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Como se decide o salário de um gestor de topo? Diretor-geral da Mercer explica

Há metas financeiras e lucros, mas saber comunicar e o ambiente já valem na hora de decidir os bónus dos gestores. Diogo Alarcão, da Mercer, explica como se chega a salários que podem ser de milhões.

António Mexia (EDP), Pedro Soares dos Santos (Jerónimo Martins), Carlos Gomes da Silva (Galp) e Pedro Queiroz Pereira (The Navigator) foram os quatro gestores mais bem pagos das empresas da bolsa portuguesa, com base em valores do ano passado. As remunerações brutas, com prémios de gestão e outros benefícios, oscilaram entre 1,7 milhões de euros e acima dos dois milhões de euros anuais.

O tema tende a gerar a polémicas, com uns a questionarem o abismo que pode existir no leque salarial pago dentro da mesma empresa — entre salário médio e administração — e algumas vozes a qualificar de excessivos os valores pagos nas grandes empresas, uma crítica que se ouviu mais durante os anos da crise e dos cortes salariais para uma parte significativa da população portuguesa.

Mas os gestores das grandes empresas nacionais ganham muito? Depende da análise.  Quem decide os salários dos administradores são os acionistas e quem os aconselha são as consultoras e membros, de preferência independentes, das comissões de remunerações internas das próprias empresas. Mas as contas para lá chegar envolvem muitas variáveis — e nem todas se medem com números. Os acionistas começam a valorizar critérios qualitativos, e não apenas metas financeiras. A capacidade de comunicar, a reputação e o impacto ambiental da empresa podem pesar nos bónus, diz o diretor-geral da consultora Mercer, especialista em gestão de recursos humanos. Em entrevista ao Observador, Diogo Alarcão explica como se chega aos valores das remunerações dos gestores, quais os critérios que valem mais, se avaliam apenas números e que mecanismos existem para travar políticas de bónus que, a prazo, podem trazer problemas.

Quem são os gestores mais bem pagos em Portugal. E quanto ganharam no último ano

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Diogo Alarcão defende que, do ponto de vista técnico, não faz sentido limitar por lei os salários pagos por empresas privadas, mas acrescenta que as limitações aos bónus que foram introduzidas no setor financeiro protegem os acionistas. Defende que a remuneração variável deve chegar ao Estado e às empresas públicas, mesmo quando estas têm prejuízo, mas também reconhece que o dinheiro não é a única solução para recompensar quadros. A geração millennium, explica, é mais motivada por outro tipo de compensação. E as empresas portuguesas pagam melhor ou pior aos seus gestores? A maioria está em linha com o mercado, mas algumas oferecem mais porque precisam de atrair talento.

Diogo Alarcão diz que os critérios qualitativos para fixar bónus ainda são pouco usados em Portugal

Miguel Quesada

Como se chega ao valor do salário de um gestor de topo?
Para estudo de mercado e de definição da política salarial, dividimos o salário de qualquer pessoa em cinco componentes. Componente 1 é o salário base anual, o que qualquer administrador ou colaborador recebe, o fixo base. A segunda são outras componentes fixas: por exemplo, subsídio de função, isenção de horário de trabalho, subsídio de refeição. A componente 3 corresponde à remuneração variável anual, o bónus que é um pagamento em relação ao desempenho de um ano. Na componente 4 encontramos a remuneração variável de longo prazo, os incentivos de longo prazo que podem ter a duração de um mandato, três anos. Na componente 5 estão os benefícios,  como o carro, o plano de seguro, fundos de pensões.

São componentes comuns a todos?
As primeiras duas são. É sobretudo na remuneração variável que existem mais diferenciações. Ao nível das chefias intermédias, a componente dois pode ter um peso importante. A isenção de horário ou os subsídios de função não são muito relevantes para administradores executivos, mas são relevantes nas segundas linhas. Muitas organizações optaram por ter carreira em comissões de serviço. Um colaborador da empresa vai para diretor e tem um complemento de direção enquanto exerce a função que depois pode perder. Nas funções executivas, esta parte da remuneração não tem tanto peso. A isenção de horário de trabalho paga não é comum nos administradores, porque a função exige disponibilidade temporal total.

O que faz a maior diferença são os prémios?
Sim. A nível da remuneração variável anual, as organizações definem um target, sempre que se cumpre um objetivo a 100% e normalmente um cap (limite) para o valor da remuneração variável. Se o objetivo era 100 e eu atingo 200, não tenho direito ao dobro da remuneração variável. O que normalmente se faz é: se eu cumpro ao nível de CEO (presidente-executivo), o bónus anda nos 40% da remuneração anual, que é composta pelas primeiras duas componentes. Se o CEO atinge os objetivos e ganha 100 pode receber mais 40 de variável. Houve alturas em que não havia limite, eram os tempos dos prémios milionários que depois colocaram grandes questões.

E há diferenças entre o presidente-executivo e outros administradores?
A prática no mercado é que a remuneração variável do CEO anual fique acima dos outros executivos. Na remuneração variável de longo prazo, três anos, essa diferença não existe. A remuneração variável em regra está muito ligada ao mandato, à colegiabilidade do órgão executivo. Na Europa, há dois anos, começou a assistir-se a indicadores diferentes em função do membro da comissão executiva, isto nos indicadores quantitativos e qualitativos. Os indicadores de desempenho do CEO não são necessariamente os mesmos que os do CFO (administrador financeiro) ou de outros.

Os critérios que determinam o cumprimento das metas (e o pagamento dos prémios) são apenas financeiros ?
Estes indicadores de desempenho são tradicionalmente financeiros. São fáceis de medir, são corporativos. Mas começaram a surgir indicadores não financeiros que têm a ver, por exemplo, com questões ambientais e de sustentabilidade. Há setores onde a pegada ecológica é muito importante. Outros valorizam o nível de satisfação de clientes ou o nível de satisfação dos colaboradores. Sobretudo na Europa, as comissões executivas começam a ser avaliadas não só por valores.

Mas esses indicadores qualitativos não têm grande peso? São acessórios?
Os números que temos apontam para que 75% a 80% dos critérios sejam financeiros (quantitativos), e 15% a 20% sejam qualitativos.

"O modelo de implementação da remuneração variável e de longo prazo é tão complexo, que se opta por dar mais remuneração fixa e menos variável. O que tem um efeito um bocado perverso. É menos meritocrático."

Em Portugal, as empresas já usam critérios qualitativos para determinar os bónus?
Existirá uma outra empresa, mas são casos pontuais. Não é uma prática comum. Mas há ainda uma outra dimensão. Se nos objetivos temos indicadores financeiros e não financeiros, também existem objetivos qualitativos e isso é comum na Europa e em Portugal. Um administrador executivo é avaliado pelo cumprimento dos objetivos corporativos, financeiros e não financeiros, mas também se olha para o desempenho da pessoa. Por exemplo, o estilo de liderança, diálogo com os diferentes stakeholders (os principais parceiros da empresa), a comunicação interna e externa, o contributo para a reputação e para a marca da empresa. São indicadores mais subjetivos, alguns são mensuráveis, como o nível de satisfação do cliente ou a notoriedade. Já para avaliar o estilo de liderança ou a coesão, recorre-se a entidades externas ou então aos órgãos internos de supervisão internos, comissões de remunerações.

Como é que os salários dos gestores e os prémios variam em função dos setores e dos países e até da estrutura acionista?
A resposta é complexa, há várias variáveis. Há uma diferença clara entre setores regulados e não regulados. A forma como são desenhados os indicadores e os bónus na banca, tem um conjunto de constrangimentos que outros setores não têm. O setor financeiro, mais do que regulado, é supervisionado. O BCE e a EBA (regulador europeu) têm diretrizes que os bancos centrais têm de aplicar e, aí sim, há um conjunto de regras que se aplicam apenas ao setor financeiro e que vão condicionar a remuneração variável.

Limitam a liberdade dos acionistas para fixar os salários da gestão?
Limitam ou protegem. Diria que as duas coisas. Por exemplo, definem-se limites para o mix entre as remunerações fixa e variável. Numa empresa com uma grande concentração acionista: se os acionistas decidirem que querem pagar 80% de variável e 20% de remuneração fixa ou o contrário, podem fazê-lo. Um banco não pode, porque está limitado para proteção essencialmente dos acionistas e colaboradores. O mix tem de ser 40/60 e idealmente de 50% com caps (limites). Por força das entidades de supervisão, há limites no desenho dos incentivos que impõe também o diferimento no pagamento dos bónus. Hoje em dia, metade da remuneração variável tem de ser diferida obrigatoriamente nos bancos.

"Há uma típica reação do mercado quando se sente demasiado espartilhado na sua capacidade de agir. Como há uma obrigatoriedade de diferimento a três anos, e porque há limites e cláusulas que podem determinar a devolução ou o não pagamento do bónus, tem-se assistido a um crescimento da percentagem de remuneração fixa."

A banca não será hoje o setor que paga mais aos gestores….
Há uma típica reação do mercado quando se sente demasiado espartilhado. Como há uma obrigatoriedade de diferimento a três anos, e porque há limites e cláusulas que podem determinar a devolução ou o não pagamento do bónus, tem-se assistido a um crescimento da percentagem de remuneração fixa. E os administradores executivos acabam por preferir. O modelo de implementação da remuneração variável e de longo prazo é tão complexo, que se opta por dar mais remuneração fixa e menos variável. O que tem um efeito um bocado perverso. É menos meritocrático. Com mais remuneração fixa os gestores ficam menos expostos à performance e a ter que cumprir objetivos. Mas não é por vontade dos próprios. Foi por força da pressão da supervisão. No caso concreto de Portugal, a banca nem pagou remuneração variável nos anos da crise. E quando foi possível fazer ajustamentos, eles aconteceram mais no fixo.

Há grandes diferenças entre empresas que estão na bolsa e as que têm poucos ou só um acionista?
Há um outro setor com regras particulares que é o das empresas cotadas. Estas empresas têm menos espartilhos, seguem o código de corporate governance (este ano vai ser aplicado um código que resulta da autoregulação). São regras menos intrusivas, deixam mais espaço ao acionista e aos órgãos onde está representado na empresa. As empresas cotadas têm muitos setores. A forma como a Galp ou a EDP atuam no mercado é muito diferente de uma Navigator ou de uma Sonae. Seria estranho que se impusesse um fato à medida. Temos trabalhado com várias empresas com concentração forte numa família e que não estão na bolsa. Têm liberdade total, mas temos verificado uma preocupação de profissionalizarem a definição das remunerações e dos modelos de governo, com recurso a empresas de consultoria e a comissões de remuneração com independentes e profissionais. Sentem que a discricionariedade de per si não é boa, está desalinhada do mercado. Estão a ir buscar o melhor de dois mundos, de certa forma. Vão buscar as regras mais transparentes, reconhecidas e auditáveis, sem terem de entrar no excesso de controlo e regulamentação impostos pelas entidades supervisoras.

Mas os administradores desses grupos são muitas vezes acionistas.
Isso também está a mudar. Se olhar para os órgãos sociais de grupos privados que não são cotados, há cada vez mais administradores independentes. RAR, Secil, Grupo José de Mello, Bensaúde, Visabeira. São grupos com forte concentração acionista, mas que se estão a preocupar com uma profissionalização dos temas da governance. O que é inteligente. E mesmo nas cotadas com uma grande concentração acionista numa família, a Sonae a Jerónimo Martins, há essa preocupação de maior profissionalização. Porque estas empresas querem atrair gestores profissionais e independentes, têm de ter regras transparentes. Um gestor que não é da família quer conhecer as regras do jogo, até porque ele está no mercado.

O primeiro prémio que Catroga recebeu foi um maço de notas tirado do cofre por Jorge de Mello na CUF

Natacha Cardoso

Ou seja, já não se abre um cofre para tirar um maço de notas e premiar um gestor. A história foi contada na primeira pessoa por Eduardo Catroga e aconteceu no grupo CUF ainda antes do 25 de abril onde teve o seu primeiro emprego. Quem deu o maço de notas foi o acionista, neste caso, Jorge de Mello.
Isto já não existe assim, sem regras. Alguém que esteja no mercado e tenha feito carreira de gestor quer ter segurança e os acionistas.

Há uma relação entre os incentivos errados para prémios e as falhas na gestão de grandes empresas e bancos? Estou a pensar na PT e no BES…
Acho que esses casos resultaram sobretudo de falhas ao nível da relação entre gestores e acionistas e conflitos de interesses. Não foi o modelo remuneratório que levou a isso. Foi o cruzamento acionista e a má governance das empresas que levou a isso. Os modelos de remuneração são hoje altamente escrutinados, há uma comissão de vencimentos que tem de apresentar contas e submeter o modelo à assembleia geral. Os modelos são mais profissionais e há mais mecanismos de proteção dos acionistas e dos interesses da sociedade. Muitos regulamentos e declarações são públicas, estão no site das empresas. São peças sólidas do ponto de vista técnico, aquilo funciona. Diria que as disfunções de governance têm mais a ver com atitude e comportamentos dos titulares dos órgãos ou com alguma falha nos outros órgão de fiscalização, controlo de risco, auditoria, compliance, do que com o modelo. Na minha opinião, não é o modelo de remunerações que desfoca.

Mas não foi o que aconteceu no setor bancário antes da crise de 2008?
É diferente. Aí o problema não foi o modelo de governance, foi a tomada de risco.

Porque o modelo de remuneração na banca e no setor financeiro premiava a tomada de risco.
Por isso é que a EBA (regulador europeu) e o BCE puseram o travão a fundo, impondo limites (caps). Temos de garantir que, ao dar uma remuneração variável com base nos resultados do primeiro ano, esses resultados se mantêm nos anos seguintes. Não temos ganhos imediatos. A Mercer, na sua função de consultora, recomenda que quando se usam indicadores de desempenho como o EBITDA (resultado operacional bruto), seja o EBITDA recorrente, sem elementos extraordinários. Temos que ter mecanismos que isolem os efeitos extraordinários ou até exógenos. Não faz sentido pagar remuneração variável que induza a comportamentos imediatistas de curto prazo. É preciso garantir que aquele resultado produziu efeitos duradouros. Ou então usamos indicadores anuais, mas diferimos parte do bónus.

"Se olhar para os órgãos sociais de grupos privados que não são cotados, há cada vez mais administradores independentes. RAR, Secil, Grupo José de Mello, Bensaúde, Visabeira. São grupos com forte concentração acionista, mas que se estão a preocupar com uma profissionalização dos temas da governance. O que é inteligente."

Que mecanismos existem para garantir isso?
Há o diferimento do período de pagamento dos prémios. Há dois mecanismos que começam a estar mais na berra. Atribuir a remuneração variável, mas só pagar em três anos. Os direitos adquiridos estão lá, mas por dolo, negligência grave, manipulação de contas ou fator que tem a ver com conduta, o clawback define que uma parte do direito adquirido se perde.

Mas estamos a falar de factos, crimes, que sejam passíveis de ser provados em tribunal?
Sim, têm det ser provados. Outro mecanismo é o malus — define que se o gestor cumprir determinados objetivos terá direito daqui a três anos, a um prémio. Ainda não é um direito adquirido. E se se provar má fé ou dolo, a empresa reserva-se o direito de não atribuir. Estes mecanismos ainda são muito pouco comuns em Portugal, e na Europa em geral. E em algumas grandes empresas que acompanhamos estão a introduzir estes mecanismos nos regulamentos, por nossa sugestão.

Tendo em conta a forma como os tribunais funcionam em Portugal, tenho dúvidas sobre a sua eficácia.
Acho que é melhor do que não ter e têm um efeito dissuasor.

A definição de objetivos e o pagamento de prémio devem aplicar-se a empresas públicas?
O setor empresarial do Estado sofreu por força da crise, com congelamento (e até cortes) no salário fixo e o não pagamento das remunerações variáveis. Percebo a razão, foi preciso fazer isso, mas espero que seja conjuntural. Espero que sejam retomados os modelos de remuneração variável nas empresas do Estado porque promovem a meritocracia.

Mas são difíceis de justificar perante os contribuintes.
Não, porque os bónus têm ser autofinanciados. A empresa que paga prémios não pode dar prejuízos. O gestor público que gere bem a empresa e que desenvolve e cresce o negócio deve ser remunerado por isso, tal como os colaboradores. O setor empresarial público e o setor do Estado têm excelentes profissionais que têm de reter. E porque durante bastante tempo não pagou variável,  foi perdendo trabalhadores muito qualificados para o setor privado, o que é mau. Precisamos de pessoas tecnicamente preparadas em funções públicas. No setor empresarial do Estado é crucial atrair gestores e talento.

Tivemos um caso recente que demonstra esse dilema na Caixa Geral de Depósitos. O aumento dos salários da administração aquando da entrada de António Domingues foi polémico.
E também quando Paulo Macedo foi contratado para diretor-geral de Impostos (decisão tomada pela ex-ministra, Manuela Ferreira Leite). E, neste caso, aprovou-se que foi uma boa decisão. Fazer benchmark (comparar com os melhores a nível internacional) e ter remuneração variável no Estado parece-me uma decisão saudável para atrair os melhores e haver livre concorrência entre o Estado e o privado na atração e retenção de talento.

Diogo Alarcão conta que nos anos 90 quando o Estado começou a pagar remuneração variável conseguiu atrair jovens quadros

Mas os partidos e o Governos criaram tetos salariais para os gestores públicos, abrindo exceção para empresas em regime de concorrência (TAP, RTP, Caixa). Faz sentido esta diferenciação?
Quando estive na administração pública, no antigo ICEP (atual AICEP), na segunda metade dos anos 90, havia remuneração variável para funcionários do Estado, baseada na definição de objetivos e na avaliação de desempenho. E foi provavelmente a altura em que se atraíram mais jovens quadros qualificados que foram prestar um serviço público. As duas coisas não são incompatíveis. Há pessoas muito qualificadas no setor empresarial do Estado que merecem ter modelos meritocráticos com remuneração variável, em função dos resultados alcançados, tanto como as do setor privado.

Mesmo nas empresas que não dão lucro, ou não têm condições para apresentar lucro? Há casos de serviço público em que o lucro não deve, nem pode ser o critério mais importante.
Nas empresas que prestam um serviço público e que podem não dar lucro, mesmo tendo uma sã gestão financeira, devem existir mecanismos para premiar. É uma forma de atrair talento para o setor público. É importante premiar excelentes quadros que existem e que estão no Estado e também para atrair gente mais nova que hoje tem esta forma de pensar. Os millenialls são muito reward oriented, orientados para a recompensa. Querem ser reconhecidos e não é sempre só financeiramente. Há uma geração que quer ser reconhecida pela proximidade, por experiências, oportunidades de carreira. Julgo que é uma geração que não é tão cash driven (orientada, dirigida para o dinheiro) como outras. São mais motivadas por outro tipo de compensações. São a geração que viu os pais desempregados. Têm o sentido de que o dinheiro não é tudo.

Nos salários das grandes empresas, também se olha para o payout ratio, a diferença entre o salário do administrador e o salário médio do trabalhador da empresa. Se um gestor ganha um salário comparável com os seus pares internacionais e os colaboradores são pagos pelos padrões nacionais, é provável que num país como Portugal essa diferença seja maior.
Não temos esse estudo feito. É um projeto que gostava de desenvolver a nível da Europa, introduzindo o custo de vida. Podemos ter duas empresas exatamente iguais, mas um diretor comercial em Portugal ganhará menos do que em Espanha. Sabemos que este assunto está a ter muita atenção nos Estados Unidos, menos na Europa e menos em Portugal. Mas estou convencido que virá para cima da mesa.

"Os millenialls são muito orientados para a recompensa. Querem ser reconhecidos e não é sempre só financeiramente. Há uma geração que quer ser reconhecida pela proximidade, por experiências, oportunidades de carreira. Não é tão orientada para o dinheiro como outras. São mais motivadas por outro tipo de compensações. É a geração que viu os pais desempregados. Têm o sentido de que o dinheiro não é tudo."

Essa discussão pode levar à tentação, já vimos propostas nesse sentido, de impor um teto legal aos salários, também no setor privado?
Essa tentação política existirá certamente. Não conheço nenhum caso de lei nesse sentido, pelo menos ao nível da OCDE. Julgo que é uma discussão política. Do ponto de vista técnico, não faz sentido estar a pôr limites. Poderá fazer sentido e faz, estabelecer limites para a remuneração variável, para garantir a proteção dos interesses dos colaboradores e acionistas.

Mas estamos a falar de limites relativos e não absolutos.
Acredito que algumas forças políticas, em linha com as suas convicções, proponham isso. Do ponto de vista técnico, não encontro nenhuma razão para esse tipo de intervenção do Estado face ao setor privado. Os acionistas, quando aprovam em assembleia-geral , sabem quanto estão dispostos a pagar às equipas de gestão. As grandes empresas portuguesas têm acionistas que, na sua maioria, não são portugueses. Esse novos acionistas têm preocupações com os seus investimentos. Estamos a falar de grandes fundos de pensões e de fundos de investimento. O escrutínio é muito maior agora do que há alguns anos. Em Portugal nunca aconteceu, mas há casos na Suécia, Reino Unido e França, em que os acionistas não aprovaram as propostas de remuneração. Ou porque acharam demasiado generosas ou porque não acreditaram no alinhamento dos indicadores. Mas são casos pontuais.

Elon Musk pode vir a receber bónus de mais de dois mil milhões

Há outro fenómeno mais ou menos novo que é dos proxy advisers, conselheiros por procuração. São consultores que aconselham os investidores institucionais sobre o sentido de voto em relação a políticas de governance e remuneração. Estes conselheiros questionam os conselhos de administração e as comissões de remuneração. Pedem informação às empresas,  querem perceber porque a política é assim para aconselhar os acionistas. Isto é também é transparência que resulta de um maior diálogo entre os administradores executivos, os não executivos, os acionistas, a comissão de vencimentos.

"No topo da pirâmide há muito menos mulheres, mas a paridade é maior. Ganham o mesmo, mas há muito menos. Por outro lado, entram menos mulheres, sobretudo nos cargos de chefia, mas depois saem mais."

Desfasamento salarial entre homens e mulheres. O problema também existe nos cargos de topo?
Uma mulher administradora ganha o mesmo que um homem. Ao nível da comissão executiva, não há disparidades. As disparidades estão na base da pirâmide onde mulheres com a mesma função ganham menos do que os homens. E há mais mulheres do que homens. Em Portugal, este tema é relevante. Quando passamos para o segundo e terceiro níveis verificamos que começa a reduzir-se o número de mulheres em cargos de chefia, mas a disparidade salarial diminui um bocado. No topo da pirâmide há muito menos mulheres, mas a paridade é maior. Ganham o mesmo, mas há muito menos. Por outro lado, entram menos mulheres, sobretudo nos cargos de chefia, mas depois saem mais. Ou seja, as mulheres sobem nas empresas, mas as empresas não as retêm. Há uma fuga maior de quadros.

Homens não só têm salários maiores, como recebem bónus mais altos do que as mulheres

Como é que os salários dos gestores evoluíram nos países mais afetados pela crise como Portugal?
A grande exposição foi no setor financeiro. Em Portugal, os bancos intervencionados tiveram de cortar em 50% as remunerações dos gestores. A situação dos bancos também contagiou as seguradoras. Nas outras empresas, a Europa cresceu um pouco mais em termos de aumentos nas remunerações dos gestores, mas houve um certo paralelismo.

Afinal, os gestores portugueses ganham bem ou ganham mal?
Eu também fiz essa pergunta e a resposta que ouvi foi: depende. Com base no benchmark (valores de referência) que fazemos – internacional, nacional e setorial –, e da informação pública e das empresas com quem trabalhamos, os gestores executivos estão a ser pagos como o mercado paga. Estão alinhados com os seus pares internacionais e no mercado. Mas há empresas que querem estar acima do mercado porque têm receio de perder gestores ou porque precisam de os atrair. Temos empresas que nos dizem: o mercado paga 100, mas eu quero pagar 120. O benchmark resulta de análises estatísticas e de observações de um conjunto de empresas o que nos vai dar um percentil. Há uns que estão mas em baixo, outros na mediana e outros que estão mais acima. Normalmente as empresas querem estar entre a mediana e o percentil 75. Nunca querem estar abaixo. Pode acontecer algumas empresas constatarem que estão abaixo e não mexem por causa da sua situação financeira.

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