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O ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital, Pedro Siza Vieira, durante a sua audição na Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, na Assembleia da República, em Lisboa, 05 de maio de 2021. JOSÉ SENA GOULÃO/LUSA
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Pedro Siza Vieira foi o ministro da Economia que nacionalizou a Efacec.

JOSÉ SENA GOULÃO/LUSA

Pedro Siza Vieira foi o ministro da Economia que nacionalizou a Efacec.

JOSÉ SENA GOULÃO/LUSA

Efacec. Nacionalização falhou objetivos e pode custar mais 80 milhões (para lá dos 484 milhões que já custou)

Auditoria em curso do Tribunal de Contas indica que apoio financeiro público à Efacec pode superar 500 milhões. Estado ainda pode recuperar grande parte, mas, para já, nacionalização falhou objetivos.

Foi uma das últimas decisões económicas do Governo de António Costa e o processo ia na rota da criação de uma comissão parlamentar de inquérito quando o então primeiro-ministro se demitiu às mãos da Operação Influencer. A crise política e o vazio que se seguiram colocaram a fiscalização à Efacec num limbo. Surgiram entretanto outras polémicas que desviaram as atenções dos partidos — como o caso das gémeas e a internacionalização da Santa Casa, que foram privilegiadas para a constituição de inquéritos no Parlamento. Mas nem tudo está ainda contado na nacionalização e posterior privatização da Efacec.

O Tribunal de Contas (TdC) está a concluir uma auditoria pedida pela Assembleia da República quando a empresa era ainda detida pelo Estado. Esta auditoria abrange também a avaliação da venda ao Fundo Mutares, concretizada entretanto. Segundo a documentação preliminar da auditoria, que passou pela fase de contraditório, o trabalho já realizado quantificou um financiamento público de 484 milhões de euros até à privatização, concluída em outubro de 2023. E que pode ainda ultrapassar os 500 milhões de euros. Há também potencial de ganho para o Estado numa nova venda da Efacec, mas a avaliação feita na versão preliminar da auditoria, sabe o Observador, é a de que a nacionalização da empresa industrial do norte não cumpriu nenhum dos objetivos iniciais.

A grande fatia dos apoios financeiros, no montante de 445 milhões de euros, foi realizada através da holding estatal Parpública, havendo mais 35 milhões de euros do Banco Português do Fomento. No caso da Parpública, conforme foi referido pelo anterior Governo quando decidiu entregar a Efacec ao fundo alemão Mutares, havia 200 milhões de euros de suprimentos, a que acresciam 231 milhões de euros colocados no fecho da operação — 201 milhões de capital e 30 milhões para fazer face a eventuais contingências em balanço na altura da venda. Haverá ainda um valor de 4 milhões gastos no processo de venda (entre avaliações e assessorias), segundo contabiliza o Tribunal de Contas na documentação preliminar da auditoria à Efacec, apurou o Observador. E ainda um montante referente a juros de suprimentos, que, aliás, estão em litígio entre a Parpública e a Direção Geral do Tesouro e Finanças.

Nem todos estes valores eram conhecidos até ao momento. Mas há mais. É que há o risco de a fatura vir a subir, avisa o Tribunal de Contas. E de aumentar 80 milhões de euros, chegando aos 564 milhões, por conta das responsabilidades contingentes assumidas pela Parpública na venda à Mutares da Efacec.

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Este risco mereceu uma ênfase na certificação legal de contas da holding estatal de 2023. Estas potenciais responsabilidades, referidas no relatório preliminar do TdC ,”incluem eventuais desvios financeiros em projetos, bem como potenciais valores decorrentes de processos judiciais desfavoráveis à Efacec e anteriores a 31 de outubro de 2023 (data da assinatura do contrato com a Mutares)”, pode ler-se na certificação das contas do ano passado.

As contas da Parpública só foram conhecidas na sexta-feira passada (ainda sem a certificação do auditor, que só foi tornada pública esta segunda-feira), uma semana depois de a administração da holding ter sido demitida pelo Governo sem justificação.

A auditoria sinaliza ainda, sabe o Observador, que o acionista minoritário — MGI Capital (que reúne os antigos acionistas da Efacec, a José de Mello e a Têxteis Manuel Gonçalves) que não acompanhou o Estado no apoio financeiro à Efacec, nem gastou dinheiro com a sua venda — poderá ter as suas responsabilidades contingentes reembolsadas pelo Estado, isto considerando os termos do contrato assinado com o fundo alemão.

Questionada pelo Observador, fonte oficial do Tribunal de Contas refere que a “auditoria sobre o financiamento público da Efacec, na sequência de pedido da Assembleia da República, encontra-se em fase de anteprojeto de relatório”. E nada acrescenta sobre as informações que constarão da mesma. O relatório irá incorporar a informação obtida no contraditório, sem necessariamente mudar as conclusões iniciais. Só depois de aprovado é que é oficialmente uma auditoria do Tribunal de Contas.

O contrato para a venda da Efacec foi assinado pelo Estado com a Mutares em outubro do ano passado e na altura admitia-se que a operação de nacionalização teria custado cerca de 400 milhões de euros ao Estado.

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O grosso dos apoios do Estado à Efacec foram realizados através da Parpública, mas um despacho de setembro de 2023 do secretário de Estado do Tesouro, à época João Nuno Mendes, determinou que a holding pública seria “ressarcida de todos os montantes suportados com o processo de privatização da Efacec, com o entendimento que deve abranger todos os apoios de tesouraria concedidos, desonerando a Parpública de qualquer responsabilidade”, é referido no relatório e contas de 2023 pela Parpública.

A empresa já foi ressarcida de 202 milhões de euros, mas quer também ser reembolsada dos juros incorridos pelos empréstimos de tesouraria à Efacec. E, por isso, reclamou o pagamento junto da Direção Geral do Tesouro e Finanças (DGTF), que não concorda com essa leitura. “Considerando que a DGTF não reconhece parte da dívida, foi constituída uma perda por imparidade no montante de 7,7 milhões de euros”, diz a Parpública no relatório anual.

No âmbito da venda à Mutares, o Governo anunciou, então, que tinham sido libertadas garantias prestadas à Efacec num valor de 72 milhões de euros.

O ministro da Economia e do Mar, António Costa Silva (E), acompanhado pelo secretário de Estado das Finanças, João Nuno Mendes, durante a conferência de imprensa sobre conclusão do processo de venda da Efacec, no Ministério da Economia, em Lisboa, 01 de novembro de 2023. JOSÉ SENA GOULÃO/LUSA

O ministro da Economia, António Costa Silva e o secretário de Estado das Finança, João Nuno Mendes, anunciaram os termos da venda da Eface

JOSÉ SENA GOULÃO/LUSA

António Costa e Silva, à época ministro da Economia, realçou, na altura, que a conta final sobre os custos da nacionalização da Efacec para o Estado não era possível ainda apurar. Já que dependia da remuneração futura que o Estado pudesse vir a ter ou através do pagamento de dividendos ou através do benefício económico garantido no contrato com a Mutares quando este fundo vender a empresa. Segundo foi dito, então, num cenário base, o Estado terá direito a 66% do produto da venda futura pela Mutares da Efacec e a 75% de dividendos que a Efacec venha a distribuir, apesar de já não ser acionista. Isto porque fez um acordo (denominado de cascata) que lhe permite ficar com direitos económicos sobre a Efacec.

Nunca foi revelado qual era o valor esperado. Mas agora, no âmbito da auditoria do Tribunal de Contas, admite-se que, numa venda a cinco anos, a Efacec garantirá um retorno de 385 milhões de euros ao Estado português e 178 milhões de euros ao fundo comprador, que gastou apenas 15 milhões de euros com o negócio. O que, sem as novas contingências de 80 milhões, significaria para o Estado uma perda líquida de 60 milhões com a Efacec. Mas esta é uma projeção e não é passível de ser, para já, confirmada.

Nacionalização falhou todos os objetivos

O principal objeto da auditoria do Tribunal de Contas é a nacionalização e a gestão pública da empresa industrial que responde a um pedido feito pelo Parlamento no final de 2022.

A Efacec passou para as mãos do Estado em 2020 após os primeiros meses da pandemia (quase ao mesmo tempo que a TAP). Esta decisão, defendida pelo então ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, não foi tomada apenas por causa da recessão económica, mas também devido à fragilidade que resultou do escândalo que apanhou a maior acionista. Meses antes, a empresária angolana Isabel dos Santos foi alvo de uma das mais bem sucedidas fugas de informação confidencial, o Luanda Leaks.

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Sobre a nacionalização, a versão preliminar da referida auditoria, segundo sabe o Observador, é contundente na conclusão de que nenhum dos objetivos que fundamentaram a decisão política foi alcançado. Ou seja, falharam todos.

Não se evitou a deterioração da situação financeira e comercial da Efacec, não se conseguiu estabilizar o seu valor financeiro e operacional e nem os postos de trabalho foram preservados (até 2022 quase um terço dos trabalhadores, sobretudo quadros qualificados, saíram da empresa).

A relação com os bancos financiadores obrigou à apresentação de garantias públicas — não bastava aos bancos o Estado ser acionista –, e a Efacec passou a um quadro de falência técnica (por apresentar capitais próprios negativos).

Empresa estratégica? Pressuposto da nacionalização não foi validado pelo Estado

Nesta versão da auditoria, que está ainda a ser trabalhada, o Tribunal de Contas considera que a nacionalização da Efacec não foi justificada com qualquer fundamentação técnica e independente do interesse público invocado (mas não demonstrado). A operação avançou sem que o Estado validasse o argumento apresentado pela administração de que a Efacec era uma empresa estratégica para o país, viável e sustentável a atravessar dificuldades transitórias de tesouraria.

Já este ano, o atual Governo concordou com a recusa da Parpública em conceder o apoio financeiro de emergência pedido pela Inapa (a holding do Estado era a maior acionista da Inapa, embora sem o controlo do capital) com o argumento de que não era uma empresa estratégica para a economia nacional.

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A nacionalização da Efacec também não foi acompanhada de qualquer estudo sobre o impacto nas contas do Estado. Uma situação que, diz o Tribunal de Contas, se prolongou nos mais de três anos em que a empresa esteve no universo empresarial do Estado.

Logo em 2020, o Observador questionou o Ministério das Finanças comandado por João Leão sobre a existência de alguma avaliação ou estudo prévio de viabilidade a esta operação, nomeadamente por parte da UTAM (a Unidade Técnica e de Acompanhamento e Monitorização do Setor Empresarial do Estado). A resposta foi negativa.

“As operações em causa (Efacec e TAP) não consubstanciam a aquisição de participações sociais por parte de empresas públicas”, situação a que se aplicaria o regime previsto na lei quadro das empresas públicas que obriga à realização dessa avalição prévia. “No caso da Efacec tratou-se de uma nacionalização e não de uma aquisição, sendo que as nacionalizações têm um regime jurídico próprio”.

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A análise negativa não se limita ao impacto financeiro, mas questiona também o cumprimento do quadro jurídico de controlo financeiro do Estado e das regras das contas públicas.

Uma das falhas identificadas nesta auditoria (ainda sem versão final) foi a decisão do anterior Governo de não qualificar a Efacec como empresa pública, mesmo depois de ter ficado claro que a natureza transitória da nacionalização ia, afinal, durar mais tempo do que o previsto (três anos). O diploma de nacionalização permitiu deixar a Efacec de fora da aplicação do regime jurídico aplicável ao setor empresarial do Estado.

Ao não revogar a exceção nem limitar o calendário desta situação excecional num contexto de incerteza sobre a privatização, foi permitido à Efacec funcionar, durante um período indeterminado, fora do regime jurídico das empresas públicas, o que inclui o estatuto do gestor público e mecanismos de controlo financeiro do setor empresarial do Estado.

A TAP, que foi nacionalizada no mesmo período, teve direito a algumas exceções, mas foi enquadrada no regime jurídico das empresas públicas, razão pela qual a negociação para o pagamento de uma indemnização a uma administradora (Alexandra Reis) foi considerada ilegal (face às regras aplicáveis às empresas do Estado).

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Apesar de a Conta Geral do Estado entre os anos de 2020 e 2022 ter informação sobre as transferências do Estado para a Efacec e os apoios concedidos pela Parpública à empresa, sob a forma de suprimentos, estarem nas contas da holding estatal, não foi feita consolidação destas duas contas. A ausência da informação completa sobre os passivos e ativos da Efacec não permitiu revelar a imagem verdadeira da exposição das contas públicas à empresa.

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