Jéssica Inchude chegou aos Jogos Olímpicos assumindo que é a sua melhor fase de sempre, mas que ainda estava “com uns toques” devido às lesões no início da época. Em julho, antes de partir para Paris, ao nível “mais forte de sempre”, prometia “fazer alguma surpresa”. A surpresa seria passar à final. Esta quinta-feira, 8 de agosto, a final foi alcançada. Jéssica Inchude vai lançar na final o peso na próxima sexta-feira.
Nascida em Portugal, foi como atleta da Guiné Bissau que participou nos Jogos do Rio em 2016. Sem mínimos. Mas deixando-lhe uma “memória marcante”. Viu “as melhores das melhores” a competir. “Tirei muita experiência e dei o meu pulo”, salientou, num vídeo partilhado pelo Comité Olímpico Portugal.
Nos Jogos de Tóquio, realizados em 2021, não conseguiu mínimos para participar — “fiquei a um lugar de ir”. Teve de esperar três anos para voltar à experiência olímpica. Com a vontade E começou bem. Entrou “por mérito e com uma marca ao nível das atletas no topo”, salientou antes de partir para Paris onde esta quinta-feira. Dois lançamentos nulos, mas um, com 18,36 metros, garantiu-lhe o nono lugar e uma qualificação para as finais — o que não aconteceu com a outra atleta portuguesa Eliana Bandeira (que ficou em 15.º).
Para a final, Jéssica Inchude tem uma nova fasquia. Ficar nos oito primeiros lugares. E quem sabe bater o recorde pessoal. “Acho que consigo fazer”. Para isso tem de lançar o peso a mais de 19,10 metros, que é o seu melhor.
Nestas qualificações, não chegou aos 19 metros, mas só três atletas superaram essa distância: a canadiana Sarah Mitton (19,77), a neo-zelandesa Maddison-Lee Wesche (19,25) e a alemã Yemisi Ogunleye (19,24). Numa qualificação em que a grande surpresa foi a marca de Chase Jackson, que não conseguiu o apuramento para a final. Fica assim de fora a norte-americana, bicampeão mundial e uma das grandes favoritas, que terminou a sua participação nos Jogos na 17.ª posição, depois de dois lançamentos nulos e um outro de 17,6 metros.
Chade Jackson, quando chegou a Paris, partilhou, no seu Instagram, um vídeo a chorar porque o equipamento não lhe servia. E essa é uma história que esta quinta-feira tem sido partilhada. “Quando passas a tua primeira hora em Paris a chorar porque não te deram nada que te sirva”, escreveu nessa mensagem da rede social, suscitando várias reações de crítica para com o comité olímpico dos Estados Unidos, para mais tarde explicar que os seus equipamentos tinham chegado atrasados porque tinha havido um erro administrativo que registou o seu tamanho de forma errada.
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Com equipamento, falhou a final e também no Instagram disse que chorou bastante depois de não se ter conseguido marca para a final. “Deus tem um plano diferente para mim e eu tenho de aceitar”, dizendo que “sente que desapontou as pessoas” e espera que seja uma experiência. “É desporto e faz parte”.
Hulk na final. Quem é a atleta da máscara
Quem segue para a final com Jéssica Inchude são outras duas norte-americanas. Jaida Rossa e “Hulk” Raven Saunders, a atleta que deu nas vistas esta quinta-feira ao competir de máscara e de óculos de sol. Desde Tóquio que a máscara começou a ser imagem de marca. Nesses Jogos, a utilização das máscaras por causa da pandemia de Covid-19 era uma necessidade. Mas Saunders continuou. Como explicou ao Yahoo Sports, é um sinal de distanciamento em competição, durante a qual prefere estar sozinha do que a conversar com as outras lançadoras.
Raven Saunders foi “batizada” de Hulk no liceu — era afável fora do ringue mas feroz quando se tratava de lançar o peso. “No início, tal como Hulk, tive dificuldade em diferenciar os dois; tive dificuldade em controlar quando o Hulk aparecia ou quando o Hulk não aparecia”, disse ao Yahoo Sports “Mas ao longo da minha vida, especialmente lidando com a saúde mental e assim, aprendi como compartimentar, da mesma forma que Bruce Banner aprendeu a controlar o Hulk, aprendeu a deixar o Hulk sair nos momentos certos e dessa forma também lhe deu um sinal de paz mental. Mas quando o Hulk aparecia, estava determinado a destruir tudo o que precisava de ser destruído”.
Em Tóquio a máscara distinguiu-a, mas foi o gesto (de X) que fez com os braços quando subiu ao pódio para receber a prata que mereceu o olhar do mundo (e uma investigação do Comité Olímpico Internacional). O COI não aceita manifestações nos Jogos. E Saunders diz que o X significava “a encruzilhada na qual todas as pessoas oprimidas se encontram”. Uma voz mais alto pela comunidade negra, LGBTQ+ e quem luta contra problemas de saúde mental. Saunders não esconde os seus próprios problemas, tendo já admitido, mesmo, que pensou em matar-se.
Não foi penalizada, então, pelo COI, mas ficou mais tarde suspendida por 18 meses por ter falhado três testes de doping. Falhou os mundiais de 2023, mas a suspensão terminou em fevereiro deste ano, a tempo dos Jogos de Paris. Na sexta-feira vai tentar novamente o pódio. E questionada sobre o traje para esse momento, citada pelo The Guardian, respondeu: “Tenho algo ainda melhor”.