Tal como acontece na Ucrânia, a guerra entre o Israel e o Hamas estende-se muito para além dos avanços e recuos no terreno, dos ataques-surpresa e das vítimas civis. A guerra da desinformação ganha cada vez maior dimensão e preponderância, ao ponto de poder ser determinante para virar, contra um ou outro lado do conflito, as opiniões públicas de muitos países.

Cerca de duas semanas depois dos ataques do Hamas contra várias localidades e cidades israelitas em redor da Faixa de Gaza, começou a circular no Facebook um vídeo dando conta de uma alegada encenação de um atentado, com recurso a um carro bomba, que terá sido orquestrada pelo Hamas com o intuito de culpar as forças armadas israelitas. No vídeo, vê-se um homem a colocar um explosivo num carro estacionado numa rua onde não se encontram pessoas. De imediato, o homem entra num outro carro e afasta-se do local. Poucos segundos depois, dá-se uma explosão, que não provoca feridos. De seguida, um grupo de pessoas aproxima-se e começam a encenar o atentado: umas deitam-se no chão, fingindo estarem mortas ou feridas, enquanto outras gritam por ajuda.

“A indústria da FAKE NEWS que o Hamas e canais igual globolixo mostram”, escreve um dos utilizadores que partilhou o vídeo, referindo-se ao canal brasileiro Globo. Mas será o vídeo em causa uma encenação montada pelo Hamas para alimentar a guerra da desinformação?

No vídeo, feito por uma câmara de videovigilância, pode ver-se, de facto, uma encenação de um atentado com recurso a um carro-bomba. No entanto, nem o vídeo foi captado durante o atual conflito entre o Hamas e Israel nem a ação decorre na Faixa de Gaza.

O vídeo em causa foi captado em Bagdade, a capital do Iraque, no ano de 2016 e retrata, de facto, a encenação de um atentado à bomba. O responsável pela encenação? O militar iraquiano Harith al-Sudani, um espião que se infiltrou no grupo terrorista Estado Islâmico para sabotar os ataques terroristas levados a cabo no Iraque. Al-Sudani transportava e desativava as bombas que lhe eram entregues pelos terroristas e encenava explosões de baixa magnitude, pedindo ajuda à população para encenar mortes e feridos, de modo a poder ludibriar os terroristas, fazendo-os acreditar que os ataques tinham provocado muitas vítimas e, por isso, tinham sido bem sucedidos.

A encenação em causa, que ocorreu perto de um mercado (que seria o alvo do atentado), teve também o contributo da polícia iraquiana, que, pouco depois da explosão, anunciou que o atentado encenado tinha provocado a morte a 34 pessoas. A história por detrás da explosão foi amplamente explicada por meios de comunicação social internacionais, como o New York Times.

O vídeo que mostra a encenação acabou por ser relevada pelo Iraque depois da morte de al-Sudani, o agente duplo que terá salvo centenas de vidas dos seus compatriotas. Acredita-se que o agente tenha sabotado, durante cerca de dois anos, mais de 30 explosões deste género e impedido 18 atentados suicidas planeados pelo Daesh.

Conclusão

A explosão encenada de um carro não mostra a “indústria de fake news do Hamas”. O vídeo que está a ser partilhado no Facebook foi gravado há sete anos, muito longe da Faixa de Gaza: em Bagdad no Iraque. Mostra, de facto, a encenação de um atentado à bomba, orquestrado por um militar iraquiano que se infiltrou no grupo terrorista Estado Islâmico e que —  com a colaboração da polícia iraquiana e da população — sabotou dezenas de ataques terroristas, salvando centenas de vidas.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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