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Os vencedores
Rui Rio
Um partido com a história do PSD perde sempre que não fica em primeiro, ainda para mais numa região que governou de forma hegemónica até meados dos anos 1990. Mas a gestão de expectativas, em política, é tudo. E estas regionais, para o PSD, eram vistas como uma corrida quase para cumprir calendário e, com vento a favor, ir desgastando o PS para apostar forte na mudança de ciclo em 2024. Nesse desgaste cabia o objetivo número um: retirar a maioria absoluta ao PS. Começou assim, mas o PSD acabou a noite eleitoral sonhar recuperar o governo da região, que lhe escapa há 24 anos. Rui Rio envolveu-se q.b. na campanha e, é preciso não esquecer, o candidato foi o seu antigo vice-presidente. Bolieiro é um dos seus (e Rio não tem muitos). Para já, isto é uma meia-vitória, mas pode transformar-se numa vitória em toda linha se houver uma caranguejola — expressão de Carlos César de outros tempos — que una toda a direita em torno de um governo regional dos Açores liderado pelo PSD. A Rio ainda lhe sobra o ‘gostinho’ de ver Costa a dizer que ganha quem fica em primeiro. É maior do que o amargo de boca que terá de ter para engolir o sapo chamado Chega em troca do poder nos Açores. Certo é que entrou para a liderança do PSD a poder perder a Madeira e, na verdade, corre é o risco de ganhar os Açores.
José Manuel Bolieiro
Quem? A maioria dos militantes do PSD, a maioria dos portugueses e a chamada “corte lisboeta” não faz ideia de quem é José Manuel Bolieiro. Não raras vezes, escrevem-lhe mal o nome, esquecendo o primeiro “i”. Mas Bolieiro não é propriamente um desconhecido para os açorianos e foi presidente da câmara de Ponta Delgada. Era um homem próximo de Passos, de quem foi mandatário regional em eleições internas, mas isso não o impediu que Rio, o descentralizador, o convidasse para vice-presidente do PSD. Saiu para se dedicar a esta batalha e, em poucos meses, conseguiu não envergonhar o partido de Mota Amaral. Subiu quase 3% na votação e vai adormecer a pensar que pode ser o próximo líder do governo regional. Mesmo que acorde com a dura realidade que afinal não vai ser porque André Ventura não quer e os astros não se alinharam a seu favor, já fez mais do que lhe era exigido.
André Ventura
Não foi a terceira força, mas andou lá perto e conseguiu ter 5% dos votos e entrar na assembleia regional açoriana com dois deputados. Mais do que ser o quarto partido mais votado, o Chega conseguiu tornar-se indispensável para a direita. Caso PSD, CDS e PPM estejam empenhados em tirar o PS do poder nos Açores, precisam do Chega. Para já, André Ventura está a vender caro esse apoio com declarações contraditórias: quer afastar o PS do governo, mas não quer fazer parte de uma coligação de direita. As duas ideias não são conciliáveis, mas também não é a primeira vez que Ventura se desdiz. Seja como for, o líder do Chega conseguiu ter os holofotes nele e obrigará a direita que o ataca e marginaliza a normalizá-lo caso queira o poder nos Açores. Coloca, no mínimo, a direita com um dilema existencial. A somar a tudo isso, Ventura, que também é candidato presidencial, ganha aqui um élan para a corrida a Belém. É indesmentível neste momento: o Chega está a crescer.
Francisco Rodrigues dos Santos
Prevendo um hecatombe centrista nos Açores, os opositores do presidente do CDS começaram a chamar a atenção para as regionais como o primeiro grande teste do líder do CDS, que o podia deitar abaixo. Não deitou. O CDS desceu de 7,1% para 5,5%, mas manteve os três deputados na assembleia regional e mantém-se como único partido que é indispensável a qualquer um dos blocos. Tanto é hipótese para uma geringonça com o PS e PAN, por exemplo, como para uma caranguejola com PSD, Chega e PPM (seu parceiro de coligação no Corvo). Artur Lima era apoiante de Francisco Rodrigues dos Santos nas eleições internas e seu vice-presidente, o que ainda dá mais propriedade à vitória do CDS/Açores. O CDS regional dá-se melhor com o PS (e até aprovou orçamentos em que a maioria socialista bastava), mas Francisco Rodrigues dos Santos já sugeriu que prefere um acordo à direita. É um vencedor da noite eleitoral que pode ver a vitória transformar-se em meia-vitória (se o CDS der a mão e for para o governo com o PS, será difícil justificá-lo a nível nacional), em vitória (se o CDS for para o governo com o PSD) ou meia-derrota (ficar na oposição ao governo do PS).
IL e PAN
São pequenos, mas começam a tornar-se cada vez mais tradicionais e ganham sotaque açoriano nas suas fileiras. Iniciativa Liberal e PAN conseguiram eleger pela primeira vez deputados para a Assembleia Regional dos Açores. Entre os dois a vitória da IL é ainda mais clara porque que se torna peça fundamental para uma geringonça de direita e porque é a primeira vez que se submeteu a votos. Apesar de não terem o sucesso relâmpago do Chega, provam ambos que são partidos pequenos, mas que começam a ter implantação nacional.
Os vencidos
António Costa
É sempre pouco avisado traçar comparações entre lógicas nacionais e locais, mas a política tem destas coincidências: no mesmo dia em que perdeu o apoio de uma das pernas da ‘geringonça’ — o Bloco de Esquerda — e com ela uma maioria de esquerda clara e inequívoca na Assembleia da República, António Costa viu a maioria absoluta escapar ao PS nos Açores. O embaraço no discurso da noite eleitoral era evidente e facto de o socialista ter despido o fato de secretário-geral para vestir o de primeiro-ministro, fazendo uma intervenção redonda sobre a importância da resposta à crise pandémica, ignorando quase tudo o resto que acabara de acontecer, tornou tudo ainda mais bizarro. Sobre os Açores, o líder socialista limitou-se a dizer o óbvio: o PS ganhou e é o PS/Açores quem tem de arranjar forma de governar. Contas feitas, e apesar de ter um Orçamento do Estado aprovado e uma vitória nas urnas, António Costa parece ter iniciado um ciclo político diferente esta noite — e, provavelmente, mais conturbado.
Vasco Cordeiro
O facto de se ter comparado ao resultado que Carlos César conseguiu em 1996 diz muito sobre o choque que percorre as tropas socialistas. Há mais de 20 anos, o PS quebrou a hegemonia do PSD e venceu as eleições regionais, mas sem maioria; hoje, depois de dois mandatos, oito de maioria absoluta, Vasco Cordeiro perdeu cinco deputados e a maioria absoluta. Ainda assim, o presidente do Governo Regional dos Açores achou por bem comparar aquilo que foi um início de um ciclo vitorioso de mais de duas décadas com um aparente princípio de fim de ciclo. O socialista fez a campanha do drama (“Ou eu ou o caos”) e acabou a pedir claramente a maioria absoluta. Os açorianos não lhe fizeram o favor e Cordeiro acabou a noite a dizer que “quem ganha é quem forma governo”. Até podia ser assim, não fosse o passado recente desenhado… por António Costa. Os próximos tempos serão interessantes.
PCP
É, em definitivo, o maior derrotado da noite. Os comunistas foram varridos do mapa eleitoral açoriano e perderam o único deputado que tinham no Parlamento regional. Na reação ao resultado, Jerónimo de Sousa reconheceu que a perda de representação parlamentar pela CDU constitui um resultado particularmente negativo na vida política regional”. Não é para menos: o partido perde o deputado num contexto em que o PS é fortemente penalizado e em que o Bloco de Esquerda consegue crescer nas urnas, o que significa que o PCP não conseguiu capitalizar à esquerda o cartão amarelo aos socialistas. Se vale para António Costa, também vale para Jerónimo: as eleições regionais e locais não devem servir para comparações diretas com a política nacional; mas não deixa de ser curioso que este resultado surja depois de o PCP ter invertido a marcha de radicalização face ao PS que vinha seguindo desde o Orçamento Suplemento para agora ajudar a viabilizar o Orçamento do Estado para 2021.