Um vídeo partilhado recentemente no Facebook mostra uma fragata com bandeira russa a atracar num porto cubano. São 28 segundos de imagens sem contexto, captadas a partir de vários ângulos, acompanhadas de uma banda sonora instrumental a puxar ao épico e rematadas por uma legenda que não deixa margem para dúvidas: “Estamos de volta à crise dos mísseis de 1963… Os EUA levam as suas armas para a Ucrânia e a Rússia envia a fragata da Marinha Almirante Gorshkov para Cuba… Espera-se que o submarino nuclear russo Kazan, com mísseis de cruzeiro da classe Yasen, também chegue ao quintal dos EUA…”.

De acordo com as publicações, o vídeo teria sido captado no início de junho, e seria prova inequívoca da tensão crescente entre Estados Unidos e Rússia na zona do Caribe, mas a verdade é que as imagens, apesar de mostrarem efetivamente uma embarcação russa a atracar num porto cubano, não foram captadas neste mês — aliás, não foram captadas neste ano, nem sequer nesta década.

Uma pesquisa na internet revela que o vídeo publicado agora no Facebook resulta da manipulação de imagens registadas e publicadas a 24 de junho de 2019, há já cinco anos, portanto, pela Associated Press.

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Na altura, a agência de notícias partilhou na sua conta de YouTube um vídeo, com duração de um minuto e 28 segundos, sob o título “Navios da Marinha russa entraram no porto de Havana”. No texto adicionado às imagens, a Associated Press explicava que a chegada da frota russa à capital cubana era um “sinal de solidariedade entre o outrora principal patrono de Cuba e a nação insular”, bem como “do aprofundamento da fratura com os Estados Unidos”, que no início desse mesmo mês tinham proibido as viagens dos navios de cruzeiro com bandeira americana ao país.

“É a primeira visita de navios da Marinha russa desde que a administração Trump impediu todos os navios de cruzeiro americanos de visitar Cuba, os navios atracaram nos mesmos cais outrora ocupados por navios de cruzeiro dos EUA há apenas algumas semanas, para o espanto de um punhado de espetadores espalhados ao longo da estrada do cais que circunda o porto de Havana”, acrescentava ainda a notícia.

Ora, percebe-se facilmente que o vídeo agora partilhado nas redes sociais é exatamente o mesmo, se bem que as imagens tenham sido aproximadas e reenquadradas.

Nada disto invalida que, de facto, uma frota russa tenha chegado efetivamente a Havana nestes últimos dias. O Ministério das Relações Exteriores de Cuba anunciou no passado 6 de junho, em comunicado, que, entre os dias 12 e 17 deste mês, o porto da capital ia receber a visita oficial ao porto de Havana de um “destacamento naval da Federação Russa”. Ao todo, explicava a nota, iam atracar no país a fragata Gorshkov, o submarino de propulsão nuclear  Kazan, o petroleiro Pashin e o rebocador Nikolai Chiker.

“Esta visita inscreve-se no quadro das relações históricas de amizade entre Cuba e a Federação Russa e está em estrita conformidade com a regulamentação internacional de que Cuba é Estado Parte. Nenhum dos navios é portador de armas nucleares, pelo que a sua escala no nosso país não representa uma ameaça para a região. A visita de unidades navais de outros países é uma prática histórica do governo revolucionário com nações com as quais mantemos relações de amizade e colaboração”, assegurava ainda o comunicado, que avançava também que, uma vez em águas e em solo cubanos, os marinheiros russos iriam visitar locais de interesse histórico e cultural e cumprir todo um “programa de atividades” que incluía “visitas de cortesia ao Chefe da Marinha Revolucionária e ao Governador de Havana”.

Entretanto, a 12 de junho, dia da chegada da frota russa a Cuba, um alto funcionário da administração dos Estados Unidos, questionado pela Associated Press, garantiu que que os destacamentos da Rússia ao país “não representam uma ameaça direta aos Estados Unidos”. E fez ainda questão de frisar que, apesar de entre as quatro embarcações russas se encontrar um submarino movido a energia nuclear, os serviços de informação americanos confirmaram que nenhum dos navios transporta armas nucleares.

Já um porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, apesar de admitir que o número de exercícios militares do género aumentaram graças ao apoio declarado pelos EUA à Ucrânia, garantiu à agência de notícias que as escalas da Rússia em Cuba são “visitas navais de rotina”.

Conclusão

É verdade que uma frota composta por quatro embarcações russas atracou este mês no porto de Havana, mas não é de todo verdade que o vídeo partilhado nesta publicação de Facebook tenha sido captado nesse momento.

As imagens, manipuladas, aproximadas e reenquadradas, a partir de um vídeo captado pela Associated Press, mostram a chegada, em junho de 2019, de uma série de embarcações russas à capital de Cuba. O que, só por si, mostra que estas visitas são comuns, e não um retrocesso aos tempos da Guerra Fria e da crise dos mísseis de 1963, agora provocado pelo auxílio prestado pelos Estados Unidos à Ucrânia, como quer fazer crer a legenda que acompanha a publicação.

Para além de ter sido previamente anunciada pelo Ministério das Relações Exteriores de Cuba, a visita foi classificada como rotineira pelas autoridades norte-americanas. À Associated Press, um alto funcionário da administração Biden assegurou mesmo: os destacamentos da Rússia a Cuba “não representam uma ameaça direta aos Estados Unidos”.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ENGANADOR

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

PARCIALMENTE FALSO: as alegações dos conteúdos são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou está incompleta.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de factchecking com o Facebook.

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