Não há sítio em Espanha onde viva mais gente do que na Andaluzia. Ao todo, são mais de 8 milhões de habitantes. Isto é, 17% de toda a população do país. Poderemos, assim, tirar conclusões dos resultados da eleições para o parlamento daquela região e com elas prever o que irá acontecer quando o país for a votos no dia 20 de dezembro de 2015?

Quiseram os eleitores andaluzes que o Partido Socialista Obrero Español (PSOE) vencesse as eleições com 35,4% dos votos, seguindo-se o Partido Popular (PP) com 26,8%. Em terceiro ficou o elefante no quarto da política espanhola, o Podemos. O partido de Pablo Iglesias, o líder do maior fenómeno político saído da atual crise em Espanha, juntou 14,8% dos votos. Em quarto, com 9,3%, ficou o Ciudadanos, partido de origem catalã que consegue agora uma importante entrada fora da sua região.

Embora as margens entre partidos sejam óbvias, as análises que surgem a partir do país vizinho não apontam todas na mesma direção. Javier Ayuso, diretor adjunto do diário espanhol El País, comentou que, apesar de todas as sentenças de morte que lhe têm sido declaradas, “o bipartidarismo não morreu”. “O PP e o PSOE sofreram, mas não morreram”, vaticina. Já o Diario de Sevilla, o jornal mais importante na Andaluzia, analisa os números de forma diferente no seu editorial: “As eleições de ontem têm um caráter histórico: quebrou-se o bipartidarismo ao mudar a soma dos votos dos partidos maioritários (PSOE e PP) dos 80% dos votos de há três anos para os 62% de agora.”

Em conversa telefónica com o Observador, o analista político espanhol José Fernández-Albertos explica que o valor do Podemos foi inflacionado depois do seu surgimento nas eleições europeias de 2014. Nessa altura, a sua primeira eleição, conseguiu 8% dos votos e lugar cativo no debate político espanhol. “Os resultados do ano passado causaram a impressão na maior parte do público que o sistema em Espanha se tinha tornado muito volátil, mas agora essas expectativas foram goradas.”

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Para Fernández-Albertos, um dos co-autores do livro “#Podemos: Desconstruyendo a Pablo Iglesias”, as mudanças no panorama político espanhol são evidentes e visíveis, mas não tão aceleradas como alguns propõem. “Não estamos perante uma destruição completa do nosso sistema político a acontecer em apenas dois anos, isso não é realista. O que há, e isso é bem real, é um processo de mudanças estruturais a longo prazo, que vão demorar muito mais do que isso. Pelo menos uma década ou até mais.”

Ainda assim, explica o analista espanhol, os resultados do Podemos não foram maus. “Se tivermos em conta que eles nem sequer participaram nas eleições anteriores [de 2012] e agora tiveram 15% dos votos, então podemos achar que tiveram um bom resultado.”

Sem grande surpresa, essa foi a mensagem que Teresa Rodríguez, candidata do Podemos na Andaluzia, passou ontem no seu discurso perante um grupo de apoiantes que o Diario de Sevilla descreveu como negativamente “surpreendidos”. “As duas grandes forças do bipartidarismo perderam vinte pontos e nós passámos do 0 a 15. Isto não é uma fotografia, mas antes um fotograma de todo o filme da mudança.” Pablo Iglesias escreveu no Twitter uma mensagem de semelhante esperança: “O caminho faz-se a andar. Obrigado, Andaluzia. Obrigado,Teresa Rodríguez. Obrigado, caminhantes, por darem o primeiro passo. Sigamos.”

Andaluzia sempre foi bastião socialista

Apesar de ser a região mais populosa de Espanha, a Andaluzia nunca foi um retrato fiel no que respeita às dinâmicas políticas do país. Desde 1982, ano em que aconteceram as primeiras eleições para o parlamento regional da Andaluzia, o PSOE saiu quase sempre vencedor. A exceção foi apenas uma: em 2012, ano em que o PP saiu por cima nas urnas. Ainda assim, graças a uma coligação com a Esquerda Unida, o PSOE assumiu o poder.
Foi também graças a esta forte implementação dos socialistas naquela região que o Podemos não conseguiu chegar nem perto dos 25% que as sondagens lhe apontam para as eleições legislativas a acontecer no final deste ano. Segundo Fernández-Alberto, “o Podemos é um partido sobretudo urbano, que consegue passar muito bem a sua mensagem para um público mais jovem e moderno, que tem acesso à Internet e tem formação académica. Ora, esse não é o perfil da maior parte dos eleitores na Andaluzia, que é uma região rural e conservadora nos costumes”.
De resto, o cenário de ontem tinha sido previsto pela grande parte das sondagens: uma vitória clara do PSO na ordem dos 35%; um rombo na influência do PP, que ainda assim permaneceria como segunda força política; e uma confirmação, embora tímida, no segundo teste eleitoral do Podemos.

Podemos continua à frente nas sondagens

O terceiro e mais importante teste para o partido de Pablo Iglesias será, já sabemos, no dia 20 de dezembro de 2015, data das eleições legislativas. A mensagem anti-corrupção e anti-sistema chegou a valer-lhe o primeiro lugar nas sondagens, com números próximos dos 30%.

Já os estudos mais recentes não são tão otimistas quanto isso. Mesmo que coloquem o Podemos como força vencedora, os outros partidos candidatos a governar Espanha surgem com números próximos. É o caso do mais recente estudo da rádio SER, publicado a 11 de março, em que o Podemos arrecada 23,4%, o PP 22%, seguindo-se o PSOE e o Ciudadanos com um empate a 19%.