Não é uma tese nova: há anos que circula nas redes sociais a ideia de que Francisco Louçã recebe a subvenção vitalícia para ex-deputados. Nesta publicação em concreto, feita no Facebook, este utilizador indigna-se com a “vergonha” que diz verificar-se por Louçã supostamente receber a tal quantia mensal a que várias centenas de antigos políticos e juízes têm direito, “paga pelo povo que trabalha”.

Acontece que não só isto não é verdade como o próprio Francisco Louçã já desmentiu essa ideia. Em primeiro lugar, é possível comprovar que o fundador do Bloco de Esquerda não consta da lista de beneficiários desta subvenção, recorrendo ao site da Caixa Geral de Aposentações, que publica essa lista atualizada todos os meses. Em fevereiro de 2022, como indica este documento, há 309 antigos políticos ou juízes que podem receber a quantia (embora para 29 deles a atribuição do valor esteja de momento suspensa), mas Louçã não faz parte dessa lista.

A conclusão é a mesma se verificarmos o ficheiro correspondente ao momento — em 2019 — em que a lista voltou a ser publicada, depois de a sua publicação ter sido suspensa devido ao Regulamento Geral da Proteção de Dados, e em que este post surgiu pela primeira vez no Facebook: Louçã também não aparecia entre esses nomes. E, na verdade, nunca poderia aparecer: tendo em conta as condições necessárias para requerer a subvenção vitalícia — que explicaremos a seguir —, o fundador do Bloco não teria sequer direito a recebê-la, porque não ocupou o lugar de deputado durante anos suficientes.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

De resto, em 2020, em resposta a uma tese que circulava nas redes sociais e noutros sites e garantia que estaria reformado e a receber uma subvenção de 3500 euros, Louçã recorreu à sua conta de Facebook para garantir que era “tudo falso”: “Nem estou reformado nem recebo nem receberei um cêntimo de subvenção. Podia ter recebido um “subsídio de reintegração” ao sair do parlamento e recusei. Mas quem põe a mentira a circular sabe bem qual é a verdade, não sabe?”.

Essa tem sido, de resto, a posição do Bloco sobre este tipo de compensações: em 2011, ainda enquanto líder do Bloco, Louçã criticava o “muito dinheiro” que se gastava nas subvenções vitalícias e frisava que “não há uma única pessoa do BE nas listas imensas de tantos partidos diferentes que receberam subvenções, ou que recebem subvenções ou que receberam subsídios de reintegração”.

Em 2016, perante uma proposta de corte nas subvenções (para quem tivesse um agregado familiar com um rendimento mensal superior a dois mil euros) barrada pelo Tribunal Constitucional, Catarina Martins voltava a garantir: “No Bloco de Esquerda, nunca nenhum deputado nem deputada ou eurodeputada recebeu alguma vez subsídios de reintegração ou subvenções, mesmo que a isso tivessem direito”, assegurava Catarina Martins.

Regime revogado no tempo de Sócrates

Em rigor, o regime das subvenções vitalícias acabou ainda durante o primeiro Governo de José Sócrates, em 2005. Mas com duas salvaguardas: o fim dessa figura não teve efeitos retroativos — quem já recebia continuou a poder receber — e foi criado um regime transitório que garante que quem tinha, à data do fim do regime, condições para poder pedir a subvenção pode continuar a fazê-lo.

Segundo a lei — a 4/85, entretanto atualizada — os membros do Governo, deputados e juízes do Tribunal Constitucional que tenham exercido essas funções (até 2005) durante oito ou doze anos, consecutivos ou interpolados, têm direito a receber uma subvenção mensal vitalícia. Ora, até à revogação do regime Louçã só tinha sido deputado durante seis anos, entre 1999 e 2005, pelo que não reúne as condições necessárias para pedir a subvenção.

Subvenção vitalícia. Números, factos e mitos

Também existe um regime próprio para ex-presidentes da Assembleia da República, ex-primeiros-ministros, ex-Presidentes da República e ex-titulares de cargos políticos das regiões autónomas, que não constam desta lista.

O exercício de funções políticas ou públicas remuneradas determina, no entanto, que esse pagamento fica suspenso durante o período em que as funções forem exercidas — neste momento, na lista de subvenções suspensas encontram-se nomes como Rui Rio, Jerónimo de Sousa (que, segundo o PCP, dá o dinheiro ao partido), Eduardo Ferro Rodrigues ou Maria de Belém. Para quem exerce uma atividade privada e recebe mensalmente mais de três vezes o indexante dos apoios sociais (1.329 euros) há um corte no valor da subvenção. Mas, e voltando à afirmação em concreto em que se baseia este fact check, nenhum desses cálculos se aplica a Louçã, que efetivamente não recebe qualquer valor.

Conclusão

A publicação em causa garante que Francisco Louçã recebe uma subvenção vitalícia “paga pelo povo”, mas a verdade é que o antigo líder do Bloco de Esquerda não consta da lista de beneficiários e nem sequer reuniria as condições para tal. Louçã é professor catedrático de Macroeconomia no ISEG, em Lisboa, não está reformado e não recebe subvenção para ex-deputados.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

IFCN Badge