Para o presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, em Lisboa, a operação que a PSP levou a cabo no Martim Moniz na passada quinta-feira foi “completamente inaceitável” e focada numa “comunidade étnica”, sugerindo que esta força de segurança “parece” ter “motivações rácicas ou étnicas”. O governante local considera ainda que a ministra da Administração Interna não tem condições para continuar em funções. Em sentido contrário, o presidente da câmara de Lisboa, Carlos Moedas, destaca que é preciso haver mais polícia na cidade e considera que existe “perceção de insegurança” na capital.
“Aquilo que aconteceu ontem é típico de uma ditadura islâmica ou de uma ditadura da América Latina […]. Julgo, como cidadão e como autarca, que não há condições para a senhora ministra da Administração Interna [Margarida Blasco] continuar e os comandos da polícia têm de explicar porque é que fecharam uma rua inteira e encostaram pessoas à parede. Seriam capazes de fazer isto em Campo de Ourique, nas Avenidas Novas, no Lumiar?”, questionou.
Em declarações à agência Lusa, Miguel Coelho (PS) indicou que vai hoje à Rua do Benformoso, junto à praça do Martim Moniz, na freguesia que gere: “Alguém tem de pedir desculpa a estas pessoas e, já que não vai lá o senhor Presidente da República, vou lá eu.”
A forma como a operação foi realizada, acrescentou, “cria uma perceção de que a insegurança e o perigo estão numa comunidade”. “Isto vai fomentar o ódio e o racismo e não vai resolver nada. Foi um ‘show off’ inacreditável por parte dos comandos policiais”, sublinhou.
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Em declarações à Rádio Observador, Miguel Coelho alertou que esta foi uma “rusga que vai fomentar o ódio” e que foi “completamente ineficaz”. “Temos problemas na Mouraria relacionado com o tráfico de droga [mas] esta ação foi apenas para criar uma certa imagem errada de que, na rua do Benformoso, estão os criminosos todos, quando esta é uma comunidade pacífica e resiliente”, disse.
O presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior mostrou-se “profundamente indignado”, no contexto de um “Estado democrático de direito consolidado” e num território pelo qual é responsável, apontando que não tinha conhecimento de que estava planeada uma operação daquela envergadura.
“Não tinha conhecimento e porventura não tinha de ter. A polícia não fala com os autarcas de proximidade. Há um completo alheamento por parte da polícia e uma arrogância. Eu defendo uma polícia com autoridade e protegida por lei dos insultos e agressões, e que ganhe melhor. Tenho um profundo respeito pelo papel da polícia, mas quero uma polícia respeitadora da Constituição e que esteja expurgada de movimentos racistas“, referiu.
Questionado sobre como se pode combater o tráfico e consumo de droga, o presidente da Junta disse à Rádio Observador que a melhor forma é com “mais patrulhamento apeado, nos becos e escadinhas da freguesia, de noite, com agentes infiltrados, com investigação e prendendo as pessoas que estão a traficar e consumir. Mas a polícia escolhe vir de dia para ser acompanhada pelas televisões”. E rematou: “Se a PSP é capaz de fazer isto aqui sem razão aparente, quem está noutras zonas da cidade também corre este risco se a PSP não tiver motivações rácicas ou étnicas, que parece que tem.”
A operação policial de quinta-feira no Martim Moniz resultou na detenção de duas pessoas e na apreensão de quase 4.000 euros em dinheiro, bastões, documentos, uma arma branca, um telemóvel e uma centena de artigos contrafeitos. Em comunicado, o Comando Metropolitano de Lisboa (Cometlis) da PSP esclarece uma pessoa foi detida por posse de arma proibida e droga e outra por ser suspeita de pelo menos oito crimes de roubo. A operação foi acompanhada por uma procuradora da República e foram cumpridos seis mandados de busca não domiciliária.
O enorme aparato policial na zona, onde moram e trabalham muitos imigrantes, levou à circulação de imagens nas redes sociais em que se vislumbram, na Rua do Benformoso, dezenas de pessoas encostadas à parede, de mãos no ar, para serem revistadas pela polícia, e comentários sobre a necessidade daquele procedimento.
Questionada sobre esta questão, a porta-voz do Cometlis, Ana Raquel Ricardo, explicou que uma “operação especial de prevenção criminal dá legitimidade para fazer outro tipo de diligências, nomeadamente a revista de cidadãos que se encontrem no local e revista de viaturas” que por ali circulem. O contingente empregue “foi o necessário” para uma operação deste tipo, referiu, sem, contudo, revelar o número de profissionais envolvidos. Segundo a PSP, participaram nesta operação meios das Equipas de Intervenção Rápida, das Equipas de Prevenção e Reação Imediata, de trânsito e à civil — investigação criminal e fiscalização.
Moedas insiste que há “perceção de insegurança” em Lisboa
O presidente da câmara de Lisboa, Carlos Moedas, diz que é “totalmente errado” achar que há um aproveitamento ideológico da operação policial em Lisboa e insiste que continua a existir uma “perceção de insegurança” na cidade.
“Olho para as pessoas, para aquilo de que elas precisam, e o que elas pedem hoje em Lisboa é segurança”, disse Carlos Moedas esta sexta-feira aos jornalistas, questionado sobre que análise faz da operação policial realizada esta semana no Martim Moniz.
“Precisamos de mais polícia”, destacou. “Continuo a pedir ao Governo mais polícia municipal. De 200 homens e mulheres que pedi só tive mais 20.”
Afirmando que é necessário “mais PSP em Lisboa” e “mais visibilidade” da polícia”, Moedas garante que as críticas de que a polícia e o Governo foram alvo são “uma injustiça”.
“Sabem aquilo que é a minha atividade e a proximidade na rua, seja em qualquer pessoa. Quem chega a Lisboa é lisboeta, todos respeitados por igual”, destaca. “É muito importante que isso fique claro.”
“A cidade, desde há muito tempo, precisa de mais segurança. Essa perceção de insegurança existe nas pessoas e existe no terreno. Obviamente, é preciso visibilidade da polícia”, acrescenta ainda.