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Pedro Nuno Santos, secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares é o homem no centro de operações do Governo quanto aos equilíbrios da “geringonça”, palavra que não aprecia. Considerado como um representante da ala esquerda do PS, este antigo líder da JS, filho de um industrial do setor do calçado, considera que o partido tem uma visão de sociedade “mais próxima” do PCP e do Bloco de Esquerda do que do PSD e do CDS. E explica-o nesta entrevista. Considera que as ideias que se fazem dos partidos à esquerda do PS são “caricaturas”.
Quanto ao Orçamento do Estado, não acha que o Governo esteja a “fazer o pino” no adiamento da eliminação da sobretaxa: “O máximo que estamos a fazer é um desfasamento temporal reduzido na eliminação da sobretaxa”. Nesta conversa longa e acalorada, durante hora e meia no estúdio do Observador, Pedro Nuno Santos comenta vídeos com declarações de Catarina Martins, mas também de si próprio a denunciar os salários milionários dos banqueiros. A entrevista começa com o secretário de Estado a comentar um vídeo de António Costa. Ora veja:
Sobretaxa: “Em 2017 vai ser eliminada, palavra dada, palavra honrada”
Tendo em conta o que vemos nestas imagens, o primeiro-ministro já não pode repetir a expressão “palavra dada é palavra honrada” no próximo debate orçamental por causa da sobretaxa?
Foi importante termos visto este pequeno vídeo que mostra que o que foi anunciado no debate do Orçamento para 2016 foi mesmo cumprido. O IVA da restauração baixou e a sobretaxa foi eliminada para alguns e reduzida para outros. Tivemos pela primeira vez, e continuará, um Governo que não aumenta os principais impostos. Há até uma diminuição do IRS com a diminuição da sobretaxa em 2017. Não há aumentos de IVA, antes pelo contrário. Não há aumentos de IRC, antes pelo contrário: há redução para as pequenas e médias empresas do interior. De facto, temos, sobre esta matéria de impostos, um Governo que faz novo e diferente.
Mas sobre a questão da sobretaxa, em 2017…
Antes disso era importante que percebêssemos que pela primeira vez em muitos anos houve um Governo que não aumentou o IVA ou o IRS ou o IRC. No entanto, sabemos que as previsões de crescimento da economia europeia e internacional, não apenas a portuguesa, foram revistas em baixa. E isso tem obviamente consequências numa pequena economia aberta como a portuguesa. É preciso ter a capacidade para fazer os ajustes necessários a uma conjuntura económica internacional que é estruturalmente diferente da esperada, mas que, mesmo assim, não altera de forma estrutural aqueles que são os compromissos do PS. Ao contrário do que faria a direita portuguesa, estamos a falar é de uma eliminação da sobretaxa durante o ano de 2017.
O que ficou escrito na lei aprovada em dezembro de 2015 foi que a sobretaxa acabava a 1 de janeiro de 2017. É um compromisso que não foi cumprido.
Mas já viram o que é estarmos pela primeira vez a fazer a discussão a esse nível: estava previsto acabar a 1 de janeiro e há um desfasamento temporal para diferentes escalões na eliminação da sobretaxa. Aquilo a que estávamos habituados era a um Governo, como o de Passos Coelho, que prometia que não ia haver aumento de impostos nem supressão do subsídio de férias nem de Natal e nós tivemos isso tudo. Estamos a falar de um contexto político que não tem paralelo.
Mas não é a mesma coisa? É que também acabámos de ver um vídeo do primeiro-ministro onde diz que pela primeira vez os compromisso não eram alterados, mas agora são.
Esse se calhar podia ser outro vídeo. Porque aquele é o primeiro-ministro, no debate do Orçamento do Estado para 2016, a dizer que vai reduzir o IVA para a restauração e eliminar a sobretaxa e foi isso que aconteceu.
Não pode repetir este número no Orçamento do Estado para o próximo ano. Era esta a pergunta.
Então não pode? Durante o ano de 2017 a sobretaxa vai ser eliminada: palavra dada, palavra honrada.
Mas não foi isso que o Governo prometeu.
Escolheram um vídeo que confrontava o primeiro-ministro com anúncios. O que ali foi dito foi cumprido, ele tem legitimidade para no próximo Orçamento do Estado dizer que a sobretaxa vai ser eliminada durante o ano de 2017. Se olharmos para 2016 como critério de credibilidade, é mais do que certo que a sobretaxa vai ser eliminada.
Mas não era isso que era suposto. O que era suposto era acabar em…
Afinal queriam mostrar outro vídeo…
Não. A verdade é que falou aqui na desaceleração do crescimento, precisamente para justificar que esta medida seja faseada, não terminando a 1 de janeiro, certo?
Já foi assumido. Não estamos aqui a fazer o pino. Acrescentei que houve uma revisão em baixa, não da economia portuguesa, mas da internacional. O máximo que estamos a fazer é um desfasamento temporal reduzido na eliminação da sobretaxa.
Se não tivesse havido este aumento extraordinário das pensões era possível acabar com a sobretaxa a 1 de janeiro? São estas opções de que fala o ministro das Finanças?
Isso é obvio. É importante falarmos dessas opções. Não há é essa correspondência direta entre uma determinada medida de receita e uma determinada medida que implica despesa. O Orçamento implica uma visão e uma política global que implica despesa e implica receita. Essa correspondência direta não corresponde à nossa leitura. Mas no Orçamento fazem-se opções. E a opção que fazemos do ponto de vista global é que o nível de fiscalidade não aumenta. Coisa rara quando olhamos para os últimos anos, em que a carga fiscal foi sempre aumentando.
A carga fiscal: “Há uma redução curta, mas há uma redução”
Um dos eixos do discurso do Governo tem sido dizer que a carga fiscal “vai baixar”. E está a dizer que ela “não vai aumentar”. Isso é muito diferente, a redução foi ligeira.
Há uma redução curta da carga fiscal, mas há uma redução.
A diferença é tão baixa que é irrelevante esta questão…
…É ao nível a que está o debate político em Portugal!
Não é spinning político o discurso de alguns responsáveis do Governo e do PS dizer que vai baixar?
Não, não vai aumentar. Vai baixar e não vai baixar o que desejaríamos, mas vai baixar e é uma novidade, que aliás se repete porque em 2016 aconteceu o mesmo. Não há de ser spinning dizer que de 2011 para 2015 a carga fiscal aumentou de 30,4% para 34,5%. Isto já não é spinning, é mesmo assim: com a direita o nível de fiscalidade aumenta sempre. Não é extraordinário termos um Governo que baixa o nível de fiscalidade — ainda que não seja muito significativo, mas pela segunda vez depois de quatro anos em que ela aumentou –, e haver um levantamento de tantos comentadores ao nível de aumento de impostos? Nível de fiscalidade ou carga fiscal baixa pela segunda vez consecutiva e o PSD e CDS não conseguem dar um ano de exemplo para fazerem este debate connosco de igual para igual.
Admitiu que há uma alteração face ao que estava previsto inicialmente, justificada com a revisão em baixa da economia. Tendo em conta que a realidade muda, pode garantir que a sobretaxa não volta em 2019?
Estamos a eliminar a sobretaxa e há aqui sempre uma margem de prudência no exercício que fazemos, que é rigoroso. Quando estamos a eliminar a sobretaxa em 2017 é para eliminar. Este Governo não volta atrás nas medidas que toma, não é isto que nos caracteriza. Caracterizava governos anteriores, este não. Em 2017 elimina-se a sobretaxa.
Mesmo que possa vir a ser necessária essa margem orçamental?
Em 2017 a sobretaxa em IRS é eliminada.
Este orçamento tem aqui algumas componentes que são receitas extraordinárias, como os 450 milhões de euros do BPP ou uma verba próxima desta do Banco de Portugal, a redução da sobretaxa. No próximo Orçamento vão ter que conseguir uma série de receitas e margens. Será mais estreito ainda o exercício orçamental do ano seguinte?
Portanto, este Governo está de parabéns quanto a 2016 e 2017. Podemos fixar isto entre nós.
Pode auto congratular-se à vontade…
Já estamos a discutir o Orçamento para 2018 quando ainda não está o de 2017 aprovado.
É importante falar disso porque cada Orçamento tem uma implicação nos anos seguintes.
Ok, podemos discutir 2018. Falou de algumas rubricas que são estruturais. O Banco de Portugal, cujo acionista é o Estado português, distribui dividendos de acordo com os resultados líquidos que tem. Neste momento, tem uma valorização muito relevante dos seus ativos. As taxas de juro sobre a nossa dívida têm baixado e isso permite o aumento da remuneração o Banco de Portugal e é daí que decorre a distribuição de dividendos. Isso não é conjuntural.
Foi articulado entre o governador e o primeiro-ministro?
Obviamente que se temos ali uma previsão de distribuição de dividendos, presumo que decorra do trabalho que é feito e da informação que é pedida pelo ministro das Finanças ao Banco de Portugal, pela relação que têm. O que está ali é o resultado da previsão de dividendos que o Banco de Portugal poderá distribuir ao seu acionista que é o Estado português.
Em muitos anos é a mais alta distribuição de dividendos, para cima do dobro. O Banco de Portugal está a ser imprudente ao fazer menos provisões do que em anos anteriores?
O Banco de Portugal é, em matéria de provisões dos mais prudentes da zona euro. Temos um nível de provisões que é claramente acima da prática normal dos países da zona euro. Não há nenhuma imprudência do Banco de Portugal. Mas também é sabido que no contexto em que o Banco de Portugal aumentou a compra de dívida pública — no quadro do programa do Banco Central Europeu –, esses títulos têm aumentado a remuneração do Banco de Portugal e isso obviamente permite-lhe também distribuir mais dividendos.
Esta semana Mario Draghi disse que o Governo conhecia as vulnerabilidade de Portugal e falou na necessidade de reformas estruturais, da reestruturação da dívida empresarial do malparado bancário. É esse o caminho?
Falta acrescentar as declarações de Draghi sobre os avanços significativos que tinham sido conseguidos em Portugal. Esses avanços vão ter de continuar.
Draghi também falou do malparado bancário. Qual é a solução? Criar um banco para ativos tóxicos?
Esse é um debate muito importante. Não quero especular sobre nenhuma solução final, porque não temos uma solução fechada. Mas é obvio que uma das maiores dificuldades que a nossa economia enfrenta é a dificuldade que o nosso sistema bancário ainda tem. É importante termos consciência que a situação do nosso sistema financeiro tem dificuldades há vários anos. Herdámos uma situação para a qual não tínhamos informação plena e este último ano tem sido uma correria para dar resposta a vários problemas do sistema bancário que não tiveram resposta nos últimos quatro anos. Estiveram mesmo escondidos durante quatro anos. Primeiro foi o Banif, o processo do Novo Banco muito longe de estar concluído, a capitalização da Caixa adiada e nós estamos a dar resposta a todas essas situações.
Caixa: “Só conseguimos ter os melhores com remunerações próximas do mercado”
Houve uma polémica que dominou esta última semana, sobre os salários da nova administração da Caixa Geral de Depósitos (CGD). Vamos ver um vídeo com declarações de Catarina Martins sobre o tema.
Pode ver no vídeo abaixo as declarações de Catarina Martins, líder do Bloco de Esquerda, a criticar os salários da Caixa Geral de Depósitos, a dizer que “são inaceitáveis” os salários “milionários”.
Concorda que são inaceitáveis estes salários milionários na CGD?
O PS e os seus parceiros não pensam o mesmo sobre todas as matérias e sobre esta não pensamos. Queremos ter os melhores a administrar aquele que é o mais importante banco português, um banco 100% público, tem um peso enorme no sistema bancário português. É altamente complexo, exige uma gestão profissionalizada, com experiência e nós só conseguimos ter os melhores se conseguirmos ter e proporcionar remunerações próximas das que são praticadas no mercado.
Isso é bem percebido pela generalidade dos portugueses?
Tem que se explicar. Nem tudo é imediatamente percebido, exige explicação e é mesmo esta: a Caixa é demasiado importante para nós, para o país, para a economia portuguesa, e isso exige ter os melhores. Neste caso, é ter gestores com provas dadas numa área tão sensível e complexa como é a da gestão bancária.
E justifica-se um salário de quase meio milhão de euros anuais?
A única coisa que posso dizer sobre isso é que a CGD deve pesar entre 20 a 25% do nosso sistema bancário. É o maior banco português. E os salários da administração são muito abaixo dos que são praticados em bancos mais pequenos em Portugal. Apesar de os salários serem, para a maioria esmagadora de nós, muito elevados. A verdade é que são os praticados naquele mercado.
E acha que é razoável?
Mesmo assim… não passa pela cabeça fixar os preços que os mercados praticam. Podíamos fixar numa empresa que é pública, mas tendo nós a intenção de ter os melhores, temos de pagar o que é prática no mercado para garantir que a CGD tem uma gestão experiente, profissional.
A JS tem uma proposta para criar tetos salariais. Não concorda?
A JS tem a sua proposta, mas é o PS que está a governar e a posição do PS é que entendemos que a CGD é muito exigente do ponto de vista da gestão, temos de ter bons quadros a geri-la e isso exige que não nos afastemos muito daquilo que são as práticas do mercado. Ressalvando que, apesar da Caixa ser o maior banco português, pagará salários abaixo de outros bancos bem mais pequenos.
Vamos só recuar a 2011, a um congresso do PS e a uma intervenção sua, nesse dia 9 de setembro.
Pode ver no vídeo abaixo uma declaração de Pedro Nuno Santos, em 2011, sobre os salários da banca, a criticar os vencimentos dos banqueiros em relação a uma “gaspeadeira” que ganha o salário mínimo a fazer sapatos.
É uma boa intervenção, hein…
O que mudou nestes cinco anos? É o facto de estar no Governo que o obriga a não dizer o que pensa?
Não, estamos no Governo, estamos numa equipa e, obviamente, construímos as mais diversas soluções. Há pouco, dizia que o PCP, o Bloco de Esquerda e o PS não pensam exatamente o mesmo. Nós, no Governo, também partimos muitas vezes de posições diferentes. Há uma coisa que é certa: não vamos ter nenhum administrador da Caixa Geral de Depósitos a ganhar 100 mil euros 150 mil euros por mês. Há uma preocupação de ter os melhores a administrar a Caixa e isso exige que nos aproximemos daquilo do que paga o mercado. Agora, a dispersão salarial, a desigualdade social é uma questão muito relevante, não é só para mim, do ponto de vista pessoal, mas isso pouco interessa para esta entrevista…
Mas ainda se revê nestas declarações ou já não?
Claro que me revejo num pensamento face a uma sociedade com níveis de desigualdade social bem menores. Não sei se sabem o que é uma gaspeadeira, é uma senhora que cose partes do sapato e que ganha o salário mínimo. Nós não conseguindo mudar o país de um dia para o outro estamos a fazê-lo. E é por isso que aumentamos o salário mínimo para 530 euros em 2016. Voltaremos a fazer isso em 2017 e um conjunto muito vasto de outras medidas que permitem melhorar a vida de quem ganha menos em Portugal. Revejo-me porque é essa a matriz do PS: construirmos uma sociedade com elevados níveis de igualdade, mas combater sempre a concentração excessiva e injustificada de riqueza. Também obviamente no sistema bancário.
Mesmo que um administrador da Caixa ganhe 100 vezes mais o salário mínimo?
Isso não vai acontecer no caso da Caixa, 100 vezes, 200 vezes, cem mil, 150 mil. Estamos muito longe disso mas é óbvio que temos de ter uma sociedade com menos desigualdade social, com menos dispersão salarial. Foi isso que conseguimos durante os dois governos do PS e é isso que vamos voltar a conseguir neste mandato, em perfeita sintonia e coerência com o que defendo para Portugal. Continuo a defender isso como defendia em 2011, como é óbvio.
A existência de um tecto salarial foi uma condição para António Domingues aceitar presidir à Caixa?
Não sei não estive na negociação nem no recrutamento dos administradores da Caixa. Imagino que, tendo como objetivo recrutar administradores do BPI, obviamente que isso exigiria que não houvesse uma quebra significativa nas suas remunerações. O PSD tem feito este debate sobre os limites, até de forma demagógica: quero lembrar que com o regime anterior esta equipa da CGD iria ganhar exatamente o mesmo. Porque o modelo anterior prevê que se possa receber a média dos últimos três anos, que é sensivelmente o mesmo que ganham com o novo modelo.
O ministro das Finanças falou numa poupança.
Não sei qual é a poupança, sei que é sensivelmente o mesmo. Para não estar a exagerar. Quanto muito quando fizerem um fact check a seguir, vão ver que pequei por pouco. Será sensivelmente o mesmo.
Afinal era indiferente o regime?
Não, este é mais transparente. O que acontecia com o regime anterior é que permitia que fosse a anterior entidade empregadora a determinar os salários dos administradores da CGD. O que temos aqui é o que se passa em qualquer empresa. Há um tabela remuneratória, decidida pelo conselho de administração cumprindo as orientações do acionista, e os administradores da Caixa vão ganhar de acordo com essa tabela. Vou dar um exemplo extremo: se o secretário de Estado do Tesouro e Finanças quisesse convidar para presidente do conselho de administração da Caixa o seu primo, que como sabem é o treinador de futebol José Mourinho, ao abrigo do regime anterior (PSD e CDS), o presidente ganharia a média do últimos três anos… Bom, eu não sei quanto ganha o José Mourinho, mas imagino que seja uma coisa exorbitante. Era o que ganharia. Isto só para dizer que o regime anterior não implicava nenhum limite, antes pelo contrário. O que temos é um sistema que é mais transparente.
No último debate, Pedro Passos Coelho colocou esta pergunta ao primeiro-ministro: como explica a diferença que Portugal e Espanha pagam de juros da dívida da República? Portugal 3% e Espanha 1,5% ou menos. Uma relação do dobro. Isto significa que Espanha sem Governo gera mais confiança do que Portugal com Governo?
Há neste momento um trabalho muito importante e sabíamos que o tínhamos de fazer, ainda mais por causa de toda a desconfiança colocada em cima deste Governo, em mostrar que o nosso programa era possível sem pôr em causa as contas públicas portuguesas. O ano está a correr, estamos cada vez mais perto de provar isso mesmo. Julgo que isso será essencial e determinante para que as taxas de juro possam baixar ainda mais. De qualquer forma, quando comparamos com Espanha — o líder do PSD tem objetivos diferentes dos nossos — nunca se lembrou de falar do que nos distingue em matéria de criação de emprego em relação a muitos países na Europa. No primeiro semestre deste ano temos o recorde de criação de emprego, desde que há séries mensais do INE sobre emprego. Esse é, de facto, o objetivo último de qualquer política económica. Temos muitos indicadores com os quis comparamos, mas o que verdadeiramente interessa é que estamos a provar que era possível esta solução de Governo conseguir resultados em matérias de contas públicas, que não envergonham ninguém, antes pelo contrário, são motivo de orgulho. Vamos cumprir a nossa meta sem o fazer através de cortes em salários, em pensões, aumento de impostos sobre rendimentos de trabalho ou aumentar o IVA. É isso que obviamente mais confusão faz à nossa oposição, porque o seu discurso cai por terra.
Austeridade: “Preferimos cativações ao corte de salários”
Existem 450 milhões de euros em cativações para 2017 e o Orçamento deste ano também se baseia muito na contenção. Isto não é austeridade? Não são cortes? Não afeta os serviços do Estado?
Preferimos gerir e fazer uma gestão rigorosa do nosso Orçamento e garantir o cumprimento das nossas metas, fazendo cativações — que são um instrumento normal de gestão orçamental –, do que cortar salários, pensões. Está a equiparar, como muita gente, as austeridades como sendo equivalentes e a verdade é que estamos a provar que podemos atingir as metas orçamentais estabelecidas sem empobrecer as famílias e as empresas portuguesas.
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Francisco Louçã foi seu professor no ISEG. Foi o seu melhor professor?
Foi um dos meus melhores professores. E, naquele ano, eu fui um dos melhores alunos dele também.
Arrependeu-se da frase em que disse que se estava a “marimbar” para o pagamento da dívida?
Vamos, ao longo da vida, fazendo declarações das quais não temos o maior orgulho. Pelo menos, pela forma com que o fazemos. Havia uma ideia que muitos tínhamos, e que eu tinha, sobre as mudanças que a Europa precisava de fazer e a forma como essas mudanças devem ser suscitadas na União Europeia (UE). Continuo a ter a mesma opinião sobre as mudanças que são precisas na UE, na arquitetura institucional do Euro, na forma como respondemos à crise. Tenho a mesma posição, quando muito melhorada porque já passaram alguns anos que nos permitem avaliar melhor a crise.
Qual foi o momento mais divertido nas reuniões da “geringonça”?
Como deve saber, não uso o termo “geringonça”, porque se há coisa que esta solução de Governo já provou é que não é uma construção frágil ou precária. Faço sempre questão de dizer isto. Temos muitos momentos de descontração. As reuniões de trabalho que temos com o PCP, com o BE e com o PEV são exigentes. Eles estão a defender o seu programa, as suas medidas, mas obviamente temos sempre espaço para ter os nossos momentos de descontração e de humor. Mas deixaremos alguns desses episódios para o próximo livro da Rita Tavares.
Sente-se mais confortável com o perfil que o BE tem mostrado nesta solução governativa ou com o método de trabalho do PCP?
São dois partidos com culturas organizacionais muito diferentes.
Essa parte nós sabemos, a pergunta é direta.
Como sabem, o trabalho é no quadro bilateral. Trabalhamos diretamente com o PCP e diretamente com o BE e com o PEV. São métodos diferentes de trabalho. Obviamente, já me fizeram essa pergunta muitas vezes. O que posso dizer sobre isso é que são reuniões com método diferentes, todas elas exigentes, todas feitas num contexto de grande lealdade e têm todas permitido a esta solução produzir resultados, contra aquilo que era a intuição de algumas pessoas em Portugal.
É mais fácil gerir a relação bilateral do que a relação entre BE e PCP?
A relação entre BE e PCP é da responsabilidade do BE e do PCP. Na função que tenho, o que posso dizer é que a minha relação com todos eles é boa e do Governo com os parceiros também, que é o que é relevante, não a minha relação pessoal. Mas há um desejo permanente de que nos consigamos aproximar cada vez mais. Não só entre cada um dos parceiros isoladamente e o Governo, mas entre os próprios parceiros.
Há uns que espalham com as patas o que outros juntam com o bico?
Aquilo que desejo é aprofundar cada vez mais as nossas relações.
É uma austeridade também…
Temos é que sair daqui com esse anúncio… O que é relevante é saber se este Governo está a cumprir as metas penalizando os rendimentos das famílias e das empresas? Não, não está. Mas é austeridade, dizem. Estamos a fazer uma boa gestão do Orçamento, coisa que a direita nunca conseguiu.
Mas se tiver consequências no funcionamento dos hospitais, das escolas, as pessoas também sentem…
Mas não está a ter.
Ainda esta semana houve uma greve numa escola de Lisboa porque não tinham funcionários…
Se começamos a falar de greves…
Há menos greves…
Há menos greves porquê? Porque os professores estão menos satisfeitos? Vamos vendo artigos, também publicados no Observador, sobre uma CGTP menos reivindicativa. Mas porquê? Porque faz menos greves. Porque não estamos a fazer aos trabalhadores famílias e professores, nem às famílias o que o Governo anterior fez. Não fazemos o mesmo que a direita fazia.
Esta “contenção”, se preferir à palavra austeridade, ou “boa gestão”, não tem efeito no serviços do Estado?
Ainda a semana passada anunciámos a contratação de novos assistentes operacionais, são os auxiliares educativos, aquilo de que falava há pouco que faltava numa escola. Onde há faltas e elas existem, estamos a dar resposta com a contratação de assistentes operacionais que já tinha sido anunciada pelo ministro da Educação. Não temos um sistema de Saúde ou de Educação desprotegido face ao passado. No Orçamento para 2017 há reforço da verba para a Educação e para a Saúde. Duas áreas que são importantíssimas para nós, porque ao contrário do PSD e do CDS, nós acreditamos mesmo no Serviço Nacional de Saúde e no sistema público de Educação.
Se estes 450 milhões de euros de cativações permitem que o Estado funcione de uma maneira aceitável porque é que não se tornam permanentes?
Porque utilizaremos essa margem que resulta da boa gestão para fazer outras coisas, para desenvolver o nosso estado social ou para fazer investimento. Fazemos é uma gestão melhor dos recursos públicos. Será uma batalha difícil para o PS. Mas há o mito que a direita gere melhor. A direita externaliza serviços públicos, privatiza serviços públicos.
O PS fez isso durante muitos anos, aliás, a externalização de serviços e as PPP começou a ser feito em anos de Governos do PS…
Podemos fazer um debate sobre a história do PS para mostrar que as peças principais do Estado Social que conhecemos foram peças do PS… Se houve algumas coisas que fizemos e que agora fazemos de diferente? Não fizemos nenhuma privatização e fizemo-las no passado. E não as fazemos só porque o PCP e o Bloco não querem. Não fazemos porque nem sequer estava no programa eleitoral do PS. Da mesma forma que queremos desenvolver o nosso Estado Social. Acreditamos seriamente nele e não fazemos desperdício com recursos públicos, desperdício da direita. É importante para muita gente que escreve no Observador e o lê. Desperdício da direita: é um debate que já tivemos várias vezes com jornalistas eminentes, mesmo aqui neste jornal. Havia um desperdício claro no sistema de educação público que era responsabilidade da direita, que financiava oferta privada mesmo onde havia oferta pública. Não há gestão pior, é de quem nunca geriu uma empresa, não otimizar os recursos que tem. É de quem nunca geriu uma empresas achar que é inteligente do ponto de vista da gestão estar a financiar um oferta privada quando há uma capacidade pública.
O Bloco de Esquerda tem esse argumento para a Saúde, é transponível para a Saúde?
Mesmo do ponto de vista liberal, termos um Estado a financiar rendas ou a garantir rendas à atividade privada vai contra tudo aquilo que pode dizer quem acredita verdadeiramente no mercado. O setor de calçado, têxtil ou vestuário também não se importava que o Estado todos os anos fizesse encomendas de sapatos ou de mobiliário que lhe garantisse uma renda certa. Não pode ser assim, sobretudo quando há oferta pública excedentária.
Mas é transponível para a Saúde o que se fez na Educação?
Claro que é. E é por isso que um dos objetivos deste Governo é internalizar de forma gradual, porque na Saúde a situação não é exatamente igual à Educação. Enquanto na Educação temos oferta pública excedentária e podemos fazer isso de forma mais rápida, na Saúde não. Não queremos, no processo de internalização de alguns serviços, reduzir os cuidados de saúde prestados à nossa população. Por isso, toda a política deste Governo é feita com moderação.
Orçamento: Se o PS tivesse maioria “provavelmente” o OE seria diferente
O Ministro das Finanças na apresentação do Orçamento disse que tinha expectativas positivas sobre a apreciação da Comissão Europeia. O Governo tem alguma indicação nesse sentido?
A indicação que temos é a que decorre do trabalho e da relação que o nosso ministro das Finanças tem com Bruxelas.
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Vem de uma família ligada à indústria da maquinaria do calçado. Chegou a trabalhar na fábrica do seu pai?
Sim, quando terminei o curso, entre 2011 e 2015. Aquilo que fazia na administração da empresa era trabalhar e acompanhar o trabalho da administração. Nomeadamente do presidente do conselho de administração que é ainda o meu pai.
Nunca lhe passou pela cabeça ficar no ramo da família?
Gosto de política desde que me lembro de mim. Quando muitos dos meus colegas queriam ser astronautas e bombeiros eu gostava já de fazer intervenção.
Ser primeiro-ministro?
Não, não era ser primeiro-ministro. Era fazer intervenção. Fazia isso na escola secundária, na associação de estudantes, continuei a fazê-lo no movimento estudantil da faculdade e estive na Juventude Socialista desde muito cedo. Os meus pais, apesar de estarem ligados ao mundo empresarial e de terem empresas ligados aos equipamentos industriais, e ao setor do calçado mais em particular, foram muito ativos nos primeiros anos da nossa democracia.
Eram da Frente Eleitoral Comunista (marxista-leninista)?
Sim, da FEC-ML… E obviamente que a política esteve sempre presente na nossa família. Mesmo tendo o meu pai se transformado num detentor de capital.
Jerónimo de Sousa nunca o confrontou com o facto de ser um capitalista, parte do patronato e detentor dos meios de produção e explorador dos trabalhadores?
Não tenho essa visão do meu pai. Não vejo o meu pai como um explorador. O meu pai é um empresário com muita iniciativa que conseguiu na sua vida construir um grupo importante no meio — é a maior empresa do país de equipamentos industriais para o setor do calçado — e isso é um motivo de grande orgulho para mim. Sou um social-democrata, sempre fui e continuo a ser e não vejo o meu pai como um adversário da classe trabalhadora.
Jerónimo de Sousa nunca brincou consigo a esse respeito?
Não. Jerónimo de Sousa é um líder político com grande capacidade empática, como é conhecido. Mas o trabalho que temos é um trabalho político muito sério. O que não quer dizer que não haja espaço para o humor.
Neste Orçamento esse contacto foi sendo feito?
Hoje, no quadro do semestre Europeu, o contacto e a relação com a Comissão e os Estados é permanente e contínuo. A expectativa que temos, que decorre do trabalho que é feito com a Comissão é de que as coisas correrão bem também nessa frente.
Há margem de resposta, se houver alguma surpresa ou reserva da Comissão face a alguma orientação que venha no OE?
É um erro tremendo fazer-se especulações que ainda para mais não têm base.
A base é a da negociação do Orçamento do Estado para 2016, onde o Governo foi obrigado a retirar do seu plano inicial algumas medidas que tinham sido acordadas com os parceiros.
Era um erro, enquanto governante, enquanto membro do Governo estar a fazer especulações quando a nossa expectativa, muito forte, é de que as coisas vão correr bem na frente externa. E na nossa negociação com a Comissão Europeia. Portanto, são os tipos de comentários que não são avisados serem feitos. E que eu não faço.
Francisco Assis escreveu um artigo de opinião no Público na quinta-feira, uma análise ao Orçamento do Estado para 2017, onde diz que António Costa revela que está mais preocupado com Bruxelas do que com o BE e o PCP. Também diz que a proposta orçamental está substancialmente mais próxima das opções políticas e programáticas do PSD do que da doutrina do Bloco de Esquerda. Concorda com esta análise que o Francisco Assis faz do Orçamento do Estado?
Não vou fazer nenhum comentário direto sobre aquilo que algum camarada…
…é a análise de um socialista destacado.
Isso de socialistas destacados eu só na minha concelhia, que é São João da Madeira, conseguia dizer mais cem.
Um socialista destacado e crítico desta solução governativa.
Está bem. E a única coisa que lhe posso dizer é que nós que estamos a trabalhar todos os dias cá. Sabemos melhor do que quem não está aquilo que é o programa, o caderno, as exigências dos nossos parceiros. E mesmo os que não estão no contacto direto com os nossos parceiros, que vão acompanhando a atualidade política portuguesa, conseguem perceber sem grande esforço que o PCP, o BE e o PEV, não estão contra aquela que é a proposta deste Orçamento.
Mas também não o acham de esquerda. Catarina Martins disse isso claramente.
Não vou comentar as entrevistas nem as declarações dos nossos parceiros. O que é que nos interessa enquanto Governo? Resultados. E aquilo que nós estamos a ter neste momento é o que nós dissemos desde o início. É que era possível cumprirmos as metas orçamentais, os compromissos europeus, ao mesmo tempo que estávamos a melhorar no concreto a vida das pessoas.
Mas porque é que ainda não é suficiente para os parceiros dizerem que este é um Orçamento de Esquerda? Ele inclui uma série de medidas acordadas com os partidos, por isso é que lhe faço esta pergunta.
Este Governo tem o apoio de quatro partidos. E não é um Governo de maioria absoluta. Por isso, é no trabalho entre estes quatro partidos que chegamos, trabalhando nas nossas convergências, a um bom documento. O Bloco de Esquerda se estivesse a governar com maioria absoluta faria um Orçamento diferente? De certeza. O PCP se estivesse a governar sozinho faria um Orçamento diferente do do BE? De certeza absoluta. E o PS se estivesse a governar sozinho faria também? Provavelmente. Há um tipo de intriga que tem de ser arredada do debate político. Porque hoje vivemos numa democracia saudável, em que há partidos que defendem pontos de vista diferentes, e que são capazes de trabalhar em conjunto para construir soluções.
Ideologia: “A nossa visão de sociedade está mais próxima dos nossos parceiros que da oposição”
O PS está disposto a construir “uma alternativa global ao sistema capitalista” como foi o apelo de Mariana Mortágua ao PS num evento do partido recente e que deu imensa polémica? Faz sentido para o PS este tipo de apelo? Este tipo de linguagem?
O PS respeita as declarações, os programas, dos nossos parceiros. Como, aliás, respeita também os da nossa oposição. Não vou comentar as declarações.
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↑ Esconder
Qual é a sua vida além da política. O que gosta de fazer?
Tenho, como os outros portugueses, uma vida privada.
Tem tido tempo para essa vida?
É mais dificultada durante o processo orçamental, mas tenho amigos, tenho família, gosto de ler, de ouvir música, de ir a concertos, de cinema. A minha mulher gosta mais de futebol que eu.
Qual foi o último concerto que foi ver, a última peça de teatro, já que também foi ator na faculdade?
Fui do grupo Capicua. Os últimos concertos, infelizmente, foram no festival NOS Alive. Tive oportunidade de ver, mais uma vez, uma das minhas bandas favoritas, Arcade Fire, e outras. A última vez que fomos ao teatro já tem algum tempo. Mas temos de continuar a tirar tempo para nós porque a família exige e nós não podemos falhar. Até porque quando as coisas nos começam a correr mal na vida privada e estamos infelizes na vida privada não conseguimos fazer bem o nosso trabalho.
Leu o livro do arquiteto Saraiva?
Não, não li. Sinceramente, tenho uma lista tão grande de livros para ler à espera de tempo. Esse não está nem sequer nessa lista.
José Sócrates é um incómodo para o PS?
Não. Acho que o PS sabe lidar bem com a sua história, com o seu passado e presente. Não temos qualquer tipo de problema sobre essa matéria.
Mas pode concordar.
Estou a falar do PS. Estou a dizer que não comento declarações que são do direito e da autonomia de cada partido e de cada dirigente de cada um dos partidos. O PS é, como aliás já tive oportunidade de dizer várias vezes, o único partido social-democrata em Portugal. Desde sempre. Não é de agora. É um partido que faz parte da família da social-democracia europeia, da social-democracia mundial. Queremos é ter uma sociedade com maiores níveis de igualdade e com maiores níveis de liberdade, que na nossa opinião…
Mas não é uma alternativa ao capitalismo?
Esse é um debate é até anacrónico. Porque não existe isso de “capitalismo”, nem existe isso de “socialismo”. Temos muitas sociedades com economias de mercado e propriedade privada de meios de produção muito diferentes. Quando estamos a falar da economia americana ou da sociedade americana, ou falamos nas sociedades ocidentais na União Europeia, estamos a falar de versões diferentes. E não há duas sequer. Portanto, esse é um debate anacrónico que não tem sentido. O que tem sentido é o PS afirmar aquilo que é a sua visão da sociedade. E a nossa visão da sociedade é de facto muito diferente da da direita, do PSD e do CDS.
A visão de sociedade do PS é mais distante da do Bloco e do PCP do que do PSD e do CDS…
Discordo, em absoluto.
A visão de sociedade do PS é mais próxima da visão de sociedade do PCP?
O que nós estamos a fazer neste momento em Portugal, era impossível ser feito com o PSD e o CDS.
Mas a pergunta não é essa. A pergunta é: a visão de sociedade do PS está mais próxima da do PCP e do BE, do que do PSD e do CDS?
Mais importante do que a proclamação que me está a pedir para fazer, é nós estarmos a governar com PCP e com Bloco e não com PSD e com o CDS. Mais importante do que a proclamação que está a querer que eu faça é nós já estarmos a governar há um ano com PCP e com Bloco de Esquerda. O que queria dizer, em resposta à sua inquietação, é que só temos uma visão da sociedade, nós trabalhamos todos os dias para a concretizar e aquilo que eu também estava a dizer é que aquilo que nós estamos a fazer…
A pergunta não era essa.
Posso é não estar a dar a resposta que queria. Mas estou a dar a resposta que acho que devo dar perante a pergunta que me faz… Se estou a dizer que não conseguíamos fazer com PSD e o CDS, a nossa visão está mais próxima da dos nossos parceiros do que da nossa oposição. Porque se estivesse mais próxima da nossa oposição e nós achássemos que era com eles que devíamos concretizá-la, era com eles que estávamos a governar. Só que não conseguíamos ter uma escola pública, universal, tendencialmente gratuita para todas as nossas crianças com o PSD e o CDS. Nós não conseguíamos ter um Serviço Nacional de Saúde público e tendencialmente gratuito, com PSD e CDS. Não conseguíamos atualizar as pensões, com PSD e CDS. Não conseguíamos fazer justiça aos trabalhadores do Estado com o PSD e o CDS. Nós não conseguíamos reduzir a sobretaxa e eliminá-la, ao ritmo que estamos a fazer, com PSD e CDS. Não conseguíamos aumentar o abono de família e adotar as políticas de apoio às pessoas com deficiência, como estamos a fazer com PCP e Bloco, não conseguiremos fazer com PSD e com o CDS. A visão de sociedade que temos, com maior coesão, com maior igualdade, com maior respeito por quem trabalha e por quem trabalhou uma vida inteira, nós não conseguíamos concretizar com dois partidos que têm uma visão profundamente liberal da nossa sociedade, que entendem que as reformas que o país tem de fazer é continuar a privatizar, a desregulamentar a legislação laboral, a liberalizar os nossos mercados. Temos uma visão muito diferente daquela que o PSD e o CDS têm. E é por isso que nós não estamos a governar com eles e estamos a governar com partidos que, tendo uma origem ideológica diferente da nossa…
Uma visão de sociedade, neste caso.
Para sermos justos, não estamos a fazer uma interpretação daquela que é uma visão de sociedade do BE e PCP.
Não é uma interpretação.
É a sua. Porque está a dizer que eles têm uma visão… Não sei qual é a visão que tem na sua cabeça. Qual é a visão que o PCP e o BE têm na cabeça deles?
Tem dúvidas?
Que é para percebermos do que estamos a falar. Porque se eu…
Tem dúvidas sobre a visão de sociedade do Partido Comunista
Diga-me então. Eu trabalho com eles todos os dias.
E não nota essa marca ideológica?
Trabalho com PCP todos dias. E o PCP em nenhum momento disse: ora bem, temos de sair do Euro, temos de sair da NATO, temos que nacionalizar todas as empresas em Portugal. E portanto…
Mas é o que o PCP defende.
Não sei do que está a falar.
É disso que me está a dizer. Acabou de me responder.
Não. Não. Estou a dizer que nada disto nos é colocado nas nossas reuniões.
Mas a minha pergunta não foi essa.
Então para não estarmos aqui em dissonância, vamos tentar perceber qual foi a pergunta.
A minha pergunta, desde o início, não é a atitude pragmática que estes partidos têm de apoiar o governo. É se o PS está mais próximo da visão de sociedade do PCP e do BE, do que da visão de sociedade do PSD e do PS.
É essa a pergunta. Pronto. Que é para tentarmos encontrar aqui um entendimento comum como nós costumamos fazer com os parceiros.
E só para situar a pergunta: são dois partidos que, tal como o PS, aceitam a democracia liberal e o funcionamento dos mercados, depois têm diferenças. E o PCP e o BE, têm visões muito diferentes em relação a isso.
O que é que isso quer dizer. Que eles não defendem a democracia liberal em que nós vivemos.
Não defendem o funcionamento dos mercado livre como defende o PS.
Porque assim nós já começamos a falar. Quando estamos a falar de mercado livre estamos a falar do quê? Privatizar a educação?
Não. Não estamos a falar nada disso. Estamos a falar por exemplo de nacionalizar toda a banca, por exemplo. Aquilo que disse. Acabou de enunciar quatro pontos.
Isso não está sequer… Eu estava-lhe a dizer porque como não concretizava eu tive de tentar perceber do que é que estava a falar. Isso não está no discurso do PCP que eu saiba nem do do Bloco, nem há nenhuma exigência desse ponto de vista na relação connosco.
Eu não estou a falar na negociação com o PS. É a visão de sociedade, em que defendem de facto a saída do Euro, da Europa, da NATO. Isso é uma visão de sociedade.
Mas está a ver como nós caricaturamos as posições dos outros partidos.
Não. Está escrito. Isto não é nenhuma caricatura.
O PCP não defende a saída da NATO, por exemplo. Nós temos muito trabalho para fazer, temos até a obrigação de fazer um trabalho maior sobre aquilo que são os programas do PCP e do BE. Porque quando vemos debates sobre o PCP e o BE sistematicamente assistimos à reprodução de caricaturas. Vejo alguns a falar sobre o PCP e o BE como se tivessem parado em 1975 ou nas vésperas de 1989. Tenho uma mesma ideia sobre o mercado livre que tem o PSD e o CDS? O sonho do CDS é haver cheque ensino na Educação. O sonho do PSD, que há de ser provavelmente o mesmo, mas não assumindo o horizonte, quer paulatinamente desviar recursos públicos para o financiamento da escola privada. Isso é outro mundo. Não é o nosso. Mas este é o programa do PSD e do CDS. Esta é a visão que eles têm do mercado. Entregar ao mercado as funções sociais do Estado. E nós somos contra isso. Como é o PCP e como é o Bloco de Esquerda.
Rocha Andrade: “Não sei quanto foi devolvido à Galp”
O secretário de Estado Rocha Andrade tornou-se um problema para o Governo?
Não. Temos no secretário de Estado dos Assuntos Fiscais um dos nossos melhores elementos. Altamente qualificado, regente de Finanças Públicas numa universidade portuguesa e que tem feito um trabalho muito importante para esta solução de Governo. Por isso, não é nenhum problema. Antes pelo contrário. É um elemento muito importante.
Ele não se excedeu agora com esta suposta lista de impedimentos?
Parto do princípio de que todos tenhamos percebido que ele diz o óbvio. Percebo que o PSD queira fazer jogo sobre todo para tentar não fazer um debate sobre um Orçamento do Estado com o qual não estão a saber lidar muito bem. Com exceção de Maria Luís Albuquerque, que assumiu que é mesmo assim. Porque no quadro do Código de Procedimento Administrativo e também do Código de Conduta que foi aprovado estão definidas com clareza e transparência as situações sobre as quais qualquer detentor de cargos públicos não pode decidir. E, obviamente, todos nós tivemos uma profissão antes ou temos familiares a trabalhar em empresas. Sobre todas as entidades com as quais há uma relação profissional ou familiar é suposto um detentor de cargos públicos estar inibido de decidir.
Mas também é suposto não ter ido ver um jogo da seleção a convite de uma empresa e foi.
Isso é outra pergunta.
Quanto é que foi devolvido à Galp?
Também não sei quanto é que foi devolvido, mas provavelmente foi devolvido aquele que era o custo da viagem, porque foi esse o compromisso.
Porque é que isso nunca foi divulgado?
Não sei, não tenho essa informação.
Mas é uma questão importante, certo? Não há essa transparência.
Aquilo que posso dizer sobre isso é que é tema que já foi amplamente comentado. Essas viagens foram feitas, a interpretação do Governo é a de que isso estava no quadro da adequação social. Mas a verdade é que há um grau de exigência na nossa sociedade que vai evoluindo. Ainda bem. Os cidadãos são cada vez mais exigentes com os detentores de cargos públicos e há, também, um acompanhamento desse grau de exigência. No decurso desse episódio, concretizamos aquilo que já estava previsto e anunciado no programa eleitoral e de Governo, a aprovação de um código de conduta, que é também uma novidade nos executivos portugueses. E permite dar previsibilidade, transparência àquilo que pode ser feito. Nós não estávamos no campo da ilegalidade.
Devia ou não o Governo divulgar o valor da restituição?
Os membros do Governo prontificaram-se a fazer a devolução. Não sei o valor. A única coisa que vos posso dizer é aquilo que já vos disse. Não tenho informação sobre quanto é que os voos custaram. Não quero fazer nenhum juízo sobre isso porque o mais relevante já foi assumido do ponto de vista político. Os membros do Governo que fizeram as viagens fizeram uma interpretação da norma legal que, na ótica deles, não faria..
A diferença é saber se foram 100 euros, 500 euros ou mil euros que foram restituídos. Isso é importante saber-se, não concorda?
Foi o valor da viagem. Não sei o valor.
A questão não é o valor, é saber se não é importante termos essa informação pública.
Mas já disse que não tenho essa informação e não quero fazer nenhum juízo sobre isso. O mais relevante sobre essa matéria já foi dito. Foi devolvido o custo, foi assumido.
Sabe se alguma vez Fernando Rocha Andrade colocou o lugar à disposição do primeiro-ministro?
Não faço ideia. Julgo que não, mas não faço ideia.
Está num cargo onde já esteve o atual primeiro-ministro, num Governo em que também era preciso bastante negociação, em que o PS não tinha maioria absoluta e onde esteve o atual Presidente da República, que também foi secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares. A sua ambição é liderar o partido e ser primeiro-ministro no futuro?
A minha ambição não vos vai satisfazer. A minha ambição, e esta é verdadeira e genuína, é trabalhar todos os dias para garantir que este Governo dura os quatro anos. Dura os quatro anos e consolida os resultados.
Estamos a falar a mais longo prazo, é indiferente deste Governo.
Julgo que na entrevista que dei ao Observador há um ano me fizeram essa mesma pergunta.
E tem razão de ser, é uma figura muitas vezes colocada como um futuro líder do PS.
A única coisa que vos posso dizer, sem que se chateiem, é que é uma resposta que não dou. A única coisa que posso dizer é sobre o momento que estou a viver. E o momento presente é o desafio que tenho. E o desafio que tenho é, com o meu trabalho, o meu gabinete e a minha equipa, trabalhar todos os dias na relação com o grupo parlamentar do PS e com o Governo e parceiros para garantir que continuamos a fazer o trabalho bem feito que temos feito até agora.
Pode ver aqui a entrevista completa: