Circula nas redes sociais uma publicação que alega que a barragem de Torcón, em Toledo, Espanha, foi recentemente esvaziada para “justificar” a existência de uma “seca devido às alterações climáticas”.

“Enviaram-me este vídeo da barragem de Torcón (Toledo). Para que as pessoas não vejam que está cheio, tiveram de o esvaziar de água para justificar que ainda estamos em seca devido às alterações climáticas… vai acontecer em muitos outros sítios”, lê-se na publicação.

O texto acompanha um curto vídeo, de apenas seis segundos, que mostra uma enorme descarga de água na barragem do Torcón, uma represa no rio Torcón, a cerca de 40 quilómetros da cidade espanhola de Toledo, que a barragem abastece.

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Contudo, não é verdade que a barragem tenha sido esvaziada para “justificar” que o mundo viva uma situação de alterações climáticas.

Uma simples pesquisa no Google pelo nome da barragem devolve um grande número de notícias, publicadas nas últimas semanas, em diferentes títulos da imprensa nacional e regional espanhola, que explicam bem o que se passou recentemente no rio Torcón.

O El Digital CLM, jornal regional de Castilla-La Mancha, do grupo do El Español, publicou esta semana vídeos da descarga ocorrida recentemente na barragem do Torcón e explicou as razões. O jornal fala das “intensas chuvas que caíram durante a Semana Santa em grandes zonas de Castilla-La Mancha” e de como esse fenómeno obrigou à decisão de abrir as comportas da barragem do Torcón.

“A barragem do Torcón, situada entre Navahermosa e Menasalbas, teve de abrir as comportas e começar a despejar água para não superar os 90% da sua capacidade e provocar inundações nos terrenos circundantes”, escreve o periódico.

Na verdade, já não é a primeira vez este ano que há problemas na barragem do Torcón.

Em janeiro deste ano, a agência Europa Press noticiava que a barragem do Torcón tinha alcançado níveis máximos de água armazenada, na sequência das tempestades Irene e Juan (que também se fizeram sentir com grande força em Portugal). Devido às fortes chuvas, a barragem tinha alcançado o nível de 90% — e, por isso, já nesse momento foi necessário abrir as comportas para garantir a segurança da barragem.

Desde janeiro de 2021 que a barragem não alcançava o nível máximo: tinha acontecido com a tempestade Filomena. A região de Toledo tem sido, aliás, afetada por uma consistente seca ao longo dos últimos anos — e a barragem do Torcón não se tem revelado suficiente para garantir o abastecimento.

De resto, no final de março, já tinha havido apelos políticos para aumentar a capacidade de armazenamento da água na região, justamente devido à grande seca que afeta o território.

No rio Torcón existe um sistema composto por duas barragens: Torcón I (aquela que está em causa nesta publicação) e Torcón II (mais a montante). A barragem de Torcón II abastece um conjunto de municípios a sul de Toledo; a água que transborda desse reservatório segue até Torcón I, onde existe uma barragem de maiores dimensões, responsável por abastecer a cidade e outras localidades da região.

A barragem de Torcón I, contudo, é também ela muito pequena (uma capacidade máxima de apenas 7 hectómetros cúbicos), pelo que não é incomum que um período de fortes chuvas a encha totalmente e obrigue ao seu esvaziamento — desaproveitando muita da água ali armazenada.

Por tudo isto, percebe-se que a barragem do Torcón não foi aberta para “justificar” a ideia (que os autores da publicação reputam como falsa) de que o planeta vive um cenário de alterações climáticas. Trata-se de uma medida de emergência para dar resposta a uma série de tempestades que nos últimos meses encheram a barragem, que é muito pequena, acima do seu limite de segurança.

No limite, a situação que levou à necessidade de esvaziar uma barragem de urgência até é mais uma evidência de como o planeta enfrenta, com maior frequência, os impactos das alterações climáticas.

É que, contrariamente à crença de alguns (como o célebre caso de Donald Trump, que periodicamente alimenta a desinformação confundindo propositadamente os conceitos, diferentes, de clima e meteorologia), as alterações climáticas não se traduzem apenas na seca e na falta de água.

Pelo contrário, o maior impacto das alterações climáticas no planeta é o aumento da frequência e da intensidade dos fenómenos meteorológicos extremos: períodos de seca mais intensos e maiores, mas também tempestades mais frequentes e mais fortes, com grandes impactos na vida humana e na economia global.

Como recordava, numa entrevista ao Observador, o antigo presidente do IPMA, Miguel Miranda, o mundo precisa de se preparar para “mais tempestades e velocidades de vento mais elevados”, para uma “subida de um metro do nível médio do mar”, para “situações de chuva intensa”, mas também para “períodos de seca prolongados, o que significa que a agricultura e o abastecimento de água têm de ter suficiente capacidade de armazenamento para poder resistir” e para fogos rurais de maior intensidade, só para citar alguns exemplos.

Conclusão

Trata-se de uma publicação falsa. As comportas da barragem do Torcón, em Toledo, foram abertas nas últimas semanas para responder, de emergência, às fortes chuvas que fizeram a albufeira superar o seu limite de segurança. Não foram abertas para “justificar” a existência da seca e das alterações climáticas, como sugere a publicação. Aliás, a crescente frequência de fenómenos extremos tão opostos como secas e inundações é precisamente um impacto das alterações climáticas.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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