Enviado especial do Observador em Paris, França

A prova perfeita, o contexto perfeito, a cidade perfeita. Mesmo tendo apenas 23 anos, Lamecha Girma tem vários capítulos de vida para contar incluindo o facto de ter feito todo o trabalho de crescimento no atletismo, em específico no meio fundo, com o técnico Kefyalew Alemu que, no seguimento da viagem para os EUA para os Mundiais de Oregon em 2022, não mais voltou à Etiópia. Ainda assim, um verdadeiro protocolo familiar acabou por espantar os fantasmas de que tudo tinha acabado e o atleta deu mesmo o passo em frente.

Há pouco mais de um ano, em Paris, Girma mostrou que a falta da grande referência podia ser contornada com outro tipo de treino e trabalho orientados pelo irmão mais velho, Fikadu, tendo ainda mais dois irmãos mais novos, Diriba e Kuma, como parceiros (no total são dez, oito rapazes e duas raparigas, filhos de pais agricultores que continuam a viver na mesma zona, Bekoji). Assim, e um pouco contra aquilo que se poderia esperar, o etíope estabeleceu uma nova marca mundial dos 3.000 metros obstáculos com o tempo de 7.52,11. Agora regressava à capital francesa com um último objetivo ainda por alcançar na carreira.

Não faltam medalhas ao currículo de Lamecha Girma. Foi prata nos Mundiais de Doha-2019, foi prata nos Jogos de Tóquio-2020, foi prata nos Mundiais de Pista Coberta de Belgrado-2022, foi prata nos Mundiais de Oregon-2022 (quando o treinador não fez depois a mesma viagem de regresso), foi prata nos Mundiais de Budapeste-2023. O etíope até podia ser o detentor da melhor marca de sempre mas continuava a falhar a primeira grande vitória internacional da carreira. Agora, o contexto não poderia ser melhor a isso.

A correr no local onde bateu o melhor registo mundial, a ter pela frente uma corrida rápida como também mais desejava, Girma foi-se mantendo no grupo da frente até ao penúltimo obstáculo. No final, todos foram olhando apenas para o sprint final na reta, que terminou com o triunfo do marroquino Soufiane El Bakkali à frente do norte-americano Kenneth Rooks e do queniano Abraham Kibiwot. O etíope, esse, ainda estava deitado do outro lado da pista após uma queda sofrida a pouco mais de 200 metros. E o caso gerou grande preocupação entre todos aqueles que foram acompanhando o drama que se foi vivendo.

Só mais tarde com ajuda da realização foi possível perceber que não só o atleta tinha tropeçado com a perna esquerda no penúltimo obstáculo como batera com a cabeça e as costa no chão com bastante violência no meio de toda a confusão com os restantes atletas a tentarem passar sem tocarem no etíope nem estragarem a sua prova. Girma não se mexia, viu-se que estava a ter convulsões e soube-se mesmo depois que perdeu os sentidos na pista, só os recuperando depois, o que fez soar alarmes nos dois primeiros elementos da organização que se foram aproximando de Girma chamando logo ajuda. Esse auxílio não demorou a chegar sem que se percebesse ao certo o que tinha acontecido com o recordista mundial, que abandonou o Stade de France de maca, com a zona do pescoço protegida na maca pelos socorristas. Já no posto médico do estádio, conta o L’Equipe, conseguiu dizer algumas palavras.

Estabilizado, foi levado para o hospital onde está a realizar exames mais detalhados.

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