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A exposição de Yoshitomo Nara, patrocinada pela Fundação BBVA, pode ser vista no Museu Guggenheim Bilbao até 3 de novembro
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A exposição de Yoshitomo Nara, patrocinada pela Fundação BBVA, pode ser vista no Museu Guggenheim Bilbao até 3 de novembro

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

A exposição de Yoshitomo Nara, patrocinada pela Fundação BBVA, pode ser vista no Museu Guggenheim Bilbao até 3 de novembro

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

O olhar inquietante que Yoshitomo Nara não consegue explicar revela-se no Guggenheim de Bilbao

É a primeira grande retrospetiva europeia do artista japonês, que confessa: "Sei o que as minhas obras significam, mas não o consigo expressar em palavras". Para ver na cidade basca até 3 de novembro.

As crianças de Yoshitomo Nara, à primeira vista, parecem bondosas. Com as suas cabeças grandes, têm um aspeto entre o adorável e o aterrador, um olhar entre o melancólico e o ameaçador. Algumas seguram facas, outras pequenas flores. Outras escondem cigarros atrás das costas.

A obra de um dos mais relevantes artistas japoneses contemporâneos pode ser descoberta a partir desta sexta-feira no Museu Guggenheim Bilbao, naquela cidade basca. A mostra, patente até 3 de novembro, é a primeira grande retrospetiva individual de Yoshitomo Nara na Europa e foi especialmente concebida para o espaço da galeria do museu em Bilbao. Depois, segue para Baden-Baden e Londres, onde será reconfigurada em função do local.

No interior do edifício projetado por Frank Gehry, 128 obras revelam um corpo de trabalho extenso. Além de telas e esboços contam-se algumas esculturas, como Fountain of Life (2001/2014/2022), em que lágrimas transbordam dos olhos de crianças cujas cabeças estão sobrepostas umas às outras, como se saíssem de uma fonte. São, todavia, as telas de crianças de olhar inquietante que mais chamam a atenção. O que motiva quem as pinta? O que sentem estas figuras de pupilas multicolores, olhos em forma de gomo de laranja? A pergunta surge já no final de uma concorrida conferência de imprensa, com jornalistas de vários cantos da Europa. Quem inquire assume a simplicidade da questão que o artista contorna com silêncios e rodeios, até por fim assumir: “Estou a tentar encontrar uma resposta, seria apropriado, mas não tenho uma”. Às tantas, concede: “Se pudesse responder, deixaria de pintar. No fundo, sei o que significam, mas não o consigo expressar em palavras. Por isso o faço nas minhas obras”.

Organizada por temas, a mostra revela o mundo de Nara através de peças que abarcam quatro décadas de trabalho e põem em evidência a sua evolução estilística

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Yoshitomo Nara nasceu em 1959 em Hirosaki, uma pequena cidade no norte do Japão, conhecida por ser a maior produtora de maças do país. Em criança, consumia vorazmente programas de televisão, livros de banda desenhada, ao mesmo tempo que desenvolvia um interesse profundo pela música, o que viria a influenciar a sua prática artística. Aos oito anos, passava as noites à escuta da Far East Network, a estação de rádio da base da Força Aérea dos EUA em Misawa. A exposição à música pop americana e europeia dos anos 60 e, mais tarde, ao punk nos anos 70, revelar-se-ia uma das suas maiores influências.

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Depois de se licenciar na Universidade de Artes de Aichi em 1987, prosseguiu os estudos na Kunstakademie Düisseldorf, na Alemanha. Sem falar uma palavra de alemão, ocupava os dias a desenhar. Ali fez as suas primeiras exposições individuais e começou a vender algumas obras, longe de imaginar, quatro décadas depois, o peso que o seu nome implicaria no mercado. Em outubro de 2019, a Sotheby’s vendeu a obra Knife Behind Back (2000) por um valor recorde de 25 milhões de dólares.

Mas, como pretende mostrar a retrospetiva instalada no Museu Guggenheim Bilbao, a arte de Nara é mais que um preço exorbitante na etiqueta. Assim como o artista é mais do que a sua conta recheada.

“Não mudei de todo. Tenho medo de mudar, até”, diz Yoshitomo Nara, perante a imprensa. E continua: “Tenho medo que o dinheiro me mude. Na minha conta bancária tenho mais dinheiro agora e mais exposições, mas a época mais feliz da minha vida foi quando vivi na Alemanha, era estudante e não tinha nenhuma exposição. Nessa altura era capaz de pintar 120 obras por ano e passava as noites a falar com os meus colegas da Universidade. São coisas que não se podem comprar com dinheiro”.

Nara tem um estatuto de rock star, mas uma atitude discreta. Nas imediações do museu passa despercebido, de calças jeans, sapatilhas e boné na cabeça. “Estas roupas que uso são muito melhores do que usar uma coisa de marca”, troça diante das câmaras, focadas na sweatshirt amarela que enverga. Tem um aspeto jovem e só o cabelo branco denuncia os 64 anos. “No caso da moda, prefiro que seja moda sustentável, que partilhe a minha forma de ver a vida”, diz o artista, que recentemente voltou a colaborar numa coleção de vestuário com a designer Stella McCartney, referência na sustentabilidade no segmento do luxo. “Gosto de trabalhar com marcas pequenas, com pessoas com quem mantenho diálogo, mesmo que vivamos longe. Colaborei com gente que me convidou a sua casa para jantar, que conheci a família, que podem ser meus amigos. Isso é um tesouro”, afirma. “Prefiro trabalhar com gente que não queira fazer de tudo um negócio. Não gosto de merchandising“. No piso inferior, na loja do Guggenheim, não faltam, porém, opções de recuerdos: há blocos de notas, sacos de pano, t-shirts, termos, canecas, bases para copos, tabuleiros e caixas de óculos com ilustrações de meninas estranhas de olhos inquietantes.

Yoshitomo Nara, 64 anos, diante do Museu Guggenheim Bilbao. É a primeira grande mostra do artista japonês na Europa

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Foram precisos três anos de persistência para conseguir reunir no País Basco as 128 obras de várias coleções privadas, museus japoneses, americanos, suíços e franceses. Lucía Aguirre, comissária da exposição, revela que procuravam uma retrospetiva com um cariz “pessoal”, que atravessasse as quatro décadas de criação. A prová-lo está o facto de a mostra arrancar com um esboço de 1984 e culminar com um quadro de 2023, Midnight Tears, concebido durante a preparação da exposição e que a comissária diz ao Observador ser “improvável” que tenha sido antes mostrado.

É uma das últimas obras no percurso da mostra, que desagua numa área temática em que o artista descortina o lado ativista com o qual se comprometeu nas últimas duas décadas — a viagem que fez ao Afeganistão em 2003 é apontada pela comissária como um ponto de viragem, tal como a tragédia nuclear em Fukushima em 2011. No War, Stop the Bombs, Peace Girl, From The Bomb Shelter, Casa titulam algumas obras.

O desenho expositivo, imaginado pelo artista, dá espaço às obras para que respirem, para que se instale a melancolia e incerteza emanada pelas pinturas. Há olhos em lágrimas, lábios franzidos à beira de um sorriso, bocas fechadas, emoções contidas.

“Às vezes as pessoas dizem que não querem ver as minhas obras, ou que não querem que os filhos as vejam”, diz o artista. As personagens recorrentes de Nara podem ser infantis, mas o que evocam é mais universal. “São meninas porque o dizemos nós, e se lê nos títulos [das obras], mas não têm género nem idade”, atenta a comissária da exposição. “O seu universo é muito mais complexo e profundo do que a aparência sugere. É um dos grandes pintores do nosso tempo, mas, acima de tudo, dos que melhor transmite humanidade com a sua obra”.

O Observador viajou até Bilbau a convite do Museu Guggenheim Bilbao

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