Comer doze passas, usar lingerie azul, subir a uma cadeira e brindar com espumante, vale tudo para entrar no ano novo com o pé direito. E seja qual for a superstição de cada um (ou mesmo a falta dela), o fogo de artifício é o fundo garantido para quase todas as celebrações, sejam elas caseiras ou em multidões a assistir a concertos. Quem atira os foguetes e apanha as canas são as autarquias e, no caso da Madeira, o Governo Regional, que entre contratos publicados no Base e gastos ainda não submetidos no portal para a transparência, já gastaram cerca de três milhões de euros. O valor distribui-se em despesa com espetáculos de pirotecnia, concertos e toda a produção das celebrações que dão por terminado 2023 e celebram a chegada de 2024.
Aos gastos diretos com os festejos de fim de ano subtrai-se a despesa pública em iluminação, já contabilizada pelo Observador, que serve para adornar as cidades no Natal, mas também no réveillon. Foram desembolsados de forma direta 10 milhões e 674 mil euros em luzes festivas em todo o país.
Um milhão para fogo de artifício e concertos em Lisboa e no Porto
Menos de um quarto de hora de fogo de artifício em Lisboa — no Terreiro do Paço e Parque das Nações — equivale a 300 mil euros pagos pela Empresa de Gestão de Equipamentos e Animação Cultural (EGEAC). Na capital, as boas vindas a 2024 também serão celebradas com atuações da banda “Os Quatro e Meia” e do Dj Nuno Luz. Questionada pelo Observador, fonte oficial da empresa municipal revela que o custo com artistas, estruturas de palco, audiovisuais, som e luz e equipas técnicas ronda também os 300 mil euros. Assim, toda a festa de réveillon na capital vai custar 600 mil euros aos cofres públicos.
Foi publicado a 28 de dezembro o contrato relativo aos espetáculos da passagem de ano em Lisboa. As obrigações imputadas à empresa contratada na modalidade de ajuste direto vão desde assegurar os “serviços de limpeza e vigilância necessários”, até à colocação de “vedações, plantas, camarins, estrados e mobiliário de orquestra” no palco que será instalado na Praça do Comércio. À parte deste contrato, foi realizado outro, no valor de 20 mil euros, também por ajuste direto, para a “locação de contentores e camarins” destinados ao apoio dos artistas que vão atuar no centro de Lisboa na última noite do ano.
Na segunda maior cidade de Portugal, o orçamento global dos festejos da passagem de ano é de 400 mil euros. Ao Observador, fonte oficial da Câmara Municipal do Porto especifica os gastos: 130 mil euros para a programação — que inclui concertos de Richie Campbell, Carolina Deslandes e Jimmy P –, 145 mil euros destinados ao suporte técnico e equipamentos e 40 mil euros para o espetáculo pirotécnico que marca o momento das doze badaladas.
Assim, os municípios de Lisboa e Porto desembolsaram um milhão de euros com toda a programação prevista para a passagem de ano, com diferenças significativas, principalmente em relação ao investimento em fogo de artifício. O espetáculo de pirotecnia no Porto custou menos 260 mil euros aos contribuintes do que o de Lisboa.
“Ex-líbris do Atlântico” é recordista no gasto em pirotecnia
60 mil pessoas em terra e 30 mil no mar. É este o número de espectadores esperados para um dos maiores espetáculos de pirotecnia do mundo que decorre na Madeira a 31 de dezembro. Este ano, sob o tema “ex-líbris do Atlântico”, o investimento chega aos 1,3 milhões de euros, despesa que, segundo fonte oficial da Secretaria Regional de Turismo e Cultura do Governo Regional da Madeira, é “semelhante à realizada no ano passado”. O espetáculo tem uma duração de oito a 15 minutos e circunda toda a cidade do Funchal.
A mesma fonte indicou ao Observador um investimento total de 3,89 milhões de euros nas Festas de Natal e do Fim do Ano, valor que inclui “toda a programação e iniciativas referidas, as iluminações, animações por toda a cidade e ainda o espetáculo pirotécnico do dia 31”. No orçamento global, inclui-se um programa de animação, a 30 e 31 de dezembro, na Placa Central da Avenida Arriaga e na Praça do Povo, com 14 atuações e concertos.
De acordo com Eduardo Jesus, secretário regional de Turismo e Cultura, 2023 será um ano de “casa cheia”, existindo a perspetiva de uma ocupação plena de toda a oferta hoteleira e de alojamento local da Madeira. E tem sido assim desde a passagem de ano 2006/2007, que ficou marcada por um recorde: o Guinness World of Records certificou os oito minutos de fogo de artifício que decorreram nessa ocasião como o “Maior Espetáculo Pirotécnico do Mundo”, e o título só caiu em 2012. Até hoje, a passagem do ano na ilha é o maior cartaz turístico da região, com a baía do Funchal a encher-se de cruzeiros na noite de dia 31 de dezembro.
No caso da Madeira, é o Governo Regional a assumir a despesa com a celebração e não o município de Funchal. E também há casos de cidades em que os preparativos e gastos com a passagem de ano não são despesa pública e ficam a cargo das associações de turismo. Bernardo Corrêa, presidente do Turismo de Cascais, divulga ao Observador os gastos com os festejos — cerca de 130 mil euros, “entre produção, fogo de artifício e espetáculo de drones”. Mas garante que o investimento tem retorno garantido. “Sendo esta uma época do ano difícil para atrair turistas, graças às celebrações de fim de ano, os hotéis estão quase cheios e verifica-se retorno para a atividade turística”, assinala.
Municípios mais pequenos gastam menos a receber 2024
Com exceção de Lisboa, Porto e Madeira, os gastos com a passagem de ano já publicados no Base por outras autarquias totalizam cerca de meio milhão de euros. O que não revela muito, já que, tomando como exemplo os registos de anos anteriores, muitos contratos só são publicados durante janeiro do ano seguinte ou nos meses subsequentes.
Já em relação à distribuição de gastos, 185 mil euros destinam-se à contratação de artistas. A autarquia da Marinha Grande, que promove as celebrações da passagem de ano na Praia da Vieira, contratou o projeto Bombatuke, um grupo musical de ritmos latinos, por cerca de 30 mil euros. Já no município de Pombal, o artista Carlão foi contratado por 34 mil euros.
Os gastos em fogo de artifício também são mais modestos nos concelhos de menor dimensão. As cinco autarquias com contratos publicados no Base somam 188 mil euros em espetáculos de pirotecnia, com valores entre os 7.500 euros, nas Caldas da Rainha, e os 47 mil euros, gastos pelo município de Alcobaça no “espetáculo piromusical em São Martinho do Porto”.
Enquanto algumas autarquias optam por realizar contratos individuais para as diferentes logísticas da celebração de passagem de ano, há quem adjudique toda a produção do evento a uma única empresa. A Câmara Municipal de Coimbra celebrou, através de concurso público, um contrato de 120 mil euros destinado à produção do evento “Fim de Ano em Coimbra 2023”. O caderno de encargos é vasto e inclui, por exemplo, o “aluguer de camarim para os artistas, com aquecimento, iluminação, charriot e espelho”, o fornecimento de “catering para a equipa de agentes de segurança que estiverem a acompanhar o evento” e ainda toda a logística com casas de banho públicas. A este contrato soma-se o de contratação de Tony Carreira, o cabeça de cartaz das celebrações na cidade, por 62.500 euros.