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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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Um expansionismo prudente no Orçamento

É o Orçamento para os mais afetados pela pandemia e para recuperar os serviços públicos (Saúde e Educação). Com um expansionismo prudente, em que a locomotiva é o Estado. Um ensaio de Helena Garrido.

Moderar os efeitos financeiros da pandemia nas famílias e nos negócios e investir em recursos humanos e equipamentos na Saúde e na Educação são as marcas do Orçamento do Estado para 2021 que está no Parlamento desde dia 12 de Outubro sem garantia de aprovação à esquerda. Apostando na recuperação da economia em 2021, mas sem certezas, as contas públicas para o próximo ano são prudentes na sua generosidade. Mas, pela primeira vez desde 2009, contribuem de forma visível para o crescimento da economia, por via do aumento do emprego público.

Boa parte das contas públicas do ano de 2021 estão desenhadas para garantir uma aterragem suave às famílias e às empresas mais afetadas pela pandemia. Paralelamente, o Estado põe a sua máquina em movimento para a economia começar a levantar voo, com a execução de investimentos planeados e a contratação de funcionários. Com a prudência ditada pela preocupação de manter a confiança dos mercados financeiros em Portugal, o Governo acaba por aplicar a receita que tem sido recomendada pelos economistas para esta fase da pandemia: apoiar quem mais precisa e investir.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

A herança do passado refletida na dívida pública impede que se vá mais longe. Não é com estas palavras que se lê esta mensagem nos documentos do Orçamento, mas é assim que se percebe quando se alerta para os riscos de instabilidade financeira. Ou quando na apresentação pública do Orçamento, o ministro das Finanças João Leão coloca na mesma frase responder à crise, recuperar a economia e rigor nas contas públicas.

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É um Orçamento sem austeridade quando austeridade é entendida como redução de rendimentos por via de aumento de impostos ou redução da despesa pública. Mas para quem considere que se devia ir mais longe – como a esquerda – ou que se poderia hoje ter mais margem para ir mais longe se o passado recente tivesse sido diferente – como a direita -, aquilo que temos é o orçamento possível. Que tem a sua concretização, como está planeado, nas mãos da evolução da pandemia.

Um crescimento nas mãos da pandemia

Já houve orçamentos muito difíceis de executar, mas a causa foi sempre a falta de dinheiro. O Orçamento do Estado para 2021 é um desafio pelo ambiente inédito que vivemos de incerteza total em tempo de paz. Neste momento, todas as organizações nacionais e internacionais preveem uma recuperação acentuada da economia em 2021, tal como o Governo. As diferenças estão quer na profundidade da quebra este ano, quer na dimensão da retoma no próximo. Mas realmente ninguém o pode assegurar, face à imprevisibilidade da pandemia. O investimento público e apoios seletivos ao rendimento são a estratégia base do Governo para 2021, até que a pandemia saia do horizonte e em linha com o que tem sido recomendado pelos economistas. A aposta no sector privado, na recuperação, será a segunda fase.

As contas públicas de 2021 estão feitas tendo como referência um crescimento de 5,4%, antecipando que a pandemia vai-se reduzindo ao longo do segundo semestre de 2021. Essa evolução da economia tem um contributo significativo da procura interna (mais 4,1 pontos percentuais). Mas a evolução do consumo e, em parte, do investimento têm como pilar fundamental a redução da incerteza, que induzirá a maior disponibilidade para o consumo, por via da redução da poupança que foi ditada pelo medo, mas igualmente pelo aumento do emprego na administração pública e no sector privado.

O investimento é, neste momento, o que tem menos riscos descendentes, ou seja, reúne melhores condições de evoluir, se não em linha, pelo menos perto do aumento de 5,3% previstos. Há duas razões fundamentais para essa previsão: uma está relacionada com o Estado que verá em 2021 a execução de boa parte dos projetos que têm vindo a ser anunciados; outra diz respeito ao sector privado que, por ter maior agilidade, poderá conseguir já em 2021 começar a concretizar projetos financiados por fundos europeus.

O investimento é, neste momento, o que tem menos riscos descendentes, ou seja, reúne melhores condições de evoluir, se não em linha, pelo menos perto do aumento de 5,3% previstos. Há duas razões fundamentais para essa previsão: uma relacionada com o Estado – que verá em 2021 a execução de boa parte dos projetos anunciados – outra diz respeito ao sector privado.

Como se pode ler no Relatório do OE 2021 (páginas 40 e seguintes), os investimentos classificados como estruturantes deverão ascender a pouco mais de 1.700 milhões de euros em 2021, com a área da Educação (619 milhões de euros) e da Ferrovia (384 milhões) a concentrarem mais de metade desse valor. Em matéria de investimento público, mantém-se a concretização de “pequenas obras” enquadradas no Programa de Estabilização Económica e Social (PEES) e o Governo admite ainda que possa começar a concretizar alguns projetos apoiados pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) cujo primeiro rascunho foi entregue pelo Governo em Bruxelas a 15 de Outubro. A habitação, designadamente dirigida à classe média, perspetiva-se como uma das promessas que tem recursos financeiros para, pelo menos, começar a ser cumprida em 2021.

Muito dependente da pandemia quer do lado da oferta como da procura, mesmo com a perspetiva de uma acentuada recuperação em 2021, o rendimento dos portugueses vai cair para valores quase de há uma década. E em 2021 o PIB ainda estará 96% abaixo daquilo que em termos reais se produzia em 2019, nas previsões do Governo. Tanto quanto é possível prever, assistiremos a uma recessão em V que será menos longa do que a registada na designada era da troika. Mas a última década e meia tem no PIB a imagem de uma autêntica montanha russa.

O Orçamento em tempo de pandemia tem implícita uma política que ainda tem uma boa dose de terapias de cuidados intensivos combinadas com algumas vitaminas, umas e outras fornecidas pelo Estado. Temos assim as medidas que pretendem apoiar as famílias e empresas mais afetadas pela crise – que o Governo designa como de “mitigação da crise” – e aquelas que, por via de um conjunto de investimentos públicos, pretendem dar um “impulso” à atividade económica. No seu conjunto, estamos perante um ano em que a locomotiva da economia vai ser fundamentalmente o Estado.

Os cuidados intensivos e as vitaminas

As medidas previstas no Orçamento para 2021 apontam para uma “entrada” adicional de recursos na economia da ordem dos 3600 milhões de euros ou 1,7% do PIB previsto para o próximo ano, de acordo com o quadro do relatório do Orçamento do Estado sobre as principais medidas de política orçamental (pg. 65) adaptado aos dois grandes objetivos, o de liquidez e impulso à economia. É um valor adicional que não integra, por exemplo, o que o Estado pretende concretizar em matéria de investimentos estruturantes – como o investimento na ferrovia – nem as medidas que foram adotadas em anos anteriores e terão efeitos orçamentais em 2021.

É ainda o pilar da mitigação dos efeitos da pandemia ou de aterragem suave que pesa mais nas medidas de política que o Governo pretende adotar em 2021. No seu conjunto, e de acordo com a classificação que seguimos, correspondem a quase três quartos do montante que o Orçamento prevê aumentar em despesa ou reduzir em receita no próximo ano.

MÁRIO CRUZ/LUSA

Neste conjunto, o apoio extraordinário ao rendimento dos trabalhadores e as medidas de apoio ao emprego e à retoma da economia, esta última abrangendo também as empresas, equivalentes a 0,7% do PIB, são as medidas que poderão ter efeitos mais significativos em termos de moderação dos efeitos negativos da crise. Com o IVA da eletricidade – um compromisso passado – e o alargamento ao segundo escalão da gratuitidade das creches são as medidas mais fortes do Orçamento no combate às desigualdades geradas pela pandemia. Junta-se ainda a majoração do limite mínimo do subsídio de desemprego que terá um efeito de aumento da despesa de 75 milhões de euros.

O apoio extraordinário será no mínimo de 50 euros e o máximo de 501,16 euros e deverá ter uma condição de recurso menos exigente. As medidas de apoio ao emprego e à retoma seguem a lógica do que foi concretizado em 2020, ajudando mais as atividades mais afetadas e sendo retiradas à medida que a recuperação se concretize.

A decisão de reduzir as taxas de retenção na fonte em 2021 e o crédito de IVA na restauração, hotelaria e atividades culturais, embora aumente o poder de compra das famílias contribui mais para o consumo e, por essa via, para as empresas, do que para o combate às desigualdades. As duas medidas beneficiam mais quem tem rendimentos mais elevados sendo, desse ponto de vista, uma iniciativa regressiva.

O efeito orçamental da redução das taxas de retenção na fonte é neutro, na medida em que o que se faz é aproximar o imposto pago mensalmente do imposto devido, e muito ligeiramente. Se considerarmos que o montante devolvido pelo Estado em sede de IRS é da ordem dos três mil milhões de euros, esta aproximação não representa sequer 7% desse valor.

De acordo com os dados que têm sido fornecidos pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, os 200 milhões de euros, quando distribuídos pelos contribuintes, correspondem a um aumento do rendimento disponível que pode variar entre um euro e 17 euros por mês – este último valor para quem ganha mais.

Nas medidas adicionais elencadas pelo Governo em matéria de investimentos estão apenas incluídos os projetos da Escola Digital e uma projeção sobre o montante que se pretende concretizar do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), 500 milhões de euros que terá um efeito neutro no Orçamento por ser subsidiado por Bruxelas.

A decisão de reduzir as taxas de retenção na fonte em 2021 e o crédito de IVA na restauração, hotelaria e atividades culturais, embora aumente o poder de compra das famílias contribui mais para o consumo e, por essa via, para as empresas, do que para o combate às desigualdades.

A atuação expansionista do Estado em matéria de investimento reúne condições para ser significativa, não se esperando que em 2021 o Governo abuse, como no passado, desta rúbrica do Orçamento para atingir o défice orçamental pretendido. Como já foi referido, os investimentos estruturantes deverão chegar aos 1700 milhões de euros, correspondendo o próximo ano à concretização dos montantes mais significativos de projetos com carácter plurianual (ver aqui página 40). A estes valores terá de se somar aquilo que for possível concretizar do PRR, tendo o Governo orçamentado 500 milhões de euros ainda que espere que o sector privado consiga, no próximo ano, usar mais os recursos europeus do plano de emergência do que o setor público. O terceiro vetor está relacionado com as pequenas obras do Programa de Estabilização Económico e Social.

Um orçamento social e para o Estado

Este será um ano de contratações. Se o Governo respeitar os compromissos assumidos no Orçamento e nas negociações com os partidos à sua esquerda, a administração pública contará no fim do próximo ano com mais 7.461 pessoas, concentrados fundamentalmente na Saúde e na Educação. Além do reforço destas funções, o esforço de apoio social reflete-se já nas contas da segurança social.

Uma das marcas deste Orçamento relativamente às últimas quase duas décadas é a existência de iniciativas viradas para o próprio Estado, que passam por contratações e investimentos com especial relevo para a Saúde e a Educação. As contratações, somadas às promoções e progressões nas carreiras, levam a um aumento da massa salarial.

Na Saúde, o Governo espera que o sector acabe 2021 com mais 4.200 profissionais, atingindo-se os 8.400 novos funcionários que estão prometidos desde finais de 2019. Assume-se ainda o compromisso de contratar 261 novos profissionais para o INEM. Paralelamente, projeta-se investir mil milhões de euros, dos quais cerca de 500 milhões vêm do Orçamento do Estado e os restantes de fundos europeus. Na Educação prevê-se igualmente a contratação efetiva de três mil assistentes operacionais. Existe ainda o compromisso de aumentar os recursos da Autoridade para as Condições de Trabalho.

INEM na Sala de Situação Nacional que apenas é ativada para situações de grande dimensão para controlo a nível nacional.

CNN

As despesas com o pessoal vão ainda ser afetadas pelas progressões e promoções e pelas medidas com efeitos plurianuais que foram adotadas para mitigar os efeitos do congelamento de algumas carreiras, como as dos professores. No seu conjunto, aumentarão estes gastos em 300 milhões de euros, 0,1% do PIB previsto para o próximo ano.

Apesar destas medidas, o Governo apresenta um Orçamento em que as despesas com pessoal registam uma redução do seu peso no PIB, passando de 12% para 11,7%.

A aposta política na Saúde e na Educação completa-se com os investimentos previstos. Na Educação, além da Escola Digital e das obras para retirar amianto, estão calendarizadas as reabilitações de várias escolas, entre elas a Escola Secundária João de Barros que está em obras há uma década. A Educação e o Ensino Superior concentram 35% dos investimentos estruturantes.

Ainda nesta perspetiva das funções sociais do Estado, o acentuado aumento dos apoios está a refletir-se nas contas da Segurança Social tendo levado o Governo a decidir, de forma extraordinária, que os montantes de IRC e do Adicional do IMI serão, em 2021, transferidos para a segurança social e não para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS), como se pode ler no art.º228 da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2021. Serão 517 milhões de euros, 140 milhões dos quais do Adicional do IMI. Este Fundo funciona como uma almofada financeira que deve garantir a cobertura do pagamento das pensões no prazo de dois anos.

Ainda nesta perspetiva das funções sociais do Estado, o acentuado aumento dos apoios está a refletir-se nas contas da Segurança Social tendo levado o Governo a decidir, de forma extraordinária, que os montantes de IRC e do Adicional do IMI serão, em 2021, transferidos para a segurança social e não para o Fundo de Estabilização Financeira.

O défice reduz pouco ou muito?

Os indicadores tradicionalmente usados para avaliar o impulso expansionista do Orçamento dão indicações contrárias. Se começarmos pelo crescimento do consumo público, e usando dados do INE, é preciso recuar a 2009, quando o consumo público aumentou 2,9%, para encontrar um crescimento acima do que vai ser registado em 2021 (2,4%). Uma evolução que é fundamentalmente explicada pelo aumento que se perspetiva do emprego público.

Se, em contrapartida, olharmos para o saldo das contas públicas depois de subtraídos os encargos com os juros da dívida pública, o Orçamento de 2021 aparece-nos como menos expansionista. O défice primário diminui de 4,4% do PIB para 1,7%. Mas se nos focarmos no saldo estrutural, a sua correção é mínima, de 0,2 pontos percentuais.

Podemos ainda olhar para o saldo sem as medidas temporárias, levando em conta os valores que são enviados para Bruxelas e, nesse caso, o défice diminui apenas 2,1 pontos percentuais. Mas o Governo diz-nos no relatório que, sem as medidas de apoio ao emprego e ao rendimento no âmbito da crise pandémica, que representa 1,7 pontos percentuais, o défice estaria já abaixo dos 3% do PIB, ou seja, seria de 2,6%.

Existem, por isso, números para todos os gostos, para os que consideram que se está a corrigir excessivamente o défice público e para os que defendem que se devia ir mais longe nessa redução. Certo é que o consumo público, mesmo durante os anos em que o Governo prometeu virar a página da austeridade cresceu sempre abaixo de 1%, tendo registado reduções na era designada como da troika.

Olhando para os grandes números e para as principais medidas que já foram identificadas, o que se pode dizer é que estamos perante um orçamento prudentemente expansionista. Ou, na linguagem que o ministro das Finanças João Leão usou na apresentação do Orçamento, as contas públicas respondem à crise, recuperam a economia e mantêm o rigor.

O expansionismo prudente do Orçamento é marcado pela consciência de que a perda de confiança dos mercados financeiros pode ser desencadeada de forma inesperada, até por razões que não têm a ver com o país. No auge da pandemia, em meados de Março, as taxas de rendibilidade da dívida pública portuguesa aumentaram pelo efeito conjugado do pânico que se via em Itália e por declarações mal compreendidas ou menos cuidadosas da presidente do BCE Christine Lagarde. Neste momento não é esse o caso e Portugal pode dar-se ao luxo de mostrar que suporta juros inferiores aos de Espanha ou Itália.

O Governo reconhece os riscos que enfrenta no próprio relatório do Orçamento do Estado, quando afirma que “o agravamento das contas públicas e uma deterioração mais acentuada da qualidade dos ativos do sistema bancário poderão traduzir-se em dificuldades de financiamento da economia e no agravamento dos canais de contágio associados à crise pandémica com consequências para a estabilidade financeira”.

OLIVIER HOSLET/EPA

A herança do passado é ainda pesada, estando Portugal neste momento financeiramente em pior situação do que estava quando se iniciou a crise das dívidas soberanas em 2010. A dívida pública estava na altura em torno dos 100% do PIB. E a banca portuguesa não conseguiu limpar o crédito malparado do seu balanço, existindo ainda dois bancos que não estão completamente estabilizados, nomeadamente o Novo Banco e o Montepio.

A contrabalançar positivamente o peso do passado temos uma situação conjuntural mais equilibrada: as contas públicas e externas estavam equilibradas, tendo um ponto de partida para esta crise mais favorável do que em 2010. Além disso e mais importante ainda, a política europeia e do BCE é hoje completamente diferente, com um apoio financeiro inédito.

A prudência na política expansionista que este tipo de crise recomenda a um país como Portugal é o preço a pagar pelos erros do passado que se traduzem na mochila de dívida que carregamos e, numa avaliação que está longe de merecer o consenso, de uma política nos últimos quatro anos que poderia ter criado mais margem orçamental do que a pouca que temos. Com mais margem nas contas públicas, hoje podia estar-se a anunciar medidas, por exemplo, de descida de impostos.

A prudência na política expansionista que este tipo de crise recomenda a um país como Portugal é o preço a pagar pelos erros do passado que se traduzem na mochila de dívida que carregamos e, numa avaliação que está longe de merecer o consenso, de uma política nos últimos quatro anos que poderia ter criado mais margem orçamental do que a pouca que temos.

 As controvérsias e um mistério do Orçamento

Num ano de grave crise económica e social que tem associado o risco não desprezível de contagiar o sistema financeiro, o Orçamento do Estado para 2021 parte para o debate na generalidade sem a garantia de apoio do PCP e do Bloco de Esquerda que viabilizaram as contas passadas dos governos de António Costa. E pela voz do BE ficará marcado pela controvérsia em torno do Novo Banco, o caso deste Orçamento.

O mistério deste Orçamento é onde está a contabilização do dinheiro que vai para o Novo Banco. O relatório do Orçamento entregue no Parlamento relatava um empréstimo ao Fundo de Resolução de 468,6 milhões de euros que afinal era um erro. O financiamento, corrigiu de imediato o Ministério das Finanças, é para a CP. E o valor desapareceu.

O modelo que vai garantir a capitalização do Novo Banco, respeitando os contratos, passa agora por um empréstimo dos bancos ao Fundo de Resolução e pela utilização dos recursos que esta entidade tem perfazendo um montante previsto de 476,6 milhões de euros. O INE já esclareceu que esta via de financiamento – sem ser por empréstimo do Estado – agrava igualmente o défice público. Assim sendo, e porque este valor ocorre apenas em 2021, não se compreende porque não aparece, como todos os anos acontece, nos quadros que descrevem as medidas temporárias e “one off”.

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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

O Governo usou esta via de financiamento para se aproximar de um dos pontos exigidos pelo BE que, numa primeira fase, exigiu que o Estado não emprestasse dinheiro ao Fundo de Resolução para capitalizar o Novo Banco, para depois exigir que fossem os bancos a emprestar diretamente.

A impossibilidade de satisfazer esta última exigência, pelos diversos compromissos assinados pelo Estado com a Comissão Europeia e com o Lone Star, mantém a incerteza quanto ao sentido de voto que o BE terá no Orçamento. O PCP tem dito que todas as possibilidades estão em aberto e as suas negociações com o Governo, por contraste com o BE, têm sido muito discretas.

Matérias relativas à legislação laboral têm sido igualmente um tema difícil das negociações, com o Governo limitado na sua margem de manobra pelo que se perspetiva que venha a ser a supervisão europeia no quadro do Plano de Recuperação e Resiliência. O princípio geral para aceder aos recursos a fundo perdido, que no caso de Portugal podem chegar aos 14 mil milhões de euros, é que os países sigam as recomendações aprovadas em Conselho no âmbito do semestre europeu. E uma das preocupações de Bruxelas incide na dualidade do mercado de trabalho português.

A prudência expansionista nas contas públicas é assim uma regra que o Governo tem de seguir também noutras áreas da política económica, com especial relevo para a legislação laboral. E é essa prudência em tempo de crise que dificulta o entendimento entre o PS e os partidos à sua esquerda. Apesar de ser a política recomendada para um país com a situação económica e financeira de Portugal, este está longe de ser o Orçamento ideal para este tipo de crise, todos os protagonistas o percebem, mas é o Orçamento possível, percebe o Governo.

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