Cerca de meia centena de entidades da Cultura, entre associações, editores e livreiros, escreveram às ministras da Justiça e da Administração Interna a pedir “medidas urgentes para impedir a continuação” de ataques da extrema-direita a autores e bibliotecários.
Através da carta “Pela liberdade de escrever, de publicar, de ler”, a que a agência Lusa teve acesso, manifestam preocupação e indignação por “ataques de elementos da Habeas Corpus e do partido de extrema-direita Ergue-te a escritoras de livros infantojuvenis e a bibliotecários, à leitura tranquila numa biblioteca pública e a apresentações de livros e debates”, e foi enviada esta segunda-feira às ministras da Administração Interna, Margarida Blasco, e da Justiça, Rita Alarcão Júdice, com conhecimento da ministra da Cultura, Dalila Rodrigues.
Assinada por entidades como a Associação Portuguesa de Bibliotecários, Arquivistas, Profissionais da Informação e Documentação (BAD), a Acesso Cultura e a Rede de Livrarias Independentes (RELI), a carta foi igualmente subscrita por editoras como o Grupo LeYa, a Penguin Random House, a Kalandraka, Orfeu Negro e a Planeta Tangerina, assim como por editores, livreiros e outros responsáveis de entidades do setor, em nome individual, num total que neste momento supera os 50 signatários.
Os subscritores pedem à ministra da Administração Interna que tome “medidas urgentes para impedir a continuação destes incidentes graves e para garantir a segurança e a liberdade de qualquer cidadã(o)”, instando o Ministério da Justiça “a agir com urgência em relação às queixas apresentadas”.
As entidades subscritoras recordam que, “além dos ataques verbais, num intento claro de boicote aos livros, às suas autoras e ao seu público”, os elementos de extrema-direita “têm invadido e desrespeitado a privacidade das autoras”.
Procurando criar um clima de medo e insegurança, intimidam com berros e insultos, calúnias e mentiras”, acrescentam.
“O discurso de ódio, violento e discriminatório, proferido por estas organizações, é público e conhecido das autoridades. Muitos destes ataques e ameaças são feitos publicamente, gravados pelos próprios e, depois, orgulhosamente partilhados nas redes sociais”.
As diferentes entidades afirmam ainda que, como “agentes culturais e agentes educativos”, têm “o dever de defender” a “efetivação dos direitos sociais e culturais” consagrados na Constituição da República Portuguesa, nomeadamente a liberdade de expressão e de pensamento, de se informar e de ser informado, “sem impedimentos nem discriminações”.
Recordam ainda que, de acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, estes direitos “não podem ser impedidos ou limitados por qualquer tipo ou forma de censura”.
Os subscritores recomendam ainda a “livrarias, bibliotecas, feiras de livros e outras entidades organizadoras de eventos públicos” que, além de tomarem “medidas de precaução”, devem também “apresentar queixa às autoridades sempre que o seu espaço for invadido e a liberdade, segurança e conforto dos seus clientes e utilizadores forem postos em causa”.
Apelam ainda aos cidadãos “para que se mantenham informados e atuantes”.
Não podemos deixar que a censura, a perseguição e a intimidação voltem a fazer sombra sobre livros, autores e leitores”, escrevem.
E concluem citando o arcebispo sul-africano Desmond Tutu, Nobel da Paz em 1984 pela luta contra o apartheid: “Se ficarmos neutros perante uma injustiça, escolhemos o lado do opressor”.
No site da Acesso Cultura, a subscrição da carta extravasa já a área da Cultura, com profissionais de áreas do ensino, da saúde, dos transportes, do imobiliário, da indústria, da tecnologia, a juntarem-se a escritores, tradutores, artistas visuais, coreógrafos, bailarinos, encenadores, em defesa da “liberdade de escrever, de publicar, de ler”.