que tínhamos de o reduzir à sua essência, percebemos que queria um projeto de futebol. E passámos muito tempo a explicar-lhe o nosso projeto. Quando trabalhas no mercado de transferências estás a lidar com pessoas, que têm sonhos, medos e influências à sua volta. Tens de perceber com quem é que estás a falar”, explicou numa entrevista à Sky.

De acordo com o The Athletic, Omar Berrada foi abordado por várias equipas da NFL nos últimos anos, mas preferiu sempre ficar no futebol e a nível interno era visto como o sucessor natural de Ferran Soriano enquanto CEO do Manchester City. Ao fim de mais de 10 anos nos citizens, escolheu voltar a sair da zona de conforto e agarrar no projeto do Manchester United — seguindo uma linha natural para alguém que mudou de continente aos 18 anos, que subiu a pulso no Barcelona e que foi parte crucial de um dos projetos desportivos mais bem sucedidos do século XXI.