Mais gente, aulas para falar em público e João Cotrim Figueiredo on the road pelo país. As eleições de 30 de janeiro catapultaram a Iniciativa Liberal para o planeta dos grandes, um mundo em que há mais dinheiro, mais recursos e mais tempo, mas também menos espaço para erro e mais responsabilidade. E foi a pensar nisso que os liberais aproveitaram os últimos meses para lançar as bases do próximo ciclo político.
A primeira preocupação passou por transmitir toda a informação sobre o Parlamento, as regras, o funcionamento e o dia a dia aos novos parlamentares. Depois, o trabalho de casa que também é feito em conjunto: independentemente da experiência que já têm, todos vão receber formação de public speaking (que vai ser dada por um membro da IL).
Desde que foram eleitos, os deputados liberais reúnem semanalmente e preparam os próximos tempos. Mesmo antes da tomada de posse, passaram vários dias na Assembleia da República a conhecer os cantos à casa, com aqueles que melhor conhecem os corredores.
A preocupação passou também por contratar pessoas com experiência na área da comunicação, que funcionem quase como uma espécie de rede numa fase inicial, nomeadamente no caso das entrevistas e das intervenções dos novos deputados.
Rodrigo Saraiva, líder da bancada parlamentar da IL, explica ao Observador que houve três qualidades tidas em conta no cômputo geral: consistência, competência e criatividade. O novo deputado compara todo o processo a um “puzzle que foi sendo construído”.
No quadro final (que pode ainda ter mudanças caso haja necessidade) há 14 assessores políticos, quatro pessoas para as vertentes de administração e organização do gabinete, duas pessoas mais ligadas à relação com a imprensa, um chefe de gabinete e um adjunto.
Cotrim pela estrada fora em modo caça talentos
O aumento do grupo parlamentar da IL também tem repercussões no partido. Além da subvenção que as forças políticas passam a ter para usar no trabalho do Parlamento (e que é dependente do número de votos nas eleições), os partidos também têm uma subvenção associada. Com a nova realidade, a Iniciativa Liberal vai aproveitar para duplicar os funcionários, fazer crescer o número de núcleos e continuar a apostar numa comunicação disruptiva.
O primeiro trunfo está pronto: João Cotrim Figueiredo, agora que já não é deputado único, vai dedicar-se ao partido. Ricardo Pais Oliveira, vice-presidente da IL, explica que o plano é “o presidente passar a estar muito mais perto do partido e andar muito mais no terreno”.
Especificamente, Cotrim Figueiredo fará um “périplo pelos núcleos” que tem como objetivo levar a “cultura do partido, a estratégia, ferramentas e informação”, tendo em conta que o objetivo é “criar uma máquina que seja capaz de trazer ideias, sugestões, problemas para resolver e talentos”.
Objetivo: triplicar o número de núcleos
Sobre objetivos estabelecidos, a IL pretende passar de quase 50 núcleos para 150, com uma aposta no interior do país: “O objetivo a médio prazo é cobrir 80% da população, mais 100 núcleos do que os atuais.” E mais: o partido tinha “cinco ou seis funcionários” e “está previsto ir para 10 ou 11” e o intuito é que seja dado “apoio à estrutura que já existia”.
Ricardo Pais Oliveira explica que não está em causa uma reestruturação das prioridades, mas sim a possibilidade de apoiar o trabalho que, até agora, era baseado num espírito de missão (e não remunerado): “A IL viveu até aqui com uma equipa pequena que levava tudo às costas e que não dormiu durante três anos.
Agora haverá um recurso de apoio para cada uma dessas áreas, não vai haver uma transformação estrutural, vai ser igual, vai é haver mais apoio a cada uma dessas áreas: comunicação, tesouraria, secretaria-geral e gabinete de estudos que implica gestão de conhecimento.”
Com o intuito de dar continuidade à comunicação pela qual a Iniciativa Liberal é conhecida, o vice-presidente do partido admite que haverá “mais publicidade de rua”, bem como um investimento na comunicação digital.
Tornar o partido mais abrangente
Além da atenção que vai continuar a ser dada a algumas das grandes bandeiras do partido — nomeadamente nas comissões de Orçamento e Finanças, Economia, Educação e Saúde — o aumento do grupo parlamentar vai permitir à IL fazer investimentos mais fortes nas áreas de Ambiente e Energia, Política e Direito internacional (assuntos europeus, negócios estrangeiros) e Tecnologia e Transição Digital.
“Na última legislatura houve assuntos em que gostávamos de ter ido a jogo e não foi possível porque tínhamos limitação de tempo e de recursos. Uma delas foi a questão da Lei do Clima. Se fosse agora, teríamos obviamente a nossa proposta e o nosso projeto de lei”, garante Rodrigo Saraiva, apontando essa como a “grande diferença” que vai permitir aos liberais chegarem a mais temas e fazerem “ouvir as mensagens da IL, com mais força política”.
Dos oito liberais eleitos só João Cotrim Figueiredo já tinha sido deputado, mas a experiência estende-se em grande parte ao gabinete parlamentar da última legislatura, do qual faziam parte Carla Castro, Rodrigo Saraiva e Bernardo Blanco — eleitos por Lisboa.
Todos os outros — Carlos Guimarães Pinto, Patrícia Gilvaz, Rui Rocha e Joana Cordeiro — são estreantes e merecem atenção redobrada, ainda que todo o percurso esteja a ser feito em conjunto.
O processo de recrutamento inédito e a pesca no CDS
O processo de recrutamento inédito — os liberais abriram as portas a candidaturas da sociedade civil para o gabinete parlamentar — levou à contratação de 14 pessoas. A IL recebeu 900 candidaturas, mais umas tantas fora do tempo, e as mesmas foram ainda usadas para as contratações feitas pelo partido, fora do gabinete.
Feitas as contas, a IL passa de um gabinete com um deputado único e quatro pessoas contratadas para um gabinete parlamentar com oito deputados e mais de 20 pessoas. “Não vamos ter um rácio de quatro pessoas para cada deputado”, explica Rodrigo Saraiva, sublinhando que a versatilidade foi uma das qualidades procuradas. “Isso não muda em relação à realidade que tínhamos antes, não vamos estar restritos a uma só função.”
Entre as contratações há juristas, economistas, pessoas de ciência política e filosofia e metade são membros da IL, enquanto os restantes não tinham ligação ao partido. Três dos novos membros do gabinete parlamentar liberal vêm do CDS: duas pessoas estavam no grupo parlamentar dos democratas-cristãos na última legislatura e a outra em legislaturas anteriores. A experiência parlamentar, apesar de não ter sido o único foco, foi “valorizada”.