Faltam quase dois anos, mas a máquina já está a funcionar. O novo ciclo eleitoral já começou e para a nova liderança do PSD só há uma meta possível: vencer as Europeias. “O Luís [Montenegro] quer ganhar, disso não há dúvidas. Ele sabe que é fundamental para depois vencer as legislativas”, diz um dos principais apoiantes do novo líder do PSD. “Falta saber como e com quem“, lembra outro membro do inner circle de Montenegro. Há na equipa do novo líder quem também defenda que é “extemporânea” a discussão, mas todos admitem que o novo presidente do PSD já tem “ideias na cabeça” sobre as Europeias. É preciso um candidato forte e já há vários cenários a ser ponderados nas hostes montenegristas.
A equipa de Luís Montenegro já identificou as principais dificuldades para o embate das próximas Europeias: um PS a querer uma “hegemonia total” e “respaldado pela maioria”, a “desmobilização das bases” do PSD (algo que vão tentar contrariar nos próximos dois anos), o “crescimento do Chega e da IL” e uma “teoria da compensação” em que o antigo eleitorado centrista favoreça o CDS em choque pelo desaparecimento da AR. A estratégia e os vários cenários equacionados partem desta difícil realidade.
Luís Montenegro reconhece ainda que fazer melhor do que em 2019, não chega, já que o resultado foi historicamente baixo: menos de 22% dos votos. O objetivo é, mesmo, o primeiro lugar. Falta o candidato.
A hipótese out-of-the-box: o candidato Moreira
Nos últimos quatro dias de campanha das internas do PSD, Luís Montenegro encontrou-se por duas vezes com Rui Moreira: num almoço informal na Casa do Roseiral, a 24 de maio, e numa conversa nos Paços do Concelho, a 25. O presidente da câmara do Porto recebe muitos políticos-candidatos (aconteceu nas Presidenciais e nas Legislativas) em plena campanha eleitoral, mas o facto de ter recebido um candidato a umas eleições internas teve de imediato várias leituras nas hostes sociais-democratas.
Há uma primeira razão para esta aproximação que está relacionada com o pragmatismo de Rui Moreira. O presidente da câmara do Porto precisava dos votos do PSD (da abstenção) para conseguir aprovar a saída da autarquia da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), o seu mais recente cavalo de batalha. Conseguiu-o contra a vontade do antigo candidato à autarquia (Vladimiro Feliz, que apoiou Jorge Moreira da Silva nas diretas), mas com o apoio do presidente da distrital do PSD/Porto e apoiante de Luís Montenegro, Alberto Machado.
Apenas três dias depois das diretas que ditaram a sucessão de Rui Rio, os deputados municipais do PSD, fiéis a Alberto Machado, abstiveram-se na Assembleia Municipal do Porto, o que foi essencial para Rui Moreira consumar o “ANMPexit”. Esta nova aliança — que pode ser útil a Moreira em outros momentos do atual mandato — foi vista por Luís Montenegro como uma oportunidade. Isto porque um acordo com Rui Moreira — em que este tivesse uma palavra a dizer sobre o candidato apoiado pelos sociais-democratas — pode ser fundamental para que o PSD consiga reconquistar a segunda autarquia do país nas autárquicas de 2025.
Na nova sociedade Montenegro-Moreira, alguns dos apoiantes do novo presidente do PSD viram outra oportunidade: a de o agora autarca ser o candidato “fora da caixa” do PSD às Europeias. “Sabemos que, se quisermos ganhar, temos de ter um nome não só forte, mas que roube eleitorado ao PS e a outros. Só o facto de o candidato ser independente aumenta a hipótese de o PSD ser mais catch all. E Rui Moreira encaixa claramente nesse perfil“, explica um destacado apoiante de Luís Montenegro ao Observador.
Um outro apoiante deo novo presidente diz que “ainda é muito cedo” para pensar em nomes para as Europeias, mas regista que “Rui Moreira tinha um efeito positivo: condicionar a Iniciativa Liberal ou forçá-los a uma coligação pré-eleitoral connosco”.
Uma federação de centro-direita para vencer?
Luís Montenegro ainda não excluiu nenhuma hipótese, nem sequer coligações pré-eleitorais com outros partidos. Por princípio, regista um destacado apoiante do novo líder, o “PSD vai sozinho a votos”. Ou seja: “Só circunstâncias muito execionais poderiam ditar uma coligação pré-eleitoral”.
Um dos cenários possíveis seria juntar PSD, IL e CDS numa coligação pré-eleitoral que, no entender de alguns estrategas sociais-democratas, poderia atirar “o resultado para a casa dos 30%/34%, o que, em Europeias, é quanto baste para ficar em primeiro”. Como o círculo é nacional, funciona por eleição de mandatos, e não há qualquer hipótese de haver “geringonças”, o que “mais interessa” no resultado das Europeias — dizem as mesmas fontes sociais-democratas — é a “perceção pública“. “Se o candidato do PSD ficar à frente do PS em 2024, a mensagem que vai passar é que o PSD venceu as eleições, que o PS do Costa está a desgastar-se e o balão vai encher para as legislativas”, analisa um apoiante de Luís Montenegro.
Há aqui, regista outro apoiante de Montenegro, vários obstáculos: “A IL quer ir sozinha para se afirmar e não está interessada a colar-se ao PSD e, do que li, o Nuno Melo já disse que o CDS vai sozinho”. De facto, o líder centrista, em entrevista ao Observador, disse-o de uma forma muito taxativa: “O CDS vai sozinho a votos”.
Um outro apoiante desde a primeira hora de Luís Montenegro explica que uma solução agregadora do espaço não-socialista “também dependeria muito do candidato”. E é aí que entra novamente Rui Moreira, que podia ser um candidato consensual entre estes três partidos: o PSD do seu novo aliado Montenegro, mas também na CDS e IL, dois partidos que o apoiam e que, com ele, estão no executivo municipal.
Em abril, antes ainda desta aproximação a Luís Montenegro que maio trouxe, Rui Moreira deixou claro em entrevista ao Diário de Notícias e à TSF, que não se imagina a “fazer outra coisa política”. E deu um exemplo: “Agora fazer outra coisa qualquer, como ser deputado municipal, não me parece muito interessante para um presidente de câmara”. Ainda assim dizia que não se deixará nunca de se preocupar com “a realidade nacional, a realidade regional e a cidade [do Porto]”.
Rui Moreira nunca deixou de ter também uma preocupação com a visão nacional, como se prova pelas “guerras” que vai comprando com o poder central (mais uma vez, é disso exemplo a saída do Porto da ANMP). Aliás, em 2009, antes de ser candidato autárquico, Rui Moreira chegou a ser apontado por um dirigente centrista (na altura o líder da JP) como um “bom candidato” em quem o CDS devia apostar.
Há, no entanto, várias declarações de Rui Moreira que vão no sentido de querer ter uma vida de intervenção pública mais pela via da opinião (como comentador) do que propriamente embarcar em novos voos políticos. Um membro do seu movimento também se mostra cético quanto à hipótese de ser candidato nas listas do PSD às Europeias, lembrando que a “cadeira de sonho” de Rui Moreira é outra: “É muito mais fácil ele ser candidato a presidente do Futebol Clube do Porto do que a Bruxelas. Isso é garantido”. Nesse particular, há mais uma sintonia com Luís Montenegro: Rui Moreira é o vice-presidente do Conselho Superior do FC Porto, do qual o novo líder do PSD também é membro.
Albuquerque: o protocandidato vindo da Madeira
O namoro de Luís Montenegro com a Madeira começou ainda antes das diretas e até antes das legislativas. O cabeça de lista dos montenegristas foi o presidente da câmara do Funchal, Pedro Calado, que foi número dois de Miguel Albuquerque no Governo regional. Calado foi, depois, mandatário da candidatura de Montenegro nas diretas, que teve o apoio não só do anterior presidente do governo regional, Miguel Albuquerque, como também do seu antecessor, Alberto João Jardim.
No PSD/Madeira era comentado entre dirigentes e caciques locais que Alberto João Jardim deu o seu apoio a Miguel Albuquerque numa perspetiva de estar a promover uma mudança no próprio governo regional. Jardim prefere Pedro Calado (por oposição a Albuquerque) à frente dos destinos da região e a ideia dos jardinistas era Miguel Albuquerque não avançar para um terceiro mandato à frente da região em 2023 e avançar como cabeça de lista às Europeias em 2024.
Mas há sinais contraditórios. Publicamente, Miguel Albuquerque já deu sinais de que quer fazer mais um mandato à frente do Governo regional. Em fevereiro, quando foi reeleito presidente do PSD/Madeira disse que a sua ideia é “fazer o último mandato de Governo em 2023” e acrescentou que “só circunstâncias excecionais é que vão alterar esse compromisso”. Isto significa que, de 2023 a 2027, Albuquerque estaria comprometido com a região e não poderia ser o candidato às Europeias. Resta saber se ser candidato às Europeias se enquadra nas “circunstâncias excecionais”.
Manter os adversários próximos (mas longe)
Há duas hipóteses que colhem menos entusiasmo do que as anteriores nos mais próximos de Luís Montenegro, mas que já foram veiculados entre dirigentes locais do partido e membros da candidatura: Paulo Rangel e Jorge Moreira da Silva.
A hipótese Jorge Moreira da Silva como candidato às Europeias (caso perdesse a corrida interna) circulava ainda antes das eleições diretas, que teria a utilidade de ser visto como uma prova de unidade e pluralidade interna. O próprio Moreira da Silva, quando confrontado pelo Observador numa entrevista antes das Europeias, negou essa intenção: “Não. Não voltarei obviamente ao Parlamento Europeu. Fui eurodeputado durante quatro anos, gostei muito dessa função, mas não se volta para uma função onde já se foi feliz. Vim para Lisboa para fazer política independentemente do resultado que resulte desta eleição.”
Na noite eleitoral, após a derrota, Jorge Moreira da Silva mostrou-se disponível para ajudar o partido nas batalhas que vai ter. Esclareceu depois que não aceitaria nenhum cargo “executivo” na direção de Luís Montenegro, mas não excluiu ser candidato pelo partido em eleições. Entre os membros da equipa do vencedor, já com os 70% no bolso, há a ideia de que Moreira da Silva não tem “peso eleitoral” para umas eleições com a importância das Europeias.
Há também a hipótese Paulo Rangel, que permitiria a Luís Montenegro fazer o mesmo que Rui Rio fez na em 2019: condicionar um potencial adversário interno e vinculá-lo aos resultados. Uma derrota nas Europeias de 2024, seria também uma derrota de Rangel. Já uma vitória de Rangel seria um bilhete dourado para Luís Montenegro avançar para as legislativas. Por outro lado, um dos apoiantes de Montenegro afirma ao Observador que Rangel já está “desgastado” junto do eleitorado, lembrando que “veio sempre a perder votação nas três eleições em que foi cabeça de lista”.
Em entrevista ao Observador no Congresso do PPE, em Estrasburgo, Paulo Rangel elevou a fasquia: “O PSD é sempre um candidato a ganhar as Europeias. É evidente que essa vai ser a sua meta. Não tenho dúvidas nenhumas que a nova liderança de Luís Montenegro tem essa perspetiva e essa ambição”.
Rangel e Moreira da Silva estão, no entanto, para já, longe das preferências da equipa de Montenegro. Até porque o novo líder, embora garanta que não prometeu lugares, também tem de corresponder às expectativas de quem o apoiou. O antigo eurodeputado Carlos Coelho, por exemplo, foi o diretor de campanha de Montenegro e será uma escolha natural para a lista, mesmo que não seja para número um.
Os nomes antes do nome
Ainda antes de decidir o nome candidato às Europeias (a escolha que pode ser a mais decisiva do mandato), Luís Montenegro tem de formar a sua direção. O novo líder está, segundo explicaram ao Observador fontes da candidatura, a “falar com muitas pessoas, para a aferir da disponibilidade, mas ainda não fez convites para nenhum cargo em específico”.
O antigo líder parlamentar, Hugo Soares, é o homem em quem Luís Montenegro mais confia e, por isso, ocupará o cargo em que se sentir mais confortável. Nomes como Pedro Alves, Pedro Duarte ou Pedro Reis também devem integrar os órgãos nacionais com mais influência e decisão, como a comissão política. Certo é que, apesar de querer dar um sinal de “unidade”, Luís Montenegro vai querer ter uma comissão permanente em quem confia. Ou seja: a comissão política (alargada) até pode ter vogais de outras fações do PSD, mas, em princípio, a Comissão Permanente (que inclui os vice-presidentes) será composta por pessoas da confiança de Montenegro.
Os convites oficiais vão começar a ser feitos na “semana dos feriados” e, apesar de Montenegro querer guardar alguns nomes para o Congresso (Passos Coelho, por exemplo, fazia os convites durante o decorrer dos trabalhos — condicionando a ação de críticos e apoiantes), alguns nomes devem ser conhecidos já no final da próxima semana.