(Este artigo foi publicado a 25 de junho e e republicado agora, no dia 1 de julho, data a partir da qual se aplicam as restrições a 19 freguesias da Área Metropolitana de Lisboa)
“No essencial, a situação é estável”. Esta foi a frase mais repetida pelo primeiro-ministro durante a conferência de imprensa onde anunciou que, a partir de 1 de julho, vai haver uma diferença significativa no estado de prontidão no território nacional: 19 freguesias da região de Lisboa vão manter-se em estado de calamidade, com a imposição do dever cívico de recolhimento, podendo apenas sair-se de casa para trabalhar, ir às aulas, adquirir bens essenciais ou prestar ajuda a familiares; isto enquanto a Área Metropolitana de Lisboa fica em estado de contingência, que é um estado intermédio; e o resto do país passa a estado de alerta, o mais suave dos níveis de exceção e do qual “não sairemos seguramente até ao final da pandemia”.
Ou seja, se o mapa de Portugal fosse um semáforo, o país estava todo a amarelo, enquanto a Área Metropolitana de Lisboa estava a laranja e as 19 freguesias assinaladas como mais problemáticas a vermelho. Verde só mesmo quando houver uma vacina.
Até lá, as regras serão mais rígidas. E as coimas mais altas. Para pessoas singulares que não cumpram a proibição de consumo de álcool na rua ou que não cumpram a limitação de ajuntamentos, por exemplo, a multa pode ir de 100 a 500 euros. Enquanto para entidades coletivas que não cumpram os horários de funcionamento dos estabelecimentos ou as regras de higienização, as multas irão de 1000 a 5000 euros. Para António Costa, o mote é simples: mais liberdade implica mais responsabilidade e pulso mais pesado das forças de segurança. As novas regras entram em vigor no dia 1 de julho e dentro de 15 dias haverá nova avaliação.
O que muda afinal no país, na região de Lisboa e nas 19 freguesias assinaladas? Fizemos as perguntas e damos as respostas possíveis, quando ainda falta conhecer a resolução do Conselho de Ministros que define a concretização do que foi anunciado por António Costa (este texto será atualizado assim que seja conhecido o despacho).
1Moro em Massamá (uma das 19 freguesias que ficam em estado de calamidade) e trabalho em Arroios. Posso sair de casa para ir trabalhar ou tenho de ficar em teletrabalho?
Pode. O dever cívico de recolhimento que passa a estar em vigor nas 19 freguesias mais afetadas não é um confinamento obrigatório. António Costa fez questão de dizer que dever cívico não é o mesmo do que confinamento obrigatório. “O confinamento obrigatório é apenas para as pessoas doentes [contagiadas] ou sujeitas a vigilância ativa [identificadas como estando em contacto com um contagiado]”, disse, sublinhando que o dever cívico de recolhimento, previsto na lei, vem associado a uma série de exceções, onde se incluem as saídas para trabalhar, as saídas para adquirir bens essenciais como comida e medicamentos, cuidados de saúde, para prestar assistência a familiares ou para ir à escola, no caso dos alunos que frequentaram aulas presenciais e que agora vão ter exames nacionais, ou ainda para pequenos passeios higiénicos. Assim sendo, nada prevê que haja um apelo mais intensivo ao teletrabalho nestas freguesias: quem já estava a trabalhar presencialmente pode manter-se nesse registo, mesmo morando ou trabalhando numa das freguesias em estado de calamidade.
2 Mas preciso de algum papel da empresa a provar onde trabalho?
Não. A saída para trabalhar vai ser uma das exceções previstas na lei do dever cívico de recolhimento e não será preciso uma prova, um papel, para o fazer. “Não é preciso papel nenhum”, disse à Rádio Observador o coordenador regional de Lisboa e Vale do Tejo para a Covid-19, Duarte Cordeiro. No limite, se for abordado pela polícia, explica o motivo da deslocação.
3 Moro em Odivelas, significa que não posso ir jantar fora quando chegar a casa?
Pode. Uma das exceções do dever cívico de recolhimento são as “deslocações a estabelecimentos, repartições ou serviços não encerrados no âmbito do presente regime”, onde se incluem restaurantes ou cafés dentro do horário previsto na nova lei. Nada indica que os estabelecimentos comerciais e de restauração inseridos nestas freguesias tenham um horário diferente do horário aplicado em toda a Área Metropolitana de Lisboa: os restaurantes podem funcionar até às 23h e os demais estabelecimentos comerciais até às 20h.
4 E posso sair para visitar familiares que moram noutro concelho (que não está em estado de calamidade)?
A deslocação entre concelhos não está proibida. Mas, dado o dever de recolhimento, só deve visitar familiares se for para prestar assistência a idosos, vulneráveis e dependentes. Ou para ir entregar bens essenciais a estas mesmas pessoas, ou, claro, se forem “deslocações para acompanhar menores”. A lista exata de exceções para o dever cívico de recolhimento vai ser publicada ainda esta quinta-feira quando for divulgada a resolução do Conselho de Ministros.
5 Moro na Amadora, posso juntar-me com uns amigos num jardim público, ao ar livre, a conversar?
Só se forem menos do que cinco amigos, e mesmo assim só se a ida ao jardim for de “curta duração, para efeitos de fruição de momentos ao ar livre”. A regra dos ajuntamentos nestas freguesias que permanecem em estado de calamidade é de apenas 5 pessoas (no resto da região de Lisboa é 10 e no resto do país é 20). E, recorde-se, continua a vigorar o dever cívico de recolhimento, que não vigora em mais nenhuma parte do país, pelo que só deve sair se for estritamente necessário. O que não podem fazer é juntar-se no jardim com umas bebidas, já que o consumo de álcool na via pública é proibido em todo o território nacional.
6 E se for no concelho de Lisboa, já posso?
Pode, mas só se forem até 10 amigos, mas a proibição de consumo de álcool na via pública continua a vigorar (como em todo o país, de resto). Além de que está também proibida a venda de álcool nas estações de serviço e bombas de gasolina em toda a área metropolitana de Lisboa.
7 O que acontece se a polícia me apanhar na rua a beber uma cerveja com uns amigos?
A polícia já não terá uma ação apenas pedagógica a partir de agora: vai mesmo multar. As coimas vão de 100 a 500 euros no caso de pessoas singulares, e de 1000 a 5000 euros no caso das entidades coletivas. A ideia é travar o botellon (ato de beber álcool na rua em grupo) e impedir os ajuntamentos acima do previsto na lei: apenas 5 pessoas nas freguesias em calamidade, 10 pessoas no resto da região de Lisboa e 20 pessoas em todo o país. Qualquer festa ilegal no norte do país, por exemplo, com mais de 20 pessoas, também será punida.
8 Relembrem-me, então, quais são as 19 freguesias que ficam em estado de calamidade?
São todas as freguesias do concelho da Amadora e todas as freguesias do concelho de Odivelas. Em Sintra são seis as freguesias abrangidas: Queluz-Belas, Massamá-Monte Abraão, Agualva-Mira Sintra, Algueirão-Mem Martins, Rio de Mouro e Cacém-São Marcos. Em Loures são: Camarate, Unhos e Apelação e Sacavém-Prior Velho. E em Lisboa, apenas a freguesia de Santa Clara.
9 Até quando tenho de ficar neste dever cívico de recolhimento?
Estas medidas entram em vigor no dia 1 de julho e vigoram, pelo menos, até dia 15. Nessa altura é feita nova avaliação para saber se há condições para aliviar as medidas nas 19 freguesias mais críticas e também na região de Lisboa como um todo. A última resolução do Conselho de Ministros que existia sobre medidas de confinamento (relativas à última quinzena) terminou vigência no dia 28, mas o Governo decidiu prorrogá-la por mais dois dias (até ao fim do mês, 30) para evitar dois dias de vazio legal.
10 E o que me acontece se não cumprir esse dever de recolhimento?
Se não estiver sob vigilância das autoridades de saúde (e muito menos infetado), as forças de segurança podem apenas recomendar-lhe o regresso ao domicílio. O dever de recolhimento é apenas isso: “Um dever cívico”.
11Mas então, não percebi bem. Este dever cívico de recolhimento para quem mora nessas freguesias, obriga-me exatamente a quê? Não posso ir à praia, por exemplo?
A lista de exceções ao dever de recolhimento vai ser publicada quando for divulgada a resolução do Conselho de Ministros, ainda esta quinta-feira. Mas, segundo apurou o Observador junto do Governo, “são muitas” as exceções. Ir à praia é uma das dúvidas: não estava prevista na lista de exceções de maio, quando passámos do estado de emergência para o de calamidade, mas nessa altura ainda não tinha aberto a época balnear. Em todo o caso, o dever cívico de recolhimento acaba por ser um dever pedagógico, uma vez que pode continuar a sair para trabalhar, ir às compras, adquirir serviços, entre muitas outras coisas. No fundo, a ideia é que não deve sair de casa se não for estritamente necessário. Há coisas que não são taxativamente proibidas, mas não se devem fazer uma vez que existe este dever cívico de recolhimento domiciliário.
12 As pessoas mais velhas vão ter de ficar outra vez fechadas em casa, ou, pelo menos, devem ficar mais recolhidas nestas freguesias?
Não, não há nenhuma regra específica que indique que os mais velhos devem ter especial dever de recolhimento. O que vale para os mais novos naquelas freguesias vale para os mais velhos: só devem sair de casa se for estritamente necessário. O objetivo é travar o surto que, nessas freguesias identificadas, está mais descontrolado por não se saber qual foi a origem das cadeias de transmissão. Daí a necessidade de vigiar e isolar os casos identificados, para travar a propagação. A obrigatoriedade de confinamento vale apenas para quem está sinalizado como doente ou como contacto próximo com pessoas infetadas.
13 Ia de férias para o Algarve nos próximos dias. Já não posso?
A deslocação entre concelhos não está proibida. A única coisa que prevalece nas 19 freguesias é o tal dever cívico de recolhimento, mas com as tais exceções. Sobre as férias, o primeiro-ministro foi questionado sobre o que aconteceria se uma pessoa estivesse de férias e ficasse doente ou tivesse contacto com um caso positivo e aí a resposta foi muito prática: “Se precisa de tratamento domiciliário, provavelmente o confinamento será mais fácil fazer no local de residência do que no local de férias, mas cada médico determinará”. Ou seja, o melhor será voltar para casa. Mas não há nada que diga taxativamente que alguém que viva na região de Lisboa e com férias marcadas para fora não o possa fazer.
14 A margem sul do Tejo também está abrangida por estas regras?
Sim. A margem sul faz parte da Área Metropolitana de Lisboa e, como tal, está ao abrigo do estado intermédio de contingência, onde vigoram regras específicas nomeadamente ao nível do novo horário de funcionamento dos estabelecimentos comerciais e da limitação de ajuntamentos a 10 pessoas. António Costa explicou que “havendo uma grande mobilidade de uma margem para a outra, achámos que fazia sentir tratar de forma homogénea a Área Metropolitana de Lisboa”.
15 Tenho uma loja num grande centro comercial e nos últimos tempos tenho fechado às 23 horas. Agora vou ter de fechar três horas mais cedo. Vou ter direito a algum apoio do Estado tendo em conta as perdas que vou ter?
Não há novos apoios do Estado para estas zonas que voltam a ter medidas mais restritivas. As medidas que estão em vigor são a que estão previstas no Programa de Estabilização Económica e Social.
Como vai ser executado e quanto custa o programa de emergência do Governo