Uma publicação realizada no Facebook afirma que a Austrália aprovou um pedido de licença para libertar uma vacina composta por bactérias vivas, geneticamente modificadas, através de “chemtrails” — uma palavra usada amiúde por teóricos da conspiração para se referirem aos rastos deixados no céu pelos aviões em movimento a grandes altitudes. Isso, alega o autor do post, forçaria milhões de australianos a serem vacinados inadvertidamente.

As afirmações, que são falsas, referem-se a um estudo sugerido pela biotecnológica norte-americana PaxVax em 2013 sobre uma vacina com a bactéria da cólera, geneticamente modificada para não causar uma infeção — apenas estimular o organismo a desencadear uma resposta imunitária ao invasor. Assim, em caso de uma infeção real pela bactéria no seu estado natural, o corpo já saberia identificar o agente invasor mais rapidamente e responder também mais depressa e com maior especificidade para a bactéria da cólera.

A publicação em análise utiliza a expressão “chemtrails”, comum em conteúdos relacionados com teorias de conspiração.

Embora os investigadores se tenham proposto administrar esta vacina de um modo não convencional — ela não seria administrada por uma seringa, mas através de uma bebida —, o documento apresentado ao Departamento Regulador da Tecnologia Genética, na Austrália, esclarece que “não vai ser pulverizada pelo ar”. Isto contradiz diretamente a afirmação de que a vacina seria espalhada na atmosfera pelos rastos deixados pelos aviões.

A proposta do estudo também estabelece que ninguém seria obrigado a tomar a vacina: na verdade, ela seria administrada a “até 1.000 voluntários saudáveis” num ensaio clínico devidamente acompanhado pelos investigadores. Acrescenta também que a bactéria da cólera foi geneticamente modificada para não causar doença aos participantes. Esse ensaio clínico foi mesmo aprovado, terminou em 2015 e levou à aprovação da vacina contra a cólera, a Vaxchora.

Nem o ensaio clínico produzido na Austrália nem o documento que comprova a aprovação da vacina nos Estados Unidos dizem respeito à “libertação de uma vacina OGM composta por bactérias vivas em Queensland, via chemtrails”. Esta expressão, utilizada normalmente de modo pejorativo, diz respeito às nuvens deixadas pelos aviões quando o vapor de água libertado por eles congela à conta das baixas temperaturas em altitude. Os rastos de condensação não têm químicos prejudiciais à saúde, como sugere a expressão “chemtrails”. O único químico que os compõe é monóxido de di-hidrogénio. H2O. Água.

Também importa esclarecer que as vacinas compostas por vírus ou bactérias vivos e modificados são uma realidade antiga. Por exemplo, as vacinas contra o sarampo, a rubéola e a papeira, que a maioria das pessoas toma nos primeiros anos de vida, utilizam uma versão viva dos vírus que provocam essas doenças, mas foram modificados para serem enfraquecidos e não causarem infeção.

O enfraquecimento ou inativação dos agentes patogénicos — a vacina contra a hepatite A, por exemplo, usa o microorganismo “morto”, inviável — pode ser realizada através de alterações realizadas diretamente no agente patogénico. Normalmente, usam-se técnicas de engenharia genética, radiação, altas temperaturas ou banhos químicos para impedir que aqueles agentes causem infeção.

Conclusão

É falso que a Austrália tenha aprovado um pedido de licença para libertar uma vacina composta por bactérias vivas da cólera, geneticamente modificadas. Na verdade, as autoridades australianas aprovaram um ensaio clínico de uma vacina contra a cólera, com uma bactéria atenuada para não causar doença. A vacina só foi administrada a voluntários — não atrás de gases, mas de uma bebida. Nenhum dos participantes foi forçado a tomar a vacina: eram todos voluntários.

Assim, segundo a classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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