O que já se sabe dos grandes números
Menos crescimento, mais défice. Para já, as contas são claras. Nem a economia vai crescer o que o Governo estava à espera, nem o défice será tão baixo como se esperava antes. Tudo isto depende do que será acordado ainda esta semana e do impacto que essas medidas terão no défice e no crescimento económico esperado pelo Governo. Para já, o Executivo espera um crescimento de 1,2% este ano e de 1,5% no próximo ano, abaixo dos 1,8% que previa no Programa de Estabilidade.
O Governo deve ajustar as suas previsões do défice para o mesmo valor de margem dado pela Comissão Europeia para o défice deste ano. Ou seja, o Governo tinha como meta um défice de 2,2% (negociado com a Comissão Europeia em fevereiro), que Bruxelas flexibilizou em 0,3 pontos percentuais em agosto, para os 2,5%. O Governo pegou neste valor e aplicou-o a 2017 também, revendo em alta a meta de 1,4% para 1,7%.
Há pelo menos mais dois números muito importantes para estas contas. Em primeiro lugar, o valor de ajustamento orçamental a ser feito. A Comissão quer que seja feito um corte de 1100 milhões no défice estrutural, corte esse que o Governo já admitiu fazer. A estes 1.100 milhões acresce a necessidade de compensar todos os custos das medidas que já foram implementadas parcialmente em 2016, mas que terão um impacto superior em 2017, como é o caso dos cortes salariais e do IVA na restauração.
€1.100 M
É o valor do corte do défice estrutural que a Comissão Europeia exige a Portugal e que corresponde a 0,6% do PIB potencial.
Em segundo lugar, o valor da inflação. A previsão do Governo deverá ser mais alinhada com a das principais instituições internacionais, que apontam para que os preços não aumentem mais que 0,7%, um valor muito abaixo dos 1,2% previstos no Programa de Estabilidade. A baixa inflação terá impacto não só no valor nominal do PIB (usado para calcular os rácios de défice e dívida), mas também nos aumentos das pensões (entre outras coisas), que está estipulado por lei. Para já, com este valor de inflação, o Governo gastaria pouco mais de 100 milhões de euros a atualizar as pensões (se o fizesse apenas ao valor previsto da inflação), o que faria com o que o aumento fosse mínimo para a grande maioria dos pensionistas.
As medidas que devem estar no OE: só falta saber o detalhe
Aumento das pensões
Sim. Quanto? Ainda ninguém sabe. Até ao momento, António Costa só se comprometeu a fazer um “aumento justo” das pensões. Mas o Bloco de Esquerda e o PCP continuam a pressionar e o dossiê não está fechado. Os comunistas defendem um aumento extraordinário de dez euros para todas as pensões — à exceção do escalão mais alto. “Há que valorizar pensões, reformas de 600, 800 euros…”, justificou Jerónimo de Sousa.
€400 M
Valor das propostas do BE e do PCP para aumentar as pensões, para além do valor da inflação.
O Bloco já avançou com dois valores. Num primeiro momento, Catarina Martins defendeu o aumento extraordinário das pensões de dez euros “até 600 e poucos euros”, como referiu a coordenadora do partido. Na quinta-feira, em entrevista à SIC, a bloquista referiu outro valor e defendeu o mesmo aumento, mas para pensões até aos 845 euros. A atualização das restantes pensões seria feita de acordo com a inflação. Impacto: de acordo com o Jornal de Negócios, ambas as propostas — a do Bloco e a do PCP — teriam um impacto orçamental semelhante, de 400 milhões de euros. Na prática, o Bloco defende uma subida de 10 euros para 90% das pensões da Segurança Social e 80% dos pensionistas da Caixa Geral de Aposentações — o que abrange grande parte dos reformados. Os pensionistas que ficam de fora deste bolo, verão a sua pensão atualizada de acordo com a inflação. O impacto total das duas propostas deverá ser semelhante.
Extinção da Sobretaxa do IRS
Não está nada fechado. Mas existe a possibilidade de a sobretaxa de IRS não terminar para todos os contribuintes no final deste ano. A famosa medida que começou por ser aplicada ainda por Teixeira dos Santos para cortar uma parte do subsídio de natal de 2010, generalizou-se depois com Vítor Gaspar nas Finanças e o seu desaparecimento foi prometido pela primeira vez por Maria Luís Albuquerque, ainda no tempo do Governo PSD/CDS.
António Costa e Mário Centeno garantiram (na lei) que a sobretaxa desaparecia no final deste ano, mas agora a conversa pode ser diferente já que, para financiar o aumento das pensões acima da inflação (ainda por fechar), poderá permanecer em 2017. Até quando? Ainda está por definir. Quem afetará? Ainda está por definir. Avançará mesmo? Ainda está por definir, como tantos outros aspetos neste orçamento, quando faltam pouco mais de três dias para a sua apresentação.
380 milhões
Perda estimada de receita em 2017 com o fim definitivo da sobretaxa. Em 2016, a primeira redução na sobretaxa representou uma quebra de 430 milhões de euros.
Este ano, os rendimentos mais baixos (entre 7 mil e 20 mil euros) pagaram ainda 1% de sobretaxa, valor que se estendia até aos 3,5% de sobretaxa para rendimentos acima de 80 mil euros. Impacto: O Governo prevê uma perda de receita de 430 milhões de euros este ano e, em 2017, uma quebra adicional de 380 milhões.
Regime de deduções de Educação no IRS
Ainda no IRS, o Governo vai avançar com uma revisão no regime de deduções com despesas de Educação. O objetivo é introduzir um teto para as deduções possíveis e alargar o leque do que é ou não dedutível no IRS. Exemplo prático: as refeições nas cantinas e a aquisição de material escolar podem passar a ser deduzidos.
Atualização do Indexante dos Apoios Sociais (IAS)
A medida já estava fechada desde do Orçamento do Estado para 2016, mas só vai ter efeitos práticos em 2017. O Governo vai atualizar o Indexante de Apoios Sociais (IAS) em linha com a inflação do ano passado, cerca de 0,7%. Isto em teoria: Bloco de Esquerda e PCP defendem uma atualização acima desse valor para recuperar o poder de comprar perdido nos últimos anos. Impacto: de recordar que o IAS é um instrumento que serve para o cálculo direto de várias prestações e apoios sociais, nomeadamente o subsídio de desemprego ou o complemento solidário para idosos. Tudo somado, uma atualização do IAS pode representar um aumento das despesas.
Controlo de trabalhadores na Função Pública
Governo deverá manter a regra que permite contratar um trabalhador por cada dois que deixem a Função Pública. Impacto: António Costa prevê uma poupança de mais 122 milhões de euros na “política de emprego público e outros incentivos à produtividade” em 2017, rubrica onde se inclui esta regra.
Impostos sobre património imobiliário
Depois de dito e desdito, ainda está por dizer como fica. Para já, o que está em cima da mesa ainda é de este imposto se aplicar sobre o património com valor tributável agregado superior a 500 mil euros (valor ainda não completamente fechado) e a taxa a aplicar deve ser superior a 0,2% (valor também ainda por finalizar). O Governo estima que esta medida dê uma receita de cerca de 100 milhões de euros ao Estado.
Cortes na despesa com consumo intermédio e juros
€180 M
Poupanças que o Governo tenciona fazer através do congelamento da despesa corrente.
Em 2017, o Governo pretende poupar 300 milhões de euros em consumos intermédios, uma estimativa incluída no Programa de Estabilidade e que não considera a redução dos encargos com Parcerias Público-Privadas (PPP). O executivo pretende ainda poupar 180 milhões de euros através do congelamento da despesa corrente e gastar menos 141 milhões de euros nos juros com a dívida pública. No entanto, não explica como nem em que rubricas. Entretanto, na circular com as instruções de preparação do Orçamento do Estado para 2017, as Finanças pediram aos serviços para que incorporassem nos planos orçamentais iniciativas de “melhoria da eficiência e de controlo de despesa que permitam acomodar o efeito de novas pressões orçamentais, mas também gerar folgas financeiras para acomodar eventuais novos projetos”.
Novo imposto sobre as bebidas açucaradas
Depois de muita discussão sobre que produtos seriam taxados no famoso “Fat Tax”, avançado pelo Jornal de Negócios, o Governo parece ter assentando nas bebidas açucaradas, criando uma taxa específica para o efeito.
Orçamento Participativo de Portugal
O orçamento total será de três milhões de euros. O dinheiro será investido nas áreas da Cultura, Agricultura, Ciência, Educação e formação de adultos. Os projetos vencedores serão executados a partir de setembro de 2017.
Novo Imposto sobre o Alojamento Local
O Governo está a trabalhar numa proposta que prevê o aumento da tributação do Imposto do Alojamento Local de 5%, o seu valor atual, para 28%. De acordo com o Expresso, o Executivo liderado por António Costa quer equiparar o valor pago pelo arrendamento habitacional com o local, que têm taxas diferentes. A proposta já passou pelo Ministério da Economia e do Ambiente (que tutela as políticas relativas à habitação) e está agora nas mãos do Ministério das Finanças.
Corte nas rendas da energia
Era uma das grandes prioridades do Bloco de Esquerda e tudo aponta para que se venha a confirmar já neste Orçamento do Estado. Socialistas e bloquistas parecem ter chegado a um princípio de acordo sobre o corte nas chamadas rendas da energia — valores que as grandes empresas exportadoras, de vários setores, recebem para estar disponíveis para parar as máquinas caso ocorram picos de consumo elétrico. Impacto: este combate às rendas pode valer mais de 100 milhões de euros em receita fiscal.
Gratuitidade dos manuais escolares
O cenário em cima da mesa, para já, é de ser alargado este regime apenas ao segundo ano do primeiro ciclo, para além do primeiro ano
O que já se sabia (mas tem impacto no orçamento)
Redução do IVA da Restauração
A taxa do IVA na restauração caiu de 23% para 13% a meio deste ano. Por isso, o seu impacto na receita do Estado ainda não se fez sentir em pleno. As contas do Governo naquele momento davam conta de um impacto de 175 milhões de euros para apenas um semestre. Em 2017, esta medida fará sentir-se em todo o ano. O custo anual era estimado em 350 milhões de euros.
Fim dos cortes salariais na Função Pública
Acabaram em outubro, ao fim de quase seis anos em vigor. Este ano, a redução foi faseada, sendo devolvida uma parte dos cortes em cada trimestre. No último trimestre deste ano
Extinção integral da Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES)
O Governo pretende extinguir de vez a Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES), uma medida implementada em 2011 e que, desde 2015, incide sobre as pensões superiores a 4.611,42 euros. O impacto estimado do Governo é de 18 milhões de euros.
O que não deve acontecer
Descongelamento dos salários
Ainda que faça parte do plano de António Costa — e dos parceiros de esquerda –, ainda não será em 2017 que os salários dos funcionários públicos vão ser descongelados. De acordo com o Programa de Estabilidade apresentado pelo Governo socialista, a progressão nas carreiras da Função Pública deverá manter-se congelada e não estão previstos aumentos da despesa com aumentos salariais.
Redução da TSU para os trabalhadores com mais baixos salários
Foi uma medida emblemática e que saiu com estrondo do orçamento para 2016 (por causa das exigências de Bruxelas), mas da qual mal se ouviu falar para já. Quando o Governo, na madrugada de 5 de fevereiro deste ano, conseguiu finalmente chegar a acordo com a Comissão Europeia e evitar o chumbo do documento, teve de deixar cair esta medida (o acordo do PS com o Bloco de Esquerda prevê a redução da TSU em quatro pontos percentuais para trabalhadores que ganham menos de 600 euros). O Governo garantiu depois que era para avançar este ano, mas o ministro Vieira da Silva disse em entrevista ao Jornal Económico que este ano estava fora de causa.