Novembro será recordado por Miguel Macedo como um mês negro no seu calendário pessoal. Demitiu-se a 16 de novembro de 2014 por causa do seu envolvimento e de pessoas próximas no caso Vistos Gold. Um ano depois é acusado pelo Ministério Público (MP) da prática de três crimes, devido a atos alegadamente praticados no exercício das funções de ministro da Administração Interna do XIX Governo Constitucional.

Miguel Macedo foi acusado de três crimes de prevaricação de titular de cargo politico e um crime de tráfico de influência. Em causa estão alegados atos ilícitos que terão favorecido a rede dos Vistos Gold, nomeadamente a intervenção de nomeação de um funcionário dos Serviços de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), órgão sob a sua tutela, para a embaixada portuguesa em Pequim e uma alegada intervenção num processo fiscal relacionado com a farmacêutica Octapharma – empresa que contratou José Sócrates como consultor.

No âmbito de uma das duas certidões que foram extraídas do caso vistos gold para posterior investigação em inquéritos autónomos, Miguel Macedo viu o MP agravar as medidas de coação: proibição de contactos com os restantes arguidos e com as testemunhas do processo. O mesmo aconteceu com Paulo Lalanda Castro, ex-patrão de José Sócrates, igualmente acusado no âmbito deste processo.

O que é o crime de prevaricação?

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A prática do crime verifica-se quando um titular de cargo político ou um dirigente da administração pública decide contra a lei em determinado processo com a intenção de beneficiar alguém.

 

Da rede dos Vistos Gold propriamente dita, as figuras mais conhecidas são António Figueiredo (ex-presidente do Instituto de Registos e Notariado), Manuel Palos (ex-diretor do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras) e Maria Antónia Anes (ex-secretária-geral do Ministério da Justiça).

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António Figueiredo foi o arguido que conheceu a acusação mais pesada, sendo o alegado autor de:

  • quatro crimes de corrupção passiva para ato ilícito 
  • dois crimes de recebimento indevido de vantagem
  • um crime de peculato de uso 
  • três crimes de tráfico de influência
  • um crime de branqueamento de capitais
  • um crime de peculato de uso 
  • um crime de prevaricação (em co-autoria com Miguel Macedo, Manuel Palos e Jaime Gomes)

Manuel Palos, ex-director do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, foi acusado de:

  • um crime de corrupção passiva para ato ilícito (em co-autoria com António Figueiredo)
  • dois crimes de prevaricação (um crime co-autoria com Miguel Macedo e o segundo crime em co-autoria com Miguel Macedo, António Figueiredo e Jaime Gomes)

E Maria Antónia Anes, ex-secretária-geral do Ministério da Justiça, conheceu a seguinte acusação:

  • um crime corrupção ativa para a prática de ato ilícito
  • um crime corrupção passiva para a prática de ato ilícito
  • dois crimes de tráfico de influência 

O grupo de três empresários chineses que tinham sido detidos a 16 de novembro de 2014 e constituído arguidos, foram acusados dos seguintes crimes em regime de co-autoria:

  • Zhu Xiadong: Um crime de corrupção ativa e um crime de tráfico de influência
  • Zhu Baoe: Um crime de corrupção ativa e um crime de tráfico de influência
  • Xia Baoling:  Um crime de corrupção ativa e um crime de tráfico de influência

Eliseu Bumba, empresário angolano sócio de António Figueiredo, foi acusado de um crime de corrupção ativa por ter alegadamente firmado um acordo com Figueiredo para elaborar um conjunto de leis para a República de Angola – um negócio avaliado em mais de um milhão de euros

Ex-Patrão de Sócrates acusado

Paulo Lalanda Castro, administrador da Octapharma e da International Life Solution, foi acusado pelo Ministério Público de dois crimes de tráfico de influência.

Quanto a Jaime Gomes, empresário amigo de Miguel Macedo, foi acusado dos seguintes crimes: 

  • Um crime de corrupção passiva para ato ilícito (como cúmplice de António Figueiredo)
  • Um crime de prevaricação (em co-autoria com Miguel Macedo, António Figueiredo e Manuel Palos)
  • Dois crimes de tráfico de influência (um deles em co-autoria com Miguel Macedo)

Um resumo do caso

O caso Vistos Gold consiste na intervenção de altos responsáveis da administração pública em negócios imobiliários com o objetivo de obter ganhos financeiros ilícitos em troca da emissão de Vistos Gold mais rápidos e, nalguns casos, atribuídos a empresários não comunitários que não cumpriam os requisitos. Em resumo, esta é a base da acusação do MP.

O que são os vistos gold?

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Nome técnico: Autorização de Residência para a Atividade de Investimento. Destina-se essencialmente a cidadãos não comunitários que desejam investir em Portugal. Os empresários chineses, angolanos e brasileiros foram os principais visados por esta medida emblemática do governo PSD/CDS criada para atrair investimento e capital internacional para a economia portuguesa. Além da autorização permanente de residência em Portugal, os investidores podem igualmente circular livremente no Espaço Schengen e requerer a nacionalidade portuguesa ao fim de seis anos.

No topo da rede estarão, segundo o MP, António Figueiredo, Manuel Palos e Maria Antónia Anes. Ambos teriam acesso privilegiado às informações sobre os processos dos Vistos Gold, tendo alegadamente participado em negócios imobiliários através de agências imobiliárias que pertenceriam a familiares. Grosso modo, o valor final de cada negócio era inflacionado de forma a incluir as alegadas ‘luvas’ que seriam pagas.

PGR confirma acusações no caso Vistos Gold

No final da tarde de terça-feira, a Procuradoria-Geral da República confirma as acusações contra o ex-ministro da Administração Interna, Miguel Macedo. Em comunicado, a PGR escreve que o Ministério Público deduziu acusação “contra 21 arguidos, 17 pessoas singulares e 4 empresas, no âmbito do inquérito” relacionado com o caso dos vistos dourados.

Entre os acusados, diz a PGR, encontra-se o ex-ministro Miguel Macedo, além de António Figueiredo, Manuel Palos, Jaime Gomes, Maria Antónia Anes, Paulo Lalanda e Castro. E ainda, “três arguidos de nacionalidade chinesa, empresários do setor imobiliário, que tinham como mercado alvo cidadãos chineses que pretendiam adquirir Autorização de Residência para Atividade de Investimento (Visto Gold) em Portugal”, confirma a Procuradoria-Geral.

“O Ministério Público requereu ainda que fosse declarada perdida a favor do Estado a quantia total de 170.000,00€, tendo também deduzido contra três arguidos um pedido de perda alargada no valor total de cerca de 744.000,00€. Este pedido de perda alargada diz respeito à quantia correspondente ao valor da incongruência entre o seu património e os rendimentos declarados”, lê-se no comunicado.

Para a investigação, foram inquiridas mais de 200 pessoas e feitas buscas nas instalações dos ministérios da Administração Interna, da Justiça e do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia, bem como no Instituto dos Registos e Notariado e no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, locais onde foram recolhidos muitos documentos ligados ao processo.