Há dez candidatos e muitas desculpas para não votar. Sim, é o que muita gente diz, mas damos-lhe nove razões para se manter atento a estas eleições – e um guia para que na noite eleitoral faça a sua própria avaliação dos resultados. Vamos a isso?
Vamos ter uma outra 2ª volta (como em 1986)?
Ainda parece estar tudo em aberto, até mesmo depois das últimas sondagens: em três, só numa Marcelo está acima da margem de erro – ou seja, com vitória segura à 1ª volta.
Para confirmar: se o candidato mais votado não tiver já mais de 50% dos votos expressos, então o país será chamado a ir novamente às urnas daí a três semanas, ou seja, dia 14 de fevereiro. Só em 1986 isso aconteceu, numas eleições renhidas que dividiram o país ao meio. Marcelo, já o repetiu, não quer ser comparado a Freitas, mas se no domingo à noite os votos não chegarem, então já sabe: prepare-se para nova campanha eleitoral (mais debates, mais 15 dias de estrada para os dois candidatos mais votados) e para nova votação. E depois? Depois, os ex-candidatos e os partidos terão de decidir quem apoiam – numa nova geometria política. A direita para um lado, sim. A esquerda para o outro, muito provavelmente.
Um Presidente eleito por menos de metade do país? Outra vez?
Nas últimas eleições presidenciais, mais de metade dos eleitores ficou em casa. E agora como será? A abstenção tem vindo a aumentar ao longo dos anos. E nas duas últimas reeleições (de Sampaio e de Cavaco) ultrapassou os 50% – o que serviu para que alguns partidos colocassem em causa a força política dos chefes de Estado eleitos.
A única exceção, quando se olha para a evolução da abstenção em presidenciais, foi o ano de 1980, em que, apesar de ter sido uma reeleição (de Ramalho Eanes), os portugueses viviam um momento quente (ainda chocado com a morte de Francisco Sá Carneiro) e com o país muito dividido. Nesse ano, registou-se uma abstenção de 15,61%, algo nunca mais repetido.
Com o passar dos anos, o desinteresse pelo voto tem aumentado e alargou-se a outros atos eleitorais. A taxa de abstenção mais elevada em Portugal acontece nas eleições europeias (66,3%). A seguir aparecem as presidenciais e, por fim, as legislativas (43,07%). Mas neste caso, além de não se tratar de uma reeleição, há outro fator que dá alento a quem espera uma inversão de tendência: o número anormal de candidatos, 10. Conseguirão todos eles atrair o interesse dos eleitores?
Como se divide o eleitorado do PS? E dois chamam mais do que um?
Há quatro meses, nas eleições legislativas, 1.747.685 pessoas votaram no PS. Agora, os simpatizantes e militantes socialistas têm vários candidatos da sua área: Maria de Belém Roseira, António Sampaio da Nóvoa, Henrique Neto e Cândido Ferreira. Primeira pergunta em aberto: os votos dos socialistas vão dispersar-se muito? E até que ponto a existência de várias opções pode levar mais apoiantes socialistas a votar do que em setembro?
Para ler melhor os resultados, segue outra comparação: nas últimas presidenciais, em 2011, Manuel Alegre concorreu com o apoio do PS e conseguiu apenas 831 mil votos. Cinco anos antes, o PS dividiu-se. Mário Soares foi o candidato oficial e Alegre o militante “indisciplinado” que avançou contra a vontade da direção. O partido ficou abalado, mas a verdade é que os dois candidatos asseguraram o voto de 1,9 milhões de eleitores – um score que se este domingo fosse repetido poderia forçar uma segunda volta nas eleições. Terão Sampaio da Nóvoa e Maria de Belém um peso igual? Para já, não é o que as sondagens indicam – mas Nóvoa está a subir nas intenções de voto.
Se Marcelo ganhar, ultrapassará Cavaco?
Cavaco Silva foi, em 2011, o Presidente eleito com menos votos de sempre – 2.231.956. Em 2006, tinha tido 2.773.431 votos, tornando-se, assim, o primeiro Presidente da República de direita depois do 25 de abril. Se Marcelo Rebelo de Sousa ganhar as eleições conseguirá o feito – que ficará na história – de Portugal eleger consecutivamente dois Presidentes de direita (três mandatos seguidos).
Ainda assim, haverá sempre um ângulo de análise importante: qual será a personalidade de direita mais amada: o professor de Finanças Públicas de postura rígida (recordista eleitoral em Portugal) ou o professor de Direito que não se cansa de abraçar as pessoas (e que ainda não ganhou uma eleição)?
Marcelo vs. PàF. Como se comparam?
Ora bem, e a direita? Nas legislativas de outubro, PSD e CDS concorreram juntos e tiveram 1.993.921 votos. Se a abstenção nas presidenciais aumentar em relação a 2011 (em que foi de 53,48%) isso significa que o vencedor poderá ser eleito com menos dos 2,2 milhões de votos de Cavaco. Fazendo as contas, o eleitorado de outubro de Passos – que foi um dos piores da direita em legislativas – quase que chegará para eleger Marcelo à primeira volta.
O ex-líder do PSD e ex-comentador televisivo, no entanto, tem dito que não quer ser o candidato da direita – como Freitas nas célebres eleições de 1986 – e insiste em cativar o voto do centro e da esquerda. Veremos domingo à noite onde pescará Marcelo os apoios.
Marisa mantém o Bloco com ânimo (e influência)?
Nas últimas legislativas, o BE contrariou todas as previsões (as pessimistas) e conseguiu subir a votação, obtendo o seu melhor resultado de sempre – 10,1%. E, com isso, ganhou peso e força política para apoiar pela primeira vez um Governo socialista (mesmo que de fora, no plenário da Assembleia).
Quatro meses depois, Marisa Matias dá a cara pelo partido. As intenções de voto nas sondagens continuam baixas (mas a subir – na TVI chegou agora aos 7%). Mas será que Marisa consegue igualar Catarina Martins? A meta é ambiciosa e o risco para o Bloco também é considerável (com as comparações na noite eleitoral inevitáveis com as legislativas e também com o PCP).
Reserve, portanto, os números absolutos para comparar: foram 550.000 votos em outubro.
Já agora: a história mostra que o BE se afundou nas presidenciais de 2006 quando o então líder Francisco Louçã não conseguiu ir além dos 5,3% dos votos (292 mil votos), embora nas legislativas anteriores o partido tivesse tido 6,3% (364 mil votos). Em 2001, nas primeiras eleições presidenciais a que concorreu, o BE com Fernando Rosas obteve 3% (130 mil votos), um resultado que ajudou o recém-criado partido a consolidar-se.
E Edgar? Tem força para ser líder?
Carlos Carvalhas foi candidato presidencial do PCP antes de ter sido escolhido para secretário-geral do PCP. Teve um grande resultado eleitoral que o partido nunca mais repetiu (12,9%, 635 mil votos) e que foi superior ao peso do PCP nas urnas. Depois disso, o PCP lançou como candidatos António Abreu (223 mil votos), Jerónimo de Sousa (474 mil votos) e Francisco Lopes (301 mil) – oscilando entre os 5,1% e os 8,6%.
Numa altura em que se mantém a dúvida sobre se vêm aí mudanças na direção do PCP – há congresso no fim do ano -, a performance de Edgar Silva pode ser um sinal de outros voos possíveis dentro do partido. O próprio candidato presidencial, quando confrontado com essa possibilidade, não fechou a porta. Depende do coletivo, respondeu, referindo-se ao entendimento do Comité Central. No PCP, é assim que funciona.
E o discurso contra a corrupção, vale quanto por cá?
Paulo Morais candidata-se com uma bandeira: o combate à corrupção. Foi acusado de demagogia pelos adversários, mas nunca deixou cair o discurso. O ex-vice-presidente da Câmara do Porto centra todas as intervenções contra os políticos, contra os negócios, pela transparência – e aparentemente tem alguma audiência. A sua página no Facebook é a que mais likes tem de todos os candidatos e há sondagens (Católica/RTP) que lhe dão tanto votos como ao candidato apoiado pelo PCP, Edgar Silva. Mas, calma, só só 3% – muito longe de fenómenos que temos visto pela Europa. Será que isto se vai confirmar nas urnas?
Dos outsiders, quem vale mais: Neto ou Tino?
Mas há ainda mais candidatos: Henrique Neto, Vitorino Silva (conhecido por Tino de Rans), Cândido Ferreira e Jorge Sequeiro. Os três primeiros têm ligações ao PS e são, ainda assim, os mais conhecidos deste lote. Mais uma vez as sondagens: Tino de Rans aparece à frente de Henrique Neto, que já foi deputado e é um empresário (re)conhecido. O calceteiro e ex-presidente de junta de freguesia é uma espécie de candidato-sensação destas eleições, reunindo simpatias tal como aconteceu na primeira vez que o vimos: no congresso do PS de 1998, em que elogiou António Guterres e empolgou a assistência. Mas o que valerá essa simpatia em cruzinhas no boletim de voto, quando se trata de eleger um Chefe de Estado?