Pontualidade britânica. 11h00 e o grupo de 20 turistas está já reunido para conhecer o Parlamento Escocês. Além de mim, portuguesa, há australianos, israelitas, alemães e, até, coreanos. O Novo Parlamento, assim denominado porque o antigo, no centro de Edimburgo, continua a aparecer no mapa mas deixou de funcionar em 1707, com o Ato de União entre a Escócia e Inglaterra. A guia chama-se Barbara Buchanan. Loira, de fato escocês às riscas, como chega a explicar quando lhe elogiam a indumentária. Não permite muito mais.

“Fotografias são completamente proibidas. Aliás, deve desligar os aparelhos e devem estar sempre juntos a mim”.

Depois de escapar a duas ou três questões (e comentários) sobre o referendo pela independência da Escócia, acaba por explicar que não pode responder. “O Parlamento tem prestado todo o apoio necessário, mas mantém-se imparcial. E não temos autorização para falar no assunto”. A cara que faz ao explicá-lo é mais descontraída do que a que fez quando a visitante, na casa dos 60 anos, afirma, animada, ser do círculo eleitoral do primeiro-ministro e líder do Partido Nacionalista Escocês, Alex Salmond – eleito por Aberdeenshire East, no nordeste da Escócia.

Mais tarde interpelar-lhe-ia: “Desculpe!”. Seguiu-se um olhar desconfiado. “Já agora, e votou em Alex Salmond?”. Os olhos arregalaram-se: “Oh, no!!!”. E seguiu-se uma gargalhada. Escusado será dizer que já não lhe perguntei o sentido de voto para esta quinta-feira.

A estrutura do Parlamento desenhado pelo catalão Enric Miralles, conhecido pelos seus edifícios para os jogos olímpicos de Barcelona, salta à vista na zona de Holyrood, na capital escocesa. Com um custo de cerca de 550 milhões de euros foi pensado como um espaço onde não se notasse a hierarquia – por isso o edifício onde os deputados têm escritório é semelhante ao de um prédio de habitação social. Era ainda objetivo do arquiteto que o edifício ficasse integrado na paisagem verdejante da cidade. Mas nem todos os escoceses concordaram que assim tivesse resultado.

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“Foram usados materiais escoceses. A madeira que não chegou veio de países europeus”, explica a guia.

Na construção houve mão-de-obra portuguesa. “Fui intérprete de alguns deles. Diziam que era muito aborrecido ter várias sessões de formação em segurança no trabalho. Mas depois admitiam a necessidade”, conta ao Observador Helena MacDonald, uma portuguesa que vive há 24 anos em Edimburgo e que, além de professora de Português, é intérprete.

À entrada do Parlamento, no teto de betão estão cravadas cruzes que representam a bandeira escocesa. Há um jogo de luz natural que passa os vidros e se reflete no chão de granito. As salas onde os deputados reúnem são envidraçadas e permitem que quem passe veja o que está acontecer. “Hoje é um dia atípico. Normalmente, em dias de sessão parlamentar, há muita gente nos corredores. Muito movimento e barulho”, diz Barbara Buchanan.

O Novo Parlamento Escocês nasceu, no papel, há precisamente 17 anos. Por autorização do então primeiro-ministro Tony Blair e por iniciativa do Partido Trabalhista foi perguntado aos escoceses, através de um referendo, se queriam um Parlamento em Edimburgo. A ideia era que pudessem deliberar sobre vários temas em áreas como Educação, Justiça e Saúde. Os escoceses disseram sim e a 9 de outubro de 2004 era inaugurado o Parlamento com a presença da Rainha. O arquiteto que o desenhou, o catalão Enric Morales, morreu antes de ver a obra pronta.

O Parlamento escocês pode deliberar sobre as chamadas “matérias delegadas”, aquelas que não afetam o Reino Unido, como agricultura, polícia, proteção civil. Há 129 deputados que se sentam semanalmente nas cadeiras do plenário (73 representam os círculos eleitorais e 56 representam áreas regionais maiores). “Não há lugares marcados, porque cada assento tem uma máquina que lê o cartão de identificação de cada deputado. Mas normalmente eles sentam-se por cor partidária”.

Atualmente estão aqui representados o Partido Nacionalista Escocês (maioritário, com 69 deputados eleitos), o Partido Trabalhista, o Conservador e Unionista Escocês, o Partido Liberal Democrata Escocês e o Partido dos Verdes. Há um deputado independente eleito.

Na inauguração, foi lido um poema escrito por Edwin Morgan sobre o novo edifício. Barbara Buchanan terminou a visita com um excerto:

“Abram as portas! (…) Temos um edifício que é mais que um edifício. (…) Queria colunas clássicas e frontões previsíveis? Um grunhido gótico? Uma caixa alegremente chata? Não aqui, não obrigado! Sem ícones ou Ikea…”