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MARVIN RECINOS/AFP/Getty Images

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Combate ao zika. Matar o mosquito ou cortar as asas ao vírus?

Enquanto não forem desenvolvidas vacinas contra o zika, a melhor forma de prevenção continua a ser evitar a picada do mosquito e para isso é preciso controlar as populações.

Quantas pessoas foram infetadas com zika no Brasil, o país mais afetado até ao momento com o surto desta doença? Ninguém sabe. Mas uma coisa é certa: o vírus é transmitido por um mosquito que nenhum país no mundo conseguiu erradicar e que o próprio Brasil tem tido muita dificuldade em controlar.

A Organização Mundial de Saúde prevê que possam existir três ou quatro milhões de pessoas infetadas, mas é praticamente impossível saber com certeza. Primeiro, apenas 20% das pessoas apresenta sintomas. Depois, os sintomas são leves e assemelham-se aos de uma gripe, o que faz com que poucas pessoas procurem um médico para se tratar. Logo, o mais provável é que a grande maioria dos casos passe despercebido.

Um trabalho desenvolvido na Ásia, que pretendia identificar as infeções com vírus em dadores de sangue, mostrou que a quantidade de vírus no sangue nas pessoas que apresentaram sintomas era equivalente à das pessoas que não apresentavam sintomas mas também tinham o vírus, contou ao Observador Scott Weaver, investigador no Instituto de Infeções Humanas e Imunidade, da Universidade do Texas (Estados Unidos). O que pode querer dizer que qualquer pessoa infetada pode passar o vírus para o mosquito e dar continuidade à propagação da doença.

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A grande preocupação do Brasil e dos restantes países que têm o mosquito Aedes aegypti, e que potencialmente podem ser afetados pelo surto de zika, é controlar a propagação do inseto. O Observador foi tentar perceber como é que isso se pode fazer, mas primeiro é preciso conhecer os comportamentos do mosquito.

Como se transmite o zika?

O vírus zika, tal como o dengue e chikungunya, são transmitidos por mosquitos Aedes aegypti (em algumas regiões o mosquito Aedes albopictus também pode ter um papel na transmissão). Mas só pelas fêmeas, porque só essas é que picam os humanos para se alimentarem de sangue.

Hábitos do mosquito

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O mosquito Aedes aegypti pica do nascer do dia ao pôr do sol e durante o ciclo reprodutivo pode picar várias vezes.

Um mesmo mosquito pode infetar várias pessoas, normalmente na mesma casa ou que vivam a distância curtas (50 a 100 metros).

Quando um mosquito pica um humano, uma de duas coisas pode acontecer: ou infeta ou é infetado. O mosquito pica o humano como uma agulha de uma injeção e, enquanto suga o sangue, também introduz saliva na corrente sanguínea da pessoa. Se a saliva tiver o vírus, o humano fica infetado. Quando há vírus suficientes em circulação no sangue humano e a pessoa for picada por um mosquito, o mosquito bebe o sangue e o vírus por arrasto.

Mas se o mosquito picar logo de seguida outra pessoa não vai infetá-la. Primeiro, o vírus tem de infetar o próprio mosquito – crescer e multiplicar-se. Uma vez instalado nas glândulas salivares do mosquito, o vírus está pronto para infetar a próxima vítima.

Evitar as picadas

Tirando o Canadá, que é demasiado frio, e o Chile, que é seco e frio, o vírus pode espalhar-se por todo o continente americano. Controlar as populações de mosquitos e evitar as picadas é a primeira forma de prevenir a infeção com zika (ou com os outros vírus transmitidos por mosquitos). Evitar a picada também é a forma que está mais acessível às populações. Aqui ficam alguns conselhos a seguir:

  • usar mangas compridas e calças, para ter o mínimo de pele exposta, pelo menos durante as horas de atividade do mosquito;
  • preferir roupas claras e de cores neutras, porque atraem menos os mosquitos;
  • evitar roupas justas, porque os mosquitos podem picar através da roupa;
  • usar repelentes diretamente no corpo ou por cima do protetor solar;
  • evitar abrir as janelas ou cobri-las com redes, para que o mosquito não entre dentro das casas;
  • pelo menos nas sestas, durante o dia, usar um mosquiteiro.
As fêmeas dos mosquitos colocam os ovos na água, onde a larva se desenvolve e de onde emerge depois o mosquito adulto.

Controlar as populações de mosquitos também é uma das missões da população, na medida em que devem evitar a acumulação de lixo e de todo o tipo de objetos que possam acumular água, incluindo os bebedouros dos animais ou os pratos dos vasos das plantas. Os recipientes com água para consumo devem estar cobertos. Também podem usar inseticidas em casa.

Mas controlar os mosquitos é uma tarefa difícil, como explicou Scott Weaver. O virologista lembrou que a América do Sul só esteve livre do mosquito Aedes aegyti entre os anos 1950 e 1970 e que só o conseguiu à custa do pesticida DDT, que mais tarde mostrou ter graves impactos ambientais. O sucesso foi, contudo, temporário – os mosquitos podem tornar-se rapidamente resistentes aos inseticidas.

O mundo está a perder a guerra do controlo vetorial [isto é, o controlo do mosquito]”, alertou Pedro Vasconcelos, investigador na Seção de Arbovirologia do Instituto Evandro Chagas (Brasil). O médico disse ao Observador que existem atualmente “120 países infestados com o vetor e 102 têm transmissão local” de vírus.

De qualquer forma, usar inseticidas persistentes (e não tóxicos) no interior das casas é uma das formas de controlar os mosquitos. Porque os mosquitos têm de pousar na parede para repousar e as paredes estão cheias de inseticidas. Porém, é um método moroso e que exige muitos recursos humanos. Outra hipótese é colocar inseticida nos locais onde as fêmeas põem ovos, mas isso é ainda mais caro.

Tudo passa, em primeiro lugar, pela educação e sensibilização. Cada pessoa tem a sua parte a cumprir, mas se alguém na vizinhança continuar a manter sítios propícios para a reprodução do mosquito, as pessoas poderão continuar a ser picadas. Em Singapura existem regras estritas, contou Scott Weaver: as pessoas pagam uma multa se forem encontrados mosquitos em casa, mas mesmo assim ainda há casos de dengue e chikungunya. O país mais bem sucedido a erradicar o mosquito terá sido Cuba, porque têm um regime que impõe determinadas medidas.

Em 2005, motivado pelo surto de dengue quatro anos antes, as autoridades cubanas implementaram uma série de medidas preventivas para combater o mosquito Aedes aegypti, como disseminação aérea de inseticidas junto à costa, fumigação intensiva das casas, equipas especializadas em matar larvas porta-a-porta e programas de educação das comunidades, conforme refere a revista Medicc Review – uma revista sobre notícias de saúde de Cuba. Estas medidas foram reconhecidas mundialmente como eficazes, segundo a revista.

Nova tecnologias para combater o mosquito

Além dos inseticidas, os cientistas procuram outras formas de controlar as populações de mosquitos, introduzindo animais que foram manipulados em laboratório. A maior dificuldade é que, como o Aedes aegypti não se afasta mais do que 50 ou 100 metros do local de origem, estes mosquitos manipulados não se espalham naturalmente por todo o país e têm de ser introduzidos em vários locais. Logo, produzidos em grandes quantidades.

Estas novas tecnologias foram testadas em pequena escala com bons resultados, contou Scott Weaver, mas ainda vão levar algum tempo até que possam ser usadas em larga escala – são precisas “grandes fábricas” de mosquitos modificados.

A empresa britânica Oxitec, que se dedica ao controlo de insetos que transmitem doenças, conseguiu introduzir um gene no mosquito que é letal para a larva. Produzem mosquitos em larga escala e, depois de separarem os machos das fêmeas, libertam os machos na zona onde se quer fazer o controlo. A descendência destes machos vai ter uma cópia do gene, que é dominante e que vai provocar a morte de todas as larvas.

Ao fim de algumas semanas a população de mosquitos chega a diminuir 89%, disse o virologista, mas entretanto as larvas morreram, os machos também e o gene desapareceu da população. É preciso voltar a introduzir mosquitos modificados para manter as populações controladas.

Uma bactéria que protege os mosquitos

Outra das tecnologias em teste passa por infetar os mosquitos com a bactéria Wolbachia, como no projeto “Eliminate Dengue”, financiado, entre outros, pela Fundação Bill & Melinda Gates. A bactéria diminui o tempo de vida do mosquito, mas mais importante do que isso: impede a replicação do vírus.

A Wolbachia infeta naturalmente cerca de 60% das espécies de insetos, mas não o mosquito Aedes aegyti. Por isso, a equipa coordenada por investigadores da Universidade Monash, em Melbourne (Austrália), criou uma nova estirpe da bactéria a partir de uma estirpe que existe na mosca-da-fruta (Drosophila melanogaster). O objetivo era eliminar a capacidade do mosquito e controlar a doença causada pelo vírus dengue, mas a expectativa é que também tenha o mesmo efeito com o zika.

Esta bactéria infecta o inseto sem o matar, pelo menos não muito rapidamente. Embora o inseto infetado com Wolbachia possa viver menos tempo, a bactéria aumenta o sucesso reprodutivo do mesmo, explicou ao Observador Luís Teixeira, investigador no Instituto Gulbenkian de Ciência (Oeiras). Como a fêmea passa a bactéria à descendência através dos ovos, a bactéria é muito bem sucedida a espalhar-se na população daquela espécie de inseto.

https://www.youtube.com/watch?v=EyfMR_Vnnk8

Como explicou Scott Weaver, uma pequena diferença no tempo de vida pode ter um grande impacto, porque mesmo depois de infetar o mosquito, o vírus leva algum tempo a multiplicar-se e a existir em quantidade suficiente na saliva para poder infetar um humano – cerca de uma semana de incubação dentro do mosquito. O que pode significar que o mosquito não vive o suficiente para transmitir o vírus.

Quando a Wolbachia foi introduzida nos mosquitos Aedes aegypti, os investigadores descobriram que a bactéria impedia que certos vírus, como o dengue, se multiplicassem no interior do mosquito. E se o vírus não infetar o mosquito primeiro, não vai conseguir infetar as pessoas, mesmo quando as pica, especificou Luís Teixeira, que coordena um grupo de investigação dedicado a estudar a Wolbachia e a sua interação com a mosca-da-fruta.

“Ainda não está publicada em artigos científicos, mas já há informação de que a Wolbachia pode conferir proteção contra o zika também”, disse Luís Teixeira, que descobriu, durante o pós-doutoramento em Cambridge, que as moscas-da-fruta com a bactéria eram mais resistentes a vírus.

Scott Weaver contou que estes mosquitos com a bactéria já foram testados numa área controlada na Austrália e que agora estão a ser testados na Indonésia e no Brasil. Por um lado, é preciso confirmar se conseguem diminuir a incidência da doença. Por outro, é preciso verificar se o vírus não evolui de forma a compensar a limitação imposta pela bactéria.

Estirpes de Wolbachia

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Existem diferentes estirpes de Wolbachia que podem variar entre as espécies de insetos.

Nem todas as bactérias protegerem contra vírus e as que são protetoras não o fazem contra todos os tipos de vírus.

O mosquito Aedes albopictus tem duas estirpes de Wolbachia, mas nenhuma protege contra o vírus do tipo flavivírus.

Há duas estirpes de Wolbachia em teste: uma confere menos proteção contra o vírus, mas também é menos agressiva com o hospedeiro; outra, reproduz-se muito mais, confere muito mais proteção, mas como provoca mais facilmente a morte do mosquito não se consegue disseminar na população. Ou seja, a estirpe que mais protege contra o vírus, acaba por ser a menos útil, uma vez que o mosquito morre mais depressa sem que a bactéria “protetora” tenha possibilidade de se espalhar na população de mosquitos.

Agora, a equipa de Luís Teixeira quer estudar melhor esta relação entre os níveis de bactéria e a capacidade de proteção contra o vírus. O ideal era que conseguissem aumentar a proteção, sem comprometer a sobrevivência do mosquito e “criar melhores linhagens de Wolbachia para introduzir no campo”.

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