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O novo Hospital de Lisboa Oriental, que será construído na zona de Chelas, vai contar com um sistema antissísmico — designado isolamento de base, confirmou ao Observador o Ministério da Saúde. O consórcio responsável pela construção, liderado pela Mota-Engil, aceitou fazer as alterações pedidas pelo Tribunal de Contas, no início de junho, de modo a incluir este sistema de proteção. Há outros dois hospitais, ambos na fase de planeamento, que vão incorporar o isolamento de base contra o sismos: o Hospital do Seixal e o Hospital Central do Algarve, confirma a tutela.
Depois da polémica em torno da inexistência de um sistema antíssísmico robusto no futuro Hospital de Lisboa Oriental (que vai agregar os serviços de sete hospitais da zona central de Lisboa, pertencentes à Unidade Local de Saúde de São José), o governo decide, assim, acatar a indicação do Tribunal de Contas para incluir o sistema de isolamento de base, considerado um dos mais eficazes e que já faz parte de unidades hospitalares em países de risco sísmico elevado.
Futuro Hospital de Lisboa Oriental terá de ter solução contra sismos, decide Tribunal de Contas
Num documento datado do final de maio, o Tribunal de Contas comunicou a concessão de um visto ao contrato de gestão do hospital (a construir em regime de Parceria Publico-Privada), mas avisou a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (entidade que era a titular do projeto e que, entretanto, foi extinta) de que estava obrigada a incluir no projeto de execução da obra uma solução de isolamento de base contra sismos — uma tecnologia utilizada há anos em países regularmente afetados por eventos sísmicos e que impede que os hospitais fiquem inoperacionais. Uma alteração ao projeto que o Ministério da Saúde garante que irá ser concretizada, tendo já recebido luz verde do consórcio que vai construir a unidade hospitalar.
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Impacto financeiro da proteção antissísmica é desconhecido
No entanto, o Ministério da Saúde não adianta que impacto financeiro terá a incorporação deste sistema no novo hospital. Há cerca de um mês, a CNN avançava que o consórcio liderado pela Mota-Engil tinha apresentado ao Ministério da Saúde uma fatura de 99 milhões de euros de modo a introduzir a tecnologia antissísmica no edifício. A confirmar-se, o custo de construção do futuro hospital (que vai contar com 875 camas) pode aproximar-se dos 500 milhões de euros, uma vez que o valor inicialmente estimado era de 380 milhões — dos quais 100 milhões são financiados através do Plano de Recuperação e Resiliência. Se for incluída a gestão, a 30 anos, e que inclui o financiamento, conservação e exploração do hospital, o valor eleva-se aos 732 milhões.
A polémica em torno da proteção antissísmica do novo Hospital de Lisboa Oriental arrasta-se há meses, depois de, em março, um grupo de 14 engenheiros (do Instituto Superior Técnico, das universidades de Aveiro, Coimbra, Nova/Lisboa, do Porto e do Instituto Politécnico de Setúbal), ter escrito uma carta aos juízes do Tribunal de Contas a pedir a recusa de visto ao contrato celebrado entre Ministério da Saúde e Mota-Engil. Os especialistas alertavam para o que consideravam ser um “erro histórico” no projeto, devido à falta do sistema de isolamento de base contra sismos.
“Caso um sismo de grande intensidade venha a ocorrer no período de funcionamento do Hospital de Lisboa Oriental, ele não poderá assistir as vítimas da catástrofe e terá de interromper tratamentos aos seus próprios doentes”, alertavam os engenheiros, citados pela CNN Portugal. Os também professores universitários garantiam que o projeto violava as melhores práticas internacionais de engenharia e avisaram que poderia provocar “muitas mortes evitáveis” e aumentar “numa proporção dantesca a necessidade de evacuação”.
Recorde-se que o Hospital de Lisboa Oriental, a construir e a ser gerido em regime de PPP, terá 875 camas e uma área de 180 mil metros quadrados, divididos por três edifícios.
ACSS recomenda sistema antissísmico nos hospitais desde 2007
Os juízes conselheiros do Tribunal de Contas ouviram as críticas e deram razão aos especialistas, exigindo à ARS que refizesse o projeto. Na visto prévio, os juízes conselheiros justificam a decisão com as boas práticas da construção antissísmica, que, sublinham, constam de um conjunto de “especificações técnicas para o comportamento sismo-resistente de edifícios hospitalares adotado pelo Ministério da Saúde em 2007 e revisto em 2020”.
O documento a que o Tribunal de Contas se refere é uma circular da Administração Central do Sistema de Saúde — disponível online na página daquela entidade da esfera do Ministério da Saúde — e em que se realça que “o isolamento de base é particularmente adequado para edifícios considerados essenciais, como os hospitais, que precisam de se manter totalmente operacionais após a ocorrência de um sismo”. O documento é baseado num parecer sobre as regras de segurança contra sismos que a ACSS pediu ao Instituto Superior Técnico. No entanto, as recomendações terão ficado na gaveta e o isolamento de base nunca terá sido aplicado a nenhum hospital construído depois de 2007.
Hospitais do Algarve e do Seixal também terão isolamento de base antissísmico, garante a tutela
Algo que está prestes a mudar. O Ministério da Saúde garante ao Observador que “os cadernos de encargos destes dois hospitais [o do Seixal e do Hospital Central do Algarve] já vão incluir o modelo de reforço antissísmico“, denominado isolamento de base, e que a mesma regra se vai aplicar a futuras unidades hospitalar a construir. O Hospital do Seixal, que dará apoio ao sobrecarregado Hospital Garcia de Orta, está em fase de elaboração de projeto, depois de o concurso ter sido impugnado judicialmente. Já o Hospital Central do Algarve, a construir numa zona entre Faro e Loulé, encontra-se também em fase de elaboração de projeto — estimando-se que venha a ter uma capacidade de internamento de 740 camas.
Já em relação aos dois hospitais em fase final de construção, o Hospital de Proximidade de Sintra e o Hospital Central do Alentejo, em Évora, a tutela diz apenas que os “dois projetos respondem às normas antissísmicas publicadas pela ACSS”. Ou seja, e considerando que a ACSS recomenda a incorporação do isolamento de base, estas estruturas estarão mais bem preparadas em caso de sismo de magnitude elevada.
PS Seixal repudia declarações da ministra da Saúde sobre hospital de proximidade
O isolamento de base tem por princípio isolar a estrutura das vibrações causadas pelos sismos, explica um documento da Universidade do Minho, assinado pelo engenheiro civil Nuno Mendes. Este sistema permite um melhor amortecimento das vibrações e uma redução das aceleracões, “relativamente ao comportamento de uma estrutura sem isolamento de base”. Segundo o documento, a aplicação da técnica de isolamento de base tem sido mais frequente em edifícios novos ou existentes de betão armado, sobretudo no Japão, nos Estados Unidos da América e em Itália. Na Turquia, foi incorporado em vários hospitais, que se mantiveram operacionais nas zonas afetadas pelos sismos de fevereiro do ano passado, que provocaram 60 mil mortos, lembra a CNN. Em Portugal, apenas o Hospital da Luz, privado, dispõe deste sistema.