A EDP voltou a suspender o pagamento da contribuição extraordinária sobre o setor energético (CESE) e regressou aos tribunais para contestar a constitucionalidade e legalidade desta contribuição cuja receita tem servido para travar a subida dos preços da eletricidade.
A CESE é uma taxa sobre o valor dos ativos que foi criada, a título temporário, pelo Governo de Passos Coelho, e tem sido renovada anualmente pelos socialistas, com grande contestação por parte de empresas como a Galp e a REN. A EDP começou por pagar mas, perante a renovação anual da CESE, suspendeu o seu pagamento em 2018.
Mas, entretanto, a elétrica que então era ainda liderada por António Mexia negociou um acordo com o governo do PS para retomar o pagamento da CESE com base em dois pressupostos. O primeiro era a transferência da receita desta contribuição por parte do Estado para baixar os custos e a dívida do setor elétrico, o que foi cumprido. O segundo era a redução gradual do valor cobrado, acompanhando a diminuição da dívida tarifária, o que ficou por cumprir.
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Já em 2020, e no quadro da pandemia, a EDP anunciou a intenção de deixar cair os processos de impugnação do pagamento desta contribuição que atingiam à data 388 milhões de euros.
A elétrica liderada por Miguel Stilwell de Andrade revela agora no seu relatório e contas de 2023 a “decisão de não pagamento da CESE cuja constitucionalidade está a ser legalmente contestada pelo grupo EDP”. A elétrica sinaliza que à data pagou 558 milhões de euros de CESE e que registou um custo de 49,4 milhões de euros nas contas deste ano, “tendo optado por não efetuar o respetivo pagamento”. Questionada pelo Observador sobre o enquadramento jurídico desta constatação, fonte oficial indicou não ter nada a acrescentar face ao descrito no relatório.
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A EDP é a maior contribuinte da CESE — em 2022 pagou 51,5 milhões de euros — taxa que também é paga pela REN e cobrada à Galp (esta última nunca pagou e mantém um braço-de-ferro com o fisco de muitas centenas de milhões de euros).
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EDP paga mais impostos em Espanha do que em qualquer outro país (incluindo Portugal)
Na sequência da suspensão da CESE, o pagamento de impostos ligados ao setor energético em Portugal por parte da EDP caiu face a 2022 e foi ultrapassado pelos montantes cobrados em Espanha onde o grupo teve de pagar 48 milhões de euros por causa da introdução do novo imposto sobre lucros extraordinários sobre as empresas de eletricidade.
Espanha foi pioneira na aplicação deste imposto sobre os lucros caídos do céu que ambicionava ir buscar receita a setores que foram beneficiados pelos preços altos e pela inflação. Mais tarde, a União Europeia aprovou uma taxa a ser adotada por todos os países durante dois anos, mas o governo optou por deixar o setor elétrico de fora. O imposto foi apenas cobrado à Galp e ao setor da distribuição alimentar.
A EDP reconhece a necessidade de medidas extraordinárias face a situações de emergência — a crise energética resultou num disparo muito mais acentuado dos preços em Espanha do que em Portugal – mas considera que a taxação do imposto extraordinário não deve prejudicar produtores que não beneficiaram dos preços altos porque fizeram cobertura das duas receitas para conter a volatilidade do mercado. Nessa medida diz que tomará as “diligências necessárias, recorrendo aos meios legais ao seu alcance com vista a contestar a legalidade destas medidas”.
Segundo as contas à contribuição fiscal por país, Espanha passou a ser o país em que a empresa suporta maior nível de tributação energética. E ultrapassou Portugal na cobrança de impostos ao grupo EDP totalizando em 2023 mais de 216 milhões de euros no ano passado.
Em Portugal, a EDP pagou cerca de 100 milhões de euros. Olhando para cada rubrica, verifica-se que a elétrica pagou mais impostos do lado de lá da fronteira em todas as categorias. Nos lucros: 88,2 milhões em Espanha e 74 milhões em Portugal; nos tributos sobre o setor da energia: 116 milhões de euros em Espanha e 22 milhões de euros em Portugal; e até sobre o património — 11,5 milhões de euros em Espanha e 1,3 milhões em Portugal.
A conta só fica mais pesada para Portugal quando se inclui a fatia da Segurança Social — 78,2 milhões de euros versus 35,6 milhões de euros. Os cálculos feitos pela própria EDP apontam para o pagamento de 180 milhões de euros em impostos e contribuições em Portugal, e para 258 milhões em Espanha.
No total, em todas as geografias, o grupo EDP pagou cerca de 900 milhões de euros em impostos e contribuições sociais, sendo Espanha o país onde esses encargos foram mais elevados, seguida do Brasil e de Portugal.
A elétrica indica que os impostos setoriais pagos no nosso país caíram muito no ano passado por causa da decisão de suspender a liquidação da CESE, mas também porque os encargos da tarifa social (cujo modelo de distribuição foi revisto) só vão ser cobrados este ano.
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