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A animosidade de Leonid Nevzlin para com o Presidente russo não começou apenas em 2022
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A animosidade de Leonid Nevzlin para com o Presidente russo não começou apenas em 2022

Facebook/Leonid Nevzlin

A animosidade de Leonid Nevzlin para com o Presidente russo não começou apenas em 2022

Facebook/Leonid Nevzlin

Quem é Leonid Nevzlin, o oligarca que diz ter sido "um dos primeiros sacos de pancada de Putin" e agora revela os segredos do Kremlin

Contou que o ministro da Defesa russo pode ter sido envenenado, que 20 generais foram demitidos e que o ex-presidente da Federação de Xadrez sofreu ultimato. Quem é Leonid Nevzlin, inimigo de Putin?

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“Tudo o que Putin toca morre.” Cerca de uma semana depois de a Rússia invadir a Ucrânia, Leonid Nevzlin anunciava a renúncia à nacionalidade russa. O milionário (agora apenas israelita) insurgia-se contra a guerra: “Sou contra o genocídio do povo ucraniano. Sou um cidadão de Israel e, se pensar numa segunda cidadania, ficaria orgulhoso se tivesse um passaporte ucraniano”, afirmou, opondo-se frontalmente à escalada bélica do Kremlin. Esta quinta-feira, o magnata revelou o que serão segredos confidenciais sobre o governo russo.

A animosidade do investidor para com o Presidente russo não começou apenas em 2022. É já uma longa história — que envolve homicídios, uma deportação falhada e até tribunais internacionais. No mesmo post do Facebook em que dava conta de que ia deixar de ser russo, Leonid Nevzlin lembrava que tinha sido um dos “primeiros sacos de pancada” de Vladimir Putin, que atirou os seus “amigos para a prisão” — e “matou” mesmo alguns. “Roubou-me negócios e casas perdidas em Moscovo”, lamentava, contando que esta perseguição o levou a fugir para Israel, onde vive atualmente.

“Passei quase 20 anos fora da Rússia, mas foi isso que me permitiu ver o processo de apodrecimento e decomposição que está a acontecer”, criticou Leonid Nevzlin, salientando que durante duas décadas “lutou contra os cúmplices de Putin” com todas as suas forças. “Há muito tempo que tento não associar aos bandidos no poder à generalidade da população russa, mas era impossível não assistir que, ano após anos, a Rússia foi-se degenerando ao seguir o seu ‘líder’.”

O negócio milionário, a tentativa de extradição e os tribunais internacionais

Na década de 90, em que ocorreu uma série de privatizações dos setores-chaves da economia russa com o fim da União Soviética, um grupo de oligarcas — em que estava incluído Leonid Nevzlin — decidiu adquirir a Yukos, uma companhia energética e petrolífera. Para conseguirem usufruir de uma política fiscal mais ‘amiga’, os magnatas transferiram a sede da empresa primeiro para as regiões com menos impostos na Rússia e depois para paraísos fiscais no estrangeiro.

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Após vários confrontos com o Kremlin e com a chegada de Vladimir Putin ao poder em 2000 (que nunca escondeu que queria diminuir o papel desses oligarcas — que não controlava), o homem mais rico da Rússia e o principal acionista da Yukos, Mikhail Khodorkovsky, foi preso, em 2003, por suspeitas de evasão fiscal, peculato e fraude na Yukos. Também Leonid Nevzlin deveria ter sido detido — mas acabou por conseguir fugir para Israel.

Yukos Oil and Gas Company

Uma das explorações petrolíferas da Yukos

Getty Images

A justiça russa pediu a extradição de Leonid Nevzlin e a retirada do passaporte, tendo alegado que era suspeito igualmente de evasão fiscal mas também de outros crimes bem mais graves, como homicídio qualificado e homicídio na forma tentada. Ainda assim, Israel rejeitou extraditar o magnata, decidindo também que não lhe retiraria o passaporte. Na base da deliberação do Supremo Tribunal Israelita esteve a falta de provas da acusação russa, principalmente no diz que respeito aos crimes de homicídio sobre os quais não se conhecem quaisquer detalhes.

A batalha legal não se ficou por aqui, tendo-se mesmo intensificado. Em 2008, num julgamento in absentia (sem a presença do acusado), Leonid Nevzlin foi condenado à pena mais gravosa na justiça russa: a prisão perpétua. No entanto, o magnata acabou por não a cumprir, já que estava fora do país e foi constantemente negando todas as acusações, dizendo sempre que estava a ser alvo de uma perseguição política.

Não foi, contudo, a única frente da batalha legal de um megaprocesso que já dura há décadas. Contestando as decisões da justiça russa, o grupo de magnatas da Yukos decidiu recorrer, em 2005, aos tribunais internacionais, mais concretamente ao Tribunal Permanente de Arbitragem com sede em Haia, nos Países Baixos. Nove anos depois, chegou o desfecho — favorável aos milionários e que obrigaria a Rússia a pagar 50 mil milhões de dólares de indemnização.

O megaprocesso ainda não terminou, tendo sido interpostos vários recursos entretanto. Porém, as sucessivas vitórias de Leonid Nevzlin mostram que Vladimir Putin talvez não seja tão invencível como pensa.

Os segredos de Leonid Nevzlin: o ministro da Defesa russo que sofreu de um ataque cardíaco de “forma não natural”

Com fontes em Moscovo, Leonid Nevzlin é muito ativo nas redes sociais, tendo colocado-se desde o primeiro momento ao lado da Ucrânia no atual conflito com a Rússia e atacando de forma permanente o Kremlin. Esta quinta-feira, na sua conta pessoal do Facebook, o magnata divulgou informações confidenciais, citando fontes próximas do governo russo.

A primeira relacionava-se com o ministro da Defesa russo, que esteve desaparecido mais de duas semanas. Ao que o magnata diz ter apurado, Sergei Shoigu está “fora de jogo” dentro do Kremlin por ter alegadamente sofrido um “ataque cardíaco”, uma informação que já tinha sido tornada pública, se bem que nunca tenha sido confirmada oficialmente pelo governo russo. Contudo, Leonid Nevzlin revelou algo que até esta quinta-feira permanecia desconhecido: os problemas cardiovasculares podem não ter “ocorrido por causas naturais”, suspeitando-se mesmo de envenenamento.  

Sergei Shoigu e Vladimir Putin, que eram bastantes próximos antes do início da guerra

Getty Images

No final de março, o antigo ministro-adjunto do Interior ucraniano, Anton Gerashchenko, revelou mais detalhes sobre o ministro que ocupa uma obviamente pasta fundamental durante uma guerra. O responsável ucraniano indicou que Sergei Shoigu sentiu-se mal “após duras acusações de Vladimir Putin” pelo “fracasso total da invasão da Ucrânia”: “É por isso que ele não aparece em público desde meados de março”, disse.

Além disso, Anton Gerashchenko sinalizou que Sergei Shoigu está agora internado a recuperar das sequelas do ataque cardíaco, uma informação que também foi corroborada pelo magnata israelita: “Está nos cuidados intensivos, ligado às máquinas”.

A não ser que o problema de saúde tenha acontecido nas primeiras semanas de março, estes dados parecem ser contraditórios com as aparições públicas de Sergei Shoigu. Ainda esta quarta-feira, o ministro da Defesa russo apareceu numa videoconferência com Vladimir Putin para discutir a situação do Ártico, apesar de não se ter pronunciado em momento algum, havendo a hipótese de poder tratar-se de uma gravação.

Mas não foi a única vez. No dia a seguir a Anton Gerashchenko ter revelado o alegado ataque cardíaco do ministro, o Kremlin revelou um vídeo em que o responsável pela pasta da Defesa russo estava a presidir a uma reunião de altas patentes militares e a discutir o abastecimento de armas às tropas russas na Ucrânia. E houve ainda outro caso que fez levantar ainda mais suspeitas sobre o seu paradeiro: antes de aparecer reunião ministerial remota com Vladimir Putin, assistiu-se a uma estranha interferência na parcela do ecrã onde depois apareceu Sergei Shoigu.

Após notícias sobre ataque cardíaco, Moscovo divulga vídeo do ministro da Defesa russo a falar em público

Ou seja, nenhuma das suas aparições públicas são rigorosamente fiáveis. Como também não é possível confirmar as informações avançadas por Leonid Nevzlin ou as suspeitas que deixa sobre o caso.

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O desvio de fundos e o ex-conselheiro de Putin em prisão domiciliária

De acordo com Leonid Nevzlin, o Kremlin já terá também prendido 20 generais, devido a um alegado desvios de fundos. “Desde 2014, cerca de dez mil milhões de dólares destinados a Putin para poder preparar a guerra na Ucrânia foram roubados”, denunciou o magnata israelita, não revelando contudo grandes detalhes sobre a identidade destas altas patentes militares. E não sendo também possível confirmar as suas informações.

Há uma exceção (de peso), todavia: Vladislav Surkov, que ficou em “prisão domiciliária” na sequência do alegado desvio de fundos pelas forças armadas russas. Considerado um dos principais ideólogos do regime, o responsável foi um dos conselheiros de Vladimir Putin até 2020 — quando foi demitido pelo próprio Presidente russo.

Vladislav Surkov sempre se manifestou a favor da invasão ao país vizinho. Numa entrevista à RadioFreeEuropa, o ex-conselheiro do Presidente russo afirmou que “não havia Ucrânia”. Em vez disso, existia uma “desordem da mente, uma paixão sem freios e levada aos extremos pela etnografia. “A história local é tão sangrenta. É uma confusão em vez de um Estado… Não existe uma nação. Só existe um panfleto: ‘A autointitulada Ucrânia'”.

Russian President Medvedev Visits Kurchatov Atomic Institute

Vladislav Surkov, um dos principais ideólogos do regime russo e possível (agora improvável) sucessor de Putin

Getty Images

Apesar de as suas posições públicas serem a favor da guerra — e terem paralelismos com o discurso de Vladimir Putin no dia da invasão à Ucrânia —, Vladislav Surkov deverá estar fora do Kremlin. No passado, tinha sido até considerado um dos possíveis sucessores para o cargo de Presidente russo — algo que, com esta acusação, será muito improvável.

O ex-presidente da Federação de Xadrez contra a guerra que tem de “testemunhar contra os colegas”

Outra das informações divulgadas pelo magnata israelita relaciona-se com Arkady Dvorkovich, economista, ex-presidente da Federação Internacional de Xadrez e um dos ex-conselheiro de Dmitry Medvedev, um dos braços-direitos de Putin. Segundo Leonid Nevzlin, está a ser “preparado um processo crime” para que “testemunhe contra os seus colegas e amigos”. Caso Arkady Dvorkovich não colabore, os serviços secretos russos ameaçam-no com uma pena de prisão.

Arkady Dvorkovich foi uma das poucas vozes dentro do Kremlin que se opôs abertamente contra a guerra na Ucrânia. “A guerra é uma das piores coisas que alguém podem enfrentar na vida. As guerras não matam apenas vidas sem preço. Matam esperanças e aspirações, congelam e destroem relações e conexões. Os meus pensamentos estão com os civis ucranianos.” 

Ambrosetti International Economic Forum 2018

Pela posição antiguerra, Arkady Dvorkovich teve de demitir-se do cargo de presidente da Federação Internacional de Xadrez

Getty Images

Após estas declarações, que chocam de frente com a escalada bélica do Kremlin, Arkady Dvorkovich foi acusado de ser um “traidor nacional” por vários deputados na câmara baixa do Parlamento russo. “Pensas que te podes esconder atrás de um tabuleiro de xadrez?”, atirou um dos aliados de Vladimir Putin, Dmitry Rogozin.

A sua posição antiguerra também já levou a que Arkady Dvorkovich sofresse represálias na carreira, tendo-se demitido da Federação Internacional de Xadrez. Agora parece que ou muda de posição ou sofre as consequências.

Isto se as informações do inimigo de Putin estiverem certas e se Leonid Nevzlin se estiver também ele a vingar, de forma fria, da perseguição de que é alvo pelo presidente russo.

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