Mais de 10 anos após o início do processo, a Operação Marquês pode conhecer a data do arranque do julgamento já na próxima semana. A informação foi avançada pelo Expresso e confirmada ao Observador por fonte judicial, que revelou que o início das férias judiciais nos tribunais, previsto para a próxima segunda-feira, não impede a marcação da data para o julgamento.
O coletivo de juízes do Juízo Central Criminal de Lisboa que tem este processo a seu cargo, constituído pela juíza-presidente Susana Seca e pelas adjuntas Rita Seabra e Alexandra Pereira, ainda não pediu exclusividade para abordar o julgamento. No entanto, o Observador apurou que esse é um cenário dado como adquirido e a exclusividade deverá mesmo ser conferida pelo Conselho Superior da Magistratura (CSM), após parecer da Comarca de Lisboa.
José Sócrates será julgado por três mulheres. A juíza presidente chama-se Susana Seca
Em pouco mais de uma semana, o processo desceu à primeira instância, foi alvo de distribuição na última quarta-feira a um coletivo de juízes e está prestes a conhecer a data de arranque do julgamento, o que contrasta com a sucessão de recursos, reclamações e incidentes que marcaram os últimos anos do processo. Recorde-se que a acusação da Operação Marquês já foi conhecida em outubro de 2017 e a decisão instrutória foi proferida pelo então juiz de instrução Ivo Rosa em abril de 2021.
Assim, tal como o Observador avançou anteriormente, ganha força a perspetiva de arranque do julgamento até ao verão.
Julgamento de Sócrates deve começar até junho — no máximo, setembro. Algo o pode ainda adiar?
Uma vez conhecida a data do julgamento, as defesas dos arguidos (18 arguidos individuais e quatro arguidos coletivos) têm normalmente um prazo de 60 dias para apresentarem as respetivas contestações.
Contudo, face à complexidade e à dimensão dos autos, é possível que as defesas tentem prorrogar esse prazo e que o coletivo de juízes aceda a esse pedido, podendo conceder 90 ou mesmo 120 dias para essa situação — que foi o prazo que o juiz Ivo Rosa deu aos arguidos para apresentarem os seus requerimentos de abertura de instrução.
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Recurso do primo de José Sócrates no STJ (ainda) pode travar arranque do julgamento
O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) obrigou a Relação de Lisboa a admitir um recurso de José Paulo Pinto de Sousa, primo de José Sócrates. O juiz desembargador Francisco Henriques deu seguimento a essa imposição e atribuiu a subida com efeito meramente devolutivo, ou seja, sem parar a tramitação dos autos. Porém, o STJ pode não ter o mesmo entendimento.
Caso o conselheiro a quem seja destinado o recurso decida atribuir efeito suspensivo, então o processo tem de parar e o julgamento na primeira instância não pode avançar sem ser conhecida a decisão do STJ.
Operação Marquês. José Sócrates está apenas a um recurso do início do julgamento
O primo de José Sócrates está contestar a composição do coletivo da 9.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa que apreciou o recurso do Ministério Público sobre a não pronúncia decidida em abril de 2021 pelo juiz Ivo Rosa e decidiu dar razão a boa parte dos argumentos dos procuradores Rosário Teixeira e Vítor Pinto. Por isso mesmo pronunciou para julgamento José Sócrates, José Paulo Pinto de Sousa e os restantes 16 arguidos individuais e os quatro arguidos coletivos por um total de 118 crimes.
A questão é simples: o argumento da composição do coletivo que decidiu pronunciar os arguidos para julgamento já foi utilizado inúmeras vezes por Pedro Delille, advogado de José Sócrates. E sempre foi rejeitado por todos os tribunais superiores que apreciaram a questão.
Por três razões:
- As juízas desembargadoras Raquel Lima (relatora) e Madalena Caldeira foram designadas, em conjunto com Micaela Rodrigues, para decidirem o recurso do MP na Relação de Lisboa;
- Depois, as desembargadoras Raquel Lima e Madalena Caldeira candidataram-se, respetivamente, à Relação do Porto e de Guimarães e foram colocadas nestes dois tribunais superiores;
- Mas — e aqui está a questão fundamental — o Conselho Superior de Magistratura decidiu a 14 de julho de 2023 que as juízas Raquel Lima e Madalena Caldeira só começariam a trabalhar nos seus novos postos após terem concluído o trabalho na Operação Marquês. Daí que tenha determinado a exclusividade nesse processo e a retirada dos seus nomes das escalas da Relação do Porto e de Guimarães. O CSM é o órgão de gestão da magistratura judicial e tem competência para esta decisão.
O objetivo de João Costa Andrade, advogado de José Paulo Pinto de Sousa, é semelhante ao de Pedro Delille: alegar que o CSM desrespeitou a lei por não ter legitimidade para tomar a decisão que tomou. Assim, as duas desembargadoras estariam impedidas de tomar qualquer decisão na Relação de Lisboa, logo deviam ter-se declarado impedidas. Ao não o fazerem, tornaram o acórdão de pronúncia nulo.
Contudo, o advogado alega que José Paulo Pinto de Sousa tinha de ser notificado pessoalmente da decisão de pronúncia da Relação de Lisboa de 25 de janeiro e não foi. Logo, existe uma nulidade que tem de ser reconhecida, defende Costa Andrade. Em resumo, é isto que o STJ vai ter de apreciar, sendo certo que a questão da notificação pessoal esteve no centro da decisão do vice-presidente do STJ, o conselheiro Nuno Gonçalves, que determinou a admissão do recurso do primo de José Sócrates.
O antigo governante já veio reagir publicamente na última semana aos derradeiros desenvolvimentos do processo Operação Marquês e defendeu que “não pode haver julgamento nenhum”, recusando a existência de uma pronúncia na decisão da Relação de 25 de janeiro de 2024.
Ex-diretor dos Serviços Prisionais representa o MP no julgamento
O antigo diretor-geral da Reinserção e Serviços Prisionais Rómulo Mateus vai representar o Ministério Público (MP) no julgamento do processo Operação Marquês.
Magistrado de carreira, esteve no Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa, bem como no de Loures, e assumiu a liderança da DGRSP entre 2019 e 2022. No entanto, o Conselho Superior do Ministério Público entendeu não renovar então a comissão de serviço do procurador-geral-adjunto.